terça-feira, 21 de junho de 2016

Brasil: Violações de direitos são recorrentes em projetos de desenvolvimento, dizem relatores da ONU

Publicado em junho 20, 2016 por

Em relatório sobre direitos humanos e atividades de empresas no Brasil, especialistas independentes da ONU alertaram que o financiamento privado de campanhas eleitorais exerce ‘influência indevida’ sobre fiscalização de projetos de infraestrutura.


Especialistas detalharam falhas do governo e de corporações em episódios como as obras de Belo Monte, a preparação do Rio de Janeiro para as Olimpíadas e o desastre ambiental no Rio Doce, em Minas Gerais e no Espírito Santo.


Indígenas ocupam canteiro de obras de Belo Monte em 2013. Foto: Paygomuyatpu Munduruku / Ocupação Munduruku / Flickr (CC)

Fiscalização inadequada, poluição do meio ambiente e destruição de comunidades afetadas por grandes projetos são alguns dos aspectos recorrentes das violações dos direitos humanos perpetradas pelo setor empresarial no Brasil. Em alguns casos, o financiamento privado de campanhas eleitorais seria responsável por exercer uma “influência indevida” sobre processos regulatórios do governo.


Essas são algumas das conclusões apresentadas pelo Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos, em um relatório final sobre o Brasil elaborado após visita oficial ao país entre os dias 7 e 16 de dezembro do ano passado.


“O Brasil tem uma legislação e instituições sólidas para a proteção contra abusos aos direitos humanos cometidos por empresas, e nós clamamos para que o país faça uso desses avanços para melhor proteger os direitos humanos na prática”, disse o especialista em direitos humanos e atual coordenador do Grupo de Trabalho, Dante Pesce, durante apresentação do relatório no Conselho de Direitos Humanos da ONU, nesta sexta-feira (17).



O documento alerta para um cenário generalizado de infrações onde indústrias extrativistas, o agronegócio, a construção civil e o setor de energia — no projeto do Grande Carajás no Pará, no Porto do Suape em Pernambuco, na Baía de Sepetiba no Rio de Janeiro, na Ponta da Madeira no Maranhão e outras partes do Brasil — estão envolvidos em casos de desmatamento, expropriação, liberação de resíduos tóxicos, violência e conflitos envolvendo comunidades afetadas por empreendimentos.


Pesce salientou que, para combater essas violações, “a participação da sociedade civil brasileira e dos corajosos defensores de direitos humanos é também essencial”.
“Nesse sentido, estamos extremamente preocupados com os riscos graves encarados por ativistas que levantam a sua voz contra abusos aos direitos humanos cometidos por empresas, e alarmados com o alto número de mortes de defensores de direitos humanos.”



O Grupo de Trabalho detalhou as violações de princípios de direitos humanos em casos específicos no Pará, no Rio de Janeiro, em Minas Gerais e no Espírito Santo.


Governo federal e Norte Energia acusados de ‘etnocídio’ em Belo Monte

 

 

Especialistas destacaram que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) concedeu, em novembro de 2015, uma licença operacional ao consórcio Norte Energia para a continuação das obras da usina de Belo Monte mesmo após o Ministério Público Federal (MPF) e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) terem se posicionado contra a autorização.


A negativa dos dois organismos foi motivada pelo fato de as empresas envolvidas não terem satisfeito as condições necessárias para mitigar impactos ambientais e sociais da hidrelétrica — construída na bacia do rio Xingu e em uma região que abriga 11 terras e duas áreas indígenas.


Em dezembro do ano passado, o MPF deu início a um processo judicial em que acusa o governo federal e a Norte Energia de etnocídio devido à destruição da sociedade e da cultura indígenas durante as obras da barragem da usina.



Testemunhos apontam para
um fracasso em considerar
de forma plena os contextos social
e cultural em torno de Belo Monte.




O Grupo de Trabalho da ONU ressalta ainda que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) abriu um processo contra o Brasil em dezembro de 2015 por conta do projeto de Belo Monte.


No relatório, os especialistas lembram que, em 2011, o organismo regional já havia exigido a suspensão do licenciamento e da construção da usina, afirmando que “a vida e a integridade física das comunidades estavam em risco”.


Embora durante sua visita os relatores independentes da ONU tenham sido informados pela Norte Energia de que as empresas cumpriram as condições exigidas para prosseguir com as obras, implementando iniciativas voltadas para a população local, o Grupo de Trabalho alerta que o consórcio “não parece ter uma abordagem baseada em direitos humanos”.


Indígenas ocupam canteiro de obras de Belo Monte em 2013. Foto: Paygomuyatpu Munduruku / Ocupação Munduruku / Flickr (CC)
Indígenas ocupam canteiro de obras de Belo Monte em 2013. Foto: Paygomuyatpu Munduruku / Ocupação Munduruku / Flickr (CC)


Autoridades estatais em Belém relataram aos especialistas que o grupo empresarial construiu uma escola que “era apenas um contêiner temporário inadequado ao clima quente de Altamira”. O local agora é utilizado como um armazém. Populações ribeirinhas foram reassentadas em moradias longe do rio — sua principal fonte de subsistência — sem infraestrutura.


Em ambos os casos, parece ter havido poucas ou nenhuma consulta junto às comunidades afetadas. Em outras avaliações apresentadas ao Grupo de Trabalho, o Instituto Socioambiental enfatizou que o IBAMA realiza análises quantitativas e não considera se as habitações construídas para pessoas deslocadas são adequadas às condições locais culturais.


Caso isso seja verdade, a situação representaria uma deficiência do IBAMA em monitorar a obediência às exigências de licenciamento ambiental. “Testemunhos apontam para um fracasso em considerar de forma plena os contextos social e cultural em torno de Belo Monte”, alertaram os especialistas.


O relatório chama atenção ainda para o temor dos residentes do bairro Independente II — em Altamira — de que as promessas de reassentamento não sejam cumpridas. A região abriga 400 casas e será inundada quando o reservatório da represa for enchido.



A Norte Energia não havia planejado qualquer tipo de realocação para os moradores, mas foi obrigada após pressão da sociedade civil e uma subsequente decisão do IBAMA. O plano de reassentamento deverá ser apresentado até outubro.



Altamira também foi citada por sofrer as consequências da falta de planejamento para a recepção do grande fluxo de trabalhadores da construção civil que chegou à cidade. O crescimento populacional veio acompanhado de casos de violência, tráfico, exploração sexual de mulheres e crianças — conforme destacado pela Secretaria de Direitos Humanos — e uso abusivo de álcool.



Vila Autódromo: quem quer ficar enfrenta insegurança física e psicológica

 

 

Durante sua passagem pelo Brasil, o Grupo de Trabalho visitou a Vila Autódromo, no Rio de Janeiro. A comunidade — próxima a canteiros das grandes obras feitas para as Olimpíadas e Paralimpíadas de 2016 — abriga cerca de 100 pessoas que se recusam a deixar suas casas e a serem reassentadas em função dos projetos de construção civil vinculados às competições de agosto e setembro.
Vila Autódromo. Protesto em abril de 2015. Foto: Catalytic Communities / Flickr (CC)
Vila Autódromo. Protesto em abril de 2015. Foto: Catalytic Communities / Flickr (CC)


Os especialistas independentes das Nações Unidas foram informados de que, em junho de 2015, foram registrados confrontos violentos entre residentes e a Guarda Municipal — que tentou romper uma “corrente humana” formada por moradores em volta de duas casas que seriam demolidas.


O Grupo de Trabalho conheceu brasileiros que participaram desta manifestação, além de tomar conhecimento de imagens que retratam o tratamento violento dado pela Guarda a idosos da Vila, “resultando em rostos ensanguentados e ferimentos”.


Embora o prefeito Eduardo Paes tenha afirmado que indivíduos poderiam permanecer em seus lares e que ninguém seria forçado a sair da região, “a vida para os que permaneceram na Vila Autódromo estava sendo tornada física e psicologicamente insegura”, disseram os relatores da ONU.


Demolições continuaram desde dezembro e sem aviso prévio a moradores e o centro comunitário — onde os especialistas independentes realizaram algumas reuniões — foi destruído.


Ao visitar a comunidade, o Grupo observou ainda que os moradores vivem rodeados por canteiros e foi informado de que os residentes sofrem com cortes frequentes de eletricidade e água. Além dos destroços das casas demolidas, valões por onde circulam rejeitos aparentemente tóxicos podem ser encontrados no perímetro da Vila.



No documento, os relatores da ONU explicam que conversaram sobre a situação do local com o Comitê Organizador dos Jogos Rio 2016. Durante o encontro, o organismo foi encorajado a manifestar preocupação quanto à conjuntura em discussões com a Prefeitura e outras autoridades municipais, uma vez que as obras em torno da Vila Autódromo estão ocorrendo devido à realização das Olimpíadas.


Governo estadual e federal ‘podia ter feito mais’ pela população de Minas Gerais após desastre de Mariana

 

 

A respeito do desastre ambiental provocado pelo rompimento da barragem de Fundão em Minas Gerais, os especialistas concluíram que “houve uma falha no plano de contingenciamento da Samarco, uma vez que as pessoas não foram alertadas sobre o desastre, apesar do intervalo de dez horas entre a ruptura da represa e a enchente de Barra Longa”.



Avisos prévios teriam permitido à população salvar pertences e poderiam ter salvado vidas. A inundação levou à morte de 18 pessoas e à destruição das cidades de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, afetando outros 3,2 milhões de indivíduos que moram às margens do Rio Doce. A Samarco (Vale/BHP Billiton) também demorou quase duas semanas para anunciar que outras duas estruturas eram pouco seguras.
Ruptura da barragem provocou a liberação de volume de 55 milhões a 60 milhões de metro cúbicos de rejeitos de minério no Rio Doce. A lama percorreu mais de 600 quilômetros até chegar ao oceano, matando peixes, a flora, a fauna e disparando uma crise social e ambiental que afetou a subsistência e o acesso à água da população, incluindo indígenas Krenak e milhares de pescadores. Foto: Fred Loureiro / SECOM ES
Ruptura da barragem provocou a liberação de volume de 55 milhões a 60 milhões de metro cúbicos de rejeitos de minério no Rio Doce. A lama percorreu mais de 600 quilômetros até chegar ao oceano, matando peixes, a flora, a fauna e disparando uma crise social e ambiental que afetou a subsistência e o acesso à água da população, incluindo indígenas Krenak e milhares de pescadores. Foto: Fred Loureiro / SECOM ES



Após encontros com autoridades brasileiras, representantes do setor privado, incluindo da mineradora Samarco, da sociedade civil e de comunidades afetadas em Minas e no Espírito Santo, o Grupo de Trabalho concluiu ainda que os governos estadual e federal “podiam ter feito mais” após a tragédia.



“Embora a Samarco seja responsável pela reparação dos danos causados, o governo federal continua (sendo) o responsável primário do qual se exige a defesa dos direitos humanos das comunidades afetadas”, que expressaram sentir falta de mais informações sobre processos de reassentamento e compensação.



Moradores dos locais atingidos pela tragédia manifestaram preocupação quanto ao recebimento efetivo de ajuda para que consigam reconstruir suas vidas. Os residentes também se disseram preocupados a respeito da falta de informação sobre os riscos ao meio ambiente e à saúde representados pela contaminação do Rio Doce e do oceano.


Os especialistas independentes da ONU receberam relatos de que as informações fornecidas pela Samarco — como garantias de que os rejeitos não incluíam material tóxico e de que a água era própria ao consumo humano, após a criação de instalações provisórias de tratamento — não seriam confiáveis.


Embora a causa exata do rompimento
da represa de Fundão
ainda seja desconhecida, tais eventos
não deveriam ocorrer jamais.
O incidente assinala a importância
de regras de licenciamento rígidas.

 

 

Em reunião com a Samarco, o Grupo de Trabalho encorajou a mineradora a ser transparente com as comunidades acerca das falhas na resposta ao desastre, além de realizar consultas junto às populações envolvidas e fornecer uma compensação justa. Os especialistas também aconselharam a companhia a criar um ambiente que indivíduos, incluindo seus empregados, possam manifestar preocupações sem medo de represálias.



“Embora a causa exata do rompimento da represa de Fundão ainda seja desconhecida, tais eventos não deveriam ocorrer jamais. O incidente assinala a importância de regras de licenciamento rígidas, de monitoramento regulatório adequado de planos de contingenciamento.”


Mecanismos legislativos, financiamento de campanha e falta de transparência preocupam especialistas

O Grupo de Trabalho elogiou a proposta de lei 3312/2016 do governo de Minas Gerais enviada em março desse ano à Assembleia Legislativa do estado. O projeto busca garantir os direitos humanos de populações afetadas pelo planejamento, implementação e operação de represas, barragens e outros projetos.


Capacidade do governo de monitorar
operações de empresas pode,
em alguns casos, ser afetada
pelos processos de financiamento político.

 

 

Ao mesmo tempo, os especialistas independentes notaram, com preocupação, tendências que parecem ir na direção contrária. É o caso da aprovação — por uma comissão do Senado — do projeto de lei 654/2015, que pretende acelerar e reduzir o processo de licenciamento ambiental para obras de infraestrutura consideradas estratégicas e de interesse nacional.



O Grupo de Trabalho também destacou as propostas de emendas (5807/2013) ao Código de Mineração que incluem a eliminação de certas proteções ambientais. As alterações sugeridas dariam à companhia mineradora encarregada o direito de usar água para operar minas sem proteger esse recurso para o uso humano.



Os relatores da ONU expressaram preocupação ainda com a utilização crescente do mecanismo legal da “suspensão de segurança”. Essa intervenção permite ao presidente de um tribunal superior suspender, a pedido de uma entidade pública, decisões legais de uma instância jurídica inferior que interditem o prosseguimento um projeto de desenvolvimento.



A liberação do empreendimento é justificada “por se tratar de uma questão de interesse público”. O Grupo de Trabalho foi informado por promotores de que este é um “mecanismo atípico que não pode ser contestado uma vez que a decisão de instância superior é tomada e favorece o governo federal”.


“Este parece ser um instrumento desproporcional, cujo uso poderia lançar o poder do governo federal contra comunidades afetadas.”


Outro receio do Grupo de Trabalho é a “influência corporativa indevida sobre processos políticos e regulatórios”. A “capacidade do governo de monitorar operações de empresas pode, em alguns casos, ser afetada pelos processos de financiamento político e por lobby corporativo”.


De acordo com os especialistas, “tais percepções foram agravadas por uma série de escândalos de corrupção envolvendo grandes companhias e políticos eleitos”.


Segundo o Superior Tribunal Eleitoral, cerca de 76% dos mais de 3 bilhões de reais em doações feitas durante as campanhas eleitorais de 2014 para a Presidência, o Senado e o Congresso vieram de entidades corporativas. A proporção representa um aumento de 10% na comparação com 2006.


“Isso merece uma atenção cuidadosa não somente pelo problema da corrupção, mas porque essa influência indevida pode facilmente minar a proteção aos direitos humanos, por exemplo, por meio do enfraquecimento das leis e políticas públicas ou limitando a responsabilização nos casos de abusos cometidos por empresas”, disse Pesce no Conselho de Direitos Humanos.


O Grupo de Trabalho destacou a importância da aplicação de leis anticorrupção que têm garantido a responsabilização de funcionários públicos e de empresas privadas, de políticos e dirigentes de grandes companhias.


“O Brasil tem os instrumentos para tratar desses problemas”, acrescentou Pesce, recordando a decisão do Supremo Tribunal Federal — pela ação direta de inconstitucionalidade 4650 — que proibiu o financiamento empresarial de campanhas politicas. Os especialistas recomendaram ao país que elabore e implemente um plano nacional sobre direitos humanos e empresas.


“O processo de desenvolvimento de um plano desse tipo deve contribuir na identificação de áreas de risco elevado e na seleção de leis, regulações, políticas e mecanismos de controle que devem ser priorizados e reforçados e na determinação de formas para melhorar o acesso a reparações para vítimas do impacto adverso sobre os direitos humanos relacionados à ação de empresas”, concluiu Pesce.


O relatório ressalta ainda a falta de transparência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que não divulgou informações sobre avaliações que medem os impactos sociais e ambientais de projetos financiados no Brasil e em outros países.
O Grupo de Trabalho da ONU esperava que o organismo financeiro contasse com exigências mais explícitas em seus projetos de financiamento, que incluíssem garantias contra impactos sobre os direitos humanos.

Especialistas esperam liberação de ‘lista negra’ do trabalho escravo no Brasil

Os especialistas independentes descreveram como uma ferramenta eficaz na promoção dos direitos humanos no mercado o instrumento da “Lista Suja” — iniciativa do então Ministério do Trabalho e Emprego para expor companhias que usam trabalho escravo em suas cadeias de produção.



Empresas citadas foram proibidas de firmar contratos com o governo e ter acesso a crédito e financiamento público. Apesar de positiva, a Lista teve sua publicação proibida por determinação do Supremo Tribunal Federal. Organizações de direitos humanos têm contestado a decisão da corte.




Enquanto os processos não são concluídos, o Grupo de Trabalho manifesta seu apoio a medidas como pedidos de liberdade de informação — que garantiram a publicação no passado do nome de empresas envolvidas com trabalho escravo.



É o caso da solicitação feita pelo Repórter Brasil à pasta federal do trabalho, que teve de liberar nomes de companhias. O Grupo de Trabalho espera que suspensão da divulgação da Lista Suja seja anulada logo.



Acesse o relatório na íntegra aqui (em inglês).



Da ONU Brasil, in EcoDebate, 20/06/2016



[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Araucária, sem manejo adequado será extinta e vai virar somente uma fotografia

Publicado em junho 20, 2016 por


Araucária não é peça de museu. Sem manejo adequado, elas serão extintas e vão virar somente uma fotografia. Entrevista especial com Flávio Zanette

“Está comprovado experimentalmente e descritivamente que a araucária não se regenera dentro da floresta. Essa conversa de preservar a araucária é o equivalente a compreendê-la como peça de museu, mas planta não é peça de museu, que você limpa bem, coloca conservante, tira a poeira e ela dura milhares de anos”, afirma o engenheiro agrônomo.
Foto: www.spvs.org.br


A exploração madeireira e a legislação ambientalestão entre as principais causas que têm contribuído para que a araucária integrasse a lista das espécies em extinção. Prova disso é que no início dos anos 1940 a mata de araucária compunha 15% do território gaúcho, 25% do território catarinense e 35% do paranaense.



Contudo, em menos de 80 anos, essa mata nativa foi reduzida a “1,5% no Rio Grande do Sul, em torno de 3% em Santa Catarina, e no Paraná, conforme o levantamento feito pela Fundação de Ciências Florestais, não chega a 1,5% de mata virgem em relação ao original”, informa Flávio Zanette à IHU On-Line.


Nos últimos 30 anos, o engenheiro agrônomo tem estudado e acompanhado o desenvolvimento dearaucárias nos três estados e frisa que, em função da legislação ambiental, a qual proíbe o corte das araucárias e exige uma série de certificações para aprovar o corte das espécies plantadas pelos produtores rurais, tem havido uma prática comum nesses três municípios: o corte antecipado da araucária.



 “Quem tinha uma área de terra começou a cortar todas as mudas de araucária que nasciam, justamente para não perder aquele espaço, porque uma vez que as araucárias crescessem, elas não poderiam ser cortadas. Esse tipo de atitude passou a ser muito normal no Paraná, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, porque os agricultores ficaram revoltados por não poder explorar o espaço da propriedade plantado com araucária”, relata.


Favorável à proibição da “retirada indiscriminada” da araucária, a fim de evitar a exploração ilegal, Zanette também faz críticas à legislação ambiental, porque ela “se esqueceu da outra parte, quer dizer, além de proibir, a legislação deveria garantir uma política de incentivo ao plantio”. Segundo ele, as pesquisas recentes têm demonstrado que a simples preservação das araucárias em mata fechada não garante a preservação das espécies, ao contrário, a sombra da mata fechada tem dificultado o desenvolvimento de novas plantas.


“Nós fizemos experimentos plantando araucária na sombra, no sol e em pleno sol, porque é absolutamente sabido por qualquer biólogo ou fisiologista vegetal, que a araucária é uma das plantas que exige muita luz para crescer, ou seja, ela não se desenvolve abaixo de uma determinada intensidade luminosa. Consequentemente, aquelas belas florestas que existem em São José dos Ausentes, e também no caminho de Caxias do Sul para o litoral, são museus de 50 ou 70 anos. Por isso, tenho afirmado que daqui a 120 anos, se não houver replantio da araucária, ela ficará só em fotografia”, adverte.



Na entrevista a seguir, concedida por telefone à IHU On-Line, Flávio Zanette propõe novas formas de preservar amata de araucária e explica sua proposta de desenvolver as espécies a partir de pomares enxertados e de um processo de seleção de matrizes de araucárias que produzam mais de 100 pinhas todo o ano, garantindo a produção do pinhão, que atualmente está decaindo. “Se está provado que ramos novos de pinheiro só se formam até quando a planta tem 60 anos, basta ver que a grande maioria dos pinheiros que temos por aí em nossas florestas têm mais de 60 anos e não estão mais formando ramos novos. Então, se não nascem mais galhos novos e a cada ano eles vão caindo e diminuindo, a tendência é diminuir a produção”, alerta.


Flávio Zanette é graduado em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal do Paraná – UFPR, mestre em Fitotecnia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e doutor em Fitotecnia pela Universite de Clermont II. Atualmente é professor da UFPR, onde atua no Laboratório de Micropropagação Vegetal, pesquisando técnicas de enxertia da araucária.



Confira a entrevista.
Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
IHU On-Line – A araucária está na lista das espécies que corre risco de extinção. Desde quando as matas de araucária estão sendo diminuídas no Brasil e qual é a probabilidade de essa planta entrar em extinção no país?
Flávio Zanette – A ameaça de extinção da araucária iniciou durante a exploração madeireirano país, nos anos 1940. Contudo, antes de falar sobre isso, vou explicar como se dá o processo de extinção. Uma espécie da fauna é considerada ameaçada de extinção – e isso eu confirmei recentemente com representantes da CTNBio – quando ela está em níveis críticos no sentido de que não é mais possível garantir a sobrevivência da espécie, portanto ela estará em processo de extinção.
Com o vegetal o processo é diferente, especialmente para plantas perenes que são nativas de um local e, portanto, não são cosmopolitas, ou seja, não se reproduzem em vários locais do mundo – milho e feijão, por exemplo, nunca estarão ameaçados de extinção.


No caso das araucárias nativas, elas têm seus sítios definidos, a exemplo do Hemisfério Sul – falando daangustifólia, que é espécie que se reproduz nessa região. Essas plantas estão desaparecendo, não há mais quase nada no Paraguai e existem algumas naArgentina. No Espírito Santo e no Rio de Janeiroelas também estão sumindo, e ainda restam algumas em Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.



Então, como disse anteriormente, a ameaça de extinção começou com o início da exploração madeireira. Nos próximos dias vou publicar um livro que está no prelo, intitulado Por que a araucária está em extinção? Por que a legislação atual não salva a araucária? Perspectivas de sustentabilidade da araucária pelo uso.
A araucária está ameaçada porque neste período todo, desde o início do século passado, mais precisamente na década de 1940, quando começou a intensa retirada da araucária, não houve equivalente reposição. Já vou adiantar que no livro que irei publicar está comprovado experimentalmente e descritivamente que a araucária não se regenera dentro da floresta. Essa conversa de preservar a araucária é o equivalente a compreendê-la como peça de museu, mas planta não é peça de museu, que você limpa bem, coloca conservante, tira a poeira e ela dura milhares de anos. A araucária é confundida com rabanete ou com inseto ou com outra espécie de ciclo curto, mas a mesma regra não vale para a araucária em termos de tempo, pois ela é uma planta que vive de 100 a 200 anos. Portanto, a extinção não será vista pela nossa geração.



As araucárias vivas, que estão envelhecendo, a cada ano produzem safras menores de pinhões e isso está acontecendo porque diminuem os galhos da planta, ela vai ficando velha, alguns galhos vão caindo, e sabemos que não são formados novos galhos na araucária depois que a planta atinge 60 anos. Os últimos galhos só crescerão na ponta dos ramos já formados, mas, obviamente, a cada um ou dois anos os ramos vão caindo e, consequentemente, não se formam novos ramos. Portanto, diminuirá o número de pinhões, porque o pinhão não é jabuticaba; ele só se forma onde houver crescimento dos ramos.
Desse modo, quanto aos pinhões, a tendência é diminuir a produção. Você pode até perguntar sobre o pinhão que cai no meio da floresta, mas esses vão ser comidos pelas cotias, pela gralha azul. Hoje, o processo comum de reprodução de araucária se dá com o pinhão que cai em torno da árvore-mãe, pois o vento só carrega o pólen, não carrega o pinhão, assim ele cai no local e nascerá sem problemas. Entretanto, hoje temos provas empíricas de que pinheiros dentro da floresta, embaixo de belas matrizes com 14 ou 16 anos, são da grossura do meu polegar, quando uma planta de 12 anos deveria estar mais ou menos com 60 centímetros de diâmetro.

“No cenário atual de legislação, pesquisa e política pública, a araucária não está ameaçada de extinção; ela já está em extinção”

IHU On-Line – O que tem ocasionado esse baixo desenvolvimento da araucária?
Flávio Zanette – A sombra, e isso já é claríssimo nos estudos que estamos desenvolvendo. Nós fizemos experimentos plantando araucária na sombra, no sol e em pleno sol, porque é absolutamente sabido por qualquer biólogo ou fisiologista vegetal, que a araucária é uma das plantas que exige muita luz para crescer, ou seja, ela não se desenvolve abaixo de uma determinada intensidade luminosa. Consequentemente, aquelas belas florestas que existem em São José dos Ausentes, e também no caminho de Caxias do Sul para o litoral, são museus de 50 ou 70 anos. Por isso, tenho afirmado que daqui a 120 anos, se não houver replantio da araucária, ela ficará só em fotografia. Portanto, no cenário atual de legislação, pesquisa e política pública, a araucária não está ameaçada de extinção; ela já está em extinção.


IHU On-Line – Quais são as demais razões desse fenômeno ou o que tem contribuído para chegarmos a esse estágio? As mudanças climáticas já são um fenômeno que impacta as araucárias?
Flávio Zanette – Estudando a questão das mudanças climáticas, recentemente comentei com os moradores da região de São Joaquim (SC) que, quando não existirem mais araucárias, dentro de dois ou três mil anos talvez, ela desaparecerá por último naquela região, por razões climáticas. Ou seja, conforme a média da temperatura subir, ela impedirá a reprodução e formação de sementes da araucária e, portanto, essa espécie irá desaparecer porque não tem regeneração. Porém a mudança climática atinge tudo, não só a araucária, e também atingirá fortemente muitas outras espécies que exigem o frio para se reproduzirem.


Então, minha tese é a de que a araucária só será salva se houver plantios, e o plantio não deve ocorrer ou porque ela é bonita, ou somente para preservá-la, mas porque ela é um grande bem econômico desses territórios. Além de fornecer madeira de qualidade incomparável a qualquer outra espécie, ela produz pinhões, algo que é de altíssimo interesse e de altíssimo rendimento para as propriedades.


Durante esses 31 anos em que estudo a araucária, desenvolvemos desde 2000, juntamente com a Embrapa, a tecnologia de fazer um pomar enxertado por meio da seleção de pinhões grandes, que coletamos em Lages, Caçadore em outras regiões. Com esse pomar será possível colher, no mínimo, depois de 30 anos de plantio, pinhão por três gerações – estou falando apenas do período de 30 a 100 anos -, que ganharão em torno de R$ 32 mil com a venda de pinhões por hectare/ano. Faça a conta e me responda qual é o outro produto agrícola que gera toda essa renda? Claro que outros produtos geram esse faturamento, mas eles têm um custo ambiental, que a araucária não gera.

“A araucária pode ser salva pelo uso, porque conseguimos provar que ela é um grande bem econômico”


IHU On-Line – Em que consiste a sua pesquisa de produção de mudas enxertadas de araucária para formar pomares? Pode nos falar da proposta de técnicas de enxerto como uma saída para estimular o plantio da espécie?
Flávio Zanette – Quando digo que a araucária pode ser salva pelo uso, é porque conseguimos provar que ela é um grande bem econômico. Ao longo desses mais de 30 anos, temos estudado formas de viabilizar o manejo adequado e concluímos, depois de fazer pinheiro de proveta, que para a araucária ser econômica devemos fazer a seleção das sementes: recentemente conseguimos provar que uma planta matriz em Lages, SC, da qual durante 30 anos foram colhidas sementes, as quais foram plantadas em outros locais a 60 quilômetros de distância, se produziram pinhões enormes, com o dobro do tamanho normal. Para termos uma ideia, o pinhão normal tem em média sete, oito gramas, e esse pinhão de que falo teve entre 14 e 16 gramas. Portanto, desenvolvemos e constatamos a possibilidade de produzir pinhões de alta qualidade plantando pinhões de alta qualidade.



Em Caçador, SC, o produtor de araucária Vânio Czerniak tem uma planta que já produziu 674 pinhas e, neste ano, produziu 539, quando na floresta se produz de 10 a 15 pinhas e, em algumas plantas mais bem situadas, sabemos que é possível produzir um pouco mais de 100 pinhas. Então, trabalhamos com um processo de seleção de matrizes de araucárias que produzam mais de 100 pinhas todo o ano. Imagine que, através de um processo de seleção das melhores matrizes de araucária, podemos passar de uma produção de 30 a 40 pinhas para 600 pinhas por araucária.


Durante a pesquisa, eu inclusive desenvolvi um processo para clonar algumas plantas, que foram clonadas in vitro, mas não fiquei satisfeito com o resultado porque o custo de produção em laboratório era muito elevado. Então, desde o ano 2000 passei a me dedicar a estudar formas de enxertar a araucária. A partir disso já surgiram teses de doutorado em que demonstramos essa experiência e produzimos um livreto publicado pela Sociedade Brasileira de Fruticultura.



Na seção de frutas nativas consta o plantio da araucária como fruteira para a produção de pinhões, e é nessa linha que falamos das técnicas de enxertia. Nesse momento nós produzimos – está sendo publicado e divulgado – um manual de como enxertar a araucária, porque nós não temos mão de obra para produzir mudas e distribuí-las, então fazemos o mais simples: uma pessoa planta o pinhão, e um ano e meio depois, usando o nosso manual de enxertia, ela mesma pode fazer o enxerto. Nós temos o que eu chamo de “jardim clonal”, onde cultivamos os pinhões selecionados dessas matrizes e enviamos as mudas até pelos Correios para quem tiver interesse em plantar araucárias.


IHU On-Line – Como é feito o plantio das mudas enxertadas?
Flávio Zanette – As mudas são cultivadas na Universidade, nesse jardim clonal, que me fornece um broto. Eu corto esse broto em pedaços e as pessoas que querem plantar a araucária fazem o enxerto seguindo o manual, que está publicado e distribuído através de uma parceria que fizemos com o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – Senarda Federação da Agricultura. Nós temos material à vontade e podemos enviar digitalmente para quem quiser, porque com esse material em mãos, ninguém precisa comprar a muda enxertada, a pessoa mesmo enxerta e, assim, o que acontece?


Em primeiro lugar, não precisa plantar 50 fêmeas e 50 machos por hectare, mas 20 machos, que são suficientes, e 80 fêmeas, porque aí a produção já sai ganhando com 30% a mais de fêmeas. Segundo, não é preciso plantar uma ao lado da outra, a cada dois ou três metros, porque nós concluímos que a araucária, para produzir e ter muitos galhos, precisa estar de oito a dez metros de distância uma da outra. É por isso que em um hectare são plantadas somente entre 100 e 120 plantas, e após 12 anos da araucária enxertada começa a cair pinhão. Considerando essa distância entre uma planta e outra, sobra espaço numa faixa do meio para plantar trigo, soja ou qualquer outra cultura anual, ou ainda uma carreira de erva-mate, que é o binômio natural, pois a erva-mate faz parte da ombrófila mista. Na verdade, a terra será usada somente para o pinhão quando a araucária começar a produzi-lo. Portanto, é possível perceber como esse processo é economicamente interessante.


IHU On-line – Já é possível saber qual é o percentual de araucárias plantadas a partir dessa técnica?
Flávio Zanette – Orientado para a produção de pinhões, iniciei esse processo há 10 anos. Inclusive, neste ano comemoramos os 10 anos de distribuição de mudas produzidas a partir dessa técnica e realizamos uma festa para comemorar e, nos dois dias de comemoração, distribuímos 10 mil mudas de araucária. As pessoas levaram a araucária para plantar com nossas orientações e ficaram com a opção de enxertá-las daqui a um ano e meio. Neste ano também adquirimos 10 mil pinhões do Vânio Czerniak, de Caçador, daquela famosa araucária que no ano passado produziu as 674 pinhas e neste ano produziu 539, a R$ 1,00 cada pinhão, para fazermos novas mudas, porque aqui há um grande interesse em plantar mudas desta árvore.


“A legislação não incentiva o plantio”










IHU On-Line – Qual é a função ambiental das araucárias para o ecossistema como um todo?
 Flávio Zanette – A araucária vale mais em pé do que deitada, porque em pé ela continuará produzindo, e quando ela morrer ou estiver velha, na fase em que produz poucos pinhões, é possível derrubá-la e teremos uma madeira excepcional, que dará nó-de-pinho – nós aqui do Sul sabemos a importância de um nó-de-pinho para jogar na lareira, uma vez que é o material vegetal mais denso que se conhece e, portanto, é uma fonte de energia com alto rendimento. Além disso, a araucária também nos dá o pinhão.
Ecologicamente, se plantarmos araucárias no campo, dentro de 25 ou 30 anos haverá um capão naquele local, porque ela é uma pioneira e, quando começar a crescer, várias aves irão se refugiar nela para se protegerem dos predadores, como o gambá. Assim, as aves ficam aninhadas ali, dormem ali e, consequentemente, jogam suas fezes ali, cultivam as sementes que caem da araucária e começam a nascer novas plantas. Com o passar do tempo o local vai virar um bosque, um capão.



IHU On-Line – O senhor afirma que a legislação é equivocada em relação à preservação da araucária. Quais os problemas que evidencia e o que seria uma política ambiental adequada para preservar as matas de araucária e incentivar sua reprodução?
Flávio Zanette – A legislação foi constituída assim: em um dado momento viu-se que não ia sobrar nenhumaaraucária em pé, porque ela estava sendo derrubada e, com isso, definiu-se que era proibido derrubá-la. Assim, quem tinha uma área de terra começou a cortar todas as mudas de araucária que nasciam, justamente para não perder aquele espaço, porque uma vez que as araucárias crescessem, elas não poderiam ser cortadas. Esse tipo de atitude passou a ser muito normal no Paraná, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, porque os agricultores ficaram revoltados por não poder explorar o espaço da propriedade plantado com araucária. A meu ver, tem que proibir mesmo a retirada indiscriminada de araucária. O ponto é que a legislação se esqueceu da outra parte, quer dizer, além de proibir, a legislação deveria garantir uma política de incentivo ao plantio.



Além disso, se não houver um manejo adequado de derrubar algumas araucárias pelo meio da floresta, essa mata, mais cedo ou mais tarde, morrerá completamente, porque as araucárias têm idades próximas, portanto todas elas envelheceram. O mais triste é que as araucárias não caem, não tombam quando morrem, elas se decompõem, vão soltando os galhos, ficam com o tronco seco, as cascas vão caindo e, por conta disso, não se abre uma clareira quando elas morrem; desse modo, não há nem condição de nascer outra no lugar dela. É por isso que defendemos que sejam realizados estudos urgentes para que as florestas densas, fechadas com araucárias, sejam preservadas. Precisamos derrubar algumas pelo meio da mata para permitir que entre a luz e, assim, as novas plantas se desenvolvam.



A legislação não incentiva o plantio. Nós produzimos mudas e as distribuímos de graça, mas muitas pessoas as jogam fora porque não querem saber de plantar araucária por causa da legislação. Apesar disso, nesses dez anos, já conseguimos distribuir mais de 70 mil mudas em todo o Brasil, tendo em vista a produção do pinhão. No meu banco de dados, tenho o nome, o CPF, o local de plantio, o número de mudas e contato de mais de três mil pessoas. Portanto, já temos mais de três mil pessoas interessadas na nossa técnica.



IHU On-Line – Como os órgãos ambientais e parlamentares se posicionam sobre uma possível mudança na legislação?
Flávio Zanette – Essa é uma batalha que estou travando há sete, oito anos, participando de reuniões e audiências públicas para mudar a legislação. O secretário de Meio Ambiente da minha região estava bem engajado nesse projeto e agora vai trabalhar como assessor do Ministro do Meio Ambiente. Quero tentar trazer o Ministro para fazer uma discussão inteligente sobre o assunto, porque não adianta o “ecologista borboleta” dizer não pode isso ou aquilo, tem de apresentar um fundamento.



IHU On-Line – Que percentual da mata de araucária ainda existe no Brasil?
Flávio Zanette – A literatura informava que o Rio Grande do Sul tinha 15% do território com araucária, ou seja, floresta ombrófila mista, Santa Catarina tinha 25% do território, e o Paraná, 35%. Contudo, depois da exploração madeireira que ocorreu a partir da década de 1940, restou, de mata nativa, 1,5% no Rio Grande do Sul, em torno de 3% em Santa Catarina, e no Paraná, conforme o levantamento feito pela Fundação de Ciências Florestais, não chega a 1,5% de mata virgem em relação ao original. É muito pouco.
Apesar desses dados, alguns lutam para retirar a araucária da lista de espécies ameaçadas. Ao invés disso, não é muito melhor fazer uma legislação específica para a araucária do que ficar mexendo e decidindo se ela deve ou não estar na lista? Ela está mais do que na lista, ela está ameaçada.

“Nós produzimos mudas e as distribuímos de graça, mas muitas pessoas as jogam fora porque não querem saber de plantar araucária por causa da legislação”

IHU On-Line – Então, a queda na produção do pinhão está relacionada com o envelhecimento da araucária e o baixo plantio de novas plantas?
Flávio Zanette – É indiscutível que o volume total de produção, na sequência de quatro ou cinco anos, tem caído e a curva é descendente. O pinhão leva de 30 a 36 meses para se formar: da indução floral, passa por todo o processo de frutificação e demora um ano até formar a flor; depois de um ano, ele fecunda, aí fica mais um ano crescendo e mais um ano em maturação. Eu estudei, junto com alguns alunos, in loco, a produção do pinhão. Usamos um caminhão com plataforma elevada e acompanhamos esse processo de desenvolvimento durante três anos.



Claro que se em um ano aaraucária está sobrecarregada com muitas pinhas, naquele mesmo período ela está preparando os botões para a produção que irá ocorrer daqui a dois anos. O clima pode ajudar nesse processo, mas não é como as pessoas dizem, que num determinado ano tem bastante pinhão porque deu frio – nada a ver. O frio deste ano vai favorecer a indução floral para 2018, pois o pinhão de 2018 tem a ver com o inverno deste ano, enquanto o pinhão do ano que vem não tem nada a ver com o inverno deste ano, porque ele já está formado, fecundado, está crescendo e ficará maduro a partir do mês de abril do ano que vem.



Então, se está provado que ramos novos de pinheiro só se formam até quando a planta tem 60 anos, basta ver que a grande maioria dos pinheiros que temos por aí em nossas florestas têm mais de 60 anos e não estão mais formando ramos novos. Portanto, a produção está se dando naqueles galhos que estão aí. Então, se não nascem mais galhos novos e a cada ano eles vão caindo e diminuindo, a tendência é diminuir a produção.



IHU On-Line – Gostaria de acrescentar algo?
Flávio Zanette – Gostaria de insistir que deve haver pressão geral e urgente para que a legislação mude e para incentivar o plantio de araucária, porque a legislação de hoje autoriza o corte da araucária que o produtor plantou, mas a dificuldade é provar que foi ele quem plantou. Para provar isso se exige uma burocracia muito grande e complicada, se exige o relatório de um engenheiro florestal e a elaboração de um projeto. Mas o pequeno produtor, que é quem tem o grande interesse, porque quem preserva é o pequeno e não o grande, não tem condições de fazer tudo que a legislação determina.


Aproveito para registrar que perto de São Joaquim, SC, está acontecendo um encontro sobre fruticultura: um ano esse evento acontece em São Joaquim, e no outro, em Fraiburgo, SC. São Joaquim só viu a araucária como madeira, porque aquela região só se desenvolveu graças à madeira e ao extrativismo puro, mas agora eles sabem que aquela região ainda é altamente produtora de pinhão, e apesar disso nem começaram a plantar pomares de araucária para produção de pinhão. Com isso, é possível observar como é o sentimento geral em relação à araucária. Então, só pelos meios de comunicação, que foi o que sempre usei, é que convenceremos a população da importância do plantio da araucária.
Por Patricia Fachin

(EcoDebate, 20/06/2016) publicado pela IHU On-line, parceira editorial da revista eletrônica EcoDebate na socialização da informação.


[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

MPF quer investigação de improbidade nas obras de despoluição da Baía da Guanabara


Publicado em junho 21, 2016 por



Lixo flutuante na Baía de Guanabara. Foto: Vermelho.org.br

Grupo de Trabalho Olimpíadas 2016 propõe investigação de desperdício e desvio de recursos em construções de estações e elevatórios de água inoperantes
O Grupo de Trabalho (GT) Olimpíadas, do Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro, criado para investigar notícias de corrupção com recursos públicos federais nas obras dos Jogos Olímpicos 2016, propõe a apuração de improbidade na construção de estações e elevatórios de água realizadas pela Companhia Estadual de águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE), total ou parcialmente inoperantes.


O GT Olimpíadas teve conhecimento de incontáveis notícias denunciando grande dano ao erário público com desperdício e desvio de recursos. De acordo com os procuradores, em 2012 o então Secretário de Ambiente do Rio, Carlos Minc, deu uma declaração ao Jornal Estadão sobre o que seria “uma fraude cavalar, que foi fazer as estações sem as redes de água”. Segundo Minc “a grana para fazer redes, conexões, era do Fecam (Fundo Estadual), que ia para tudo, menos para saneamento e meio ambiente. Rede é debaixo da terra, o que dá voto é estação. São elefantes brancos, monumentos à incompetência, ao descaso, à ilusão.”

Minc se referia ao antigo Programa de Despoluição da Baía de Guanabara – PDBG (1992 – 2006), coordenado atualmente na esfera estadual pelo Programa de Saneamento Ambiental dos Municípios do Entorno da Baía de Gunabara – PSAM. Há indicações de que novas estações e elevatórias foram construídas posteriormente, sem as redes de esgotos, estando inoperantes ou subutilizadas, em uma repetição dos mesmos erros.


Fonte: Procuradoria da República no Rio de Janeiro
in EcoDebate, 21/06/2016

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta enviar um email para newsletter_ecodebate+subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.

Alimentação de crianças brasileiras até dois anos não é adequada


Publicado em junho 20, 2016 por



Consumo de alimentos ricos em ferro é baixo nessa faixa etária, enquanto ingestão de ultraprocessados é alta

Verduras, grãos, frutas e legumes devem fazer parte da dieta do bebê a partir dos 6 meses. Foto: Reprodução/EBC

A alimentação de crianças brasileiras entre 6 e 23 meses ainda requer atenção especial. Pesquisa realizada com os pais de 38.566 crianças nessa faixa etária em Unidades Básica de Saúde de municípios de todo o País mostra que apenas 14% delas consumiram alimentos ricos em ferro no dia anterior à consulta, enquanto 56% ingeriram algum tipo de comida ultraprocessada.


Em relação ao aleitamento materno, cuja orientação dos especialistas é de que seja continuado até os dois anos de idade, apenas 53% haviam sido amamentados antes da pesquisa. Os dados fazem parte do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional do Ministério da Saúde, referentes ao ano de 2015, e reforçam a preocupação do órgão com medidas para garantir uma alimentação saudável nessa fase de desenvolvimento.


“Devemos fazer uso de alimentos in natura ou minimamente processados na base da alimentação. Nesse sentido, entendemos que o aleitamento materno deve ser continuado até os dois anos de idade ou mais, garantir uma alimentação adequada e variada, com presença de alimentos ricos em ferro e vitamina A, por exemplo.


Já o consumo de alimentos ultraprocessados, como hambúrguer, embutidos, macarrão instantâneo, biscoitos e bebidas adoçadas devem ser evitados. Encontrar percentuais tão elevados nessa faixa etária é algo bastante preocupante”, alerta Sara Araújo, nutricionista da Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde.


O consumo de alimentos como biscoito recheado, macarrão instantâneo e bebidas adoçadas também apresentaram resultados elevados, com índices de 32%, 27% e 40%, respectivamente. Por outro lado, 63% das crianças comeram alimentos ricos em vitamina A, o melhor resultado entre os itens pesquisados.


O uso de ultraprocessados, ricos em açúcar, sódio e gorduras é um dos principais motivos para a ocorrência do excesso de peso, que apresentou crescimento expressivo nos últimos anos em todas as faixas etárias no Brasil.


A nutricionista explica que os períodos mais críticos para o desenvolvimento da obesidade estão na primeira infância e na adolescência. “Quando a obesidade se manifesta na infância, o risco de se tornar um adulto obeso é aumentado. Há evidência de que, a partir dos seis anos, aproximadamente, uma a cada duas crianças obesas torna-se um adulto obeso, enquanto apenas uma a cada dez crianças não obesas alcança o mesmo desfecho quando adulta.”


Cuidados
O aleitamento materno é a melhor opção de alimentação para crianças pequenas e é recomendado de forma exclusiva até os seis meses de vida, devendo ser complementado após essa idade, com a introdução de outros alimentos, mantendo-se a amamentação até os dois anos ou mais.


A partir dos seis meses, as necessidades nutricionais da criança passam a não ser mais atendidas só com o leite materno, embora esse ainda continue sendo uma importante fonte de energia e nutrientes. Então, mesmo recebendo outros alimentos, a criança deve continuar mamando no peito até os dois anos ou mais.


Como a criança nasce com preferência para o sabor doce, a adição de açúcar a preparações é desnecessária e deve ser evitada nos primeiros anos de vida. Assim, alimentos como bolos preparados com açúcar e alimentos processados, como atum em lata, sardinha em lata e frutas em calda, devem ser evitados.


Na alimentação complementar, devem ser incluídos nas refeições ofertadas para as crianças, alimentos in natura ou minimamente processados. Alimentos in natura são obtidos diretamente de plantas ou de animais e não sofrem qualquer alteração após deixar a natureza.


Para garantir a alimentação saudável nessa faixa etária, o Ministério da Saúde acompanha os resultados de levantamentos com o objetivo de criar políticas capazes de melhorar a situação apresentada. As recomendações oficiais do órgão estão no Guia Alimentar para Crianças Menores de Dois Anos, que traz orientações completas aos pais.

Consumo alimentar de crianças entre 6 e 23 meses

Fonte: Portal Brasil, com informações do Ministério da Saúde
in EcoDebate, 20/06/2016

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta enviar um email para newsletter_ecodebate+subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.

Brasil lidera ranking de mortes de ambientalistas em 2015, diz a ONG Global Witness

Publicado em junho 21, 2016 por


luto

O Brasil está no topo da lista dos países onde mais ativistas ambientais e da terra foram mortos em 2015, com 50 casos, segundo o levantamento Em terreno perigoso, divulgado ontem (20) pela organização não governamental Global Witness.


Em todo o mundo, foram 185 ativistas assassinados no período, segundo a entidade. É o maior número de mortes por ano de ambientalistas já registrado pela entidade e representa aumento de 59% na comparação com 2014.


“Em 2015 mais de três pessoas por semana foram assassinados por defender suas terras, florestas e rios contra indústrias destrutivas”, diz a publicação.


O Brasil é seguido no ranking pelas Filipinas, com 33 assassinatos; Colômbia, com 26; Peru e Nicarágua, com 12 casos; e a República Democrática do Congo, onde 11 ativistas dessas causas foram assassinados.


De acordo com a Global Witness, as principais causas de morte dos ativistas de causas ambientais e ligadas à terra em 2015 foram o envolvimento das vítimas em conflitos contra a atividade de mineração (42 mortes), agronegócio (20), exploração madeireira, com 15 assassinatos, e projetos de energia hidrelétrica, também com 15 casos. A organização atua contra abusos de direitos humanos e ambientais na exploração de recursos naturais no mundo e estima que os números são ainda maiores, levando em conta as dificuldades para se obter informações sobre essas mortes.


Entre os assassinatos no Brasil está o do líder comunitário Antônio Isídio Pereira da Silva, encontrado morto na véspera do Natal no povoado de Vergel, no município de Codó (MA), após uma semana desaparecido. “Este líder de uma comunidade de pequenos agricultores do estado do Maranhão sofreu ameaças de morte durante anos por denunciar a exploração ilegal de madeira em suas terras. A polícia nunca investigou o assassinato dele”, denuncia a Global Witness no relatório.


Indígenas são mais vulneráveis
A vulnerabilidade dos povos indígenas em conflitos agrários, agravada por muitos casos de posse precária da terra e isolamento geográfico, recebeu destaque no documento, que aponta que cerca de 40% das vítimas de 2015 eram indígenas.


No Brasil, o relatório cita o caso do Guarani-Kaiowá Simeão Vilhalva, 24 anos, morto em 29 de agosto do ano passado no município de Antônio João, em Mato Grosso do Sul. O crime ocorreu quando um grupo de fazendeiros tentou retomar à força fazendas ocupadas por indígenas em uma área que faz parte da Terra Indígena Nhanderu Marangatu. A terra foi homologada em 2005 pelo governo federal, mas o decreto foi suspenso e os índios aguardam decisão final do Supremo Tribunal Federal em terra provisória.


Conflitos na Amazônia
As mortes de ativistas na Amazônia brasileira tiveram destaque no documento, segundo o qual a luta para salvar a floresta está se tornando cada vez mais uma briga contra organizações criminosas que aterrorizam as populações locais. Nem mesmo as forças policiais são respeitadas na região, na avaliação da ONG.


Na última sexta-feira (17), durante uma operação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) na Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim, em Novo Progresso, no Pará, a equipe de fiscalização foi atacada a tiros em uma emboscada que levou à morte o sargento da Polícia Militar João Luiz de Maria Pereira.


O relatório também destaca que na Amazônia há milhares de campos de extração ilegal de madeira, que acaba chegando ao mercado internacional.


Papel dos governos
Segundo a Global Witness, os interesses em comum de governos e empresas muitas vezes protegem os responsáveis pelas mortes de ativistas envolvidos em conflitos de terra ou com a proteção do meio ambiente e que pouco se faz para levar os autores à Justiça. A organização alerta que, se não houver intervenção estatal, os números serão cada vez maiores.


Segundo a organização, entre os casos de morte de ativistas mais bem documentados no mundo no ano passado, 16 estão relacionados com grupos paramilitares, 13 com o Exército, 11 com policiais e 11 guardas de segurança privada.


Para enfrentar a questão, a Global Witness pede providências dos governos dos países envolvidos e aponta caminhos para diminuir o número de mortes, como garantir maior proteção aos ativistas da terra e do meio ambiente que estiverem sob risco de violência, investigar os crimes, garantir que as empresas consultem as comunidades antes de fazerem empreendimentos que as afetem, entre outros.


A assessoria de imprensa do Ministério da Justiça e Cidadania informou que “ainda não possui posicionamento sobre o relatório”.


Por Maiana Diniz, da Agência Brasil, in EcoDebate, 21/06/2016

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta enviar um email para newsletter_ecodebate+subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.
O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.


Comentários (1)


  1. Prof. José de Castro Silva disse:
     
    Sou dos tempos do faroeste (Far west) que era sucesso nos cinemas. Tudo não passava de ficção, embora não tivéssemos a noção de que a telona do cinema era fruto da imaginação dos magnatas e artistas de Hollywood.

    Hoje, tudo acontece ao vivo e a cores. deixou de ser pura imaginação. Além das poucas diferenças, os bandidos nunca levavam vantagem. Hoje, os bandidos são os heróis, pois estão nas manchetes dos jornais e da televisão e não existe presídio que os segure.

Inovações Sustentáveis, artigo de Roberto Naime


Publicado em junho 21, 2016 por



artigo

[EcoDebate] Ricardo Abramovay assevera que precisamos de inovações sustentáveis.
Crítico do alarmismo, o professor Ricardo Abramovay defende divulgação de boas práticas ambientais para sensibilizar população. Em entrevista a Renato Grandelle afirma que “em qualquer setor, as empresas precisam conversar cada vez mais com os cientistas e ser sensíveis às mudanças das preferências dos consumidores”


Parece impossível discutir o futuro do planeta sem cair no pessimismo. As mudanças climáticas são tão flagrantes que teriam provocado o início de um novo período geológico.
A indústria ainda não consegue adaptar toda a sua cadeia de produção a práticas sustentáveis. O economista Ricardo Abramovay, da Universidade de São Paulo (USP) prefere não olhar para o abismo.


Existem estudos mostrando que até 80% do noticiário relacionado às mudanças climáticas é alarmista. Não é culpa dos meios de comunicação porque, quando alguém abre o jornal, as catástrofes chamam mais atenção. Então, é natural que ganhem mais ênfase.


É importante ressaltar que as ameaças não são inventadas. De fato vivemos uma situação preocupante. No entanto, acredito que, se quisermos sensibilizar a população, é importante expor exemplos e conquistas que permitam dizer que, apesar dos problemas, há condições de organizar a vida.


Indagado sobre quais são as consequências da comunicação baseada em catástrofes, arguiu, “se as pessoas têm a expectativa de que a vida vai piorar, elas acreditam que é melhor aproveitar enquanto há tempo. Você sabe o que está acontecendo, mas nada faz a respeito, porque não haverá um prejuízo imediato. Acredito que, se os gases de efeito estufa tivessem cor, nunca chegaríamos a esta situação. As pessoas se revoltariam contra a poluição. Infelizmente a destruição do sistema climático não é visível”.


Indagado porque tantos relatórios científicos também adotam um tom alarmista, mas ainda não convenceram os governos a estabelecer um acordo global assevera “a capacidade de comunicação da ciência é muito pequena. Aliás, ela parece avessa à comunicação. O discurso é hermético. Os relatórios são difíceis de compreender”.


Perguntado sobre onde os ambientalistas erram em seu discurso, manifesta que “um exemplo é o setor de transportes, hoje baseado em carros particulares, movidos a combustíveis fósseis. O discurso ambientalista convencional é “você não pode ter o automóvel que tanto almeja, porque ele é poluente”. Isso induz a uma reação, “como assim? Agora que eu quero (e posso), você me vem com esta história?”. O ideal é dizer: “Este carro não vai trazer o bem-estar que você quer”. Enquanto isso, devemos investir seriamente no transporte coletivo”.


Provocado a se manifestar sobre o setor energético, onde também há exagero quando se fala sobre a possibilidade de racionamentos no futuro, argumentou “nos Estados Unidos, alguns anos atrás, achava-se que seria necessário reduzir o uso de equipamentos elétricos e eletrônicos que são indispensáveis. O uso de tecnologias como a energia solar por um preço cada vez mais barato muda completamente este negócio. Mostra que a redução das emissões derivadas do consumo de energia não se traduz em mal-estar para as pessoas. Temos técnicas para assegurar que as mudanças exigidas à sociedade pelo aquecimento global sejam menos traumáticas do que pensávamos recentemente”.


Perguntado se acreditava que a crise hídrica tivesse sido uma lição para a sociedade sobre a fragilidade do fornecimento de energia, aduziu “a ocorrência dos eventos climáticos extremos coloca a sociedade em um clima de incerteza totalmente inédito. Não podemos dizer que fenômenos como este ocorrerão, por exemplo, a cada dez anos. Não há uma frequência correta. Falta uma campanha para mostrar à população que economizar energia continua sendo muito importante, mesmo com os avanços tecnológicos”.


O senhor também inclui o setor alimentício no rol daqueles que mais demandam mudanças radicais no relacionamento entre clima, empresas e consumidores. Manifestou convicto que “a indústria alimentícia é altamente dependente de insumos químicos.


Ao mesmo tempo, a explosão da epidemia de obesidade está fazendo com que as grandes empresas do setor agro-alimentar revejam os seus modelos de negócio.


Então, a forma de vender alimentos é cada vez mais contestada, tanto por organismos médicos como também pela opinião pública. Em qualquer setor, as empresas precisam conversar cada vez mais com os cientistas e ser sensíveis às mudanças das preferências dos consumidores. Do contrário, elas perdem sua legitimidade social, o que afeta seus lucros”.


Inquirido se as empresas estão preparadas para este diálogo, desenvolveu manifestações de que “ainda não. As empresas do século XXI são aquelas que conseguirão se organizar diante da preferência dos clientes, da rede de fornecedores, de políticas públicas e da concorrência. Elas sofrem pressões e devem reagir a elas. Já não investem mais em pesquisas que negam as mudanças climáticas, como faziam aquelas que exploram combustíveis fósseis”.


Em continuidade na entrevista, diante da questão que o senhor já escreveu artigos sobre o Antropoceno, um novo período geológico, o primeiro provocado pelo homem. Como nossa intervenção sobre o planeta tornou-se tão importante?


Respondeu que “cerca de 10 mil anos atrás, na Revolução Neolítica, o homem tornou-se uma força biológica, porque alterou ecossistemas com o surgimento da agricultura. Desde então, a temperatura do planeta não sofreu grandes alterações, oscilava cerca de 1 grau Celsius. Isso mudou a partir da Revolução Industrial, no fim do século XVIII, quando começamos a usar combustíveis fósseis.


O ser humano, em vez de força biológica, converteu-se em uma força geológica. Em tão pouco tempo, a temperatura já aumentou 0,8 grau Celsius. Além disso, vivemos uma explosão populacional. Durante o século XX, passamos de 1,6 bilhão para 6,1 bilhões de pessoas. Pela primeira vez, causamos a chegada de um novo período geológico. Este é o Antropoceno”.


Finalizando, diante do questionamento sobre o que pode ser feito a partir de agora, conclui “o Antropoceno não significa o fim do mundo. A questão é: como transformar o limão em limonada? Levando em consideração as transformações que provocamos sobre a Terra, o que significa uma vida digna? Precisamos aumentar a cooperação das pessoas, mudar a relação com o mundo natural.


Isso deve ser apoiado em revoluções tecnológicas. Precisamos de inovações sustentáveis, porque já é certo que as temperaturas globais aumentarão de 3 a 6 graus Celsius até o fim do século. O sistema produtivo precisa ser modificado”.


Aqui isto frequentemente tem sido denominado nova autopoiese sistêmica, na interpretação livre da semântica das acepções de Niklas Luhmann e Ulrich Beck, para um novo arranjo civilizatório.


Nada foi mais nefasto na civilização humana do que as hecatombes ambientais produzidas pela falta de liberdade e práticas ambientalmente condenáveis geradas pela auto-suficiência de ditadores socialistas.


Esta mudança deve começar logo, juntando as lutas singulares, os esforços diários, os processos de auto-organização e as reformas para retardar a crise, com uma visão centrada numa mudança de civilização e uma nova sociedade em harmonia com a natureza.


Não é preciso esperar catástrofe ecológica ou hecatombe civilizatória para determinar nova autopoiese sistêmica. Nada foi mais deletério em causar a maior catástrofe ambiental do planeta do que a falta de liberdade e imprensa livre dos ditos regimes socialistas.


Mas esta é a concepção resultante de convicções muito pessoais e personalizadas.


Referência:
http://ghgprotocolbrasil.com.br/ricardo-abramovay-precisamos-de-inovacoes-sustentaveis-diz-especialista-em-meio-ambiente-da-usp-entrevista?locale=pt-br

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.


Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

in EcoDebate, 21/06/2016
"Inovações Sustentáveis, artigo de Roberto Naime," in Portal EcoDebate, ISSN 2446-9394, 21/06/2016, https://www.ecodebate.com.br/2016/06/21/inovacoes-sustentaveis-artigo-de-roberto-naime/.

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta enviar um email para newsletter_ecodebate+subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.

Integração Lavoura Pecuária Floresta (iLPF): Tecnologia da Embrapa evita desmatamento de novas áreas para produção


Publicado em junho 21, 2016 por

Embrapa pecuária e lavoura
“A tecnologia é capaz de dobrar a produtividade, quintuplicar a produção de pecuária sem alteração de custo e sem abertura de novas fronteiras agrícolas”, diz  pesquisador da Embrapa. Foto: Divulgação Embrapa/ Breno Lobaro


A tecnologia aplicada na agricultura tem permitido que em uma mesma área sistemas integrados produzam até quatro safras por ano. Desenvolvido pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), os sistemas de integração envolvem a produção de grãos, fibras, madeira, energia, leite ou carne, em plantios em rotação, consorciação e/ou sucessão.


Tratada como a “revolução dos trópicos”, por um de seus criadores, o pesquisador da Embrapa Cerrados João Kluthcouski, a técnica funciona basicamente com o plantio, durante o verão, de culturas agrícolas anuais como arroz, feijão, milho, soja ou sorgo e de árvores, associado a espécies forrageiras (braquiária ou panicum). As combinações são variadas entre os componentes agrícola, pecuário e florestal e levam em consideração espaço e tempo disponíveis.


“Essa é a maior revolução dos trópicos, do cinturão tropical do mundo todo. Porque ela não é uma simples tecnologia, é um complexo tecnológico de fácil aplicação e entendimento, que permite recuperar áreas degradadas com alta sustentabilidade. Este é o sistema de integração: recuperação de áreas degradas, produção sustentável, quatro colheitas por ano que dependem apenas de chuva”, explica João Kluthcouski, conhecido como João K.


Ao integrar as atividades, evita a necessidade de desmatamento de novas áreas para o aumento da produção. A tecnologia resulta em diferentes sistemas integrados, como lavoura-pecuária-floresta (iLPF), lavoura-pecuária (iLP), silvipastoril (SSP) ou agroflorestais (SAF). A técnica de integração aceita todas as espécies vegetais, em áreas de a partir de 1 hectare de terra.


“A tecnologia é capaz de dobrar a produtividade, quintuplicar a produção de pecuária sem alteração de custo e sem abertura de novas fronteiras agrícolas”, disse João K.
O pesquisador foi o idealizador da implementação da tecnologia na Fazenda Santa Brígida, localizada em Ipameri (GO), a 200 km de Goiânia. Na ocasião, a proprietária Marize Porto Costa acabara de ficar viúva e a fazenda, até então administrada por seu marido, estava com dificuldades de manutenção.


“Quando nós assumimos a gestão da fazenda Santa Brígida em 2006, nós nos deparamos com pastos totalmente degradados, infestados de cupim e que não davam suporte para os animais que estavam aqui [na fazenda]. Quando fizemos o levantamento para ver quanto ficaria para recuperar esse espaço, nós vimos que da forma convencional era impossível fazer isso aí, era uma coisa cara e com retorno de logo prazo”, conta Marize, ao descrever o cenário da fazenda antes de procurar apoio técnico da Embrapa.


Visitada pela Agência Brasil*, a fazenda atua no sistema de integração lavoura-pecuária-floresta, com produção de gado, soja, milho, girassol e eucaliptos. Antes do sistema, a produção era de duas e meia arroba por hectare/ano. Atualmente, são 25 arrobas por hectare/ano. Com relação à soja, no começo, houve um empate de produção para uma evolução de 65 sacos por hectare/ano. A produção de milho, que era 90 sacos por hectare passou para projeção de 185 a 190 sacos por hectare.


Pecuária
Segundo o presidente da Embrapa, Maurício Lopes, o sistema representa um “novo paradigma de produção” da agricultura e pecuária brasileiras. A estatal trabalha no desenvolvimento de métricas que permitirão, ao associar a tecnologia de integração, o rastreamento da produção e a certificação da carne brasileira, em um sistema de chamado “Carbono Zero”.


Quando se cria uma métrica e um processo de rastreabilidade para a carne inserida num processo como esse, onde se tem soja, milho, árvore, pasto, o que acontece é que o sistema faz um ‘off-set‘ da emissão de metano. A Embrapa já tem dados seguros mostrando que é perfeitamente possível, quando se computa o carbono, que é incorporado pela pastagem, pelas lavouras”, explica Lopes.


Lopes ressalta que o desafio do sistema é a falta de informações do produtor rural e o estímulo para adoção do sistema. Segundo o presidente, a estatal tem atuado na adaptação de modelos para média e pequena propriedade. Nestes casos, as possibilidades de integração são mais diversificadas, mas ainda desconhecidas por parte dos agricultores.


“Com este sistema, nós estamos mudando o conceito tradicional de sustentabilidade, que era o seguinte: use os recursos naturais de forma inteligente, segura e garanta que ele esteja bom para os seus filhos. Nós estamos trabalhando um outro conceito de sustentabilidade, vamos entregar um produto muito melhor para os nossos filhos. A gente está construindo estoques de carbono no solo”, afirma Lopes.


Segurança alimentar
Segundo Maurício Lopes, os sistemas integrados diminuem a necessidade do uso de agrotóxicos na produção e atuam em variações de clima e temperatura de maneira mais segura.


“Sistemas integrados em oposição a sistemas únicos ou uso massivo de uma espécie só, eles são sistemas naturalmente mais resilientes. Esses sistemas mantém uma vida biológica extremamente mais diversificada, isso facilita por exemplo, abrigo para inimigos naturais de pragas, o que não se encontra, geralmente, em grandes culturas. Você elimina o abrigo para aqueles que seriam os inimigos naturais das pragas. Quando se tem um sistema mais diversificado, aumenta a probabilidade de você ter abrigo e proteção para inimigos naturais”, explica Lopes.


Rede de Fomento
Paulo Herrmann, presidente da empresa de máquinas agrícolas John Deere Brasil e da Rede de Fomento à Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF) explica que a tecnologia integra produção e preservação da natureza.


Do ponto de vista ambiental, ela é um avanço no que nós temos hoje, porque se tem sempre o solo coberto, sempre há vegetação, vai ter menos emissões de carbono o tempo todo, menos aquecimento global. Se consegue produzir a mesma quantidade de elementos, de produtos, que você faria num sistema convencional, numa área seis vezes menor, com 55%  menos emissões [de gases]”, aponta.

Hermann destaca o benefício social da tecnologia. “Como se trata de uma atividade mais intensa, se passa a ter uma atividade ao longo do ano e isso fixa mão de obra, gera mais emprego porque é mais intensiva, tem que ter mais gente especializada para trabalhar com máquina, com a parte de gado”.

O presidente da rede de fomento ressalta  a mudança de paradigma como obstáculo para o uso da tecnologia no país. “A maior dificuldade é a quebra de paradigma, não é a dificuldade da pessoa em fazer. É ela colocar na cabeça que pode plantar duas coisas ao mesmo tempo sem ter prejuízo de produtividade. De uma maneira geral, não estamos preparados para esse tipo intensivo de trabalho”.

A Rede de Fomento ILPF foi criada em 2012, composta por uma parceria entre Embrapa e as empresas Cocamar, Dow AgroScience, John Deere, Parker, Syngenta. Atualmente, há 97 unidades de referencia Tecnológica distribuídas em todos os biomas brasileiros, que envolve a participação de 19 Unidades de Pesquisa da Embrapa para disseminar informações sobre a tecnologia.

*A repórter viajou a convite da John Deere Brasil 

Por Heloisa Cristaldo, da Agência Brasil, in EcoDebate, 21/06/2016

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim diário, basta enviar um email para newsletter_ecodebate+subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a inscrição.

O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por terceiros.

'Erramos', diz Rio 2016 após morte de onça presente em tour da Tocha

21/06/2016 17h34 - Atualizado em 21/06/2016 19h11

Animal que participou de evento no AM escapou e foi morto por militares.


'Cena contraria nossas crenças e valores', disse organização de Jogos.

Do G1 AM
Onça Juma participou de evento da Rio 2016 em Manaus momentos antes de ser morta (Foto: Jair Araújo/Diário do Amazonas)Onça Juma participou de evento da Rio 2016 em Manaus momentos antes de ser morta (Foto: Jair Araújo/Diário do Amazonas)


A organização dos Jogos Olímpicos Rio 2016 se pronunciou nesta terça-feira (21) sobre a morte da onça Juma, abatida após participar do revezamento da Tocha Olímpica no Centro de Instrução de Guerra na Selva (Cigs), em Manaus. "Erramos ao permitir que a Tocha Olímpica, símbolo da paz e da união entre os povos, fosse exibida ao lado de um animal selvagem acorrentado", admitiu o comitê.


Em nota divulgada em sua página no Facebook, a Rio 2016 disse que o ocorrido "contraria as crenças e valores" da organização.

Veja a íntegra da nota:

Erramos ao permitir que a Tocha Olímpica, símbolo da paz e da união entre os povos, fosse exibida ao lado de um animal selvagem acorrentado. Essa cena contraria nossas crenças e valores.

Estamos muito tristes com o desfecho que se deu após a passagem da tocha. Garantimos que não veremos mais situações assim nos Jogos Rio 2016.

Entenda o caso


A onça Juma foi abatida pelo Exército após fugir e avançar contra um militar, informou o Comando Militar da Amazônia (CMA). O fato ocorreu na segunda-feira (20), após o local receber o 'Tour da Tocha'.


Segundo o CMA, a onça escapou no momento em que o Cigs estava fechado para visitas. Uma equipe de militares composta de veterinários especializados tentou resgatar o animal. Porém, mesmo atingido com tranquilizantes, Juma se deslocou em direção a um militar e foi realizado um tiro de pistola por medida de segurança. O animal morreu no local.


Ambientalistas criticaram o ocorrido. Ao G1, Diogo Lagroteria, analista ambiental do Ibama e veterinário, disse que, mesmo com anos de treinamento e em cativeiro, a onça nunca poderá ser considerada um animal domesticado. "O incidente no Cigs aconteceu pelo simples fato dele [o animal] ser uma onça. Animais selvagens sempre serão animais selvagens. Não tem como prever a reação deles nesse tipo de situação", disse o analista ambiental ao G1.

Sacrifício de onça exibida em passagem da tocha por Manaus revela drama de espécie ameaçada

BBC21/06/2016 07h23 - Atualizado em 21/06/2016 07h46

Onça mascote do Exército foi morta com um tiro de pistola após avançar sobre soldado; ela havia sido acorrentada e apresentada ao público durante cerimônia.

Joao FelletDa BBC
  •  
Juma foi morta com um tiro de pistola após fugir e avançar sobre soldado; ela havia sido acorrentada e apresentada ao público durante cerimônia (Foto: Jair Araújo/Diário do Amazonas)Juma foi morta com um tiro de pistola após fugir e avançar sobre soldado; ela havia sido acorrentada e apresentada ao público durante cerimônia (Foto: Jair Araújo/Diário do Amazonas)
A morte de Juma, a onça que participou de uma cerimônia com a tocha olímpica em Manaus na segunda-feira, revela o drama de uma espécie ameaçada de extinção e gera questionamentos sobre a manutenção de animais selvagens em centros do Exército na Amazônia.


A onça Juma foi abatida com um tiro de pistola no Centro de Instrução de Guerra na Selva (Cigs) logo após ser exibida no evento olímpico. Como outra onça, apelidada de Simba, ela havia sido acorrentada e apresentada ao público durante a cerimônia.


O Exército mantém várias onças em cativeiro na Amazônia. Os felinos ─ bem como animais de outras espécies ─ costumam ser adotados pelo órgão ao serem encontrados em cativeiro ou em poder de caçadores.


Muitas onças, como Juma, se tornam mascotes dos batalhões e passam por sessões de treinamento. Em Manaus, os felinos são presença frequente em desfiles militares, prática condenada por biólogos e veterinários.


Em 2014, durante gravação de um documentário em Manaus, militares do Cigs mostraram Juma, a mascote do centro, à BBC Brasil. Na época, explicaram que a onça havia sido resgatada com ferimentos após sua mãe ter sido morta. Foi levada para o centro e ali cresceu sob os cuidados de tratadores.


O destino trágico de Juma chama a atenção para a situação cada mais precária da espécie, listada como ameaçada no Brasil pelo Ibama em 2003.


É um animal que exige extensas áreas preservadas para sobreviver, caçando espécies como capivaras e até jacarés. Ela vem sendo ameaçada pelo desmatamento, não apenas na Amazônia como também no Pantanal e no Cerrado, para abrir espaço para a expansão da atividade agropecuária.


Tiro de pistola
Em nota enviada ao site da agência local de notícias Amazônia Real, o Comando Militar da Amazônia (CMA) diz que, após a solenidade olímpica na segunda, Juma escapou dentro do zoológico do centro do Exército. O órgão afirma que um grupo de veterinários e militares tentou recapturá-la com tranquilizantes, mas que, mesmo atingido, o animal avançou sobre um soldado.


"Como procedimento de segurança, visando a proteger a integridade física do militar e da equipe de tratadores, foi realizado um tiro de pistola no animal, que veio a falecer", diz o órgão.
Onça Simba também participou de cerimônia  (Foto: Exército Brasileiro)Onça Simba também participou de cerimônia (Foto: Exército Brasileiro)
Segundo o Amazônia Real, dois militares seguravam a corrente presa a Juma durante todo o evento. O site diz que muitas pessoas tiraram fotos com a onça na cerimônia. Ela teria fugido logo após a exibição, quando militares tentavam colocá-la numa caminhonete.


O Exército diz que abriu um processo administrativo para investigar a morte do felino. Segundo o Amazônia Real, o Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas (Ipaam) não havia autorizado a participação de Juma no evento e poderá multar a corporação.


Indomesticável
Para João Paulo Castro, biólogo com mestrado em comportamento animal pela Universidade de Brasília, Juma pode ter fugido após se estressar durante o evento.


"Não é saudável nem recomendável submeter um animal a uma situação como essas, com barulho e muitas pessoas em volta", ele diz à BBC Brasil.

"Muitas vezes a onça já vive numa situação precária e estressante no cativeiro, o que é agravado num cenário de agitação."

Castro diz que muitos batalhões do Exército na Amazônia mantém onças em cativeiro. Ele afirma ter visitado um centro que mantinha um felino em Cruzeiro do Sul (AC) em condições "bem toscas".

Segundo Castro, é um erro tratar onças como animais domesticáveis. Ele afirma que são necessárias várias gerações em cativeiro para que uma espécie se acostume a conviver com humanos.

O biólogo diz que, idealmente, onças apreendidas devem ser devolvidas à natureza ou levadas a refúgios, onde possam ficar soltas em amplos espaços.

Segundo ele, a soltura de felinos é um processo complexo, mas há casos bem sucedidos pelo mundo ─ como o de tigres devolvidos a florestas na Ásia.

Horas antes da morte de Juma, a BBC Brasil pediu ao Exército detalhes sobre a manutenção de animais selvagens em dependências do órgão na Amazônia. Não houve resposta até a publicação desta reportagem.

Um veterinário de Manaus que já trabalhou com o Exército e pediu para não ser identificado defendeu o órgão das críticas. Segundo ele, ao cuidar de animais resgatados, a corporação assume uma função que deveria ser de outros órgãos públicos.

Ele diz que os militares são muito cuidadosos com os animais e que a burocracia impede que muitos sejam devolvidos à natureza.

O veterinário afirma ainda que grande parte das onças resgatadas chegam ao órgão ainda filhotes e se tornam dependentes dos cuidadores, o que torna difícil sua soltura.