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segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Falas de Bolsonaro são como Viagra para desmatadores”, diz Sirkis

Falas de Bolsonaro são como Viagra para desmatadores”, diz Sirkis

Ex-coordenador do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima diz que presidente estimula crime ambiental e que tem dúvida sobre continuidade do fórum



Alfredo Sirkis (Foto: Brizza Cavalcante/Câmara dos Deputados)
Alfredo Sirkis (Foto: Brizza Cavalcante/Câmara dos Deputados)
O jornalista e ex-deputado federal Alfredo Sirkis foi exonerado em maio do cargo de secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima pelo ex-colega de Câmara, Jair Bolsonaro (PSL-RJ). A demissão do posto, que não é remunerado, ocorreu a pedido do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Novo-SP), cuja atuação Sirkis criticava (e ainda critica).

Desmobilizado durante o governo de Dilma Rousseff, o fórum passou seis meses acéfalo e foi remontado na gestão Temer, com Sirkis assumindo a secretaria-executiva em 2017. Nesse período, produziu uma proposta de plano de implementação da NDC, a meta do Brasil no Acordo de Paris, e começava a discutir um plano de longo prazo para a descarbonização da economia brasileira na metade do século. Com um governo que desmontou a agenda de clima, o futuro desses trabalhos é incerto.

Segundo Sirkis, a preocupação mais imediata para o país no clima é com a volta do desmatamento, que, segundo ele, pode ser mais “uma grande onda do que um repique”. Pior, essa onda é soprada pelo próprio Presidente da República, que, além de desmobilizar a fiscalização, dá sinais de estímulo ao crime ambiental ao dizer, por exemplo, que o Ibama não deve destruir equipamentos apreendidos de desmatadores. “Isso é como um Viagra para os grileiros de florestas públicas, devolutas ou em unidades de conservação, que agora vão ser desmatadas com mais voracidade, porque o ‘Mito’ liberou geral”, afirma.


Leia a entrevista.
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O que tem a dizer sobre a mudança no fórum, com sua saída em maio?
Normal. Seria a quadratura do círculo coordenar um fórum presidido por um presidente da República mais seu entorno com convicções negacionistas. Fomos colegas por seis anos – dois, no Rio, como vereadores e quatro como deputados federais. Era uma relação adversária mas, em geral, pessoalmente cordial. Então eu o conheço muito bem. Sabe muito pouco, toma conhecimento dos temas de orelhada e mentalmente coloca mudanças climáticas e meio ambiente, pavlovianamente, na caixinha do “comunismo”.
Estar no poder obviamente piora mais ainda, vem aquela sensação de onipotência.


Bolsonaro vê a questão de mudança do clima como algo “da esquerda”…
Uma bobagem. A esquerda que nos anos 1980, 1990 era majoritariamente hostil – ecologia é preocupação pequeno-burguesa, desvia da luta de classes. Acabou adotando o tema depois do assassinato do Chico Mendes. Há ali ambientalistas sérios, mas uma boa parte enxergava nesses temas apenas “bandeiras de luta”, que tentam associar a um anticapitalismo nefilibata. A economia de mercado seria intrinsecamente antiecológica. Mas economia de mercado é o existe hoje no mundo inteiro. Pode ser mais, menos ou nada sustentável, mas é a realidade global. Quem visitou o “socialismo real”, antes da queda do Muro de Berlim, viu o desastre ecológico que era aquilo. Na verdade, Bolsonaro e sua turma ignoram que os pioneiros da ecologia no Brasil foram o Marechal Rondon, que dispensa apresentações, o major Archer, que fez o maior reflorestamento no planeta, antes dos atuais que estão sendo feitos pelos chineses, o almirante Ibsen Gusmão, Marcelo de Ipanema e José Lutzemberger – nenhum deles um “esquerdopata”, como eles dizem.


Mas a geração de vocês tinha essa tendência.
[Fernando] Gabeira, [Carlos] Minc e eu, que somos uma segunda ou terceira geração de ambientalistas, de fato viemos da esquerda, dos anos 1970, mas já com uma visão crítica dela. Por isso fundamos o PV, que acabou nas mãos da pequena política tradicional, embora ainda restem alguns abnegados como o Eduardo Jorge, o Rogério Medeiros e o André Fraga. Mudança climática não é nem de esquerda nem de direita, é sobre o futuro de nosso filhos, netos e bisnetos, para que não vivam num inferno sobre a Terra. A questão climática, muito mais que “ambiental” no sentido estreito da palavra, é uma agenda de desenvolvimento sustentável, onde a economia tem um peso central.

O negocionismo climático é de direita?
Já encontrei negacionistas de esquerda que achavam que era tudo uma farsa do imperialismo americano contra nosso desenvolvimento. Agora o Trump atribui à China. Negacionismo é burrice ou lobby, ponto. São como aqueles médicos, contratados pela indústria do tabaco, nos anos 1950 que iam à TV dizer que não havia “prova científica” que cigarro dava câncer. Aí era lobby, odioso, assassino.

Na ala da burrice são que nem os terraplanistas. No Brasil, nem o lobby do carvão nem o do petróleo são negacionistas. Aceitam a discussão de descarbonização mas em termos que não cabem numa trajetória nem de 2 graus. Negacionistas são os “olavetes” e a turma, criminosa, do desmatamento ilegal.


O desmatamento subiu mais de 200% em julho e fechará o ano bem acima da taxa do ano passado. O que fazer?
Temo que, mais que um repique, isso seja uma grande onda, mesmo. Temos um discurso presidencial de “liberou geral”, o desmantelamento da fiscalização. O Ibama, antes, já estava quase em colapso com metade do efetivo necessário e um concurso que tardava e não saía. 

Agora… é um enorme estímulo quando você proíbe a destruição in loco do equipamento das facções criminosas que desmatam e poluem rios com mercúrio e matam indígenas. Não pode destruir mais o trator com correntão, quebrar a motosserra ou o equipamento do garimpo ilegal. É legalmente autorizado, mas vai o Presidente na internet dizendo que não pode mais – o MP deveria verificar se ali não há um crime de responsabilidade dele. Isso é como um Viagra para os grileiros de florestas públicas, devolutas ou em unidades de conservação, que agora vão ser desmatadas com mais voracidade, porque o “Mito” liberou geral. Isso também estimula a indústria de falsificação cartorial para “esquentar” o produto desse desmatamento e se apropriar de terras da República. Vejo o assunto no colo do ministro Sérgio Moro.


E desmatamento legal?

Aí precisamos encontrar mecanismos de estimulo econômico, como o pagamento por serviços ambientais e a precificação positiva. Esse estímulo tem de servir tanto para a população pobre da floresta ser desestimulada, para ajudar a evitar que se envolvam com atividades ilegais, quanto para o empresário do Cerrado, por exemplo, que pode legalmente desmatar, mas passa a ter um estímulo para não fazê-lo. Há projetos no Congresso, é uma questão complexa, mas precisa ser enfrentada.


Como vê o futuro do fórum?
O Oswaldo Lucon é uma pessoa com conhecimentos técnicos, uma boa visão ambiental e climática. Está numa missão dificílima. Não pode ficar subordinado a este ou aquele ministério, precisa se relacionar com os oito ou nove ministérios que participavam do GEx, o grupo executivo para mudanças climáticas. Volto a repetir: clima não é uma questão “ambiental” mas de desenvolvimento.
Precisa manter a interlocução com as o setor empresarial, as ONGs e a academia sem se dobrar a pressões idiossincráticas ou ideológicas. E, sobretudo, precisa dar continuidade ao que vinha sendo feito. Passamos dois anos preparando, com aporte de 214 organizações desses quatro setores e   537 pessoas da Proposta Inicial para a Implementação da NDC Brasileira. É, de fato, um documento fruto de um trabalhoso consenso e serve de base para discussão com o governo, qualquer governo, inclusive esse. Tem também a discussão de longo prazo para o qual existe o estudo Brasil Carbono Neutro em 2060 e A Estratégia de Longo Prazo para 2050.


O que acontece com a agenda do fórum, que incluía a revisão da NDC?
Não sei. Me ofereci para ajudar numa transição harmônica, desde que o fórum não seja deturpado ou rebaixado. Este ano estaria programada a discussão de metas setoriais e a de uma proposta mais avançada de NDC, para 2020, pois sabemos que o somatório das atuais nos coloca numa trajetória de 3 graus. O primeiro documento nos oferece dicas de como poderíamos ir mais longe. Acho que uma nova NDC brasileira deveria ser condicional a um Fundo Garantidor internacional que financie maciçamente projetos de descarbonização ao menor juro existente no mercado internacional com o melhor prazo de carência. Os governos do países ricos devem oferecer garantias a esse fundo, junto com os entes multilaterais. E temos de avançar no conceito da precificação do menos-carbono. Nós colocamos isso no Acordo de Paris: as ações de mitigação possuem um valor econômico intrínseco: o menos-carbono vale dinheiro.


E a questão subnacional a que você vem se dedicando?
Independentemente do fórum, mas desejando seu apoio, entre outros, estou trabalhando com os governos de Estado, prefeituras e iniciativa privada num ente subnacional. Isso já era crucial antes desse governo. Envolve a ABEMA, a ANAMA, o ICLEI, as associações diversas de prefeitos, organizações empresariais como o CEBDS, a Ethos. Envolve um diálogo com a FIESP, a FIRJAN e outros.
Mesmo que fosse outro tipo de governo, seria crucial melhorar muito a performance nos Estados. Há males que vem para o bem, vou ter mais tempo para isso.


Que outras iniciativas?
Estou terminando de escrever meu novo livro. Chama-se Descarbonário. Embora no jogo de palavras assim pareça não se refere ao tema de Os Carbonários, meu best seller de já lá se vão 40 anos, premio Jabuti, em 1981. É sobre minha ação na descarbonização, como fui entendendo a questão da mudança do clima, que, inicialmente, considerava apenas uma dentre muitas questões “ambientais” virou tão importante para mim. Foi a partir de 2005, ouvindo uma líder esquimó, que passei a vê-la como a grande questão civilizacional contemporânea. Conto também de algumas questões e folclores da política brasileira, no último período em que participei dela, quando deputado federal. Analiso os antecedentes da atual situação.

Comentários

Um comentário:

  1. Eu acho o Bolsonaro um otimo presidente, gosto da sinceridade, da honestidade e do vigor com que ele defende a familia tradicional cristã brasileira sobretudo as crianças.Mas a ansia , a voracidade com que ele tem atacado a floresta amazonica, querendo trazer garimpo e agricultura para as terras indigenas me apavora.Para mim colocar o meio ambiente nas mão dos ruralisas é assumir levianamente um risco enorme para anossa pobre floresta e consequentemente para nossa avifauna. OUtra crueldade é querer regularizar a caça como atividade esportiva.Desde quando o assassinato de seres inocentes pode ser considerado um esporte? Matar por prazer, por divertimento? O que é isso, Presidente? É isso que devemos ensinar aos nossos filhos?Que para serem machos eles tem de assassinar seres inocentes?


    Machismo não pode ser sinonimo de crueldade. Homens bem formados devem ser protetores dos mais fracos, dos mais vulneraveis.Protetores das mulheres, das crianças e de todos os seres indefesos ante uma espingarda.

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