segunda-feira, 17 de abril de 2023

Legado Verdes do Cerrado: árvores são produzidas em reserva em Goiás para restauro de áreas degradadas e paisagismo urbano

 


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Legado Verdes do Cerrado: árvores são produzidas em reserva em Goiás para restauro de áreas degradadas e paisagismo urbano

Cerrado é o segundo maior bioma da América do Sul – ocupa mais de dois milhões de metros quadrados do território brasileiro – e, do ponto de vista da diversidade biológica, é reconhecido como a savana mais rica do mundo: segundo dados do Ministério do Meio Ambiente, abriga cerca de 11,6 mil espécies de plantas nativascatalogadas. E muitas a serem descobertas. 

No entanto, em 2020, já havia perdido 46% da vegetação nativa e apenas cerca de 20% permanecia intocado, de acordo com estudo realizado por pesquisadores do Instituto Internacional para a Sustentabilidade (IIS), entre outras instituições nacionais e internacionais, e divulgado em setembro desse ano, em artigo na revista científica Nature Ecology and Evolution.

Eles já diziam que, até 2050, o Cerrado poderia perder o que ainda restava se a taxa de desmatamento do bioma fosse mantida (já era 2,5 de vezes maior do que na Amazônia!), o que levaria à extinção de 1.140 espécies endêmicas, número oito vezes maior que o número oficial de plantas extintas em todo o mundo desde 1500, quando começaram os registros. Seria a maior perda de espécies vegetais do mundo!

Na ocasião, Bernardo Strassburg, professor da PUC-Rio, coordenador do estudo e secretário-executivo do IIS, declarou que a projeção apocalíptica dos pesquisadores já era uma combinação de dois fatores: o Cerrado é um hotspot global de biodiversidade – tem mais de 4,6 mil espécies de plantas e animais que não são encontrados em nenhum outro lugar do mundo, mas a classificação se deve principalmente às plantas! -, e já perdeu 52% de seu território.

Hoje, apenas 8,21% do bioma é legalmente protegido por Unidades de Conservação (UCs); deste total, somente 2,85% são UCs de uso sustentável. E a devastação ambiental se deve principalmente aos ataques do agronegócio, que substitui vegetação nativa por extensas áreas de monocultura e pecuária. E também por obras de infra-estrutura.

Como salvar o Cerrado?

Restaurar áreas menos degradadas já era apontado pelo estudo do ISS como uma forma de reverter até 83% do cenário de extinção. E é justamente essa a expertise do Centro de Biodiversidade do Legado Verdes do Cerrado, localizado na Reserva Particular de Desenvolvimento Sustentável de propriedade da CBA (Companhia Brasileira de Alumínio), em Niquelândia, norte de Goiás (a menos de 300 km de Goiânia e Brasília).

Criado em 2018, ele alia a conservação do bioma atividades da economia verde, promovendo o uso múltiplo do solo. Produz 200 mil mudas de espécies nativas por ano – algumas raras -, destinadas a diferentes tipos de projetos de recuperação de áreas degradadas, como também para paisagismo urbano

Trata-se de um dos maiores bancos de sementes do Cerrado no país, com 1,9 milhão de amostras de mais de 80 espécies diferentes – entre elas a aroeira, o angicobarucanela-de-emapitombaguarirobapequi e ipê -, que representam cerca de 12,5% da flora do bioma no Brasil. 

Banco de sementes do Centro Biodiversidade do Legado Verdes do Cerrado / Foto: divulgação

Cerca de 30 espécies produzidas têm propriedades para fármacos e indústria de cosméticos, como óleos essenciais, 70 espécies atendem o setor de ornamentação, 30 tem potencial madeireiro e 20 espécies são frutíferas.

David Canassa, diretor das Reservas Votorantim, explica que esse novo olhar para o negócio trouxe, além de melhorias estruturais, mudanças no modelo de trabalho, que incorporou pesquisa científica e tecnologia à produção vegetal. 

“As pesquisas são essenciais em duas frentes: a primeira é nos indicando quais as espécies com maior necessidade de conservação, ou seja, as raras ou ameaçadas de extinção. Já a segunda é como vamos produzi-las. Desse trabalho, identificamos as espécies com potencial ornamentaleconômico e conservacionista, aliando a ampliação da biodiversidade ao paisagismo urbano e serviços ecossistêmicos promovidos pelas plantas, como atração de avescontrole de pragas urbanas, conforto térmico, drenagem do solo, entre outros benefícios”, explica. 

O Centro Biodiversidade produz 200 mil mudas de espécies nativas por ano / Foto: Luciano Candisani

As plantas produzidas atendem à demanda de parceiros da Reserva, instituições e proprietários rurais, além de prefeituras, tanto em projetos de recuperação da flora, como de paisagismo. 

“As regiões brasileiras de Cerrado possuem uma enorme demanda de recuperação de áreas degradadas, incluindo o Estado de Goiás. Por outro lado, atualmente, são poucas as iniciativas de produção de espécies nativas em maior escala. Com o Centro de Biodiversidade do Legado Verdes do Cerrado, oferecemos soluções para essas áreas, da muda, plantio à manutenção, além de ajudar na arborização de centros urbanos e atender empreendedores no processo de compensação ambiental, contribuindo para a conservação do Cerrado,” acrescenta.

Foto: Luciano Candisani

E Canassa ainda chama a atenção para espécies com grande importância econômica e ambiental, e que estão na lista de espécies vegetais em risco de extinção.

“O pequi e o baru, por exemplo, são a base alimentar de muitas espécies da fauna do Cerrado, incremento de comunidades locais e, até mesmo, negócios de grande porte. Mas também são ameaçadas de extinção, tornando necessárias diferentes abordagens de conservação, entre elas a produção de mudas e árvores dessas espécies. Por isso, procuramos dar ênfase a produção que atenda às necessidades do mercado, mas também de conservação”, finaliza.

O Centro Biodiversidade alia a expertise das pesquisas científicas realizadas em seu território – em parceria com universidades – à produção inteligente de espécies nativas da flora do Cerrado para comercialização, com foco em paisagismo e restauração ecológica de áreas degradadas.

Sobre o Legado

Legado Verdes do Cerrado é uma área de 32 mil hectares (equivalente à cidade de Belo Horizonte ou à Bélgica) de propriedade da CBA – Companhia Brasileira de Alumínio (uma das empresas do portfólio da Votorantim S.A.) e tem aproximadamente 80% de sua área composta por Cerrado nativo.

Trecho da floresta do Legado Verdes do Cerrado / Foto: Luciano Candisani

A área fica a cerca de três horas de Brasília e é dividida em dois núcleos: Engenho e Santo Antônio Serra Negra.

No Engenho está a sede do Legado Verdes do Cerrado, que ocupa 28 mil mil hectares:
– 23 mil hectares são dedicados a pesquisas científicas (em parceria com universidades)ações de educação ambiental e atividades da nova economia, como produção de plantas e reflorestamento; 
– os 5 mil hectares restantes são dedicados à pecuária, produção de soja e silvicultura. 

Nessa região, já foram descobertas 16 novas espécies de plantas, entre elas a Eythroxylum niquelandense (batizada em homenagem a Niquelândia), semelhante à pimenta-do-mato e muito valorizada na indústria farmacêutica devido a propriedades utilizadas em medicamentos para tratamentos de doenças como câncer e AIDS.  

Ela foi descrita e ilustrada em trabalho publicado pelos pesquisadores Marcos José da Silva e Maria Iracema Bezerra Loiola na revista científica Phytotaxa Magnolia Press, em janeiro de 2021.

Erythroxylum niquelandense é uma planta de folhas simples e frutos vermelhos, cujas propriedades são utilizadas em medicamentos para o tratamento de doenças como câncer e AIDS / Foto: Marcos Silva

Nessa parte do Legado estão as nascentes de três rios – Peixe, São Bento e Traíras -, de onde é captada a água que abastece o município de Niquelândia. 

Já no núcleo Santo Antônio Serra Negra, que ocupa 5 mil hectares, está a área de cerrado nativo intocado, margeada, em parte, pelo Lago da Serra da Mesa.

Nessa área, o Legado já registrou 1670 espécies de fauna e flora, sendo 67 endêmicas do Cerrado, que representam 2% de todas as espécies endêmicas do bioma.

Em 2019, foi feito o primeiro registro de onça pintada (até agora, foram cinco) no Legado, visto que a área é corredor ecológico para a espécie. 

Em 2022, o Legado foi primeira área do bioma a emitir créditos de carbono na América Latina pelo programa REED – Cerrado.

A seguir, uma seleção de 11 flores encontradas no Cerrado, alguma só lá, para seu deleite:

Conhecida por Algodão-do-Cerrado, a Cochlospermum regium não é exclusiva do Cerrado: é um arbusto amplamente distribuído nos biomas brasileiros: também pode ser encontrada na Mata Atlântica e Amazônia. Além de sua beleza, ela muito apreciada pelo uso medicinal: a casca da sua raiz pode ter inúmeras aplicações, principalmente em chás e garrafadas para combate à inflamação uterina e regulação menstrual / Foto: Luciano Candisani
Cajuzinho-do Cerrado é uma espécie nativa deste bioma e muito popular. Também é conhecida como CajuíCajuzinho-do-campo, seus pseudofrutos são pequenos, suculentos e muito utilizados em sucos, bebidas, doces, ou consumidos ao natural. Também tem uma castanha que produz um óleo muito utilizado para fins medicinais por sua ação antisséptica / Foto: Luciano Candisani
Canela-da-Ema (Vellozia squamata) também é conhecida como Fênix do Cerrado pelo seu alto poder de regeneração / Foto: Luciano Candisani
Deianira erubescens faz parte da família Gentianaceae e é conhecida como Boca-de-Sapo. Uma curiosidade é que essa planta é uma erva e, no Cerrado, pode ser encontrada tanto em formações florestais, na borda de mata de galeria, quanto em formações savânicas e campestres/ Foto: Luciano Candisani
Diplusodon sessiliflorus (Lythraceae) é um subarbusto ou arbusto e cresce principalmente no Cerrado / Foto: Luciano Candisani
Foto: Luciano Candisani
Esta é a Mimosa Claussenii, uma espécie endêmica do Cerrado, ou seja, só é encontrada neste bioma / Foto: Kamylla Barboza
Este é o Murici Rasteiro / Foto: Luciano Candisani
Pachira aquática, da família das Bombacaceae, é popularmente conhecida como cacau selvagem, pois seus frutos são muito parecidos com os do cacaueiro / Foto: Luciano Candisani
Pavonia Grandiflora / Foto: Luciano Candisani
Psittacanthus cinctus é uma espécie de rara beleza encontrada no Cerrado e também na Amazônia. É uma hemiparasita, ou seja, se fixa em outra planta lenhosa, chamada de hospedeiro, mas não é completamente dependente dela, podendo viver também sem esse apoio. Muito comum no Pará, Amazonas, Amapá, Rondônia, Bahia e em Goiás / Foto: Luciano Candisani

Foto (destaque): Luciano Candisani