Este texto foi originalmente publicado no blog “Mundo analista“. Para ler o original, clique aqui.
Pensador 2Na primeira postagem da série “Pensando Direito: como a direita pode inovar na política“, elenquei doze propostas de Reforma Política que a direita poderia lançar de acordo com os seus princípios básicos de Estado enxuto e limitado, liberdade individual, economia livre, leis penais rígidas e etc. Conforme prometido, hoje vou falar de uma delas em específico: o autofinanciamento partidário. Antes, porém, vamos ver o panorama geral da questão.


O panorama geral da questão
Como o leitor sabe, nada é de graça. Isso inclui o financiamento das campanhas eleitorais dos partidos políticos. Sim, elas também custam dinheiro. E muito! Mas quem é que paga essa conta? Bom, cada país adota um modelo de financiamento, com suas regras peculiares. No Brasil, atualmente, o modelo em voga é misto. Isso significa que as campanhas são sustentadas em parte pelo dinheiro público (o chamado “fundo partidário”) e em parte por doações de pessoas físicas ou jurídicas.


Esse modelo tem sido questionado cada vez mais por muitas pessoas, a maioria de esquerda. Para elas, um modelo que permite a empresas financiar campanhas abre uma margem enorme para a corrupção. Nesse sistema, as empresas podem doar dinheiro em troca de favores após o partido se eleger. O partido se elege e para não perder os financiadores, vendem licitações bilionárias para as empresas doadoras, ou espantam a concorrência através das empresas reguladoras.


Em virtude desses problemas, a esquerda tem proposto que o financiamento de campanhas passe a ser 100% público. Ou seja, nenhuma empresa ou pessoa física poderia mais doar. As campanhas seriam totalmente pagas pelo fundo partidário, que seria bem maior do que é hoje, evidentemente.


Embora o atual modelo seja falho e realmente ofereça grande margem para corrupção, não é preciso pensar muito para concluir que a proposta de financiamento totalmente público também é péssima. Em primeiro lugar, ela vai obrigar todos os brasileiros a contribuir com partidos cuja ideologia não concordam. Isso é ridículo! Você estará ajudando um partido do qual discorda a angariar votos para governar você! Ninguém deve ser obrigado a fazer esse tipo de coisa. É imoral! É antiético! É antidemocrático!


Em segundo lugar, o financiamento totalmente público irá aumentar o nível de impostos. E esse aumento, meus caros, não irá parar, porque a cada ano surgem mais partidos políticos no Brasil. Hoje temos 32. Daqui há alguns anos talvez tenhamos 70. Ademais, quando o dinheiro é “público” é muito fácil aumentar a verba para gastar cada vez mais. Os políticos votam a favor, o presidente dá uma canetada e pronto. Para os partidos que estão no poder, então, é uma maravilha! Eles dispõem de todo o dinheiro que quiserem para gastarem com marketing e se manterem soberanos.


Ok. Descartamos o financiamento público. Mas o sistema que aí está realmente é ruim. Como podemos lidar com isso? Bom, no caso das licitações, isso poderia ser resolvido (pelo menos legalmente) proibindo empresas doadoras de participarem das mesmas. Há, inclusive, um projeto tramitando na câmara nesse sentido (PL 6445/13). Não obstante, embora isso fosse ajudar bastante, não excluiria a possibilidade de grandes empresas criarem uma empresa fantasma para ser doadora, ou até algumas pessoas físicas.



É claro que seria um processo mais complicado e um pouco arriscado, já que a descoberta implicaria em escândalo e prisões. Ainda assim, a possibilidade existe.
Quanto à outras trocas de favores, como a de proteger empresas de concorrentes, isso é algo quase inevitável, mesmo com a aprovação da PL citada acima.



Governos intervencionistas usam desse método há décadas. À pretexto de regular setores, ou proteger a nação de investidores estrangeiros, ou de proteger o cidadão contra o empresariado, criam diversas burocracias, limitações, barreiras e, claro, altos impostos.


Só quem sobrevive a isso são as grandes empresas. A concorrência morre e as grandes empresas amigas do governo sobrevivem. Isso é uma estratégia passiva do governo.


Ainda podemos falar das ativas, quando a agência reguladora fecha os olhos para problemas que suas empresas amigas criam. Portanto, para resolver isso, seria necessário uma enorme reforma na forma como o governo intervém na economia, diminuindo seu tamanho e poder e liberalizando a economia. Ainda assim, haveria o risco eventual de o governo e grandes empresas tentarem fazer negócios escusos. É lucrativo para os dois lados, afinal. E numa sociedade tão corrupta quanto a brasileira, qualquer coisa pode acontecer.


O Autofinanciamento
A proposta de autofinanciamento resolveria todos os problemas. Neste modelo, o financiamento não seria nem público, nem feito por empresas, mas pelos próprios filiados de cada partido. Isso impediria que nosso dinheiro fosse usado para financiar partidos que odiamos, que os impostos fossem elevados e que empresas participassem das doações. Mas isso seria viável?


Totalmente. Vamos fazer alguns cálculos simples.



Nas eleições de 2014, foram gastos cerca de 5 bilhões de reais em campanha, somando todos os 32 partidos. Nos 32 partidos, temos 15 milhões de filiados, no total. Se cada filiado contribuir com 1 real mensal ao seu partido, temos no total, 15 milhões de reais. Se cada um contribuir com 10 reais mensais, temos 150 milhões por mês.



Se cada um contribuir com 50 reais, temos 750 milhões de reais mensais. Vamos trabalhar com a contribuição de 50 reais mensais.


As eleições ocorrem de dois em dois anos. Então, temos 24 meses para juntar dinheiro. Multiplicando os 750 milhões por 24 meses, temos a volumosa quantia de: R$ 18.000.000.000,00 (dezoito bilhões) de reais.


Quanto foi gasto em 2014 de campanha mesmo? 5 bilhões. Ou seja, dá pra fazer as campanhas e ainda sobram 13 bilhões para os 32 partidos gastarem com luz, água, telefone, viagens, eventos e outras atividades internas de seu núcleos durante aqueles dois anos.

Agora, vamos fazer alguns cálculos por partido político. Escolhi três partidos: O PT, o PSDB e o PSOL.

O PT e o PSDB foram os que mais gastaram. Cada um deles precisou de cerca de 1 bilhão de reais na campanha de 2014.

O PT possui hoje 1.589.941 filiados. Se multiplicamos esse número pelos 50 reais de contribuição mensal, temos o valor arrecadado de R$ 79.497.050,00 (mais de 79 milhões) por mês. Multiplicando esse número por 24 meses, temos R$ 1.907.929.200,00 (quase 2 bilhões).

O PSDB possui hoje 1.352.107 filiados. Multiplicando pela contribuição de 50 reais, temos R$ 67.605.350,00 (mais de 67 milhões). Multiplicando esse número por 24 meses temos, R$ 1.622.528.400,00 (mais de 1,5 bilhão).

O PSOL foi o partido que menos gastou. Foram 12 milhões. Ele possui hoje 89.151 filiados. Multiplicando pelos 50 reais mensais, temos R$ 4.457.550,00 (quase 4 milhões e meio) por mês. Multiplicando por 24 meses, temos R$ 106.981.200,00 (quase 107 milhões).


Algumas considerações
1. Como se pode ver, a arrecadação dos partidos pelos seus próprios filiados seria suficiente para financiar as campanhas de 2014, com bastante folga;

2. A justiça poderia diminuir os gastos partidários proibindo propagandas políticas na televisão e no rádio. Haveria permissão apenas para debates. Além de aliviar o orçamento dos partidos, isso nos livraria de boa parte do marketing político, que não nos serve para nada (bom marketing não significa boas propostas, não é verdade?);

3. A justiça poderia impedir doações de pessoas jurídicas (empresas ou ONG’s), limitar os valores das doações de pessoas físicas de acordo com a renda declarada da mesma e exigir que todo aquele que quiser doar para um partido, deverá se filiar ao mesmo. Isso tornaria bem mais simples o rastreamento de possíveis operações de “caixa 2″.

4. A justiça poderia obrigar os políticos eleitos a contribuírem com quantias maiores, já que ganham bem. Quem sabe 10% da renda bruta. Se um partido tiver 100 políticos eleitos em todo o país e cada um deles ganhar, em média, 10 mil reais mensais, o partido arrecadará 100 mil reais deles em apenas um mês. Isso dá mais de 2 milhões no fim de dois anos. Para um partido que tenha feito uma campanha de 12 milhões, como o PSOL, 2 milhões é um bom montante.


5. Se o dinheiro mensal destinado às campanhas for aplicado em uma poupança, durante os dois anos, haverá uma renda interessante para o partido.


6. Se mesmo assim os partidos não tiverem dinheiro suficiente para suas atividades, o problema é deles. Ninguém tem nada a ver com isso a não ser os próprios filiados e quem deseja vê-los no poder.


7. Existem algumas tendências econômico/administrativas que nunca devem ser esquecidas: (a) Quanto mais se tem, mais se gasta; (b) quanto mais se pode gastar, menos se preocupa em economizar; (c) quanto menos dinheiro se tem, melhor ele tende a ser administrado; (d) o melhor administrador é sempre aquele que faz muita coisa com pouco dinheiro. Então, mesmo que os partidos aleguem que o dinheiro é pouco, é com pouco dinheiro que os pobres sobrevivem e que pequenas empresas se expandem. Uma vez que os partidos pretendem eleger administradores do país, não há nada mais natural que exigirmos que eles aprendam a administrar a verba.


Esta proposta é totalmente pautada nos ideais de Estado enxuto e limitado. Quem quer um Estado que cumpra seu papel e não mais que isso, não tem porque não aceitar essa ideia. E se o povo, em massa, exigisse esse tipo de Reforma Política, rechaçando e ridicularizando as outras, duvido que ela não acabaria saindo.


Mas isso, claro, se tivermos defensores do Estado mínimo no Congresso (o que também depende do povo).


Na próxima postagem, vamos falar sobre propostas para a educação.
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Confira os números citados:
G1: Partidos informam ao TSE que têm mais de 15 milhões de filiados
Folha: Custo de R$ 5 bilhões faz eleições deste ano baterem recorde histórico
Estadão: Campanhas gastaram 5 bilhões em 2014