quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Brasil ficará em acordo sobre o clima, afirma Bolsonaro

Brasil ficará em acordo sobre o clima, afirma Bolsonaro

O presidente já chegou a dizer que o país poderia deixar o acordo climático fechado pela ONU em 2015, a exemplo dos EUA

Brasil ficará em acordo sobre o clima, afirma Bolsonaro
Notícias ao Minuto Brasil
Há 4 Horas por LUCIANA COELHO, LUCAS NEVES E MARIA CRISTINA FRIAS, para Folhapress 

Política ACORDO PARIS 

O Brasil não vai deixar o Acordo de Paris sobre o clima, disse o presidente Jair Bolsonaro em encontro com CEOs em Davos nesta terça (22) segundo um dos participantes.

Ele já havia feito um aceno nessa direção ao afirmar, na plenária do Fórum Econômico Mundial, que o país pretende estar sintonizado com o mundo na busca da diminuição de CO2 e na preservação ambiental.

Segundo o executivo presente na reunião com o presidente e com o ministro Paulo Guedes (Economia), Bolsonaro foi questionado pelos representantes das multinacionais sobre quais eram seus planos em relação ao ambiente e à questão indígena.

O presidente já chegou a dizer que o país poderia deixar o acordo climático fechado pela ONU em 2015, a exemplo dos EUA. Também já afirmou que era algo a se pensar.

Dois dias antes do segundo turno da eleição, Bolsonaro afirmou que, se fosse eleito presidente, manteria o Brasil no Acordo de Paris sobre o clima, desde que a soberania plena da Amazônia fosse preservada.

"Eu perguntaria a vocês: nesse Acordo de Paris, nós poderíamos correr o risco de abrir mão da nossa Amazônia? Vamos então botar no papel que não está em jogo o triplo A e nem a independência de nenhuma terra indígena que eu mantenho o Acordo de Paris", disse na época. A região chamada por ele de "triplo A" engloba os Andes, o oceano Atlântico e a Amazônia.


Em Davos, ele esclareceu sua posição, seguindo o que dissera seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Informou aos empresários e executivos estrangeiros que seguirá no acordo, mas que espera contrapartida pelo fato de o país ser um dos que menos poluem o planeta.

Clima é um dos principais trilhos da agenda em Davos neste ano, e os participantes mostram preocupação com a ação humana no aquecimento do planeta.

Nesta terça, o príncipe William entrevistou o naturalista David Attenbourgh, 92, a esse respeito na plenária do Fórum. "Somos agora tão numerosos, tão poderosos, tão dominadores"¦ que podemos realmente exterminar o ecossistema inteiro sem nem perceber que estamos fazendo isso", disse o conhecido narrador de programas de história natural da rede BBC. Com informações da Folhapress.

Riscos ambientais dominam a Pesquisa Global de Percepção de Riscos do Fórum Econômico Mundial



Riscos ambientais dominam a Pesquisa Global de Percepção de Riscos do Fórum Econômico Mundial



Os riscos ambientais continuam a dominar a Pesquisa Global de Percepção de Riscos do Fórum Econômico Mundial , responsável por três dos cinco principais riscos por probabilidade e quatro por impacto.

Organização Meteorológica Mundial (OMM)*

O clima extremo liderou a lista, mas há uma preocupação crescente com o fracasso das políticas ambientais, com o fracasso da mitigação e adaptação às mudanças climáticas sendo o segundo maior risco em termos de impacto este ano.

Os resultados da inação do clima estão se tornando cada vez mais claros. O ritmo acelerado da perda de biodiversidade é uma preocupação especial. A abundância de espécies diminuiu em 60% desde 1970. Na cadeia alimentar humana, a perda de biodiversidade está afetando a saúde e o desenvolvimento socioeconômico, com implicações para o bem-estar, a produtividade e até mesmo a segurança regional.

Em um horizonte de dez anos, as falhas climáticas extremas e as mudanças climáticas são vistas como as ameaças mais graves.

“De todos os riscos, é em relação ao meio ambiente que o mundo está mais sonambulando em catástrofe”, adverte o relatório. Foi publicado antes da reunião anual de Davos do Fórum Econômico Mundial, que começa em 21 de janeiro. O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, discursará na reunião de 24 de janeiro com um endereço que deve enfatizar a necessidade de uma ação climática mais urgente.

“Esta pesquisa destaca – mais uma vez – a importância crítica do core business da OMM. Isso demonstra por que os serviços hidrometeorológicos e climáticos precisam ser incorporados na tomada de decisões em todos os níveis, porque são vitais não apenas para a segurança pública, mas também para a segurança econômica e ambiental ”, disse Wenjian Zhang, vice-secretário-geral da OMM. entrada no relatório.

O Relatório de Riscos Globais baseia-se na pesquisa anual de Percepção de Riscos Globais, que é completada por cerca de 1.000 membros das comunidades multistakeholders do Fórum Econômico Mundial. Os especialistas da OMM contribuíram para a análise, que incluiu um capítulo sobre a preparação para o aumento do nível do mar.

Cidades em rápido crescimento e os efeitos contínuos da mudança climática estão tornando mais pessoas vulneráveis ao aumento do nível do mar. Espera-se que dois terços da população mundial vivam em cidades até 2050 e já estima-se que 800 milhões de pessoas vivam em mais de 570 cidades costeiras vulneráveis a um aumento do nível do mar de 0,5 metros até 2050, segundo o relatório.

Em um círculo vicioso, a urbanização não apenas concentra pessoas e propriedades em áreas de possíveis danos e interrupções, mas também exacerba esses riscos – por exemplo, destruindo fontes naturais de resiliência, como manguezais costeiros, e aumentando a pressão sobre as reservas de água subterrânea. Impactos de intensificação irão tornar uma quantidade crescente de terra inabitável.

Existem três estratégias principais para se adaptar ao aumento do nível do mar: (1) projetos de engenharia para manter a água fora, (2) soluções baseadas na natureza e (3) estratégias baseadas em pessoas, como mover famílias e empresas para terrenos mais seguros ou investir em capital social para tornar as comunidades de risco de inundação mais resilientes, diz o relatório.

O aumento do nível do mar é apenas um dos muitos riscos da mudança climática induzida pelo homem, que está causando um clima mais extremo e um estresse hídrico. Os desafios em cascata e interconectados exigem uma abordagem holística para lidar com vários riscos e construir a resiliência da infraestrutura básica.


Pesquisa Global de Percepção de Riscos
Pesquisa Global de Percepção de Riscos

* Tradução e edição de Henrique Cortez, EcoDebate

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 22/01/2019

"Riscos ambientais dominam a Pesquisa Global de Percepção de Riscos do Fórum Econômico Mundial," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 22/01/2019, https://www.ecodebate.com.br/2019/01/22/riscos-ambientais-dominam-a-pesquisa-global-de-percepcao-de-riscos-do-forum-economico-mundial/.

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Dessalinização e reúso devem crescer

 

Por Saneamento Ambiental – 
 
Com a introdução do novo Manual de Segurança da Água da IDA, a Associação Internacional de Dessalinização (IDA) e a Global Water Intelligence (GWI) divulgaram a última visão para os mercados mundiais de dessalinização e reutilização de água. O documento mostra que após três anos – período onde o mercado de dessalinização permaneceu estável – 2019 deve ser o ano de maior crescimento de projetos de dessalinização desde o final dos anos 2000.
 
 
O 31º inventário de dessalinização (que cobre de julho de 2017 a junho de 2018) aponta que a capacidade mundial instalada de dessalinização é de 97,4 milhões m³/dia, enquanto a capacidade total acumulada global é de 104,7 milhões m³ diários. Até junho de 2018, mais de 20 mil usinas de dessalinização haviam sido contratadas em todo o mundo. 
 
 
Em relação ao reúso, a capacidade global de reutilização contratada quase dobrou desde 2010, com a capacidade contratada acumulada aumentando de 59,7 milhões de m³/dia, em 2009, para 118 milhões de m³/dia, em 2017. “A IDA sempre defendeu soluções para a escassez de água apoiando o desenvolvimento da indústria de dessalinização e reutilização de água para garantir água sustentável e recursos naturais. Nas últimas décadas, nossa indústria alcançou uma importante redução nos custos não convencionais de água e aumentou a qualidade para garantir a sustentabilidade da água”, afirmou Miguel Angel Sanz, Presidente da IDA.
 
 
Dessalinização e reutilização da água são soluções de abastecimento ambientalmente corretas e estão em consonância com a economia circular da água. “As tendências que estamos vendo apontam para um amplo reconhecimento de que essas soluções avançadas de tratamento de água são essenciais para a saúde e o bem-estar das pessoas e das economias em todo o mundo, tanto agora como no futuro”, disse Shannon McCarthy, Secretária-Geral da IDA. 
 
De acordo com Christopher Gasson, editor da GWI, o grande avanço recente está relacionado ao custo dos projetos de dessalinização. “Propostas de projetos na Arábia Saudita e Abu Dhabi viram o preço cair abaixo de US$ 0,50/m³ pela primeira vez, o que é uma ótima notícia”. Gasson espera que 2019 seja o melhor ano no mercado de dessalinização. Em termos de reutilização de água, os preços para água potável indireta estão na faixa de US$ 0,30 a US$ 0,40, mas o mercado ainda é retido pelas percepções do público.
 
 
Os projetos de dessalinização crescem cada vez mais entre os países do Conselho de Cooperação do Golfo (GCC) – formado por Omã, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Qatar, Bahrein e Kuwait. De acordo com o Manual de Segurança Hídrica de 2018-2019, 1,9 milhão de m³/dia de capacidade de água do mar foram contratados no primeiro semestre de 2018, um aumento de 26% em relação ao mesmo período de 2017.
 
 Desde então, os licitantes preferidos surgiram em projetos que totalizam mais de 1 milhão de m³ diários em novas capacidades adicionais na região. No entanto, nem todas as grandes fábricas de água do mar contratadas estão localizadas no Oriente Médio. 
 
O maior empreendimento de dessalinização de água do mar listado no 31º inventário de dessalinização é o projeto de 378 mil m³/dia de osmose reversa de água do mar (SWRO) em Rosarito, México. Globalmente, a capacidade contratada de dessalinização de água salobra diminuiu 19% ano a ano, mas nos EUA a dessalinização de água salobra aumentou significativamente, totalizando 205.600 m³/dia, o maior nível desde 2012 e um aumento de 26% em relação a 2016, uma divisão razoavelmente uniforme entre plantas municipais e industriais. 
 
A dessalinização de água de alimentação de baixa concentração, como água residual e água superficial de baixa concentração, cresceu quase 25% da capacidade total em 2017, em comparação a aproximadamente 15% em 2016. A maior parte dessa capacidade é composta por grandes estações de tratamento de águas residuais na China e na Índia.
 
 
O manual também relata que o mercado de dessalinização industrial cresceu 21% em capacidade contratada entre 2016 e 2017. O aumento da atividade em petróleo e gás upstream e downstream representou mais de um terço da capacidade industrial contratada em 2017, enquanto o aumento dos preços das commodities revitalizou a atividade de dessalinização na indústria de mineração, com 201.000 m3/dia de nova capacidade contratada somente no primeiro semestre de 2018. 
 
 
A indústria de microeletrônica também está criando oportunidades para tecnologias de dessalinização, com capacidade contratada neste setor mais do que dobrando entre 2016-2017. Do ponto de vista geográfico, a capacidade contratada no Oriente Médio – o maior mercado de dessalinização – caiu de 2016 para 2017, mas foi compensada em 2018 com a concessão de vários grandes projetos.
 
(#Envolverde)

O conhecimento indígena sob ataque, segundo este pesquisador

O conhecimento indígena sob ataque, segundo este pesquisador


Por Camilo Rocha, do Nexo – 

Saberes de povos indígenas, historicamente influentes para a cultura brasileira, correm riscos quando terras são invadidas ou retiradas, diz o arqueólogo Eduardo Góes Neves

Os primeiros dias do governo de Jair Bolsonaro registraram diversos ataques a comunidades e terras indígenas. Entre eles, estão invasões a terras dos Uru-eu-wau-wau, em Rondônia, e dos Awá Guajá, no Maranhão. Para o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), as declarações de Bolsonaro, antes e depois da posse, têm funcionado como incentivo para que se invista contra territórios indígenas.

Com a transferência da Funai (Fundação Nacional do Índio) para o Ministério da Agricultura, existe preocupação de quem atua em questões indígenas com o futuro das terras indígenas, em especial as mais de 200 que ainda estão em processo de demarcação. Em entrevista dada em Brasília em 18 de janeiro, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, falou em não permitir invasões e proteger aldeias isoladas, mas também que deveria ser permitida a produção agrícola comercial nas terras indígenas, ideia criticada por estudiosos da área.

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(#Envolverde)
O conhecimento indígena sob ataque, segundo este pesquisador Camilo Rocha 20 Jan 2019 (atualizado 22/Jan 15h41) Saberes de povos indígenas, historicamente influentes para a cultura brasileira, correm riscos quando terras são invadidas ou retiradas, diz o arqueólogo Eduardo Góes Neves Foto: Bruno Kelly/Reuters Yanomami ao lado de uma mina ilegal de ouro durante uma operação de uma agência ambiental contra exploração ilegal em terras indígenas, em Roraima Os primeiros dias do governo de Jair Bolsonaro registraram diversos ataques a comunidades e terras indígenas. Entre eles, estão invasões a terras dos Uru-eu-wau-wau, em Rondônia, e dos Awá Guajá, no Maranhão. Para o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), as declarações de Bolsonaro, antes e depois da posse, têm funcionado como incentivo para que se invista contra territórios indígenas. Com a transferência da Funai (Fundação Nacional do Índio) para o Ministério da Agricultura, existe preocupação de quem atua em questões indígenas com o futuro das terras indígenas, em especial as mais de 200 que ainda estão em processo de demarcação. Em entrevista dada em Brasília em 18 de janeiro, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, falou em não permitir invasões e proteger aldeias isoladas, mas também que deveria ser permitida a produção agrícola comercial nas terras indígenas, ideia criticada por estudiosos da área. “É um tipo de conhecimento cujo desaparecimento é muito ruim, principalmente agora, com o mundo em que estamos vivendo, sentindo e percebendo com mais intensidade a mudança climática.” Eduardo Góes Neves Arqueólogo, Museu de Arqueologia e Etnologia da USP Não são apenas extensões de terra ou modos de vida tradicionais que correm risco quando se desloca ou se modifica o uso de terras ocupadas por populações tradicionais. Existe também um acúmulo de conhecimento de cada povo ou comunidade que fica ameaçado. São saberes que vão desde informações sobre uso de plantas a modos de preservar o meio ambiente em uma área. “O arrendamento da terra [conforme proposto pelo governo Bolsonaro] é como tirar todo o conhecimento tradicional que estes povos têm, toda a tradição que têm no resguardo da floresta”, explicou Carlos Nobre, cientista e pesquisador do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), em entrevista ao UOL. Em 2014, um comunicado da Plataforma para Biodiversidade e Serviços do Ecossistema das Nações Unidas enfatizou que o conhecimento das comunidades indígenas de várias regiões tinha utilidade para áreas como agricultura, manejo florestal e exploração dos oceanos, assim como para cumprir as metas da biodiversidade global. “Os povos da floresta são detentores de bancos genéticos e promotores de novas variedades de agricultivares”, escreveu Mauricio Torres, doutor em Geografia Humana pela USP, em artigo de 2011 intitulado “A despensa viva: um banco de germoplasma nos roçados da floresta”, em que questiona a perda dessa diversidade agrícola frente à “uniformidade” do agronegócio. Em seu trabalho, Torres pontua que em comunidades, em que a história se baseia na transmissão oral, há uma “memória coletiva” interligada com a paisagem e a geografia de suas regiões. Para Eduardo Góes Neves, pesquisador do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (Universidade de São Paulo), autor de “Arqueologia da Amazônia” e coautor de “Unknown Amazon: Culture in Nature in Ancient Brazil” (Amazônia desconhecida: cultura na natureza no Brasil antigo, em tradução livre), desperdiçar esse patrimônio implica um grave problema ético. “Esse arranjo que compõe a diversidade do planeta tem milhares de anos e a nossa geração não tem o direito de acabar com isso”, afirmou ao Nexo, por telefone. Leia a entrevista completa abaixo. Quando se extingue ou se altera o território de um povo indígena, quais os riscos para o conhecimento que ele acumulou? Eduardo Góes Neves Corre o risco é de desaparecer também. Esse processo geralmente é muito violento e truculento e o processo de transmissão desse conhecimento também é demorado, é um diálogo que as sociedades vão construindo ao longo do tempo. A gente sabe de populações que têm contato há muitos anos com a sociedade nacional, mas que têm conhecimentos que ficam guardados naquele âmbito. E se formos pensar no conhecimento sobre bichos, dos ciclos da natureza, por exemplo, isso é muito importante diante dos desafios que temos pensando em lugares como na Amazônia, que a gente ainda nem conhece direito e estamos ocupando de maneira totalmente errada. É um tipo de conhecimento cujo desaparecimento é muito ruim, principalmente agora, com o mundo em que estamos vivendo, sentindo e percebendo com mais intensidade a mudança climática. Quando se fala em conhecimento indígena, pensamos primordialmente em plantas. O que mais a gente pode considerar? Eduardo Góes Neves É uma maneira diferente de olhar para o mundo. Cada maneira de olhar que é diferente da que consagramos, a tradição intelectual judaico-cristã, tem de ser respeitada pelo seu próprio valor. A gente fala de ontologias diferentes, maneiras de olhar para o mundo, de pensar a existência. Compartilhamos o mesmo planeta, mas somos populações com histórias culturais diferentes, então vivemos o desafio de aceitar essa unicidade que é biológica, mas ao mesmo tempo de respeitar todas as manifestações culturais, assim como as outras formas de vida que estão aqui, e não só humanas, mas animais, plantas. Claro que o conhecimento sobre a natureza é importante, mas estamos falando de um conhecimento sobre o mundo em geral, sobre o universo, no sentido mais amplo. Mas essa discussão não pode ser apenas utilitária, porque esses caras têm uma solução para os problemas que criamos no mundo. Claro que é importante, é legal saber para poder usar e aplicar, mas tem uma questão mais de fundo, de justiça. As sociedades ocidentais tem a força bélica, mas não temos o direito de fazer isso, se formos pensar num sentido mais profundo. Esse arranjo que compõe a diversidade do planeta tem milhares de anos e a nossa geração não tem o direito de acabar com isso, de zerar esse relógio. Você pode falar um pouco mais sobre como o conhecimento indígena colabora para manter a biodiversidade? Eduardo Góes Neves Uma coisa vai ficando cada vez mais clara: uma parte dessa biodiversidade da Amazônia foi formada por humanos, por uma interação entre humanos e não-humanos, plantas e animais, ao longo dos últimos 10, 12 mil anos. O que se percebe em populações tradicionais, não só indígenas, mas quilombolas também, e populações ribeirinhas, é o interesse em estimular a diversidade, experimentar plantas diferentes, plantar, colher, trazer para o quintal, ver para que serve, ver como funciona. Um exemplo: trabalhamos com restos de plantas preservadas arqueologicamente e temos de fazer coleções de referência para comparar, por exemplo, [vestígios de] plantas antigas com modernas para poder classificá-las. Percebemos que mais de 90% das plantas que encontramos não sabemos ainda quais são. Significa que estamos vislumbrando só uma parte inicial desse conhecimento. Esse processo de produção, de aumentar a biodiversidade, é muito interessante, mas o que temos oferecido para a Amazônia nos últimos anos é justamente o oposto: é reduzir a diversidade, é não saber manejar. E fazemos isso de uma maneira tecnologicamente muito avançada e máquinas super-modernas, como a gente vê lá no Cerrado, substituindo a biodiversidade por algumas poucas espécies de plantas e animais. Como vê o discurso que encara os indígenas como “animais no zoológico”, como se em estágio “inferior” ao do homem branco? Eduardo Góes Neves Existe aí uma espécie de racismo ambiental, porque a gente vem de uma tradição intelectual forjada em países nórdicos, de clima temperado, na Europa e na América do Norte, que tem um contexto geográfico e ecológico totalmente diferente e que vê as regiões tropicais como insalubres, marginais, periféricas, que tem de ser aprimoradas. Lembro quando descobri que a malária não era uma doença tropical em uma visita ao Instituto de Medicina Tropical, mas existia malária na Europa até o século 20, nos Estados Unidos também. O conceito de doença tropical não é natural, mas sim social, que tem a ver com pobreza, com o contexto dos trópicos. Existe uma relação de colonialismo interno que funciona da mesma maneira. Nosso discurso sobre a Amazônia é sempre de que ela tem de ser aprimorada, desenvolvida, ocupada, a partir de critérios que não têm nada a ver com essas regiões e que não respeitam populações que vivem lá há séculos, milhares de anos, e que desenvolveram formas de vida interessantes para esse tipo de ambiente. Faz sentido, no contexto atual, desvalorizar o conhecimento indígena para poder usar como justificativa [de ocupar suas terras]. Ninguém está preocupado com o país, se trata de negócios, tem muito dinheiro potencialmente disponível nessas terras. O paradoxal é que são terras públicas. É um discurso cínico: eles querem privatizar terras públicas dizendo que é pelo interesse nacional. Como é que uma terra pública pode ser contra o interesse nacional? Olhando historicamente, qual o tamanho da influência do conhecimento indígena na cultura e sociedade brasileiras? Eduardo Góes Neves Veja as matas de pinhão no sul do Brasil, por exemplo. Temos evidências de que são antrópicas, de que foram manejadas pelos ancestrais dos indígenas caingangue. Temos evidências de que o símbolo do estado do Paraná, a araucária, compõe matas que ganharam mais extensão pelo manejo humano, o que chamamos de domesticação da paisagem. A mandioca todo mundo sabe, mas tem a castanha, pupunha, amendoim, cacau, goiaba, tabaco, o açaí, que virou um produto de exportação, que gera muito dinheiro no norte do Brasil. É uma planta manejada há muito tempo. Saindo da Amazônia, temos exemplos como a batata, que é uma planta andina. Hoje, se pensamos em comida alemã e inglesa logo pensamos em batata. Tem muita planta consumida no mundo inteiro que resultou desse processo de manejo e seleção realizado por povos indígenas que vivem no continente americano há muito tempo. Esse conhecimento não funciona da mesma maneira que o método científico, mas ele vem de uma curiosidade que reflete uma forma de conhecimento que é sofisticada também. Desprezar isso tem uma questão ética, mas é também uma grande estupidez. É uma catástrofe.

Link para matéria: https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2019/01/20/O-conhecimento-ind%C3%ADgena-sob-ataque-segundo-este-pesquisador

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O conhecimento indígena sob ataque, segundo este pesquisador Camilo Rocha 20 Jan 2019 (atualizado 22/Jan 15h41) Saberes de povos indígenas, historicamente influentes para a cultura brasileira, correm riscos quando terras são invadidas ou retiradas, diz o arqueólogo Eduardo Góes Neves Foto: Bruno Kelly/Reuters Yanomami ao lado de uma mina ilegal de ouro durante uma operação de uma agência ambiental contra exploração ilegal em terras indígenas, em Roraima Os primeiros dias do governo de Jair Bolsonaro registraram diversos ataques a comunidades e terras indígenas. Entre eles, estão invasões a terras dos Uru-eu-wau-wau, em Rondônia, e dos Awá Guajá, no Maranhão. Para o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), as declarações de Bolsonaro, antes e depois da posse, têm funcionado como incentivo para que se invista contra territórios indígenas. Com a transferência da Funai (Fundação Nacional do Índio) para o Ministério da Agricultura, existe preocupação de quem atua em questões indígenas com o futuro das terras indígenas, em especial as mais de 200 que ainda estão em processo de demarcação. Em entrevista dada em Brasília em 18 de janeiro, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, falou em não permitir invasões e proteger aldeias isoladas, mas também que deveria ser permitida a produção agrícola comercial nas terras indígenas, ideia criticada por estudiosos da área. “É um tipo de conhecimento cujo desaparecimento é muito ruim, principalmente agora, com o mundo em que estamos vivendo, sentindo e percebendo com mais intensidade a mudança climática.” Eduardo Góes Neves Arqueólogo, Museu de Arqueologia e Etnologia da USP Não são apenas extensões de terra ou modos de vida tradicionais que correm risco quando se desloca ou se modifica o uso de terras ocupadas por populações tradicionais. Existe também um acúmulo de conhecimento de cada povo ou comunidade que fica ameaçado. São saberes que vão desde informações sobre uso de plantas a modos de preservar o meio ambiente em uma área. “O arrendamento da terra [conforme proposto pelo governo Bolsonaro] é como tirar todo o conhecimento tradicional que estes povos têm, toda a tradição que têm no resguardo da floresta”, explicou Carlos Nobre, cientista e pesquisador do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), em entrevista ao UOL. Em 2014, um comunicado da Plataforma para Biodiversidade e Serviços do Ecossistema das Nações Unidas enfatizou que o conhecimento das comunidades indígenas de várias regiões tinha utilidade para áreas como agricultura, manejo florestal e exploração dos oceanos, assim como para cumprir as metas da biodiversidade global. “Os povos da floresta são detentores de bancos genéticos e promotores de novas variedades de agricultivares”, escreveu Mauricio Torres, doutor em Geografia Humana pela USP, em artigo de 2011 intitulado “A despensa viva: um banco de germoplasma nos roçados da floresta”, em que questiona a perda dessa diversidade agrícola frente à “uniformidade” do agronegócio. Em seu trabalho, Torres pontua que em comunidades, em que a história se baseia na transmissão oral, há uma “memória coletiva” interligada com a paisagem e a geografia de suas regiões. Para Eduardo Góes Neves, pesquisador do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (Universidade de São Paulo), autor de “Arqueologia da Amazônia” e coautor de “Unknown Amazon: Culture in Nature in Ancient Brazil” (Amazônia desconhecida: cultura na natureza no Brasil antigo, em tradução livre), desperdiçar esse patrimônio implica um grave problema ético. “Esse arranjo que compõe a diversidade do planeta tem milhares de anos e a nossa geração não tem o direito de acabar com isso”, afirmou ao Nexo, por telefone. Leia a entrevista completa abaixo. Quando se extingue ou se altera o território de um povo indígena, quais os riscos para o conhecimento que ele acumulou? Eduardo Góes Neves Corre o risco é de desaparecer também. Esse processo geralmente é muito violento e truculento e o processo de transmissão desse conhecimento também é demorado, é um diálogo que as sociedades vão construindo ao longo do tempo. A gente sabe de populações que têm contato há muitos anos com a sociedade nacional, mas que têm conhecimentos que ficam guardados naquele âmbito. E se formos pensar no conhecimento sobre bichos, dos ciclos da natureza, por exemplo, isso é muito importante diante dos desafios que temos pensando em lugares como na Amazônia, que a gente ainda nem conhece direito e estamos ocupando de maneira totalmente errada. É um tipo de conhecimento cujo desaparecimento é muito ruim, principalmente agora, com o mundo em que estamos vivendo, sentindo e percebendo com mais intensidade a mudança climática. Quando se fala em conhecimento indígena, pensamos primordialmente em plantas. O que mais a gente pode considerar? Eduardo Góes Neves É uma maneira diferente de olhar para o mundo. Cada maneira de olhar que é diferente da que consagramos, a tradição intelectual judaico-cristã, tem de ser respeitada pelo seu próprio valor. A gente fala de ontologias diferentes, maneiras de olhar para o mundo, de pensar a existência. Compartilhamos o mesmo planeta, mas somos populações com histórias culturais diferentes, então vivemos o desafio de aceitar essa unicidade que é biológica, mas ao mesmo tempo de respeitar todas as manifestações culturais, assim como as outras formas de vida que estão aqui, e não só humanas, mas animais, plantas. Claro que o conhecimento sobre a natureza é importante, mas estamos falando de um conhecimento sobre o mundo em geral, sobre o universo, no sentido mais amplo. Mas essa discussão não pode ser apenas utilitária, porque esses caras têm uma solução para os problemas que criamos no mundo. Claro que é importante, é legal saber para poder usar e aplicar, mas tem uma questão mais de fundo, de justiça. As sociedades ocidentais tem a força bélica, mas não temos o direito de fazer isso, se formos pensar num sentido mais profundo. Esse arranjo que compõe a diversidade do planeta tem milhares de anos e a nossa geração não tem o direito de acabar com isso, de zerar esse relógio. Você pode falar um pouco mais sobre como o conhecimento indígena colabora para manter a biodiversidade? Eduardo Góes Neves Uma coisa vai ficando cada vez mais clara: uma parte dessa biodiversidade da Amazônia foi formada por humanos, por uma interação entre humanos e não-humanos, plantas e animais, ao longo dos últimos 10, 12 mil anos. O que se percebe em populações tradicionais, não só indígenas, mas quilombolas também, e populações ribeirinhas, é o interesse em estimular a diversidade, experimentar plantas diferentes, plantar, colher, trazer para o quintal, ver para que serve, ver como funciona. Um exemplo: trabalhamos com restos de plantas preservadas arqueologicamente e temos de fazer coleções de referência para comparar, por exemplo, [vestígios de] plantas antigas com modernas para poder classificá-las. Percebemos que mais de 90% das plantas que encontramos não sabemos ainda quais são. Significa que estamos vislumbrando só uma parte inicial desse conhecimento. Esse processo de produção, de aumentar a biodiversidade, é muito interessante, mas o que temos oferecido para a Amazônia nos últimos anos é justamente o oposto: é reduzir a diversidade, é não saber manejar. E fazemos isso de uma maneira tecnologicamente muito avançada e máquinas super-modernas, como a gente vê lá no Cerrado, substituindo a biodiversidade por algumas poucas espécies de plantas e animais. Como vê o discurso que encara os indígenas como “animais no zoológico”, como se em estágio “inferior” ao do homem branco? Eduardo Góes Neves Existe aí uma espécie de racismo ambiental, porque a gente vem de uma tradição intelectual forjada em países nórdicos, de clima temperado, na Europa e na América do Norte, que tem um contexto geográfico e ecológico totalmente diferente e que vê as regiões tropicais como insalubres, marginais, periféricas, que tem de ser aprimoradas. Lembro quando descobri que a malária não era uma doença tropical em uma visita ao Instituto de Medicina Tropical, mas existia malária na Europa até o século 20, nos Estados Unidos também. O conceito de doença tropical não é natural, mas sim social, que tem a ver com pobreza, com o contexto dos trópicos. Existe uma relação de colonialismo interno que funciona da mesma maneira. Nosso discurso sobre a Amazônia é sempre de que ela tem de ser aprimorada, desenvolvida, ocupada, a partir de critérios que não têm nada a ver com essas regiões e que não respeitam populações que vivem lá há séculos, milhares de anos, e que desenvolveram formas de vida interessantes para esse tipo de ambiente. Faz sentido, no contexto atual, desvalorizar o conhecimento indígena para poder usar como justificativa [de ocupar suas terras]. Ninguém está preocupado com o país, se trata de negócios, tem muito dinheiro potencialmente disponível nessas terras. O paradoxal é que são terras públicas. É um discurso cínico: eles querem privatizar terras públicas dizendo que é pelo interesse nacional. Como é que uma terra pública pode ser contra o interesse nacional? Olhando historicamente, qual o tamanho da influência do conhecimento indígena na cultura e sociedade brasileiras? Eduardo Góes Neves Veja as matas de pinhão no sul do Brasil, por exemplo. Temos evidências de que são antrópicas, de que foram manejadas pelos ancestrais dos indígenas caingangue. Temos evidências de que o símbolo do estado do Paraná, a araucária, compõe matas que ganharam mais extensão pelo manejo humano, o que chamamos de domesticação da paisagem. A mandioca todo mundo sabe, mas tem a castanha, pupunha, amendoim, cacau, goiaba, tabaco, o açaí, que virou um produto de exportação, que gera muito dinheiro no norte do Brasil. É uma planta manejada há muito tempo. Saindo da Amazônia, temos exemplos como a batata, que é uma planta andina. Hoje, se pensamos em comida alemã e inglesa logo pensamos em batata. Tem muita planta consumida no mundo inteiro que resultou desse processo de manejo e seleção realizado por povos indígenas que vivem no continente americano há muito tempo. Esse conhecimento não funciona da mesma maneira que o método científico, mas ele vem de uma curiosidade que reflete uma forma de conhecimento que é sofisticada também. Desprezar isso tem uma questão ética, mas é também uma grande estupidez. É uma catástrofe.

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Crianças podem ser biólogos por um dia no Projeto Tamar (São Paulo-Ubatuba)

Crianças podem ser biólogos por um dia no Projeto Tamar

Crianças de 6 a 10 anos podem acompanhar o dia-a-dia das equipes que cuidam das tartarugas marinhas.

Quem já pensou em ser biólogo por um dia? O Projeto Tamar Ubatuba começa nesta terça-feira (22) uma nova atividade educativa. Crianças de 6 a 10 anos podem acompanhar o dia-a-dia das equipes que cuidam das tartarugas marinhas e conhecer de pertinho o trabalho com os animais e o que se faz há 39 anos para protegê-los.

Uma tarde com os biólogos e pesquisadores do Tamar seguindo os passos diários que acontecem no Centro de Visitação e Educação Ambiental e no Hospital Veterinário, apoiando e realizando atividades como: o banho na tartaruga marinha, o preparo da alimentação dos animais e o enriquecimento ambiental.

“Através do conhecimento, interação e vivência com as tartarugas marinhas, o propósito do programa educativo, que já acontece na Bahia desde 2017 e em outras bases do Tamar, além do despertar para a pesquisa e para a ciência, é promover a sensibilização e olhar de amor e cuidado para a conservação dos ecossistemas marinhos”, conta a coordenadora do Tamar Ubatuba, Berenice Gomes.

O Biólogo por Um Dia é para crianças de 6 a 10 anos e acontece as terças-feiras, das 14h às 18h, no Projeto Tamar Ubatuba/SP. Uma experiência inesquecível para quem já participou e relatou as reações das crianças, as descobertas, o aprendizado e a inspiração para a vida.

Como participar

Para participar do programa é necessário a apresentação com cópia de documento oficial com foto da criança e do responsável, o preenchimento do termo de autorização e do termo de uso de imagem. A inscrição deve ser realizada pelo menos com 24h de antecedência da realização da atividade.

Quando e onde

Quando: terças-feiras, das 14h às 18h
Onde: Projeto Tamar Ubatuba/SP
Podem participar: crianças de 6 a 10 anos
Informações e inscrições: (12) 3832-6202
Valor: R$ 150,00
Incluso: 1 Biológo por Um Dia 1 camiseta SOS
1 squeeze
1 mochila-saco
1 Lanche Integral (1 barrinha de cereais, 1 suco, 1 mix de pães de queijo, 1 sorvete)

Toques fazem plantas crescerem até 30% menos, revela estudo

A universidade australiana de La Trobe revelou recentemente que as plantas são senvíveis ao toque e que esse ato pode prejudicar significativamente seu crescimento. A descoberta foi feita com base em estudos com plantas do gênero Arabidopsis. Esses vegetais foram submetidos a vários estímulos de toque e mesmo os mais leves desencadearam uma grande resposta genética nesses seres vivos.


Pesquisa mostra que um simples esbarrão pode gerar alteração de 10% no genoma dos vegetais.





“Após um toque, dentro de meia hora, 10% do genoma da planta é alterado. Isso envolve um enorme gasto de energia que é tirado de outras funções do vegetal. Se o toque se repetir, o crescimento pode ser reduzido em até 30%”,  explica o diretor do instituto de agricultura da universidade e líder da pesquisa, o professor Jim Whelan. Os pesquisadores explicaram que a razão por trás dessa reação ainda não está clara. Entretanto, um dos motivos pode estar associado à defesa contra o ataque de insetos. A hipótese é que, quando um inseto pousa em uma planta, por exemplo, os genes são ativados para defendê-la.


Os resultados desse estudo, publicado na revista The Plant Journal, podem levar a novas abordagens para otimizar o crescimento e a produtividade de culturas agrícolas. “Por meio de técnicas de biologia molecular, esse gene poderia ser desativado em plantas cultivadas, permitindo a elas economizar toda essa energia que seria gasta para se defender de toques inofensivos”, ressalta Adriana Brondani, diretora-executiva do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB).


Para a executiva, essa característica pode ter sido uma resposta evolutiva às ameças. “É possível que as plantas selvagens tenham desenvolvido esse mecanismo de defesa contra toques porque insetos podem danificar suas folhas e caules, prejudicando seu desenvolvimento”, afirma. Entretanto, na agricultura, onde o plantio e o crescimento são constantemente monitorados, esse gene pode fazer com que a planta desperdice energia.

 “A edição genética poderia silenciar esse gene em culturas essenciais para a alimentação humana e animal, a exemplo da soja, milho, trigo, arroz e etc. Essa seria uma alternativa para tentar aumentar a produtividade sem incrementar a área cultivada, contribuindo, portanto, com a sustentabilidade da agricultura”, completa Adriana.


A pesquisa foi realizada com a espécie Arabidopsis thaliana, usada como modelo em pesquisas científicas. Entretanto, é provável que seja aplicável à maioria das plantas. O próximo passo da pesquisa será testar a resposta ao toque em outras espécies vegetais.


El País (Espanha/Edição Brasil) – Governo brasileiro liberou registros de agrotóxicos altamente tóxicos

El País (Espanha/Edição Brasil) – Governo brasileiro liberou registros de agrotóxicos altamente tóxicos


Entre eles está o Sulfoxaflor, que já foi acusado de exterminar as abelhas nos EUA.
A liberação desse produto ocorreu nos últimos dias do ano passado
PEDRO GRIGORI (AGÊNCIA PÚBLICA)
REPÓRTER BRASIL

Quarenta novos produtos comerciais com agrotóxicos receberam permissão para chegar ao mercado nos próximos dias. O Ministério da Agricultura publicou no Diário Oficial da União de 10 de janeiro o registro de 28 agrotóxicos e princípios ativos. Entre eles um aditivo inédito, o Sulfoxaflor, que já causa polêmica nos Estados Unidos. Os outros são velhos conhecidos do agricultor brasileiro, mas que agora passam a ser produzidos por mais empresas e até utilizados em novas culturas, entre elas a de alimentos.

Na edição desta sexta–feira (18/1) do Diário Oficial, a Coordenação–Geral de Agrotóxicos e Afins do Ministério Agricultura publicou lista com mais 131 pedidos de registro de agrotóxicos solicitados nos últimos três meses de 2018. Eles ainda passarão por avaliações técnicas de três órgãos do governo.

Especialistas ouvidos pela reportagem apontam uma aceleração na permissão de novos registros, que estaria em “nível desenfreado”.

As autorizações publicadas em 10 de janeiro foram aprovadas no ano passado, ainda durante o governo de Michel Temer (MDB). Nas duas primeiras semanas do Governo Bolsonaro, mais 12 produtos receberam registro para serem comercializados, segundo apuraram a Agência Pública e a Repórter Brasil. A aprovação sairá no Diário Oficial nos próximos dias, diz o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Em 2018, Brasil bateu recorde de aprovações de novos agrotóxicos

Dos 28 produtos já publicados, um é considerado extremamente tóxico, o Metomil, ingrediente ativo usado em agrotóxicos indicados para culturas como algodão, batata, soja, couve e milho. Além dele, quatro foram classificados como altamente tóxicos. Quase todos são perigosos para o meio ambiente, segundo a classificação oficial. Quatorze são “muito perigosos” ao meio ambiente, e 12, considerados “perigosos”.

Os mais tóxicos são o Metomil e o Imazetapir, o qual foi emitido registro para quatro empresas. Eles são princípios ativos, ou seja, ingredientes para a produção de agrotóxicos que serão vendidos aos produtores rurais.

Apenas três fazem parte do grupo de baixa toxicidade, o menor nível da classificação toxicológica: o Bio–Imune, Paclobutrazol 250 e o Excellence Mig–66, indicados para culturas de manga e até mesmo para a agricultura orgânica.

Segundo o Ministério da Agricultura, os produtos não trazem riscos se usados corretamente. “Desde que utilizado de acordo com as recomendações da bula, dentro das boas práticas agrícolas e com o equipamento de proteção individual, a utilização é completamente segura”, afirmou a assessoria de imprensa do órgão.

Dos 28 produtos com o registro publicado na última semana, 18 são princípios ativos e serão usados na produção de outros defensivos agrícolas. Vinte e um deles são fabricados na China, país que vem se consolidando como um dos maiores produtores, exportadores e usuários de agrotóxicos do mundo.

No ano passado, 450 agrotóxicos foram registrados no Brasil, um recorde histórico. Destes, apenas 52 são de baixa toxicidade.

Sulfoxaflor ligado ao extermínio de abelhas
Um produto polêmico fora do país é o Sulfoxaflor, aprovado nos últimos dias do Governo Temer, em 28 de dezembro, o único novo químico entre os 40 que tiveram o registro publicado.

Maioria dos químicos já estava liberada no mercado, mas agora pode ser vendida por novas empresas

O responsável pelo registro é a Dow AgroSciences, que faz parte da gigante americana Dow Chemical Company. O produto entrou em circulação nos EUA em 2013. Dois anos depois, organizações defensoras de polinizadores levaram ao Tribunal de Apelações de São Francisco a denúncia de que o uso do pesticida estaria ligado ao extermínio de abelhas. Eles solicitaram revisão da permissão de comercialização.

“O tribunal considerou que o registro não era apoiado por evidências que demonstrassem que o produto não era prejudicial às abelhas, e por isso retiraram o registro”, relata a decisão da Agência de Proteção Ambiental Americana (EPA). Em setembro daquele ano, o registro de todos os produtos à base de Sulfoxaflor nos Estados Unidos foram cancelados devido ao potencial extermínio de abelhas.

No ano seguinte, a agência americana deferiu uma nova licença para o produto, mas com ressalvas. “O Sulfoxaflor terá agora menos usos e requisitos adicionais que protegerão as abelhas. A EPA tomou essa decisão após uma análise cuidadosa dos comentários do público e do apoio científico”, informou a agência. A partir daí, o produto passou a ser proibido para culturas de sementes e só pode ser utilizado em plantações que atraem abelhas após a época do florescimento. Entre elas estão uva, tomate, pimenta, batata, feijão e cranberry.

As avaliações da Anvisa e do Ibama classificaram o Sulfoxaflor como medianamente tóxico e perigoso ao meio ambiente. É usado como ativo para agrotóxicos eficazes contra pragas de insetos que se alimentam de seiva da planta. Foi indicado para culturas de algodão, soja, citros, nozes, uvas, batatas, legumes e morangos.

A Dow AgroSciences abriu a solicitação de registro em 28 de junho de 2013, mas a aprovação do projeto só se apressou no fim de 2018. “A Anvisa convocou consulta pública para o produto no fim de novembro, que durou curtíssimo tempo. Com isso, debateu–se pouco um ativo que nos Estados Unidos chegou a ser proibido por um tempo”, explica Karen Friedrich, membro do grupo temático de saúde e meio ambiente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).

A Anvisa abriu a consulta pública durante 30 dias em 23 de novembro de 2018. O deferimento do registro pelos três órgãos ocorreu 35 dias depois.

Proibidos fora do país
Dos 40 registros aprovados no Brasil, 11 não são permitidos na União Europeia. Um deles é o Fipronil, inseticida que age nas células nervosas dos insetos e, além de utilizado contra pragas em culturas de maçã e girassol, é usado até mesmo em coleiras antipulgas de animais domésticos. O produto é proibido em países europeus como a França, desde 2004, também acusado de dizimar enxames de abelhas. É permitido no Brasil e, segundo o registro publicado no Diário Oficial, classificado como medianamente tóxico e muito perigoso ao meio ambiente. Ele é legalizado e indicado para culturas de algodão, arroz, cevada, feijão, milho, pastagens, soja e trigo.

A importância da preservação das abelhas é a relação direta entre a vida dos insetos e da humanidade. Na busca por pólen, elas polinizam plantações de frutas, legumes e grãos. “Na França, os apiários registravam morte de cerca de 40% das abelhas, a partir daí países da Europa começaram a proibir o Fipronil, que continua permitido no Brasil mesmo após sofrermos impactos semelhantes”, explica Murilo Souza, professor de recursos naturais do Cerrado na Universidade Estadual de Goiás.

Produtos à base de Imazetapir, herbicida aplicado por pulverização em culturas como a da soja, também são proibidos na União Europeia desde 2004. Quatro deles tiveram registro deferido por aqui. O Diquate, que está entre os ativos aprovados no Brasil na última semana, teve registro cassado na União Europeia no fim de 2018 após comissão de avaliação ter identificado alto risco para trabalhadores e residentes de áreas próximas à aplicação do produto, além de risco para aves.

O Sulfentrazona foi banido em toda a União Europeia em 2009 e nunca chegou às mesas do continente. Já no Brasil, o registro foi deferido no fim do ano para as empresas brasileiras Tradecorp, Rotam e da Nortox — todas têm indústrias na China como endereço de fabricante. E neste ano, mais três permissões, agora para as empresas brasileiras Ihara, Allierbrasil e Helm.

Pressão para aprovar rápido
Antes de chegar ao mercado, a substância precisa passar por avaliação do Ministério da Agricultura, Ibama e da Anvisa. Os órgãos fazem diversos testes para medir, por exemplo, o grau toxicológico e o potencial de periculosidade ambiental.

O prazo de avaliação de registro pode chegar a cinco anos, mas vem se tornando mais rápido. De acordo com o Ibama, a diminuição dos períodos de avaliação ocorre “devido ao aperfeiçoamento de procedimentos e incorporação de novos recursos de tecnologia de informação”, segundo a assessoria do órgão.

Já no Ministério da Agricultura, a aprovação mais rápida se deve a uma nova política que prioriza os produtos de baixa toxicidade, que contêm organismos biológicos, microbiológicos, bioquímicos, semioquímicos ou extratos vegetais. Para estes, o tempo médio total entre o pedido de registro e a conclusão do processo varia de três a seis meses. O que explica a rápida aprovação do Bio–Imune e do Excellence Mig–66.

O longo prazo de avaliação do registro é uma das principais críticas dos ruralistas, que apostam no Projeto de Lei 6.299/2002 para acelerar a liberação das substâncias. Conhecido pelos opositores como “PL do Veneno”, uma das medidas previstas pelo texto é que, caso o período de análise do químico passe de dois anos, o produto ganha o registro automaticamente.

No momento, o Ministério da Agricultura, a Anvisa e o Ibama estão avaliando o pedido de registro de mais 1.345 agrotóxicos e ingredientes ativos. Grande parte das empresas que querem vender esses produtos no Brasil é do exterior, como Estados Unidos, Alemanha e, principalmente, a China.

Como “farmácias em cada quadra”
Dos 40 produtos autorizados, 39 são ingredientes ativos ou pesticidas já permitidos no país. O pedido de registro de um produto anteriormente liberado é comum, segundo quatro especialistas consultados pela reportagem. “A partir do momento que as empresas produtoras iniciais perdem a patente, as demais começam a solicitar registro para usar esses ingredientes ativos e produzir novos produtos agrícolas”, explica Murilo Souza, da Universidade Estadual de Goiás.

Para Leonardo Melgarejo, vice–presidente da regional sul da Associação Brasileira de Agroecologia, a aprovação dos registros está em ritmo “desenfreado”. “Temos aprovadas variações sobre o mesmo item. Não precisamos de todos os produtos comerciais para uma mesma finalidade. Estamos chegando perto do lance da ‘automedicação’, com duas farmácias em cada quadra, todas vendendo variantes das mesmas drogas”, afirma.

Para o professor Murilo Souza, é surpreendente a rapidez com que as aprovações vêm ocorrendo. Ele critica também o fato de que produtos originalmente aprovados para determinada cultura sejam liberados para outras. “A maioria dos produtos são testados apenas em plantações de grande escala, como soja, algodão e cana de açúcar. Poucas pesquisas são feitas para entender os impactos nas culturas menores”, explica.