terça-feira, 17 de abril de 2018

Impactos da revolução verde, Parte 2/2 (Final), artigo de Roberto Naime



agricultura mecanizada

[EcoDebate] Essa revolução foi introduzida no país na época da ditadura militar, nos anos 60 e 70, com as mesmas características do restante do mundo, uma vez que o modelo sustenta a premissa de que a agricultura pode ser industrializada.
Um dos impactos marcantes dessa modernização do setor está na incidência de monoculturas com plantas híbridas, além de ser fortemente apoiada em energias não renováveis, nos agrotóxicos, nos adubos e na intensa mecanização e alteração genética dos alimentos, sendo bastante questionada.
“Essa necessidade de insumos é decorrente da não valorização da biodiversidade funcional nos agroecossistemas, caracterizando-se por ser um pacote tecnológico desenvolvido para a produção em larga escala, em grandes monoculturas”, explica José Maria Gusman Ferraz.
Na época em que foi introduzida, foram criadas políticas públicas para adoção do novo modelo por parte dos agricultores. Entre elas, pode-se citar o crédito subsidiado atrelado à compra de insumos como agrotóxicos e adubos.
A criação de órgãos de pesquisas nacionais e estaduais para dar suporte ao modelo também é considerada como um incentivo, junto ao treinamento, no exterior, dos professores das faculdades de agronomia e a criação de um serviço de extensão rural para levar a tecnologia até o agricultor.
Pedro Abel Vieira Júnior, doutorando do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), afirma que o Brasil e a Índia foram grandes beneficiados economicamente pelo novo sistema e pela modernização da cultura agrícola.
Para ele, parte disso se deve ao fato de, no Brasil, ter sido desenvolvida uma tecnologia própria para a chamada agricultura tropical, o que culminou, atualmente, na liderança do país em tecnologia para a produção agrícola nos trópicos.
“A partir da década de 1990, a disseminação dessas tecnologias em todo o território nacional permitiu que o Brasil vivesse um grande desenvolvimento agrícola, com aumento das fronteiras de produção e disseminação de culturas em que o país é recordista de produtividade, como a soja, o milho e o algodão, entre outros. Há quem denomine esse período da história brasileira de a Era do Agronegócio”, sustenta Pedro Abel.
Sem dúvida, uma das mais acaloradas discussões sobre as consequências da Revolução Verde reside nos alimentos transgênicos ou geneticamente modificados. Ainda não se chegou a um consenso sobre o assunto, que divide a opinião de especialistas e da sociedade civil. Há quem defenda que os transgênicos possam acabar com a fome no mundo. Contudo, há quem afirme que eles podem acarretar inúmeros danos à saúde humana e animal e também ao meio ambiente.
Em artigo publicado na “ComCiência”, Lavína Pessanha aponta que Estados Unidos e União Européia representam visões distintas sobre o tema e que se contrapõem. Os primeiros são a favor da liberação, alegando não haver nenhuma comprovação científica dos malefícios dos alimentos geneticamente modificados, já os europeus defendem que é preciso pesquisar melhor antes de disponibilizar os transgênicos para consumo.
Não faz sentido exercer qualquer condenação prévia e apriorística da biotecnologia ou de qualquer substância química, com apropriação dogmática. Qualquer inovação tecnológica teve como estimulação, os benefícios que podem ser gerados, embora possam ter trajetória tão diferenciada quanto são as intenções e predisposições.
Assim, todos os procedimentos merecem isenção e avaliações em cada caso, e não condenações gerais de qualquer natureza, que respondam a anseios dogmáticos ou políticos.
Conforme já se referiu, mesmo que não se apregoe qualquer restrição às evoluções científicas que inegavelmente são representadas por incrementos na transgenia, não custa nada admoestar a todas as partes interessadas que é preciso ter um pouco de humildade.
Mecanismos de proteção que podem até interferir na seleção natural, e produzem complexas reações bioquímicas, são temerários, sem compreender todas as relações implícitas ou explícitas, e não lineares ou cartesianas da homeostase dos ecossistemas.
Logo, parece um pouco pretensioso na atual fase de conhecimentos da civilização humana, implementar estes incrementos sem considerar os princípios de precaução e sem mobilizar tentativas mais sistêmicas e holísticas de se apropriar da realidade.
Ferraz alerta para um dos problemas ambientais e de saúde que podem resultar da implementação das sementes transgênicas, seguida da utilização de agrotóxicos. “O uso de um produto seguidamente leva à seleção das plantas resistentes, que passam a competir com a cultura. Num primeiro momento, aumenta-se o uso do herbicida, aumentando o impacto ambiental pelo aumento dos resíduos. Como isso não tem resolvido o problema, agora aparecem plantas transgênicas chamadas de ‘piramidadas’, que são resistentes a mais de um herbicida, ou plantas transgênicas que usam herbicidas com maior toxicidade, e em alguns casos sob suspeição de causarem graves danos à saúde e ao meio ambiente”, explica.
De acordo com Antonio Márcio Buainain, professor do Instituto de Economia da UNICAMP, existe uma mistificação sobre o uso e consumo de alimentos geneticamente modificados. “O último relatório da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) e da OCDE (Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico) sobre perspectivas para a agricultura até 2020 indica a necessidade de expansão da produção em torno de 30% para dar conta do aumento populacional e de renda. E, para isso, não podemos nos dar ao luxo de negar alternativas com base apenas em hipóteses, às vezes, mal fundamentadas e em fantasmas ideológicos sem nenhuma base objetiva”, afirma.
Para Antonio Márcio, a proibição dos transgênicos seria o equivalente a negar os medicamentos. “Só podemos negar alternativas que não atendam às restrições institucionais, que são cada vez mais duras e envolvem o meio ambiente, as relações trabalhistas, entre outros. Portanto, não se trata de negar os transgênicos em geral. Isso equivaleria a negar os remédios. O que temos que recusar é produto transgênico que fuja dessa conformidade, da mesma maneira que negamos remédios que não atendam ao conjunto de condicionalidades impostas pelos órgãos reguladores”, defende. Se acredita que este é um argumento falacioso, mas ganha espaço igual no debate, por equidade.
Ferraz, por sua vez, lembra que o problema da alimentação mundial não está na quantidade de alimento disponível, mas sim no poder aquisitivo das populações, caracterizando-se num problema socioeconômico resultante da má distribuição de renda.
“A Organização das Nações Unidas (ONU) e várias instituições não governamentais têm disponibilizado informações de que os alimentos disponíveis dariam de sobra para alimentar a população humana. Cada pessoa no mundo poderia comer aproximadamente todos os dias, 1,7 kg de cereais, feijões e nozes, 200 g de carne, leite e ovos e 0,5 kg de frutas e vegetais. Isso é mais que suficiente para uma boa nutrição”, observa Ferraz.
Para ele, o discurso de que os alimentos geneticamente modificados podem acabar com a fome no planeta é a mesma falácia utilizada por aqueles que defendiam a implementação da Revolução Verde, que, além de não acabar com a fome, ainda agravou os problemas sociais e ambientais. “Como esse modelo está se esgotando, o novo rearranjo para mantê-lo por mais tempo é a introdução de plantas transgênicas com o uso casado do agrotóxico”, conclui.
Resta saber se os órgãos reguladores, um dia irão de fato avaliar as relações trabalhistas, os impactos ao meio ambiente e à saúde humana e animal dessa faceta mais contemporânea da revolução. E se essa nova fase vai proporcionar não apenas um aumento da produção, mas do acesso aos alimentos, o que até o momento não ocorreu.
Referência:
OCTAVIANO, Carolina, Muito além da tecnologia: os impactos da Revolução Verde, Com Ciência n. 120 Campinas 2010

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

* Nota da Redação: Leia, também, a primeira parte deste artigo clicando aqui.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/04/2018
"Impactos da revolução verde, Parte 2/2 (Final), artigo de Roberto Naime," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/04/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/04/17/impactos-da-revolucao-verde-parte-22-final-artigo-de-roberto-naime/.

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Impactos da revolução verde, Parte 1/2, artigo de Roberto Naime

Impactos da revolução verde, Parte 1/2, artigo de Roberto Naime


agricultura mecanizada

[EcoDebate] A Revolução Verde é considerada como a difusão de tecnologias agrícolas que permitiram um aumento considerável na produção, sobretudo em países menos desenvolvidos, que ocorreu principalmente entre 1960 e 1970, a partir da modernização das técnicas utilizadas.
Embora tenha surgido com a promessa de acabar com a fome mundial, não se pode negar que essa revolução trouxe inúmeros impactos sociais e ambientais negativos, conforme afirma José Maria Gusman Ferraz, pós-doutorando em agroecologia pela Universidade de Córdoba, na Espanha, e pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA).
É sempre bom lembrar que estas realidades não passaram nem perto de solucionar o problema da fome, que depende da distribuição de riqueza.
O caso brasileiro ilustra bem a situação definida pelo pesquisador, se de um lado está a melhoria econômica, do outro persistem os problemas sociais. “Para usarmos exemplos brasileiros, entre 1970 e 1985, o aumento na produção de alimentos básicos para a população foi de 20%, enquanto que a de produtos de exportação (cacau, soja, e outros) cresceu da ordem de 119 a 1.112%.”
“O país ocupa hoje lugar de destaque entre os países exportadores de alimentos, contrastando com uma população de milhões de subnutridos”, destaca ele.
Além de não ter resolvido os problemas nutricional e da fome, a Revolução Verde também é reconhecida por aumentar a concentração fundiária e a dependência de sementes, alterando a cultura dos pequenos proprietários que encontraram dificuldades para se inserir nos novos moldes.
“A concentração da posse da terra e o decorrente êxodo rural causaram um inchaço das cidades, levando a uma favelização nunca vista. Houve uma transferência do lucro decorrente da atividade agrícola para a agroindústria, deixando o produtor rural com uma estreita margem, levando ao seu endividamento”, avalia Ferraz.
Pedro Abel Vieira Júnior, dourando do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e também pesquisador da EMBRAPA, aponta para o contraponto gerado por essa revolução. “De uma forma crítica, a Revolução Verde proporcionou ganhos consideráveis para a produção agrícola. Por outro lado, é inegável que esses ganhos foram associados a alguma degradação ambiental e que os lucros extraordinários gerados pelos ganhos de produtividade da terra, da mão de obra e do capital não foram apropriados pelos produtores rurais”, afirma.
Para Vieira Júnior esses danos ao meio ambiente são quase inexistentes, pois a agricultura evoluiu no sentido da sustentabilidade. Ele cita como exemplo que “em várias regiões do planeta, os sistemas agrícolas são entendidos como produtores de água. Culturas não destinadas ao consumo humano ou animal são irrigadas com efluentes industriais e domésticos. Desse modo, o sistema agrícola filtra os efluentes, devolvendo ao meio ambiente a água pura”, ilustra.
Já Ferraz defende a criação de um novo modelo que contemple a ecologia e o sustentável. “Temos que ter um pensamento sistêmico para repensar um novo sistema produtivo, o que é possível. As propostas de mudança elaboradas pela agroecologia apontam um caminho que pode nos levar a uma nova forma de produção sustentável.
A valorização e incentivo para a agricultura familiar, que de fato produz os alimentos que consumimos no dia a dia, dentro dos conceitos agroecológicos, é uma proposta que pode mudar o rumo de nossa agricultura numa direção realmente sustentável”, acredita.
Referência:
OCTAVIANO, Carolina, Muito além da tecnologia: os impactos da Revolução Verde, Com Ciência n.120 Campinas 2010

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 10/04/2018
"Impactos da revolução verde, Parte 1/2, artigo de Roberto Naime," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 10/04/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/04/10/impactos-da-revolucao-verde-parte-12-artigo-de-roberto-naime/.

Expansão de cana-de-açúcar para a Amazônia colocará em xeque os serviços ambientais da floresta

Expansão de cana-de-açúcar para a Amazônia colocará em xeque os serviços ambientais da floresta


Expansão de cana-de-açúcar para a Amazônia colocará em xeque os serviços ambientais da floresta. Entrevista especial com Lucas Ferrante

IHU
Apesar de a legislação proibir o cultivo de cana-de-açúcar na Floresta Amazônica desde 2009 por causa do impacto ambiental que esse tipo de cultura gera na biodiversidade, um projeto de lei recentemente discutido no Senado Federal propõe que esse plantio seja retomado em áreas degradadas. Entretanto, de acordo com o biólogo Lucas Ferrante, que já realizou estudos para verificar a influência do cultivo de cana-de-açúcar sobre florestas adjacentes, “esse é um dos cultivos mais nocivos” para a floresta. “Grandes plantações desse cultivo na Amazônia podem causar um dano muito grande à estrutura da floresta adjacente e também à biodiversidade, representando uma perda de patrimônio genético para o Brasil. Além disso, existem outros problemas envolvidos, porque a degradação da floresta, por si só, faz com que percamos diversos serviços ecossistêmicos dos quais somos altamente dependentes, como, por exemplo, a regulação do clima. Se houver plantação de cana-de-açúcar na floresta, poderemos colocar em xeque até o próprio cultivo agrícola da região”, adverte.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone à IHU On-LineFerrante também informa que nem mesmo a indústria da cana-de-açúcar está apoiando o projeto de lei. “Essa questão é repudiada pela própria indústria de cana-de-açúcar e de álcool. Para aumentar a demanda de biocombustíveis não é interessante a implementação desse cultivo na Amazônia, o que demonstra, mais uma vez, que esse cultivo não é economicamente viável”. E reitera: “Se o próprio setor de biocombustíveis não apoia essa proposta, como pode-se dizer que ela vai gerar renda e será viável para a região? O próprio setor já se manifestou, duas vezes inclusive, contrário ao plantio de cana-de-açúcar na Amazônia”.
Lucas Ferrante | Foto: Xapuri
Lucas Ferrante é graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Alfenas – Unifal e mestre em Ecologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – Inpa. Atualmente é doutorando em Ecologia também no Inpa. É pesquisador associado ao Centro de Estudos Integrados da Biodiversidade Amazônica – Cenbam, ao Programa de Pesquisa em Biodiversidade – PPBio, e ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia dos Serviços Ambientais da Amazônia – INCT-Servamb.
Confira a entrevista.
IHU On-Line — Em que consiste o projeto de lei que propõe o plantio de cana-de-açúcar na Amazônia, pautado recentemente no Senado?
Lucas Ferrante — Esse projeto de lei tenta promover a abertura da Amazônia e do Pantanal para o plantio de cana-de-açúcar. Desde 2009 existe um veto de plantações de cana-de-açúcar nessas áreas devido ao potencial impacto que esse cultivo teria na biodiversidade e nas comunidades locais. O projeto de lei propõe que esse plantio deveria ser implementado em áreas alteradas. Primeiramente, levantamos a questão sobre o que são áreas alteradas, já que essas podem ser de muitos modos. Além disso, sabemos que a introdução do plantio de cana-de-açúcar causa um dano ambiental que vai além da área de plantio.
Na ecologia há um efeito conhecido como Efeito de Borda, o qual é causado por um cultivo agrícola para além da área plantada sobre áreas de floresta. Liderei alguns estudos para verificar a influência do cultivo de cana-de-açúcar sobre florestas adjacentes e verifiquei que esse é um dos cultivos mais nocivos. Portanto, grandes plantações desse cultivo na Amazônia podem causar um enorme dano à estrutura da floresta adjacente e também à biodiversidade, representando uma perda de patrimônio genético para o Brasil. Além disso, existem outros problemas envolvidos, porque a degradação da floresta, por si só, faz com que percamos diversos serviços ecossistêmicos dos quais somos altamente dependentes, como, por exemplo, a regulação do clima. Se houver plantação de cana-de-açúcar na floresta, poderemos colocar em xeque até o próprio cultivo agrícola da região.
Também existem outras questões, porque na Amazônia ocorrem os fenômenos de migração de cultura que geram desmatamento — podemos observar isso com a soja. Quem vive de pecuária ou outros cultivos vai acabar vendendo suas terras para os plantadores de cana-de-açúcar, que vão usar esse dinheiro para comprar terras mais baratas, gerando desmatamento. Logo, a implementação do cultivo de cana-de-açúcar também tende a estimular o desmatamento na Amazônia. Assim, uma série de problemas sociais serão gerados, principalmente conflitos de terra, além da degradação ambiental. Ademais, podemos esperar que o desenvolvimento econômico da região seja pequeno ou nenhum, porque o cultivo de cana-de-açúcar é basicamente mecanizado e isso gera pouquíssimos empregos.
IHU On-Line — Como esse projeto de lei está sendo discutido no Senado?
Lucas Ferrante — O debate político praticamente não existe. Os senadores têm diferentes pontos de vista: alguns entendem que esse cultivo realmente é nocivo para a Amazônia e para a América Latina como um todo. O que vemos é que essa é uma questão que a bancada ruralista tem defendido. O fato é que esse tipo de plantio não irá gerar desenvolvimento para a região, talvez gere riqueza, mas ela será muito concentrada. Portanto, não vemos o plantio de cana-de-açúcar como uma fonte de desenvolvimento para a região, como vem sendo alegado por diversos senadores da bancada ruralista. Alguns senadores são contra essa iniciativa e se mobilizaram em oposição a esse projeto, inclusive foi por essa razão que não houve quórum em algumas votações e a votação não ocorreu em definitivo. Essa questão ainda está sendo debatida, por isso é importante divulgarmos o conhecimento científico que temos, justamente para pautar a decisão.
IHU On-Line — Entre os argumentos que justificam a plantação de cana-de-açúcar na Amazônia, destaca-se a necessidade de aumentar a demanda por biocombustíveis. Como você vê esse tipo de justificativa?
Lucas Ferrante — Essa questão é uma falácia que a bancada ruralista tem defendido. Em primeiro lugar, essa questão é repudiada pela própria indústria de cana-de-açúcar e de álcool. Para aumentar a demanda de biocombustíveis não é interessante a implementação desse cultivo na Amazônia, o que demonstra, mais uma vez, que esse cultivo não é economicamente viável.
Se o próprio setor de biocombustíveis não apoia essa proposta, como pode-se dizer que ela vai gerar renda e será viável para a região? O próprio setor já se manifestou, duas vezes inclusive, contrário ao plantio de cana-de-açúcar na Amazônia.
IHU On-Line — Já houve plantio de cana-de-açúcar na Amazônia antes da legislação proibitiva de 2009?
Lucas Ferrante — Sim, já houve alguns plantios que, inclusive, se mantêm. Próximo a Balbina tem uma plantação de cana-de-açúcar que é da Coca-Cola. Ou seja, os cultivos que foram implementados antes de 2009 permaneceram, e simplesmente houve a proibição para novos cultivos. Também existem áreas no Acre que têm pequenas plantações.
É importante frisar que pequenas plantações de fundo de quintal acabam ocorrendo, porque o que a lei proíbe é a plantação em larga escala, o que é altamente nocivo para a biodiversidade e para a floresta adjacente, pois tende a contribuir para a modificação da floresta, além de estimular o desmatamento para outras áreas e causar diversos conflitos socioeconômicos. Inclusive, a própria sociedade da indústria de cana-de-açúcar, que assinou alguns acordos de clima e de floresta, se manifestou completamente contrária à implementação desse cultivo.
Brasil já tem a maior área de plantio de cana-de-açúcar do mundo e é o maior exportador de biocombustível à base de cana-de-açúcar. Portanto, não tem por que aumentar mais o mercado nesse quesito; não existe uma demanda real de aumento desse mercado. Talvez o que precisamos fazer é investir em biotecnologia, para que as áreas que já têm esse cultivo se tornem mais produtivas de uma maneira que não danifique o solo e que não prejudique a safra futuramente.
Expandir isso para a Amazônia seria um erro fatal, porque poderia colapsar a própria produção de cana-de-açúcar do país, uma vez que existem estados, como os do SulSudeste e Centro-Oeste, que são os maiores produtores desse cultivo no Brasil. Além disso, sabemos que grandes modificações na Amazônia poderiam colapsar essas plantações e também outros cultivos do Sul e Sudeste. Então, Sul e Sudeste do Brasil e países como a Argentina são extremamente dependentes do vapor de água exportado pela Amazônia. Garantir a conservação da Amazônia e desse serviço ecossistêmico é primordial para a própria agricultura do Brasil. É uma contradição quando vemos ruralistas do Sul do país defendendo que o cultivo de cana-de-açúcar na Amazôniavai gerar riqueza para o Brasil. Isso é um tiro no pé, pois estarão prejudicando os cultivos dentro do seu próprio estado. Por isso essa proposta não é vantajosa nem para a Amazônia, nem para os
Lavoura do Projeto PROCANA (Foto: Instituto Agronômico de Campinas – IAC)
IHU On-Line — Quais são as implicações ambientais do plantio de cana-de-açúcar para a Amazônia e para os biomas vizinhos? Essa cultura causa algum dano específico à floresta?
Lucas Ferrante — As alterações climáticas serão perceptíveis em todos os biomas até chegar à costa atlântica brasileira. Vamos observar danos não só na estrutura do bioma, porque se esperam secas mais prolongadas e chuvas mais concentradas. Então, isso pode afetar o ciclo reprodutivo de várias espécies, principalmente na Mata Atlântica, onde já estamos observando algum declínio em algumas espécies, como anfíbios, que são controladores de pragas para a agricultura e de vetores de doenças para a saúde humana.
Atualmente vivemos um surto de febre amarela silvestre em alguns estados da Mata Atlântica, e isso pode, sim, estar relacionado ao declínio de fauna pontualmente, em especial de anfíbios, que são predadores naturais das larvas. Podemos esperar várias consequências ambientais em decorrência disso, inclusive perda de biodiversidadenão só na Amazônia, como também em outros estados; mas pode haver, sobretudo, alteração de serviços ecossistêmicos importantes que beneficiam a própria população. A partir disso podemos esperar o surgimento de outras doenças tropicais. Também podemos esperar que a água se torne um recurso escasso para regiões que demandam grande quantidade de água para abastecimento humano. Além disso, a seca em São Paulo tende a aumentar e precarizar a distribuição de água. A própria agriculturatende a sofrer nesses estados por conta dessa prolongação da seca.
O Cerrado é um bioma que já vem enfrentando grande desmatamento, e essas alterações climáticas podem propiciar o aumento de incêndios, danificando ainda mais florestas desse bioma. Os prejuízos são basicamente incalculáveis.
IHU On-Line — Nos últimos anos aumentou o plantio de soja na Amazônia. Esse tipo de cultivo tem gerado implicações à floresta?
Lucas Ferrante — A expansão da soja é um problema e isso tem que ser controlado para que não tenhamos zonas de conflito, inclusive com comunidades tradicionais. Soja e pecuária são líderes em trabalho escravo na Amazônia. Esses cultivos têm que ser muito bem manejados, as fazendas têm que ser muito bem fiscalizadas. O que o setor ruralista defende é que a conservação ambiental é um entrave para a produção agrícola do país, mas isso não é verdade. A própria agricultura se beneficia dos serviços ecossistêmicos propiciados pela conservação do meio ambiente.
cana-de-açúcar é um problema, porque ela geraria o mesmo dano que a soja já gerou quando se expandiu na Amazônia. Não podemos deixar que áreas hoje ocupadas por outros cultivos sejam tomadas pela cana-de-açúcar, porque os outros cultivos vão migrar para outras áreas, aumentando o desmatamento. O dano da cana-de-açúcariria potencializar o dano causado pela pecuária e pela expansão da soja; esses são fatores que devemos considerar. A soja por si só já gerou um dano muito grande, tanto ambiental quanto social, e a própria pecuária também. Hoje esses cultivos estão amplamente disseminados na Amazônia e o que temos de fazer é estudar melhor, compreender esses impactos e tentar fazer um zoneamento ambiental de forma que possamos fiscalizar esses cultivos para que não aumentem o desmatamento e os problemas sociais e ambientais.
IHU On-Line — Como a proposta de expansão da cana-de-açúcar para a Amazônia tem sido discutida pelos estados da federação que fazem parte da Amazônia?
Lucas Ferrante — O projeto é muito bonito no papel, mas sabemos que aquilo é “para inglês ver”. Sabemos que quando se trata de Amazônia, as coisas são muito mais obscuras quando implementadas e muito difíceis de ser fiscalizadas. Diversos senadores dos estados que fazem parte da Amazônia já manifestaram que essa expansão será boa para o desenvolvimento econômico da região, mas sabemos que isso é uma falácia.
Os estados tendem a perder com a implementação desse cultivo, porque outros problemas tendem a surgir a partir daí e, talvez, o ganho gerado não pague o dano causado por conta dessa implementação. É muito importante que esses estados se conscientizem disso e não comprem uma ideia que um político apresentou como sendo muito bonita.
Em geral a opinião é muito dividida. Alguns senadores se manifestaram contra, como a senadora Vanessa Grazziotin, que é do Amazonas, e outros senadores estão pautando a favor. Os relatórios técnicos que temos sobre isso precisam ser considerados pelos senadores, porque fazer uma liberação apenas a partir do ponto de vista deles é arbitrário. Não é possível tomar decisões apenas com base na política; temos dados científicos que nos indicam que esse tipo de plantio vai ser ruim para a região e para outras regiões do país também e isso deveria ser pautado na hora de considerar a votação.
IHU On-Line – Que tipo de cultivo diria que é adequado para a floresta?
Lucas Ferrante – Existem várias alternativas para garantir o desenvolvimento na Amazônia, conservando a floresta e, principalmente, gerando renda para o pequeno produtor, que é aquele que realmente produz o que consumimos. Isso porque 70% do alimento produzido no Brasil vem dos pequenos agricultores, e não da agricultura em larga escala e mecanizada, que é a que recebe maior apoio do governo e maior financiamento bancário. O estímulo do pequeno produtor rural é muito importante para aumentar a demanda de alimentos na região.
Nesse sentido, temos alternativas de alimentos bons, limpos e justos, que valorizem o trabalho do pequeno produtor de forma que não agrida o meio ambiente. Temos sistemas agroflorestais, que produzem alimentos e não agridem o meio ambiente. Existem também iniciativas atuando na região, como o movimento de Slow Food, que tem como premissa produzir alimentos bons e justos, livres de agrotóxicos.
Paralelamente, existem outras iniciativas, como a do crédito de carbono. A Amazônia é enorme e o crédito de carbono é um mercado importante, porque diversas empresas internacionais com grandes emissões de gases têm comprado créditos de carbono, e a Amazônia por si só é a maior reserva de carbono do mundo. Então, se estimularmos o crédito de carbono numa iniciativa em que o próprio Estado promova isso, pensando na conservação da floresta, fazendo zoneamento ambiental adequado e controlado por imagens de satélites, talvez essa seja uma solução muito melhor para o desenvolvimento dos estados, mantendo a floresta em pé e o desenvolvimento da região, do que manter o cultivo em larga escala.
Para se ter uma ideia, o PIB total do Amazonas em 2017 foi de 93.599 milhões de reais. Se considerarmos por base o crédito de carbono que a Amazônia poderia gerar por ano, seria em torno de 8 bilhões, ou seja, é infinitamente maior que o próprio PIB do estado. Com esses créditos de carbono poderíamos fazer abatimentos fiscais para esses estados que fazem parte da Amazônia e investir na saúde e educação da população. Nesse sentido, podemos valorar os serviços ambientais que a floresta nos proporciona e não perder o serviço ecossistêmico do qual toda a América do Suldepende.
IHU On-Line – Muitas ONGs e movimentos sociais têm se manifestado contra mecanismos como o REDD ou créditos de carbono como alternativa para proteger as florestas, alegando que esses mecanismos vinculam as comunidades locais a um contrato financeiro em que elas ficam impedidas de manejar a área por muitos anos, enquanto a outra parte do contrato continua produzindo e emitindo poluição do outro lado do mundo. Apesar dessa crítica, por que, na sua avaliação, o REDD e os créditos de carbono são boas alternativas para preservar as florestas? De que modo esses mecanismos podem proteger as florestas, a exemplo da Amazônia?
Lucas Ferrante – Sempre que pensamos em desenvolvimento, existem pontos positivos e negativos, por isso precisamos pensar modelos que sejam benéficos para as comunidades tradicionais. Hoje verificamos que grandes alterações paisagísticas na Amazônia tendem a gerar mais problemas sociais e menos desenvolvimento do que realmente se propõe, e um exemplo disso é Belo Monte. Então, as comunidades têm culturas e precisamos criar métodos de preservá-las, valorando os alimentos que elas produzem, por meio de certificações ambientais, inclusive para exportação. Tem sido feito isso com o guaraná, que é exportado para a Europa, e o mel. Isso possibilita que a comunidade mantenha sua cultura e se preserve a própria identidade do povo, valorando seu alimento e seus costumes e dando recursos de subsistência. Isso não vai na contramão de implementar créditos de carbono. Ao contrário, essas medidas podem ser conciliadas e vão somar para melhorar a qualidade de vida da população.

(EcoDebate, 17/04/2018) publicado pela IHU On-line, parceira editorial da revista eletrônica EcoDebate na socialização da informação.

[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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Fim da obrigatoriedade do selo dos transgênicos pode ser votado pela Comissão de Meio Ambiente do Senado

Fim da obrigatoriedade do selo dos transgênicos pode ser votado pela Comissão de Meio Ambiente do Senado


Comissão rejeita projeto que retira do rótulo o símbolo de alimentos transgênicos

Agência Senado
O fim da obrigatoriedade dos rótulos com informações sobre a presença de transgênicos em produtos alimentícios pode ser votado na Comissão de Meio Ambiente (CMA) na terça-feira (17). O relatório do senador Cidinho Santos (PR-MT) é pela aprovação do PLC 34/2015, do deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS).
O texto determina a retirada do triângulo amarelo com a letra “T”, que hoje é colocado obrigatoriamente nas embalagens de alimentos transgênicos. Cidinho afirma que “uma análise científica rigorosa” sobre a questão dos transgênicos é o melhor caminho para que se afaste “o medo em torno deles”, a seu entender fruto de “ignorância e obscuridade”. O senador afirma ainda  que ainda não há “qualquer evidência que demonstre a negatividade dos transgênicos”.
“A despeito dos alimentos transgênicos serem uma realidade há mais de 15 anos no mundo, ainda não há registros de que sua ingestão cause danos diretos à saúde humana. Não existe um registro sequer”, escreveu.
No mês passado esta mesma proposta foi rejeitada pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS). Na ocasião, Cidinho disse que ONGs dos Estados Unidos tentaram contatá-lo para que também votasse contra, mas respondeu que “achava melhor que eles fossem defender esta bandeira no país deles”.
— Porque estas ONGs não exigem o mesmo no frango ou no leite que é produzido por lá? Nenhum país do mundo utiliza esta simbologia (referência ao triângulo amarelo com a letra T), que desvaloriza a produção. Porque não usam símbolos também para identificarem sódio ou gordura trans? Porque não faz sentido, e o uso do ‘T amarelo’ também é desnecessário — afirmou na ocasião.

Uso de agrotóxicos

Na CAS, o relatório pela rejeição foi da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM). Ela argumentou que a expansão das plantações de transgênicos leva ao aumento no uso de agrotóxicos, pois grande parte das sementes geneticamente modificadas (OGMs) tem como principal característica a resistência aos venenos agrícolas.
— Com o aumento do emprego de agrotóxicos, crescem os riscos à saúde dos consumidores, pois os efeitos nocivos à saúde humana e ao meio ambiente já são mais do que conhecidos — disse na ocasião.
Para ela, portanto, retirar o triângulo amarelo com a letra “T” restringe a informação para o consumidor em relação aos alimentos que compra, no caso de terem transgênicos.
A senadora afirmou que seu relatório teve o apoio do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), além de outras entidades que representam profissionais de saúde, associações acadêmicas e defesa de pacientes.
Vanessa também considerou altamente prejudicial à agricultura familiar o artigo do projeto que dificulta a comercialização de produtos orgânicos, ao vincular a divulgação de que um alimento é livre de OGMs a uma análise comprobatória. Para ela, jogar este custo sobre os pequenos produtores é proibitivo.

Da Agência Senado, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/04/2018

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Uso de urso em abertura de jogo na Rússia é condenado por ambientalistas

Se pudesse, aquele pobre urso usado pelos russos para entregar a bola ao árbitro antes do confronto entre Angusht e Mashuk, dois times de terceira divisão, na cidade de Piatygorsk, estaria reagindo à altura de sua capacidade. Mas não podia. Amordaçado numa focinheira, treinado sabe-se lá com quais métodos, ele fez direitinho o papel de bobo da corte. Só que, como sabemos muito bem aqueles que estudamos o tema, somos sensíveis às raças e nos interessamos pela preservação da biodiversidade, os bobos é que estavam aplaudindo.

Sim, eu sei. As opiniões são divididas. Tem quem argumente, dizendo que é hipocrisia criticar o show dos russos se os humanos montam em cavalos, confinam cachorros e comem bois. Mas tem também que perceba no teatro do urso russo uma ótima oportunidade para se debater a maneira estúpida com que os humanos tratam os animais em geral. Estou entre esses.

"Além de ser desumano e totalmente fora de alcance, usar um urso como servo cativo para entregar uma bola é absolutamente perigoso", disse Elisa Allen, diretora da organização mundial People for the Ethical Treatment of Animals (Peta) ao site da BBC.

O urso é um animal símbolo da Rússia, o que talvez tenha motivado o uso do bicho na abertura de um jogo. Segundo algumas informações ainda não confirmadas, a ideia é levar Tim, o nome do urso, para a abertura da Copa do Mundo que vai acontecer naquele país a partir do dia 14 de junho. Mas é justamente pelo fato de ser um animal símbolo do país que o uso dele como um troféu vivo é desumano e sem sentido, acrescenta Elisa Allen:

“O urso é o símbolo da Rússia, por isso esperamos que o povo do país mostre alguma compaixão e orgulho nacional e pare de abusar deles”, disse ela.

Estar acorrentado, amordaçado e forçado a realizar atitudes que não tem o hábito de realizar pode causar estresse a qualquer animal, segundo lembrou Brian de Cal, diretor de outra ONG, a Four Paws UK. A declaração dele me fez lembrar o triste caso da onça Juma, que em 2016 se tornou mascote do Centro de Instrução de Guerra na Selva, levada para a cerimônia de tocha das Olimpíadas. Depois do evento, que a deixou estressada, a onça reagiu como reage um animal selvagem: avançou sobre um veterinário. Doparam-na e mataram-na. Um ser vivo morto para deleite e gáudio dos humanos, como muitas outras infinitas vezes já aconteceu.

Yuval Noah Harari, pesquisador que nos brindou com uma obra extensa sobre a história da humanidade – “Sapiens” (Ed. L&PM) – alerta: é um crime bárbaro a maneira como os humanos lidam com os animais, julgando que estes são seres inferiores. Não são. Cientistas já fizeram pesquisas e descobriram que vacas, galinhas, porcos, e até ursos têm sensações, percepções, podem sentir dor, podem sentir medo, podem sentir amor.Com esta informação, fico pensando: o que Tim pensou naqueles momentos em que foi apresentado como um pobre tolo a fazer gestos que não são seus, a tocar uma bola que, para ele, nada representa?

Logo depois de a cena ganhar o mundo via internet, começaram a surgir os primeiros comentários dos ativistas ambientais, condenando o uso do animal. Muitos lembraram que as pessoas que estavam em volta de Tim correram um sério risco, já que se trata, como todos nós sabemos, de um bicho selvagem e feroz. A menos que, como não é incomum no país, segundo a Peta, eles tenham arrancado as garras e os dentes do animal.

“Espancamentos, choques elétricos e privação de comida são métodos usados pelos tratadores russos para fazer com que os ursos realizem truques depreciativos e estúpidos", disse Mimi Bekcechi, chefe de campanhas da Peta Austrália para o site da SBS News.

De qualquer maneira, a cena é bizarra e não poderia ter sido mais infeliz. A pergunta é: será que ninguém se preocupou, por um só momento que fosse, com o sofrimento que seria causado ao animal? Teriam imaginado, um segundo ao menos, que a repercussão poderia ser negativa? Que as pessoas não iam achar engraçadinho um bicho daquele tamanho se submetendo a tamanha imbecilidade?

No livro “Animal Liberation”, escrito nos anos 70, o filósofo australiano Peter Singer escreve sobre consideração que os humanos deveriam ter com relação aos bichos. E respeito.Sim, os animais devem ter direitos, merecem viver sua vida longe de opressão, sofrimento e exploração porque têm um valor que desafia a visão da sociedade humana. São criaturas que têm vontade de viver, lutam pela sua preservação. E não merecem ser submetidos a tratamentos humilhantes.