segunda-feira, 17 de julho de 2017

Grileiros ganham meio bilhão com redução de Jamanxim


Por Eduardo Pegurier e Daniele Bragança
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Vista aérea do reabanho de gado na Flona de Jamanxim, alvo da Operação Boi Pirata II. 
Foto: Nelson Feitosa/Ibama



Nesta quinta-feira (12), o governo federal enviou ao Congresso um projeto de lei que reduz em quase 350 mil hectares a Floresta Nacional de Jamanxim. Caso seja aprovado, a mudança manda duas mensagens claras: vale a pena invadir unidades de conservação na Amazônia. E mais, faça isso e você vai obter terra na região a preço de banana.



Para mostrar o tamanho da transferência de renda àqueles que se apossaram ilegalmente de terras da União, os pesquisadores Paulo Barreto e Elis Araújo, da ONG  Imazon, fizeram um cálculo do valor deste subsídio, que vai de um mínimo de R$511 milhões até R$605 milhões.



A conta é a seguinte: no mercado de terras, um hectare de pasto vale R$1.800 no município de Novo Progresso, onde fica a Floresta Nacional de Jamanxim. Pelas novas regras aprovadas pela chamada MP da Grilagem (Lei 13.465/2017), os grileiros poderão pagar uma fração do valor de mercado. Essa lei prevê que o custo para regularização de posses seja de 10% a 50% dos valores que o INCRA estabelece. Em Novo Progresso, este valor é de R$672 por hectare.



Em suma, enquanto compradores regulares de terra pagariam R$1.800, os posseiros poderão pagar de R$67 (3,7% do valor de mercado) a R$336 (18% do valor de mercado).


Exatos 349.085 hectares poderão ser repassados desta forma a invasores, um território duas vezes maior que o município de São Paulo. Essa área será transformada em APA, uma categoria de unidade de conservação que aceita propriedade privada e atividades como pecuária e mineração.
O gráfico abaixo mostra a estimativa de subsídio aos posseiros.
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Fonte: Imazon



Histórico
A novela da redução da Floresta Nacional de Jamanxim teve três capítulos até agora. O primeiro foi a edição em dezembro/16 da Medida Provisória 756, que transformou 304 mil hectares de Jamanxim em APA (Área de Proteção Ambiental), a mais branda das categorias de Unidade de Conservação do país. Esse rebaixamento no status de proteção tinha apenas um objetivo: legalizar a propriedade e a produção de posseiros e grileiros que fizeram de Jamanxim a área protegida mais desmatada da Amazônia. Como contrapartida pela perda da proteção, o Ministério do Meio Ambiente acrescentou na proposta que 438 mil hectares da Floresta seriam anexados ao Parque Nacional do Rio Novo. Outra proposta era que parte da nova APA de Jamanxim fica em uma área onde não havia qualquer Unidade de Conservação.



O Congresso tratou de desmantelar esses ganhos. O projeto tramitou na Comissão Mista no Congresso, onde recebeu 12 emendas. Foi modificado de novo durante a votação no plenário da Câmara e no Senado. O resultado foi converter a MP756 em lei, aumentando a perda de Jamanxim de 304 para 486 mil hectares e, ao contrário, diminuía o tamanho da recém criada Área de Proteção Ambiental de Jamanxim, que passou de 542.309 para 486.438,00 hectares.



Os ambientalistas começaram uma campanha pelo veto presidencial e a visita do presidente Michel Temer à Noruega deu o empurrão que faltava: o país escandinavo é o maior financiador do Fundo Amazônia e sancionar uma proposta que contribui diretamente para o desmatamento da maior floresta do país não passaria despercebido.



Então, o segundo capítulo da novela foi o veto para norueguês ver, que saiu com um acordo de cavalheiros: o presidente vetaria tudo e enviaria um Projeto de Lei, em caráter de urgência, reduzindo Jamanxim num tamanho pré acertado pelos parlamentares, aquele de 486 mil hectares. O anúncio foi feito pelo próprio ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, em um vídeo no qual aparece ao lado do senador ruralista Flexa Ribeiro (PSDB-PA).



Após a volta da Noruega, Sarney Filho acenou com a possibilidade de sentar em cima do acordo e anunciou que acataria a decisão técnica do Instituto Chico Mendes (ICMBio). Se o órgão dissesse que era para reduzir, o Ministério do Meio Ambiente enviaria o Projeto de Lei, se dissesse o contrário, nada de projeto.


Os ruralistas entenderam o golpe e se mobilizaram: desde terça-feira passada, manifestantes bloqueiam a BR-163, que margeia a Floresta Nacional, em protesto contra o veto. Ontem, informações vindas dos corredores do Congresso davam conta que os ruralistas se articulavam para derrubar o veto do Temer, enquanto o presidente batalhava pela sua sobrevivência no cargo, ao buscar votos na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara para rejeitar o relatório do deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ), que recomendava a aceitação da denúncia contra Temer por crime de corrupção passiva.


O terceiro capítulo começou ontem, (12/7), quando o governo cedeu aos ruralistas e  enviou o Projeto de Lei reduzindo não 468 mil hectares, mas 349 mil. A novela continua em aberto. Esses números poderão ser modificados durante a tramitação do projeto no Congresso.


Ode à grilagem
A justificativa apresentada no texto do PL pelo ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, para reduzir a Floresta Nacional é justamente o fato de ela ter sido grilada e desmatada: "A área onde se localiza a Floresta Nacional do Jamanxim tem sido palco de recorrentes conflitos fundiários e de atividades ilegais de extração de madeira e de garimpo associados a grilagem de terra e a ausência de regramento ambiental. Com reflexos na escalada da criminalidade e da violência contra agentes públicos, sendo necessária a implantação de políticas de governo adequadas para enfrentar essas questões", diz  o texto do PL.


O envio do Projeto de Lei que flexibiliza a proteção da Floresta Nacional do Jamanxim ocorre dois dias depois que o presidente Michel Temer sancionou a Medida Provisória 759, a chamada MP da Grilagem, que regulariza posses de terras públicas ocupadas até 2011, em zona urbana e rural.


A medida, na prática, é uma anistia à grilagem, já que amplia em sete anos o período de regularização comparado a lei anterior, de 2009, que trata do mesmo assunto. Também amplia de 1.500 para 2.500 hectares o tamanho das propriedades passíveis de regularização, o que permite legalizar a posse de grandes propriedades, em especial na Amazônia.

Ser humano provoca metade das mortes de raposas-do-campo


Por Vandré Fonseca
Raposinha do campo (Lycalopex vetulus). Foto: Wikipédia.
Raposinha do campo (Lycalopex vetulus). Foto: Wikipédia.


O ser humano é responsável por quase metade das mortes de raposas-do-campo (Lycalopex vetulus) que ocorrem foram de unidades de conservação. Além disso, a maioria dos animais morrem antes de oito meses de idade. As informações foram obtidas graças ao monitoramento da espécie, realizado pela Universidade Federal de Goiás (UFG).

Entre as causas estão o envenenamento ou o aterramento de tocas com filhotes, de acordo com o biólogo Frederico Gemésio Lemos, responsável pelo programa de monitoramento e professor da UFG. Mas ainda ocorre o abate de animais, segundo ele. O estudo indica que a espécie corre o risco de extinção.

O grupo de pesquisa da UFG monitora raposas-do-campo em fazendas, no município de Cumari, sul de Goiás, que carregam colares com radiotransmissores e brincos de identificação. Com o estudo fora e Unidades de Conservação, os pesquisadores podem conhecer, por exemplo, como a espécie interage com outras espécies e se é vítima de agressões cometidas pelo ser humano.

Os estudos avaliam também o papel dos machos na criação de filhotes, responsáveis por cuidar e levar comida, além de defender o grupo de agressores. As fêmeas passam a noite alimentando ou amamentando, em intervalos de até duas horas, os filhotes. A pesquisa é financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e inclui ações na divulgação da raposinha em escolas, órgãos ambientais regionais, estaduais e federais, e na internet.

A raposa-do-campo é um dos menores canídeos do mundo e ocorre apenas no Cerrado brasileiro. Apenas 20% da área ocupada originalmente pela espécie mantém as condições naturais originais. Embora seja classificada na categoria menos preocupante pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), está na lista vermelha nos estados de São Paulo e Paraná. Na lista nacional, a espécie é classificada como Vulnerável.