domingo, 23 de julho de 2017

Catástrofe climática: a Terra inóspita e inabitável, artigo de José Eustáquio Diniz Alves


“Para cada mil pessoas dedicadas a cortar as folhas do mal,
há apenas uma atacando as raízes.”
Henry Thoreau
The Uninhabitable Earth, NYMag
[EcoDebate] A revista New York Magazine (NYMag) publicou, no dia 09/07/2017, uma matéria denominada “The Uninhabitable Earth” – pintando no pior cenário, um Armagedon climático – que se tornou viral e foi comentada amplamente em diversos países e passou a ser o artigo mais lido da revista (ver o link no final desse artigo). 



Infelizmente, pouco se falou sobre o assunto no Brasil. A matéria, com chamada de capa, feita a partir de entrevistas com cientistas renomados, traz uma visão catastrófica do efeito do crescimento das atividades antrópicas sobre os ecossistemas e as mudanças climáticas. A repercussão foi enorme. Houve muita comoção pelo tom apocalíptico, reproduzido por uma grande revista que tem respeitabilidade e repercussão imediata.


O texto começa assim: “It is, I promise, worse than you think” (Prometo, é pior do que você pensa). O subtítulo diz do que se trata: “Fome, colapso econômico e um sol que nos cozinha: o que as mudanças climáticas podem causar – mais cedo do que você pensa”. Evidentemente, o autor está tratando de um cenário extremo e de baixa probabilidade, mas que pode ocorrer se nada for feito para mudar os rumos da insustentabilidade do crescimento econômico e suas externalidades ambientais.



Desta forma, o jornalista David Wallace-Wells realmente conseguiu assustar. A seguir segue uma tentativa de resumir alguns dos principais pontos da matéria.



Na primeira parte, denominada “Apocalipse, espiando além da reticência científica” o autor explica que a ansiedade sobre os efeitos do aquecimento global em relação à elevação do nível do mar, é justificável, mas apenas arranha a superfície dos horrores que podem acontecer no espaço de tempo da vida de um adolescente de hoje. A elevação do nível dos oceanos é ruim, muito ruim, mas fugir do litoral é um problema menor. Na ausência de um ajuste significativo de como bilhões de seres humanos produzem e consomem, partes da Terra provavelmente se tornarão inabitáveis ​​e outras partes ficarão terrivelmente inóspitas, antes do final deste século.



David Wallace-Wells diz que até mesmo pessoas que reconhecem as mudanças climáticas são incapazes de compreender seu alcance. No inverno passado, em diversos dias, a temperatura do Polo Norte ficou 60 a 70 graus mais quentes do que o normal, derretendo o PERMAFROST. Até recentemente, o permafrost não era uma grande preocupação dos cientistas, porque, como o nome sugere, era um solo permanentemente congelado. 


Mas o permafrost do Ártico contém 1,8 trilhão de toneladas de carbono, mais do dobro do que atualmente está suspenso na atmosfera terrestre. Quando se descongela e é liberado, esse carbono pode evaporar-se como o metano, que é 34 vezes mais poderoso do que o CO2. Ou seja, mesmo que a humanidade pare de emitir gases de efeito estufa nas atividades industriais e nos automóveis, o efeito feedback do metano do permafrost pode elevar a temperatura a níveis infernais. Na Antártica não é diferente. O “parto” da Plataforma Larsen C é mais um dos sinais de alarme.


A ocupação, dominação e exploração humana sobre os ecossistemas, juntamente com efeito estufa e a acidificação dos solos e das águas está provocando a 6ª extinção em massa das espécies. O Antropoceno é como uma “máquina de guerra”, todos os dias, o ser humano coloca mais munição. Atualmente, estamos adicionando carbono na atmosfera a uma taxa extremamente elevada. Isto é o que Stephen Hawking tinha em mente quando disse que a nossa espécie precisa colonizar outros planetas no próximo século para sobreviver e o que levou Elon Musk a anunciar seus planos para a colonização do planeta Marte.



Na segunda parte da matéria da NYMag, “O calor mortal, transformando Nova Iorque em Bahrain”, David Wallace-Wells mostra que os seres humanos, como todos os mamíferos, são motores de calor. Sobreviver significa ter que esfriar continuamente, como cães ofegantes. Para isso, a temperatura precisa ser suficientemente baixa para que o ar atue como uma espécie de refrigerador, extraindo calor da pele para que o motor possa continuar bombeando. Mas as ondas mortais de calor estão tornando a vida impossível em algumas regiões, pois em temperaturas muito altas, dentro de horas, um corpo humano seria cozido até a morte por dentro e por fora.


O autor reporta que na região açucareira de El Salvador, cerca de um quinto da população tem doença renal crônica, o resultado presumido da desidratação de trabalhar nos campos. Desde 1980, o planeta experimentou um aumento de 50 vezes no número de locais com calor perigoso ou extremo. Um aumento maior virá em breve. Os cinco verões mais quentes da Europa desde 1500 ocorreram desde 2002 e, em breve, simplesmente estar ao ar livre, nessa época do ano será insalubre para grande parte do globo. A quatro graus, a onda mortal de calor europeia de 2003, matou 2.000 pessoas por dia. 


Mesmo que atingindo os objetivos de Paris de dois graus de aquecimento, cidades como Karachi e Calcutá se tornarão próximas a inabitáveis. A crise será mais dramática no Oriente Médio e no Golfo Pérsico, onde, em 2015, o índice de calor registrou temperaturas tão altas que a sensação térmica chegou a 163 graus Fahrenheit (72º C). Assim, num futuro próximo, o Hajj se tornará fisicamente impossível para os 2 milhões de muçulmanos que fazem a peregrinação a cada ano a Meca.



Na terceira parte da matéria da NYMag, “O fim da comida, rezando por campos de milho na tundra”, David Wallace-Wells diz que nas culturas de cereais os rendimentos da colheita diminuem 10% para cada grau de aquecimento. O que significa que, para uma população de 11 bilhões de habitantes, poderemos ter 50% menos de grãos para oferecer. E o efeito do aquecimento global sobre as proteínas animais serão pior. A perda de solos será dramática, especialmente nos trópicos. A seca pode ser um problema ainda maior do que o calor, com algumas das terras mais aráveis ​​do mundo passando rapidamente para o deserto. O quadro já é preocupante hoje, com a ONU alertando de que 20 milhões de pessoas podem morrer de fome na Somália, Sudão do Sul, Iêmen e Nigéria.



Na quarta parte da matéria da NYMag, “Pragas climáticas, o que acontece quando o gelo bubônico derrete”, David Wallace-Wells relata que o gelo funciona como um livro do clima, mas também é uma história congelada, com pragas armazenadas que podem ser reanimados quando descongelados. Atualmente, estão presos no gelo do Ártico, doenças que não circularam no ar há milhões de anos. O que significa que nosso sistema imunológico não teria ideia de como lutar quando essas pragas pré-históricas emergem do gelo. O Ártico também armazena insetos aterrorizantes nos tempos mais recentes. Já no Alasca, pesquisadores descobriram os restos da gripe de 1918 que infectaram até 500 milhões e mataram cerca de 100 milhões de pessoas – cerca de 5% da população mundial e quase seis vezes mais do que morreram na Primeira Guerra Mundial.



Na quinta parte da matéria da NYMag, “Ar irrespirável, uma poluição (smog) mortal que atinge milhões de pessoas”, David Wallace-Wells considera que até o final do século, os meses mais legais da América do Sul tropical, da África e do Pacífico provavelmente serão mais quentes do que os meses mais quentes no final do século XX. Nossos pulmões precisam de oxigênio, mas isso é apenas uma fração do que respiramos. Com o aumento da concentração de CO2, em comparação com o ar que respiramos agora, a capacidade cognitiva humana diminui em 21%. 



Em 2090, cerca de 2 bilhões de pessoas em todo o mundo estarão respirando um ar poluído, acima do nível “seguro” definido pela OMS. Documentos mostram que, entre outros efeitos, a exposição da mãe grávida ao ozônio aumenta o risco de autismo da criança. Já morrem cada dia mais de 10 mil pessoas das pequenas partículas emitidas pela queima de combustível fóssil. A cada ano, 339 mil pessoas morrem de fumaça de incêndios, em parte porque a mudança climática prolongou a temporada de fogo florestal. O que preocupa ainda mais as pessoas é o efeito que teria sobre as emissões, especialmente quando os incêndios provocam uma queda nas florestas decorrentes da turfa. Os incêndios são especialmente ruins na Amazônia que sozinha fornece 20% do nosso oxigênio. O “airpocalypse” chinês de 2013 tem afetado as atividades econômicas do país e foi responsável por um terço de todas as mortes na China.



Na sexta parte da matéria da NYMag, “Guerra perpétua, a violência cozida no calor”, David Wallace-Wells relata que os climatologistas são muito cuidadosos ao falar sobre a Síria e querem crer que, embora a mudança climática tenha produzido uma seca que contribuiu para a guerra civil, não é justo dizer que o conflito é o resultado do aquecimento. Mas há pesquisadores que conseguiram quantificar algumas das relações não óbvias entre temperatura e violência: para cada meio grau de aquecimento, eles dizem, as sociedades verão entre um aumento de 10 e 20% na probabilidade de conflitos armados.
Na sétima parte da matéria da NYMag, “Colapso Econômico Permanente, tenebroso capitalismo em um mundo meio pobre”, David Wallace-Wells ridiculariza o mantra do neoliberalismo de que “o crescimento econômico nos salvaria de todos e de tudo”. 



Mas no rescaldo da crise financeira de 2008, um crescente número de historiadores que estudam o que chamam de “capitalismo fóssil” começaram a sugerir que toda a história do rápido crescimento econômico, que começou um pouco antes do século 18, não é o resultado da inovação, mas simplesmente da descoberta dos combustíveis fósseis e todo o seu poder energético. Com o pico do petróleo, voltaremos a uma economia do “estado estacionário”. Além do mais, cada grau Celsius de aquecimento custa, em média, 1,2% do PIB. Os limites ambientais devem levar a economia global à estagnação secular.



Na oitava parte da matéria da NYMag, “Oceanos Envenenados, Sulfeto de hidrogênio e o esqueleto”, David Wallace-Wells declara que o mar se tornará um assassino. O nível do mar vai subir no mínimo um metro. Um terço das principais cidades do mundo estão na costa, para não mencionar suas usinas de energia, portos, bases da marinha, terras agrícolas, pescas, deltas de rios, pântanos e plantações de arroz. O naufrágio das benfeitorias é apenas o começo. No momento, mais de um terço do carbono do mundo é absorvido pelos oceanos – ainda bem, ou então teríamos muito mais aquecimento. Mas o resultado é o que se denomina “acidificação do oceano”, que, por si só, pode aumentar meio grau de aquecimento neste século. 



Há também o “branqueamento de corais” – isto é, morte de corais – que é uma notícia muito ruim, porque os recifes suportam tanto quanto um quarto de toda a vida marinha e fornecem alimentos para meio bilhão de pessoas. Acidificação dos oceanos frita as populações de peixes. Nas águas ácidas, as ostras e os mexilhões terão dificuldade em cultivar suas conchas. Quando o pH do sangue humano cai tanto quanto o pH dos oceanos, induz convulsões, comas e morte súbita. A absorção de carbono pode iniciar um ciclo de feedback em que as águas sub-oxigenadas produzem diferentes tipos de micróbios que tornam a água ainda mais “anóxica”, primeiro em “zonas mortas” do oceano profundo, depois gradualmente em direção à superfície.




Na nona parte da matéria da NYMag, “O Grande Filtro, nossa curiosidade atual não pode durar”, David Wallace-Wells pondera que não existe uma vontade de esclarecer os efeitos da mudança climática. Certamente essa cegueira não durará, pois, o mundo que estamos prestes a habitar não o permitirá. Em um mundo de seis graus mais quente, o ecossistema terrestre vai ferver com tantos desastres naturais. Os furacões mais fortes virão com mais frequência, e teremos de inventar novas categorias para descrevê-los.




Em síntese, o autor considera que é preciso avaliar melhor os danos já causados ​​ao planeta. A Terra pode ficar inabitável, pois são muitos os processos que estão afetando a capacidade de sobrevivência da humanidade. Provavelmente, a Terra não ficará desabitada, mas a qualidade de vida da população mundial poderá reduzir bastante em um Planeta degradado. O Holoceno garantiu 10 mil anos de estabilidade climática. O Antropoceno e a grande aceleração das atividades antrópicas estão desequilibrando o clima e transformando a biosfera em um habitat inóspito e inabitável.



Indubitavelmente, David Wallace-Wells conseguiu assustar muita gente. Mas, principalmente, conseguiu fazer as pessoas discutirem os cenários negativos para os quais o mundo está caminhando na medida que mantém o atual modelo de produção e consumo, sem respeitar o fluxo metabólico entrópico e os limites do meio ambiente.




Creio que vale a pena ler o artigo “The Uninhabitable Earth” e as centenas de respostas que foram publicadas logo a seguir. Para contribuir com a discussão indico abaixo algumas referências das pessoas que concordaram, aquelas que discordaram do tom, mas concordam com os perigos potenciais do aquecimento global e aquelas que discordam:



Artigos que defendem o uso de uma linguagem catastrófica como forma de alerta:
JOE ROMM. We aren’t doomed by climate change. Right now we are choosing to be doomed, 11/07/2017 https://thinkprogress.org/climate-change-doomsday-scenario-80d28affef2e
KEVIN DRUM. Our Approach to Climate Change Isn’t Working. Let’s Try Something Else. 10/07/20017
Steve Rousseau. Did New York Magazine Make Its Climate Change Story Too Scary? 10/07/2017
SUSAN MATTHEWS. Alarmism Is the Argument We Need to Fight Climate Change. New York magazine’s global-warming horror story isn’t too scary. It’s not scary enough, 10/07/2017
ROBERT HUNZIKER. Uninhabitable Earth? 14/07/2017
Ian Johnston. Earth could become ‘practically ungovernable’ if sea levels keep rising, says former Nasa climate chief, 14/07/2017



Artigos que consideram sérias as ameaças, mas não defendem o uso de uma linguagem catastrófica:
ROBINSON MEYER. Are We as Doomed as That New York Magazine Article Says? Why it’s so hard to talk about the worst problem in the world, JUL 10, 2017
Eric Holthaus. Stop scaring people about climate change. It doesn’t work. Jul 10, 2017
Michael E. Mann, Susan Joy Hassol and Tom Toles. Doomsday scenarios are as harmful as climate change denial, 12/07/2017
Michael Le Page. Uninhabitable Earth? In fact, it’s really hard to fry the planet. A controversial article says we’re heading for the worst-case warming scenarios. But while we can’t rule out extreme warming, it’s not our most likely future, 12 July 2017
JOHN TIMMER Climate scientists push back against catastrophic scenarios. In both the popular and academic press, scientists argue against worst cases. 12/07/2017
Ian Johnston. Climate change doomsday warning of ‘rolling death smog’ and ‘perpetual war’ criticised by scientists, Independent, 13/07/2017
David Roberts. magazine climate story freak you out? Good. It’s okay to talk about how scary climate change is. Really, 11/07/2017
Judith Curry. Alarm about alarmism, July 15, 2017


Artigos contra o tom catastrófico e que acreditam que ainda há esperança
EMILY ATKIN. The Power and Peril of “Climate Disaster Porn”. Climate scientists say New York magazine’s cover story about global warming is unnecessarily apocalyptic. But can fear help the planet? July 10, 2017
Warner Todd Huston. NY Magazine Claims Planet Earth Will Soon Become Uninhabitable, Turns Into Giant Mess, 11/07/2017
Rachel Becker. Why scare tactics won’t stop climate change. Doomsday scenarios don’t inspire action, 11/07/2017
Oren Cass. Truth Is Just a Detail. Pundits invested in climate-change alarmism praise even shoddy work—as long as it comes to the right conclusions. July 11, 2017
ANDREW FREEDMAN. No, New York Mag: Climate change won’t make the Earth uninhabitable by 2100, 11/07/2017
Climatefeedback. Scientists explain what New York Magazine article on “The Uninhabitable Earth” gets wrong, 12/07/2017
Mark Tercek. Don’t Panic, Do Act: A Climate Resource With Real Solutions, 14/07/2017



Entrevista com David Wallace-Wells sobre o artigo “The Uninhabitable Earth”
REBECCA FISHBEIN Are Humans Doomed? A Q&A With The Author Of NY Mag’s Terrifying Climate Change Story`, 10/07/2017
Wikipedia. The Uninhabitable Earth, 11/07/2017
Referências:
David Wallace-Wells. The Uninhabitable Earth. Famine, economic collapse, a sun that cooks us: What climate change could wreak — sooner than you think. NYMag, 09/07/2017
Versão revisada e comentada do artigo pelo próprio autor
David Wallace-Wells. The Uninhabitable Earth, Annotated Edition. The facts, research, and science behind the climate-change article that explored our planet’s worst-case scenarios, 14/07/2017
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 19/07/2017
"Catástrofe climática: a Terra inóspita e inabitável, artigo de José Eustáquio Diniz Alves," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 19/07/2017, https://www.ecodebate.com.br/2017/07/19/catastrofe-climatica-terra-inospita-e-inabitavel-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/.

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A dialética fóssil de Michel Temer, artigo de Nicole Figueiredo de Oliveira



Como investimentos em petróleo e gás podem ajudar ou manchar ainda mais a imagem do governo brasileiro no cenário internacional


Michel Temer tem a escolha em suas mãos: manchar ainda mais sua imagem com petróleo e gás, ou colocar o Brasil na liderança climática global (Foto: France Press).
Michel Temer tem a escolha em suas mãos: deixar seu rastro sujo de petróleo ou colocar o Brasil na liderança climática global (Foto: France Press).
Não importa a cor dos trajes usados por Michel Temer durante a reunião de cúpula do G20, todos tinham um tom “envergonhado”. Vendo seu governo ruir a olhos nus, o presidente está mais empenhado em livrar a própria pele do que preocupado com a economia, a diplomacia ou quem dirá com o planeta. Temer quase desistiu de participar do encontro na Alemanha, mas uma vez lá, ele não poderia assumir outra postura que não aquela da cabeça baixa, dos ombros retraídos e do sorriso amarelo.


Perto do isolamento de Donald Trump, entretanto, até que sua imagem não estava de todo mal. O comunicado final da reunião, que reuniu as maiores economias do mundo, registrou o apoio dos 19 países, com exceção dos Estado Unidos, à manutenção do Acordo de Paris. O governo brasileiro reafirmou seu compromisso de combate “inadiável” ao aquecimento global e o cumprimento das metas estabelecidas no Acordo, recém-promulgado como lei nacional.


Mas como o presidente pode sustentar essa promessa se os combustíveis fósseis, maiores emissores de gases do efeito estufa, continuam no topo da sua lista de prioridades domésticas? Enquanto Temer participava do encontro em Hamburgo, o Plano Decenal de Energia 2026, aberto para consulta pública na última sexta-feira, prevê nada menos do que 70,5% de investimentos em carvão, gás e petróleo, em especial o do pré-sal, mantendo a mesma proporção do plano anterior. E isso só espelha o que já está sendo posto em prática pelo setor petrolífero do governo.


Na audiência pública que analisou o edital e contrato da 14a Rodada de Licitações da Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP), que acontecerá em setembro, o superintendente de Licitações da ANP, Marcelo Castilho, afirmou que esta será a segunda dentre as dez rodadas previstas para os próximos dez anos. Além disso, com a nova política para o setor aprovada recentemente pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que permite a oferta permanente de blocos já licitados em terra e mar, a indústria fóssil tem sido cada vez mais fortalecida no cenário nacional.


Segundo relatório divulgado na última semana pela iniciativa Climate Transparency, que monitora as políticas climáticas dos países, o governo brasileiro gastou US$ 25,5 bilhões (R$ 76 bilhões) em 2014 para subsidiar carvão, petróleo e gás. O total inclui gastos com incentivos fiscais para o desenvolvimento de infraestrutura, regime tributário especial para equipamentos de exploração e produção de petróleo e gás, além da geração elétrica a carvão.


Como se não bastasse, outra ameaça ao clima, ao ambiente e à saúde da população tem retomado sua força junto ao governo. Desde a suspensão da 12a Rodada de Licitações,  realizada em 2013 e que leiloou blocos para exploração não convencional de petróleo e gás de xisto, o método do fraturamento hidráulico – ou fracking – não vem à tona nos editais da ANP. Entretanto, recentemente o governo voltou a falar publicamente no assunto.


Durante a audiência da 14a Rodada, o diretor da ANP, Waldyr Barroso, admitiu que, mesmo não tendo isso explicitado no edital, podem haver áreas para exploração não convencional no próximo leilão. Alguns dias depois, o Ministério de Minas e Energia (MME) declarou que planeja realizar um projeto-piloto para “testar a exploração não convencional de óleo e gás” no país.


Isso só demonstra que o governo brasileiro não está honrando seus compromissos, e que a tão necessária transição para uma economia com baixas emissões de carbono, com recursos direcionados a fontes renováveis de energia, está muito mais distante do que as palavras de Temer podem fazer crer. Nesse ritmo, os limites de aquecimento estabelecidos pelo Acordo de Paris serão naturalmente ultrapassados.


Para frear as emissões de gases-estufa é preciso não só parar o financiamento aos fósseis como interromper a queima de todas as reservas de carvão, petróleo e gás existentes. As potenciais emissões de carbono nos campos e minas já operantes no mundo todo são suficientes para elevar a temperatura acima dos 2°C.


Continuar a investir na indústria fóssil significa financiar a crise climática global. O desinvestimento em combustíveis fósseis é mais urgente do que nunca e, ainda de quebra, pode ajudar a limpar a imagem do governo de Michel Temer, colocando o Brasil na liderança climática global. Mas para isso o presidente precisa tomar o caminho certo em suas decisões, só para variar um pouco.

*Nicole é Diretora da 350.org Brasil e América Latina

Fonte: 350.org Brasil e América Latina e COESUS – Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 18/07/2017

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Aquecimento global e ondas mortais de calor, artigo de José Eustáquio Diniz Alves



distribuição geográfica das condições climáticas mortais

[EcoDebate] O mundo está ficando mais quente, mas umas áreas esquentarão mais do que outras e as ondas de calor ficarão mais frequentes e mais letais. O Brasil vai ser um dos países mais afetados pelas ondas mortais de calor que devem se espalhar pelo globo ao longo do século XXI, ainda que se atinja a meta do Acordo de Paris de manter o aquecimento global abaixo do patamar de 2º C até 2100.


A figura acima mostra o número de dias por ano que excede o limiar de temperatura e umidade para além do qual as condições climáticas se tornam mortíferas no cenário RCP 8.5 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). O artigo “Global risk of deadly heat”, publicado no periódico Nature Climate Change (19/06/2017) considera que as mudanças climáticas vão tornar mais frequentes as ondas de calor letais, no cenário de manutenção atual das emissões de gases de efeito estufa (GEE).


Atualmente, 30% dos habitantes da Terra passam por períodos de calor extremo em algum momento do ano, mas ao longo do corrente século, três quartos da população mundial enfrentarão ondas mortais de calor. Mesmo com o cumprimento dos objetivos do Acordo de Paris, a população exposta ao calor mortal será de cerca de 50%.


As ondas de calor não são coisas do futuro, mas já deixaram milhares de mortos, até mesmo em países desenvolvidos e melhor equipados para enfrentar o clima extremo. Na Europa Ocidental, por exemplo, houve mais de 70 mil mortes apenas durante o verão intenso de 2003.


Em junho de 2017, uma onda de calor intensa atingiu a cidade de Phoenix, Arizona, quando os termômetros foram a 120° F (49º C). Isto fez algumas companhias aéreas cancelarem os voos por causa do calor. A American Airlines disse que cancelou 50 voos porque os aviões não podem operar acima de 118° F. Foi apenas um exemplo das interrupções que a mudança climática criará para viagens aéreas.


Artigo de Georgina Gustin (13/07/2017) mostra que durante uma intensa onda de calor no Sudoeste no mês passado, a American Airlines cancelou dezenas de voos em Phoenix porque certos aviões em sua frota não foram projetados para operar a temperaturas acima de 118º F. Estudo recente apontou 19 aeroportos ao redor do mundo onde o aumento das temperaturas tornaria mais difícil o fluxo dos aviões. Durante períodos especialmente quentes, os aviões provavelmente terão que reduzir a quantidade de peso que podem transportar para se transportar no ar.


No início de julho de 2017, uma onda de calor impressionante envolveu o oeste dos EUA, ajudando a alimentar vários incêndios florestais. O calor veio graças uma corrente de alta pressão que se moveu para o Oeste, com as temperaturas máximas batendo vários recordes, como na figura abaixo:



Uma temperatura acima de 120º F (49º C) pode tornar a vida inviável e o local inabitado. A temperatura mais alta já registrada ocorreu no Vale da Morte da Califórnia, nos EUA, de 134º F (56,7 graus Celsius), em 10 de julho de 1913.


Mas normalmente, os trópicos enfrentam as maiores temperaturas médias e podem ser as regiões mais afetadas no futuro. A Indonésia, as Filipinas, o norte e nordeste do Brasil, a Venezuela, o Sri Lanka, o sul da Índia, a Nigéria, a maior parte da África Ocidental e o norte da Austrália enfrentarão mais de 300 dias de ondas de calor potencialmente letais cada todos os anos sob a trajetória atual de emissões, conhecida como RCP 8.5.


O Brasil terá a maior área atingida pelas ondas de calor. Cidades como Boa Vista, em RR, Manaus, AM, Macapá, AP, e Cuiabá, MT, vão ter dificuldades para manter as suas atividades normais, pois as ondas de calor vão perturbar o dia a dia da vida de todos os habitantes. Deve subir os casos de câncer de pele e outras doenças, pois a umidade elevada reduz a capacidade do corpo humano de esfriar através da transpiração. Quando o calor no corpo não pode ser expelido, cria uma condição chamada citotoxicidade por calor que é prejudicial para muitos órgãos e pode ser fatal.


No início do verão de 2017, várias partes do hemisfério norte foram atingidas por ondas de calor mas também por picos de frio, acentuando os eventos extremos. A Sibéria quebrou recordes absolutos de temperatura. A temperatura em Krasnoiarsk (a 3.350 km a leste de Moscou) quase quebrou o recorde absoluto da região, com a marca de 37ºC, o que desencadeou incêndios florestais na Rússia. Em outro extremo do país, em Murmansk, os termômetros marcaram 1º C, com a ocorrência de neve.


Na cidade de Ahvaz, no Irã, a temperatura atingiu 129º Fahrenheit (ou 54º Celsius) no dia 29/06/2017. O índice de “calor real” atingiu 142 graus por causa da umidade (61º Celsius). Estes valores superam o índice de calor, desenvolvido em 1978, e que tem um máximo de 136 graus Fahrenheit (58º Celsius). As ondas de calor são mais facilmente atribuíveis às mudanças climáticas, de acordo com cientistas, porque há uma conexão clara entre o carbono absorvido na atmosfera e a temperatura elevada. Esse calor extremo coloca os moradores de Ahvaz em grave perigo para desidratação, fadiga por calor, cólicas, choque de calor e outras doenças. Para os idosos, esses riscos são amplificados.

Na cidade de Ahvaz, no Irã, a temperatura atingiu 129º Fahrenheit (ou 54º Celsius) no dia 29/06/2017

Problema grave são também as queimadas, pois o tempo seco e quente aumenta a autocombustão das florestas e matas, que, ao mesmo tempo, aumenta a emissão de GEE. Artigo de Anne-Sophie Brändlin (DW, 19.06.2017) mostra que incêndios incrivelmente grandes causaram um impacto devastador sobre o Alasca e a Indonésia em 2015. Em 2016, o Canadá, a Califórnia e a Espanha foram devastados por chamas incontroladas.


Em 2017, incêndios maciços devastaram as regiões do Chile e Portugal, com dezenas de vidas. Estudos extensivos constataram que grandes incêndios florestais no oeste dos EUA têm ocorrido quase cinco vezes mais frequentes atualmente do que nos anos 70 e 80. Outro incêndio atingiu em junho uma reserva natural espanhola e ameaça o Parque Nacional de Doñana, uma das áreas de biodiversidade mais importantes da Espanha e um patrimônio mundial da Unesco.


Incêndios florestais nos estados norte-americanos de Utah e Califórnia destruíram a vegetação e obrigaram a evacuações de casas. Em Utah, 1.500 pessoas tiveram de ser retiradas de suas casas. Na Califórnia, o incêndio foi em Santa Clarita, a norte de Los Angeles. Tais incêndios queimam mais de seis vezes a área terrestre, aumentando as emissões e diminuição a capacidade das matas em sequestrar carbono. Com o aumento das temperaturas os incêndios vão se transformar em coisas normais e mais frequentes (Georgina Gustin, 11/07/2017).


Artigo de Lorraine Chow (30/06/2017) apresenta as imagens capturadas por satélite da NASA, na última semana de junho de 2017, mostrando incêndios violentos cobrindo grandes faixas das florestas boreais da Sibéria. Cerca de 27 mil hectares (100 milhas quadradas) queimaram na região do Oblast de Irkutsk no sul da Sibéria e outros 27 mil hectares queimados em estados e regiões vizinhas. As florestas boreais armazenam cerca de 30% do carbono mundial. Quando queimam, colocam esse carbono na atmosfera, aumentando os impactos das mudanças climáticas e criando uma Ciclo vicioso que provavelmente levará a mais incêndios


O aquecimento global e as ondas mortais de calor vão afetar os solos e as águas dificultando a produção de alimentos. Assim, vai ficar cada vez mais difícil fornecer e garantir água potável e alimentos para 11 bilhões de habitantes do Planeta, previstos para 2100. Ou seja, o aquecimento global deve afetar a vida da maioria dos seres humanos além de contribuir para acelerar a 6ª extinção em massa das espécies.


O artigo “The Uninhabitable Earth” de David Wallace-Wells, publicado na revista New York Magazine (09/07/2017), que teve grande repercussão nas redes sociais, mostra um cenário catastrófico das ondas mortais de calor, especialmente em um quadro de aceleração do aquecimento global:


Os seres humanos, como todos os mamíferos, são motores de calor. Sobreviver significa ter que esfriar continuamente, como cães ofegantes. Para isso, a temperatura precisa ser suficientemente baixa para que o ar atue como uma espécie de refrigerante, extraindo calor da pele para que o motor possa continuar bombeando. Isso se tornaria impossível para grandes porções da banda equatorial do planeta, especialmente os trópicos, que poderiam aquecer sete graus e onde a umidade contribuiria para agravar o problema. 



Nas selvas da Costa Rica, por exemplo, onde a umidade geralmente atinge 90%, simplesmente se mover quando o sol está a mais de 105º Fahrenheit (41º C) seria letal. E, em temperaturas mais altas, o efeito seria rápido: dentro de horas, um corpo humano seria cozido até a morte por dentro e por fora” (tradução livre).


Os cenários são terríveis se nada for feito para deter o aquecimento global e as ondas letais de calor. O renomado físico britânico Stephen Hawking disse à BBC que “As ações de Trump podem levar a Terra à beira do abismo e transformá-la em Vênus, onde a temperatura atinge 250ºC e há chuva de ácido sulfúrico”.


O temor de Hawking é de que nossas circunstâncias na Terra fiquem cada vez mais parecidas a essas condições inóspitas. “Estamos em um ponto crítico no qual o aquecimento global vai se tornar irreversível”.



Referências:


Camilo Mora et. al. Global risk of deadly heat. Nature Climate Change, 19 June 2017
https://www.nature.com/nclimate/journal/vaop/ncurrent/full/nclimate3322.html
Anne-Sophie Brändlin. How climate change is increasing forest fires around the world, DW, 19.06.2017
http://www.dw.com/en/how-climate-change-is-increasing-forest-fires-around-the-world/a-19465490
Lorraine Chow. Siberian Wildfire Can Be Seen from Space as Earth’s Boreal Forests Burn at Unprecedented Rates, EcoWatch, 30/06/2017
https://www.ecowatch.com/nasa-siberian-wildfire-2450916592.html
Georgina Gustin. Longer, Fiercer Fire Seasons the New Normal with Climate Change, Inside Climate News, 11/07/2017
https://insideclimatenews.org/news/11072017/wildfire-forest-fire-climate-change-california
Georgina Gustin. Why Heat Waves Will Get Costlier for Airlines, More Annoying for Travelers, Inside Climate News, 13/07/2017
https://insideclimatenews.org/news/13072017/climate-change-airline-flight-delays-excessive-heat-waves-weight-restrictions
David Wallace-Wells. The Uninhabitable Earth, NYT, 09/07/2017
http://nymag.com/daily/intelligencer/2017/07/climate-change-earth-too-hot-for-humans.html

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 21/07/2017
"Aquecimento global e ondas mortais de calor, artigo de José Eustáquio Diniz Alves," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 21/07/2017, https://www.ecodebate.com.br/2017/07/21/aquecimento-global-e-ondas-mortais-de-calor-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/.

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Carta ao Secretário André Lima

Senhor Secretário André Lima. 

Quando fixei residência no Park Way, ano de 2000, o fiz plenamente consciente com  seu diferencial de uso e ocupação exclusivamente residencial, sendo este o principal motivo de minha decisão e, acredito, de ciência de todos os moradores. 

Sem postos de abastecimento, padarias, mercearias, academias, etc  e, ainda, sem casas noturnas, trombadinhas, pedintes, sequestros relâmpagos e tudo o mais que condiz com o barulho e insegurança justificam a paz com a natureza, o silêncio e o convívio harmonioso e de respeito com o meio ambiente, seus mananciais e reservas naturais. 

Não raro surgem manifestações contrárias  a esta privilegiada condição de bem estar, com propostas de instalação de equipamentos públicos, comércio e outros despropósitos que culminam na degradação ambiental e desfiguração do Park Way.

A questão do momento é a mudança na LUOS e o absurdo propósito de permissão para que os MEIs  possam se instalar nas residências do Park Way, Lago Norte, Lago Sul e um sem número  de condomínios nestas regiões. 

A propagação de dados estatísticos suspeitos, se não mentirosos, dão conta de aprovação da população e que tudo se dá com transparência e participação dos moradores. A questão está sendo conduzida e direcionada de forma tendenciosa,  prejudicial e mal intencionada , sem o necessário e real respaldo de seus residentes. 

Neste contexto enviei e-mail para o Secretário  Adjunto da Segeth, vide anexo e para o qual solicito sua ciência, com cópias para vários moradores e também para a Associação PW Residencial, tendo recebido amplas manifestações de apoio e solidariedade.

Neste sentido encareço sua atenção e consideração para os termos ora expostos. 

Atenciosamente. 

Roberto Costa


Gatos predadores

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Áreas de Cerrado em recuperação após anos de uso para agropecuária ou plantio de eucalipto podem abrigar tantos animais quanto áreas sem interferência humana. É o que apontam pesquisadores brasileiros e britânicos a partir de imagens capturadas por armadilhas fotográficas instaladas no Parque Estadual Veredas do Peruaçu, distribuído nos municípios mineiros de Cônego Marinho, Januária e Bonito de Minas. Antes de seu estabelecimento, nos anos 1990, a região do parque serviu à pecuária, plantio de eucalipto e produção de carvão.



As fotos e vídeos mostram antas, tamanduás-bandeira, porcos-do-mato e outros grandes mamíferos, em quantidade e frequencia semelhantes a de áreas naturais. Todavia, o caso do Parque Estadual não pode ser extrapolado para o restante do bioma. Afinal, uma área protegida tem justamente a função de abrigar animais silvestres. "Não quero que as pessoas pensem que podemos cortar tudo e que tudo voltará ao normal. Mas quando você abandona o pasto, por exemplo, pode levar algum tempo, mas o Cerrado retornará. Se você dar tempo suficiente, eu diria que a vida selvagem também retornará", comentou Guilherme Ferreira, do Instituto Biotrópicos (MG). A pesquisa está publicada na revista Biotropica e traz esperança para a manutenção da biodiversidade no bioma, que perdeu metade da vegetação nativa em apenas cinco décadas, majoritariamente para a formação de pastagens para gado.


Da agropecuária brasileira, o Cerrado já responde por mais de metade da produção de soja, por 40% da carne bovina e por 84% do algodão. E a fronteira produtiva segue avançando, agora rumo ao Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia, onde estão os remanescentes do bioma. Em termos globais, a agricultura é a principal causa de perdas de biodiversidade. Um time internacional de pesquisadores se debruçou sobre o tema para jogar luz em regiões com alto risco de perder vida silvestre pela expansão agrícola.



Com essa bússola nas mãos, a equipe aponta que um terço das espécies pode ser perdido pela avanço de lavouras na Amazônia e regiões da África. Outras áreas na mira do agro foram identificadas na Índia e na Europa Oriental. Publicado na revista Nature, o trabalho também levanta o baixo nível de proteção oficial dessas regiões. Na África tropical, por exemplo, apenas 21% das áreas no caminho da expansão agrícola estão protegidas. Do Cerrado brasileiro, menos de 3% são abrigado em parques nacionais e outros tipos de Unidades de Conservação de Proteção integral. Frente ao aumento da produção no campo, melhor planejar o uso da terra e ampliar a rede de áreas protegidas são medidas que poderiam reduzir perdas de biodiversidade.


@ Implantar estradas e rodovias para tráfego normal de veículos dentro de parques nacionais ou estaduais e demais tipos de Unidades de Conservação prejudica aves e outras espécies que vivem nessas áreas. É o que constataram pesquisadores brasileiros em artigo publicado na revista Ornitologia Neotropical. Para tanto, o grupo analisou a influência da BR-472 sobre o Parque Estadual do Espinilho, em Barra do Quaraí, no extremo sudoeste do Rio Grande do Sul.


A rodovia corta ao meio a área protegida. Conforme a pesquisa, quanto mais longe do asfalto, maiores a quantidade e a variedade de aves. “Com base nos nossos resultados, reforçamos a recomendação que rodovias devem ser evitadas próximas ou dentro de áreas destinadas à conservação. Em áreas protegidas onde as rodovias estão presentes faz‐se necessário estudos sobre os impactos das rodovias e possíveis medidas mitigadoras”, reforçam os especialistas. Seis em cada dez das mais de 300 Unidades de Conservação federais são cortadas por rodovias.


 Após vasculhar quase três centenas de estudos científicos publicados desde a Rio+20, em 2012, especialistas da Universidade de Oxford (Reino Unido) engrossaram o coro global por maior proteção de ambientes marinhos. Segundo eles, a saúde dos mares e oceanos têm influência direta na qualidade de vida das pessoas e na conservação da biodiversidade, mas esses ambientes estão seriamente ameaçados por mudanças do clima, pesca excessiva, contaminação por rejeitos da mineração e da agropecuária e poluição por quantidades colossais de plásticos e outros resíduos.


Por essas razões, pedem urgência na definição de um tratado internacional voltado à proteção do alto mar - para além da faixa de 22 quilômetros a partir da costa, sob jurisdição de cada país. "Isso é muito importante. Vários países querem desenvolver ou ampliar atividades como pesca oceânica, mineração em águas profundas, gerar energia renovável e até mesmo aquicultura marinha. É realmente vital que possamos chegar a algum acordo internacional sobre como proteger ou gerenciar a biodiversidade no alto mar diante de todas essas pressões", disse Alex Rogers, professor de Biologia de Conservação no Departamento de Zoologia de Oxford. Mais de 60% da área de mares e oceanos não tem qualquer tipo de proteção ou regras para manejo da pesca e outras atividades econômicas.


 Obedecendo seus instintos e em número cada vez maior próximo a ambientes naturais, gatos domésticos figuram entre os principais predadores de aves no mundo (foto abaixo). Apenas nos Estados Unidos, cerca de 2,5 bilhões de emplumados morrem por ataques dos bichanos a cada ano. Estudos mostram que a simples presença de gatos em áreas de reprodução de aves aumenta a captura de ovos e filhotes por outros predadores e reduz em até um terço a quantidade de alimento oferecido pelos pais a suas crias. 


O impacto é tão grande que a União Internacional para Conservação da Natureza (UICN) incluiu os gatos entre as cem piores espécies invasoras no planeta. 


Diante desse cenário, a Nature Canada listou medidas para reduzir a pressão desses animais domésticos sobre a vida silvestre. Entre elas, acostume o pet a viver mais tempo dentro das residências - onde devem ser criados ambientes estimulantes às atividades dos gatos -, acostume-o a passear com coleira e invista em cercas, tanto para isolar o jardim quanto para definir espaços para brincadeiras ao ar livre. 


Outras medidas são manter os gatos sempre bem alimentados, equipá-los com pequenos sinos ou chocalhos para alertar às aves quanto a sua presença e, ainda, fomentar campanhas de esterilização de gatos de rua.




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Este boletim é um oferecimento de

© Aldem Bourscheit // Jornalista DRT/RS 9781 // conectacomm@gmail.com 

- Ativista em Políticas Públicas Socioambientais


- Membro da Comissão sobre Educação e Comunicação da UICN

- Mestrando em Desenvolvimento Sustentável pelo Fórum Latino-americano de Ciências Ambientais

- Especialista em Meio Ambiente, Economia e Sociedade pela Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais