Juiz mantém investigação sobre brigadistas na Polícia Civil do Pará

 

 

 

O magistrado Alexandre Rizzi argumenta que a gestão da APA Alter do Chão é da Secretaria de Meio Ambiente de Santarém (Foto: Jader Paes /Ag.Pará)

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Manaus (AM) –  O juiz Alexandre Rizzi, titular da 1ª Vara Criminal da Comarca de Santarém, manteve em decisão, no dia 13 de dezembro, a competência da Polícia Civil do Pará no processo que investiga o suposto envolvimento de quatro brigadistas em incêndios florestais na Área de Proteção Ambiental (APA) Alter do Chão e desvio de recursos de doações de organização não governamentais internacionais. No despacho, o magistrado negou o pedido de declínio da competência do Ministério Público Federal (MPF). O órgão argumentou que as queimadas aconteceram em área pertencente à União e que o ordenamento jurídico considera que houve um interesse federal atingido.

Com a decisão de Rizzi, que acompanhou parecer do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), que também negou o declínio da competência do processo em favor da Justiça Federal, as investigações do inquérito ficam sob a responsabilidade do delegado Waldir Freire, diretor Especializada em Meio Ambiente.

No despacho, o juiz afirmou que a União tem apenas interesse indireto no que diz respeito à APA Alter do Chão, nos termos do art. 23, VI e VII da Constituição Federal, e a que a unidade é de jurisdição estadual, pois foi criada por um ato do Poder Executivo Municipal de Santarém, através da Lei Nº 17.771/2003, e está inserida no Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, junto ao Ministério do Meio Ambiente tendo a Secretaria de Meio Ambiente de Santarém como órgão gestor do local.

“Pode-se afirmar, portanto, que a União reconhece, como de fato e de direito declara em seu Cadastro Nacional, que o Município é quem possui a competência ambiental para gerir a APA Alter-do-Chão”, diz Rizzi na decisão.

A reportagem da Amazônia Real procurou o MPF em Belém para o órgão comentar a decisão do juiz Alexandre Rizzi. Por meio da assessoria de imprensa, o órgão disse que está analisando a questão e, até o momento, não tem nenhuma decisão tomada sobre o tema.

Os brigadistas, que foram presos pela operação “Fogo do Sairé”, estão em liberdade provisória desde o dia 28 de novembro por determinação do juiz Alexandre Rizzi. Ao conceder a liberdade, o juiz impôs restrições aos paulistas João Victor Pereira Romano, Daniel Gutierrez Govino e Gustavo de Almeida Fernandes, todos membros do Instituto Aquífero Alter do Chão, além de Marcelo Aron Cwerver: eles precisam comparecer todos os meses no fórum judicial, não circular pelas ruas entre 21 horas e 6 horas, não sair da comarca sem autorização do juízo por mais de 15 dias e entregar os passaportes. No momento, os brigadistas estão no estado de origem.

Os quatro brigadistas João, Daniel, Marcelo e Gustavo deixam a Penitenciária Agrícola Silvio Hall de Moura, em Santarém (Foto Marizilda Cruppe/Colabora)

 

Além dos brigadistas, foram alvo da operação as organizações não governamentais Projeto Saúde e Alegria (PSC) e Instituto Aquífero Alter do Chão – a segunda coordena as ações da brigada na área de combate a queimadas e educação. Os ambientalistas e as ONGs alegam a inocência. As provas, que não foram apresentadas à imprensa pela Justiça, são contestadas pelos advogados de defesa.
Ao pedir a competência do processo em ação assinado por 12 procuradores da República, o  MPF do Pará, que já tinha solicitado acesso ao inquérito à Polícia Civil, alegou que apura a responsabilidade dos incêndios na APA Alter do Chão desde o mês de setembro e, no procedimento, não há indícios do envolvimento dos brigadistas. Segundo o órgão, os suspeitos são grileiros e fazendeiros interessados na especulação imobiliária e no turismo do balneário.

Na decisão que manteve a competência do processo na Justiça Estadual, o juiz Alexandre Rizzi questionou os argumentos do MPF sobre o suposto envolvimentos de grileiros nos incêndios florestais da APA de Alter do Chão.

“Especificamente sobre o conteúdo dos primeiros documentos protocolizados nos autos pelo MPF, causou-me estranheza ter sido suscitado o vínculo do que ainda estava sendo investigado com possível ação de grileiros naquela localidade”, diz o juiz.

“Como é sabido, o que se tem até o momento são elementos indiciários na seara policial que foram colhidos durante intensas investigações. Sendo assim, fiquei deveras intrigado que autoridades não responsáveis pela apuração do caso manifestem-se formal e publicamente com certo grau de certeza sobre os rumos dos fatos ainda não integralmente elucidados”, completa Rizzi. Ele destacou na decisão que o pedido do MPF para ter acesso aos autos do processo da operação “Fogo do Sairé” foi atendido pelo MPPA.

A reportagem da agência Amazônia Real procurou a defesa dos brigadistas e assessoria de imprensa do Instituto Aquífero Alter do Chão para repercutir a decisão do juiz Alexandre Rizzi, mas os advogados não responderam às solicitações de entrevistas.

“Legitimidade”

O juiz Alexandre Rizzi, titular da 1ª Vara Criminal da Comarca de Santarém
(Foto: Marizilda Cruppe/Colabora)

Ainda na decisão, o juiz Alexandre Rizzi rebateu o MPF com relação a investigação federal sobre a especulação imobiliária e a responsabilidade da concessão de licenciamento ambiental e fiscalização da APA Alter do Chão. O magistrado afirma que, desde a criação da unidade, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) só teria aplicado um auto de infração na localidade, em 2016, à Secretaria Municipal de Agricultura e Incentivo à Produção Familiar de Santarém, cujo procedimento não teria sido julgado até o momento.

Todos os autos de infração aplicados pela secretaria municipal foram encaminhados à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Sema), que por sua vez os encaminhou ao Ministério Público Estadual, afirma a decisão.

“Como se observa, portanto, a própria União, através do seu Ministério do Meio Ambiente, reconhece que o órgão gestor, ou seja, aquele que administra a APA Alter-do-Chão, no que diz respeito à conservação, concessão de autorizações/licenças, fiscalização primária e outros, é o município de Santarém. Por outras palavras, o município de Santarém é o responsável direto pela proteção ao meio ambiente na APA Alter-do-Chão, cuja atuação não se confunde com a defesa do patrimônio, ou seja, do domínio da União em relação à área”, diz o juiz no documento.

“Por todo o exposto, considerando que o MPF não possui legitimidade para postular na demanda, havendo, inclusive, manifestação do Ministério Público Estadual pela manutenção da competência da Justiça Estadual, deixo de conhecer o pedido do MPF e, por consequência, determino o desentranhamento da documentação protocolada pela instituição”, afirmou Alexandre Rizzi.


Os incêndios florestais aconteceram entre 14 a 18 de setembro na APA Alter do Chão. Além de homens do Corpo de Bombeiros e Grupamento Aéreo de Segurança Pública do Pará (Graesp), do Exército, da Prefeitura de Santarém, da Polícia Civil e da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), atuaram no combate ao fogo os brigadista voluntários da Brigada de Alter do Chão – organização independente, recém-formada no distrito de Alter do Chão. Esses brigadistas testemunharam a morte de milhares de animais, entre eles, tatus, tamanduás, abelhas, gafanhotos, serpentes, conforme relataram à agência Amazônia Real.

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