segunda-feira, 17 de abril de 2017

Parlamentares tiram proteção de parque nacional na Amazônia



Sob o pretexto de abrir caminho para a Ferrogrão, medida deixa brechas para mais desmatamento e ocupações ilegais no oeste do Pará.

WWF-Brasil alerta: os parlamentares que alteraram as MPs 756 e 758 deixam desprotegidos mais de um milhão de hectares Amazônia, em uma área já marcada por conflitos fundiários, avanço do desmatamento e crimes como corte ilegal de madeira, garimpos clandestinos e grilagem de terras públicas.

desmatamento

Um dia depois de uma comissão mista do Congresso Nacional reduzir cerca de 660 mil hectares de florestas no oeste do Pará, outro colegiado, também formado por deputados e senadores aprovou, em menos de dez minutos, na manhã desta quarta-feira, mudanças nos limites do Parque Nacional (Parna) do Jamanxim e da Floresta Nacional de Itaituba II – na mesma região.



Pela medida aprovada hoje, 273 mil hectares do parque foram transformados em Áreas de Proteção Ambiental (APAs) Carapuça e Rio Branco. APA é uma modalidade de unidade de conservação que permite diversos tipos de uso do solo, como atividades agropecuárias e garimpo, abrindo brecha para mais desmatamento e ocupações irregulares. Outros 70 mil hectares do parque passam para a Floresta Nacional do Trairão.


O texto da Comissão segue agora para o plenário da Câmara, depois ao Senado. A MP tem de ser votada até dia 29 de maio. Em seguida, vai à sanção do presidente da República.



Um milhão a menos
WWF-Brasil alerta: em duas tacadas, os parlamentares que alteraram as MPs 756 e 758 deixam desprotegidos mais de um milhão de hectares Amazônia, em uma área já marcada por conflitos fundiários, avanço do desmatamento e crimes como corte ilegal de madeira, garimpos clandestinos e grilagem de terras públicas. A decisão tomada hoje consta do relatório do deputado José Reinaldo (PSB/MA), no âmbito da Comissão Mista da Medida Provisória (MP) 758, proposta pelo presidente Temer no final do ano passado.


O plano do Executivo era desafetar aproximadamente 862 hectares do parque para abarcar as curvas da futura ferrovia EF-170, a Ferrogrão, que deve ligar o município de Sinop (MT) ao distrito de Miritituba, em Itaituba (PA). O traçado da ferrovia passa no meio do parque, mais ou menos em paralelo à BR-163, e por isso seria necessário mudar parcialmente o status de alguns trechos da unidade de conservação, conforme desenho proposto pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).


A ferrovia é considerada estratégica pelo agronegócio, que quer usar a via para facilitar as exportações. A expectativa é que passem por ali até cinco milhões de toneladas de grãos por ano.



Minérios
No arranjo do relator, aquilo que foi retirado da Flona de Itaituba (169 mil hectares) foi com o intuito de atender aos interesses do setor minerário. Ao longo da discussão da MP 758, o Ministério de Minas e Energia apresentou uma série de sugestões ao relator, defendendo que o novo desenho deixasse de fora do parque áreas com potencial para mineração.


A prática na região tem sido a de cortar a floresta, colocar em cima algumas cabeças de gado e se apropriar a terra pública. Os que já se adiantaram e invadiram áreas às margens da BR-163, no trecho que corta o parque, também foram a Brasília pressionar, esperando anistia e vantagens com as alterações.


Ao final, o relatório ateve-se apenas aos interesses econômicos, sem considerar a importância ambiental das áreas, que apresentam cobertura florestal contínua e íntegra. “Alterar a categoria de proteção dessas áreas para aproveitamento agrícola, como justifica a emenda feita à MP original, é efetivamente apostar no avanço do desmatamento na Amazônia”, diz a Nota Técnica do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).


Segundo o documento, o parque quando foi criado, em 2006, serviu como barreira ao desmatamento que avançava de modo veloz na região. Essa barreira agora está fragilizada.

Do WWF-Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 13/04/2017

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Redução do patrimônio natural – retrocesso ambiental e social, artigo de Carlos Hugo Rocha





[EcoDebate] O estado do Paraná nunca foi competente em gerenciar o seu patrimônio natural, como mostram os esparsos remanescentes de florestas com Araucária ou Peroba que dominavam o estado antigamente.


A paisagem natural dos Campos Gerais é magnífica, uma das mais belas paisagens do Brasil, reconhecida desde os tempos da colonização regional e dotada de rico patrimônio arqueológico, histórico e cultural. Bem servida por estradas e com fácil acesso à capital, a região pode ser tornar uma das áreas mais visitadas do país. Esse potencial ainda é pouco explorado como gerador de recursos e empregos, em grande parte pela incompetência de nossos administradores e legisladores, que não conseguem conceber e criar condições necessárias para que isso ocorra.


Nas três últimas décadas, levantamentos da biodiversidade regional desenvolvidos no âmbito de universidades, tanto do Brasil quanto do exterior, constataram a importância e riqueza da diversidade biológica dos ecossistemas dos Campos Gerais e foram unânimes em apontar a necessidade de proteção. Justamente por isso, a região foi incluída entre as áreas de extrema prioridade para a conservação da biodiversidade brasileira (Decreto 09/2007- MMA).


Em 1992, foi instituída a Área de Proteção Ambiental – APA da Escarpa Devoniana, integrando 12 municípios dos Campos Gerais. Abrangendo superfície de 395.000 ha, a maior Unidade de Conservação do estado foi delimitada com base nos remanescentes de campos nativos, ou seja, menos de 10% da superfície original dos Campos Gerais.


A APA nunca chegou a ser verdadeiramente implantada e aqueles importantes remanescentes dos Campos Gerais foram sendo paulatinamente substituídos por cultivo agrícola (principalmente soja e milho) ou reflorestamentos.


O objetivo básico de uma APA é compatibilizar a conservação com o uso sustentável dos recursos naturais para gerar recursos econômicos e garantir a conservação em parceria com agricultores e comunidades. Compatibilizar crescimento econômico equitativo com a manutenção dos serviços ecológicos essenciais – água, biodiversidade e sequestro de carbono, é um dos grandes desafios da ciência e da sociedade humana no século XXI. Mas para isso é preciso pelo menos um pouco de inteligência e boa vontade, matéria em falta entre nossos legisladores e governantes.


No final de 2016, deputados da base governista, que legislam independentemente do interesse da sociedade, propuseram estabelecer novo perímetro para a APA. Com base em estudo realizado sem base científica adequada e do poder emanado pela aristocracia rural no atual governo estadual, pretende-se excluir 68% da superfície protegida. Pior, o texto do projeto de lei (PL 527/2106) comete erro grosseiro ao definir os novos limites, tornando a proposta ainda mais incongruente.


Na última segunda-feira, 10, audiência pública para debater a proposta ocorrida em Ponta Grossa lotou o local e quase metade do público presente ficou de fora. Ficou clara a farsa da proposta apresentada, mas isso não significa quase nada para os nossos tomadores de decisão. Resta, portanto, pedir à sociedade que continue democraticamente a se manifestar no sentido de pressionar nossos representantes na Assembleia para agirem de forma mais digna e inteligente em prol do meio ambiente, que é de todos.


*Carlos Hugo Rocha é agrônomo, professor da UEPG, doutor em Gestão de Recursos Naturais pela Colorado State University (EUA) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 13/04/2017


"Redução do patrimônio natural – retrocesso ambiental e social, artigo de Carlos Hugo Rocha," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 13/04/2017, https://www.ecodebate.com.br/2017/04/13/reducao-patrimonio-natural-retrocesso-ambiental-e-social-artigo-de-carlos-hugo-rocha/.

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Morte de macacos pela população prejudica controle da febre amarela



ICTB/Fiocruz
O Brasil vivencia um dos períodos de maior mortandade de primatas da história devido à febre amarela silvestre no país, segundo a Sociedade Brasileira de Primatologia (SBPr). Além das mortes pela infecção pelo vírus, autoridades suspeitam que macacos estejam sendo executados pela população pelo medo de transmissão da doença. O quadro prejudica a implementação de medidas preventivas pelas autoridades sanitárias e pode levar à extinção de espécies, prejudicando todo o meio ambiente.
Morte de macacos pela população prejudica controle da febre amarela
“Os macacos são sensíveis ao vírus da febre amarela e a morte dos animais pela doença é um alerta aos órgãos de saúde sobre a necessidade de vacinação da população humana nos arredores. Ou seja, eles permitem aos gestores de saúde implementar estratégias preventivas, antes de o vírus atingir populações humana”, explica a diretora do Instituto de Ciência e Tecnologia em Biomodelos (ICTB/Fiocruz) e veterinária, Carla Campos.


Ela esclarece ainda que os primatas são tão vítimas da doença quanto os humanos, não a transmitindo diretamente. “Esses animais, assim como o homem, são hospedeiros do vírus e não reservatórios da doença. Os vírus ficam vivos neles por um período de tempo muito curto. Os mosquitos silvestres são os responsáveis pela manutenção do vírus na natureza. Portanto, matar macacos para acabar com o vírus não só é uma estratégia ineficaz, como pode agravar o quadro de risco para a população”, adverte ela.


Em comunicado, a SBPr esclarece que há consenso entre os especialistas de que os macacos não são os responsáveis pela disseminação da doença, embora ainda seja desconhecido o mecanismo de propagação do vírus por extensões geográficas tão vastas. O órgão ressalta que preservar os habitats naturais é essencial para o controle da febre amarela “Desflorestar ou matar macacos não impede a circulação do vírus da febre amarela. Na verdade, o efeito é danoso para a saúde pública, pois elimina o papel de sentinela dos primatas, que, ao morrerem pela doença, avisam as autoridades sobre a sua ocorrência. Os macacos têm, portanto, uma valiosa e insubstituível contribuição para a saúde pública”, explica o órgão.


As autoridades ambientais temem que as mortes por febre amarela somadas àquelas decorrentes de agressões contra os macacos possam levar à extinção de espécies, como aconteceu com o bugio-ruivo, em 2008 e 2009, no Rio Grande do Sul. Segundo o Instituto Chico Mendes para a Conservação da Biodiversidade, do Ministério do Meio Ambiente, o surto da doença afetou populações de bugio-preto (Alouatta caraya) e bugio-ruivo (Alouatta guariba clamitans), matando milhares de macacos, com registros de extinções locais, inclusive em unidades de conservação.


Animal doente ou morto
O Centro de Informação em Saúde Silvestre (Ciss/Fiocruz) orienta que, ao encontrar um macaco morto ou com comportamento estranho, deve-se contatar a secretaria municipal de saúde de sua cidade ou, no caso do Rio de Janeiro (capital) notificar pelo telefone 1746. Além disso, é indicado realizar a notificação no aplicativo Siss-Geo (disponível apenas para Android).



Segundo a bióloga, coordenadora do Ciss e do Programa Institucional Biodiversidade & Saúde, Márcia Chame, o aplicativo permite saber a localização exata do animal encontrado, pois utiliza o sistema de GPS do celular, além de enviar fotos. “Ao receber essas informações, notificamos imediatamente as autoridades sanitárias competentes, permitindo que esses animais sejam removidos de maneira correta e possam ser encaminhados para análise em instituições de referência, além de alertar essas instâncias para a necessidade de outras ações naquele local, como imunizar a população, por exemplo”.


Já no caso de maus tratos de macacos é possível denunciar pela Linha verde do Ibama (0800 61 8080) ou pelo e-mail linhaverde.sede@ibama.gov.br, inclusive podem ser encaminhadas fotos e vídeos que auxiliem na identificação do crime e de quem o cometeu.



A doença
Segundo o Ministério da Saúde, a febre amarela é uma doença infecciosa febril aguda, causada por um arbovírus (vírus transmitido por artrópodes), que pode levar à morte em cerca de uma semana, se não for tratada rapidamente. Os casos da doença no Brasil são classificados como febre amarela silvestre ou febre amarela urbana.


O vírus causador e os sintomas clínicos da doença são os mesmos nos dois casos: a diferença entre elas é o mosquito transmissor. Na febre amarela silvestre, os mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes transmitem o vírus e os macacos são os principais hospedeiros. Nessa situação, os casos humanos ocorrem quando uma pessoa não vacinada adentra uma área silvestre e é picada por mosquito contaminado. Na febre amarela urbana, o vírus é transmitido pelos mosquitos Aedes aegypti ao homem. O Brasil não registra casos desta doença desde 1942.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/04/2017

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Tragédia de Mariana: Além do Rio Doce, águas subterrâneas da bacia também estão contaminadas




ABr


Colatina (ES) - Rio Doce é atingido por rejeitos de mineração do rompimento da barragem da Samarco em Mariana, em Minas Gerais (Fred Loureiro/Secom ES)
Águas subterrâneas da bacia do Rio Doce também estão contaminadas com metais pesados, segundo estudo. Foto: Fred Loureiro/Secom ES

Um estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em parceria com o Greenpeace, revelou que, além do Rio Doce, as águas subterrâneas da região estão contaminadas com altos níveis de metais pesados. A água dos poços artesianos locais apresentaram níveis desses metais acima do permitido pelo governo brasileiro. Os pequenos agricultores são os mais prejudicados, já que não têm outra fonte de água para a produção e para beber.


 As águas do Rio Doce foram contaminadas pelo rompimento da Barragem de Fundão, pertencente à mineradora Samarco, no município mineiro de Mariana, em 5 de novembro de 2015. O incidente devastou a vegetação nativa e poluiu toda a bacia do Rio Doce, atingindo outros municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo. Dezenove pessoas morreram e diversas comunidades foram destruídas. O episódio é considerado a maior tragédia ambiental do país.


Após o desastre, agricultores familiares recorreram a poços artesianos para irrigar suas plantações e ter água para beber. As amostras coletadas pela equipe da UFRJ apresentaram altos níveis de ferro e manganês, que prejudicam o desenvolvimento das plantações e oferecem riscos à saúde, no longo prazo, segundo os pesquisadores.


Um dos objetivos do estudo do Instituto de Biofísica da UFRJ, em parceira com o Greenpeace, foi avaliar se os agricultores, impossibilitados de utilizar em suas plantações as águas do Rio Doce contaminadas pelo desastre, poderiam empregar com segurança os poços artesianos como fonte de irrigação e consumo.


Resultados
Pesquisadores analisaram a presença de metais pesados na água em 48 amostras coletadas de três regiões diferentes da bacia do Rio Doce: Belo Oriente (MG), Governador Valadares (MG), e Colatina (ES). As amostras foram coletadas em poços, em pontos do rio e na água tratada fornecida pela prefeitura ou pela Samarco.


A cidade de Belo Oriente apresentou cinco pontos de coleta com níveis de ferro e manganês acima do estabelecido pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), órgão do Ministério do Meio Ambiente. Em Governador Valadares foram identificados 12 pontos e, em Colatina, dez pontos com os valores acima do permitido. Segundo o estudo, a água desses locais não é adequada para consumo humano e, em alguns casos, também não é recomendado o uso para irrigação de plantas – situação de alguns pontos de Governador Valadares e Colatina.


A contaminação do Rio Doce se deu pelos rejeitos que vazaram com o rompimento da barragem. No entanto, os pesquisadores disseram não poder afirmar que os poços sofreram a contaminação por conta da lama vinda da barragem, por falta de estudos prévios na região. “Contudo, podemos afirmar que a escavação dos poços e sua posterior utilização se deu por conta do derramamento da lama na água do rio, que porventura, a inutilizou”, diz o relatório.


No longo prazo, para a saúde, a exposição ao manganês pode causar problemas neurológicos, semelhantes ao mal de Parkinson, enquanto o ferro, em quantidades acimas das permitidas, pode danificar rins, fígado e o sistema digestivo.


“A contaminação por metais pesados pode ter consequências futuras graves para as populações do entorno, que necessitam de suporte e apoio pós-desastre. Isso deve ser arcado pela Samarco e suas controladoras, Vale e BHP Billiton, e monitorado de perto pelo governo brasileiro”, defendeu Fabiana Alves, da Campanha de Água do Greenpeace.


Agricultura
No curto prazo, o grande impacto tem sido na agricultura, identificou a pesquisa. O estudo buscou pequenos produtores locais para analisar como seus modos de vida foram atingidos pela lama. Muitos dos que não abandonaram suas terras enfrentaram dificuldades financeiras por não conseguir mais produzir com o solo e a água que têm.


De acordo com o relatório, 88% dos entrevistados afirmaram ter alterado o tipo de cultivo e/ou criação realizada pela família após o incidente. A produção de cabras foi bastante afetada pelo desastre e as atividades de pesca e criação de peixes praticamente desapareceram na bacia.


Dados apresentados pelos pesquisadores após entrevistas com os agricultores demonstraram também que, antes do desastre, 98% dos entrevistados utilizavam água do Rio Doce para atividade econômica do dia a dia. Após a tragédia, somente 36% continuaram usando a mesma água. Destes, 87% utilizam a água para irrigação. Cerca de 60% dos entrevistados considera a água imprópria para uso, o que demonstra a insegurança no uso desse recurso fundamental para as populações que vivem à beira do rio.

Por Camila Boehm, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/04/2017

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]




A estagnação das emissões de CO2 do setor de energia, artigo de José Eustáquio Diniz Alves



global carbon dioxide emissions, 1980-2016

[EcoDebate] A Agência Internacional de Energia (IEA em inglês) divulgou em março os dados que mostram que as emissões globais de dióxido de carbono relacionadas à energia ficaram estáveis pelo terceiro ano consecutivo (2014, 2015 e 2016). Isto aconteceu mesmo com o crescimento da economia internacional, sinalizando um desacoplamento relativo das emissões de CO2 e da atividade econômica. Este fato inédito nas últimas décadas foi possível graças ao crescimento da geração de energia renovável, a substituição de carvão por gás natural, as melhorias na eficiência energética, bem como mudanças estruturais na economia global.


As emissões globais do setor de energia ficaram em 32,1 gigatoneladas nos últimos três anos, enquanto a economia global cresceu em torno de3%, segundo estimativas da IEA. As emissões de dióxido de carbono diminuíram nos dois maiores consumidores e emissores de energia do mundo. Nos Estados Unidos (devido ao aumento do fornecimento de gás de xisto) e na China (devido à redução do uso do carvão mineral, necessário para reduzir a poluição do ar). E permaneceram estáveis ??na Europa, os três, compensando os aumentos na maior parte do resto do mundo. As emissões nos Estados Unidos no ano passado estavam em seu nível mais baixo desde 1992, período em que a economia cresceu 80%. Evidentemente, a transferência de fábricas para o Terceiro Mundo ajuda neste processo.


Ainda segundo IEA, em 2016, as energias renováveis forneceram mais de metade do crescimento da demanda global de eletricidade, sendo a hidrelétrica responsável pela metade dessa participação. O aumento global da capacidade nuclear do mundo no ano passado foi a maior desde 1993, com novos reatores na China, Estados Unidos, Coréia do Sul, Índia, Rússia e Paquistão.


A demanda de carvão caiu mundialmente, mas a queda foi particularmente acentuada nos Estados Unidos, onde a demanda caiu 11% em 2016. Pela primeira vez, a geração de eletricidade a partir do gás natural foi maior do que a do ano passado nos Estados Unidos. Na China, as emissões caíram 1% no ano passado, à medida que a demanda de carvão diminuía e o PIB cresceu 6,7%.


Esta tendência teve várias razões, sendo que a principal foi a mudança do carvão para o gás no setor industrial e imobiliário, impulsionada em grande parte pelas políticas governamentais de combate à poluição atmosférica. Dois terços do crescimento da demanda de eletricidade na China, que cresceu 5,4%, foi fornecido por energias renováveis ??- principalmente hidrelétricas e eólicas – bem como nucleares.

co2 emissions and global economy growth rates

Esse desacoplamento relativo se deveu às forças do mercado, às reduções de custos tecnológicos e às preocupações com as alterações climáticas e a poluição atmosférica. Porém, a própria IEA ressalva que a pausa no crescimento das emissões é uma notícia positiva para melhorar a poluição do ar, mas não é suficiente para colocar o mundo em um caminho para manter as temperaturas globais abaixo de 2º C.


Sem dúvida, é necessário reduzir urgentemente as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Os seres humanos já lançaram 1,9 trilhões de toneladas de carbono na atmosfera. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), para evitar o pior cenário, o mundo só pode emitir, entre 2012 e 2100, 1.000 gigatoneladas (Gt) de CO2. Em termos médios, isso significa que o mundo só pode liberar no máximo 11,3 GtCO2 por ano até 2100. O problema é que as emissões estão atualmente em torno de 40 GtCO2, o que dá uma ideia do tamanho do desafio para fazer essa redução.


Assim, o chamado “orçamento carbono” não está sendo cumprido e as INDCs do Acordo de Paris são insuficientes para resolver o tamanho do desafio. A estagnação das emissões do setor de energia é uma boa notícia, mas insuficiente. A concentração de CO2 na atmosfera ultrapassou 400 partes por milhão (ppm) em 2014 e já se aproxima de 410 ppm em 2017. O nível seguro é 350 ppm. Porém, os anos de 2015 e 2016 marcaram aumento de mais de 3 ppm ao ano, recorde absoluto. Com o aumento do efeito estufa aumenta a temperatura global e os três últimos anos foram os mais quentes desde o início do registro em 1880. Consequentemente, o nível de degelo global também tem batido todos os recortes.

O mundo precisa de uma mudança da matriz energética. O avanço da produção de energia renovável, a construção de uma rede inteligente de distribuição e o fortalecimento dos prosumidores são tarefas imprescindíveis. Mas também é preciso reduzir o desmatamento, fazer a transição da dieta cárnea para uma dieta vegetariana (ou vegana) e reduzir a demanda agregada global via o decrescimento demoeconômico, promovendo a transição do modelo de crescimento econômico infinito para um novo modelo de redução do metabolismo entrópico, que Howard e Elisabeth ODUM (2013) chamam de DECLÍNIO PRÓSPERO.

Referências:
ALVES, JED. Aquecimento global e Orçamento Carbono, Ecodebate, RJ, 11/11/2016
https://www.ecodebate.com.br/2016/11/11/aquecimento-global-e-orcamento-carbono-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/