quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Queimadas na Amazônia em 2019 seguem o rastro do desmatamento


Queimadas na Amazônia em 2019 seguem o rastro do desmatamento

20.08.2019 • Notícias

daisy photographed from below
O número de focos de calor registrados na Amazônia já é 60% mais alto do que o registrado nos três anos anteriores. O pico tem relação com o desmatamento, e não com uma seca mais forte como poderia se supor, segundo nota técnica sobre a atual temporada de queimadas que o IPAM (Instituto de Pesquisas Ambiental da Amazônia) divulga hoje.


De 1º de janeiro a 14 de agosto, 32.728 focos foram registrados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) no bioma. Uma das hipóteses para explicar a alta em 2019 seria uma estiagem intensa, como registrada em 2016. Mas ela não se confirmou: apesar da seca, há mais umidade na Amazônia hoje do que havia nos últimos três anos.

Se a seca não explica as queimadas atuais, a retomada da derrubada da floresta faz isso. O fogo é normalmente usado para limpar o terreno depois do desmatamento, e a relação entre os dois fatores é positiva em uma análise entre os focos de calor e o registro de derrubada feito pelo Sistema de Alertas de Desmatamento (SAD).

“Não há fogo natural na Amazônia. O que há são pessoas que praticam queimadas, que podem piorar e virar incêndios na temporada de seca”, explica a diretora de Ciência do IPAM, Ane Alencar, uma das autoras da nota. “Mesmo em uma estiagem menos intensa do que em 2016, quando sofremos com um El Niño muito forte, o risco do fogo escapar é alto.”

A fumaça desencadeia uma série de problemas respiratórios em quem mora na região, o que gera ainda gastos com saúde pública e prejuízos econômicos pela ausência de funcionários. No Acre, que a nota destaca como exemplo, os satélites já registraram 1.790 focos de calor, número 57% mais alto do que em 2018 e 23% mais alto do que em 2016, com cidades respirando uma quantidade de material particulado muito acima do que é recomendado pela Organização Mundial de Saúde.

“As consequências para a população são imensas. A poluição do ar causa doenças e o impacto econômico pode ser alto”, diz o pesquisador sênior do IPAM Paulo Moutinho. “Combater o desmatamento, que é um vetor das queimadas, e desestimular o uso do fogo para limpar o terreno são fundamentais para garantir a saúde das pessoas e das florestas.”


CORREDOR TRIPLO A: A Nova Ameaça à “SOBERANIA BRASILEIRA NA AMAZÔNIA”

CORREDOR TRIPLO A: A Nova Ameaça à “SOBERANIA BRASILEIRA NA AMAZÔNIA”

Um real, possível e provável argumento para desenvolvermos interessantes e preocupantes Hipóteses de Conflito do Brasil.

Corredor Biológico ANDES - AMAZÔNIA - ATLÂNTICO como apresentado pela Fundação Gaia Amazonia em 2015

CORREDOR TRIPLO A: A NOVA AMEAÇA À “SOBERANIA BRASILEIRA NA AMAZÔNIA”
Carlos Alberto Pinto Silva[1]

Um real, possível e provável argumento para desenvolvermos interessantes e preocupantes Hipóteses de Conflito do Brasil.
 
“A observância do comportamento dos governantes, a orquestração da mídia quase sempre desfavorável a um país, a manutenção de exigências absurdas nos campos político e econômico, a “Satanização” da futura vítima, ao mesmo tempo que campanhas bem dirigidas buscam minar o moral nacional da população do país alvo são indícios claros do preparo da opinião pública mundial para aceitar  uma ação” baseada na nova Doutrina da ONU, o princípio da “Responsabilidade de Proteger”

O Documento Final da Cimeira de 2005 [2], na ONU, estipula que Estados devem proteger suas populações de genocídio, crimes de guerra, limpeza étnica e todos os outros crimes contra a humanidade. Quando obrigação não é cumprida, a comunidade internacional tem de interferir, em tempo útil, com uma ação coletiva decidida por intermédio do Conselho de Segurança, em conformidade com a Carta da ONU. Isso ocorre porque concilia o conceito de soberania [3] com a responsabilidade que o Estado possui em proteger sua própria população de graves violações de direitos humanos.

No estado atual das relações de força entre as grandes potências e os outros países, é inteiramente legítimo recear uma “manipulação do conceito”, que não constituiria, aliás, nada de novo. Nos lembra Noam Chomsky, que o Japão invocou a responsabilidade de proteger para invadir a Manchúria e que Hitler fez o mesmo em relação à Polônia.

É importante ressaltar que segundo a ONU a comunidade internacional deve conhecer o princípio da “Responsabilidade de Proteger”, e quando um Estado não é capaz, ou não assume a responsabilidade de aplicá-lo, essa ação recai sobre a comunidade internacional.

A ONU abrandou o termo“direito de ingerência” que salientava o papel dos países interventores, evidenciando, o “direito de ser protegido”, ou seja, evidenciando aposição dos beneficiários das intervenções.

Reavivemos alguns casos usados[4] referentes a cobiça e ao desejo antigo de internacionalizar a Amazônia: 

- A tese defendida, em 1850, pelo chefe do Observatório Naval de Washington, Mathew Maury, propunha a ocupação norte-americana da Amazônia, expandindo a produção de algodão daquele país, desviando toda a sua estrutura, incluindo os escravos africanos, para a região, como forma de evitar uma guerra civil entre o norte e o sul;

- A tentativa da UNESCO, em 1948, de criação do Instituto Internacional da Hileia Amazônica, aceita pelo Brasil, e tão somente depois, rejeitada pelo Congresso;

- A proposta do Hudson Institute e, apresentada em 1967 e intitulada "Plano Mar Mediterrâneo" previa a construção de sete lagos (quatro no Brasil e três na Colômbia) na floresta amazônica e a abertura de uma hidrovia interior, com saída para o Pacífico, alternativa ao Canal do Panamá;

 - A persistente campanha, desde 1981, do Conselho Mundial de Igrejas Cristãs, para a criação de "nações indígenas";

O professor Marcos Coimbra [5], ainda nos mostra:

Frases que servem para amplificar o temor dos que identificaram uma antiga conspiração internacional em relação a Amazônia. De Madeleine Albright, Secretária de Estado dos EUA (1997–2001): “Quando o meio ambiente está em perigo, não existem fronteiras”. Do ex-presidente francês François ­Mitterrand: “Alguns países ­deveriam abrir mão de sua soberania em favor dos interesses globais”. Ou do ex-presidente russo Mikhail Gorbachev: “O Brasil deve delegar parte de seus direitos sobre a Amazônia aos organismos internacionais”. Ou, por fim, do ex-vice-presidente dos EUA Al Gore: “Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é só deles, mas de todos nós”.

Triplo A: a nova ameaça à “soberania brasileira na Amazônia”.

Em 2015, “no Dia Mundial do Meio Ambiente, o Brasil se viu diante de uma proposta do presidente da Colômbia para criar um “corredor ecológico” que iria dos Andes ao Atlântico, passando pela Amazônia”.

Uma grande área de 200 milhões de hectares onde vivem 30 milhões de pessoas, entre seus habitantes 385 povos indígenas, de oito países sul-americanos. Seria no total, 309 áreas protegidas (957.649 km2) e 1.199 terras indígenas (1.223.997 km2) ligadas pelo imenso corredor.
Você sabe o que é “Corredor Triplo A”? É uma questão de soberania! Minha missão como Comandante do @exercitooficial, preocupado com interesses nacionais, é indicar os riscos dessa proposta para o país. Precisamos discutir profundamente com a sociedade. NOSSA SOCIEDADE!
3.075 pessoas estão falando sobre isso

No dia 19 Setembro 2018  então Comandante do exército Gen Ex Eduardo Villas Boas postou na sua conta do Tweeter


De acordo com Maestri[6], de fato, o envolvimento da Gaia Foundation na proposta do Triplo A é mais um indício “de uma direção em termos de ocupação de espaço por outros países”.[7]

A ideia que ainda gera controvérsia tem feito os olhos de muitos ambientalistas brilharem, assim como os de gestores políticos que vislumbram nesta como sendo uma grande contribuição da América Latina para a conservação da biodiversidade e evitar os impactos drásticos da variação do clima.

Acresce o “Sínodo a ser realizado no Vaticano, de 06 a 29 de outubro, um encontro global de 250 Bispos para discutir a realidade de índios, ribeirinhos e demais povos da Amazônia, políticas de desenvolvimento dos governos da região, mudanças climáticas e conflitos de terra. Avalia-se que os setores da Igreja aliados a movimentos sociais e partidos de esquerda, integrantes do chamado “clero progressista”, pretenderiam aproveitar o Sínodo para criticar o governo Bolsonaro e obter impacto internacional” [8].

“Países em que as suas populações mal sabem o que é o Brasil, onde fica, qual a sua expressão ou que língua é aqui falada, têm, na atual conjuntura, em seu noticiário de todo tipo, de modo praticamente diário, mensagens em que se diz que o Brasil desrespeita minorias, migrantes, tem um governo fascista, está no limiar da total destruição de toda Amazônia, está em vias de terminar com o oxigênio do mundo, com os índios, e a poluição gerada no Brasil alarga o buraco de ozônio que causa o câncer por todo o resto do mundo”.  

O que ocorre na região amazônica pode ser importante para o resto do mundo, mas é, antes de tudo, de grande importância para o próprio Brasil, que deve assumir a liderança na busca de soluções que conciliem o ideal de conservação ambiental com a soberania e os objetivos de desenvolvimento econômico, de que não abriremos mão.

Neste contexto, as motivações futuras para uma intervenção armada internacional ou ingerência política no Brasil poderão ser a defesa do meio ambiente; dos direitos dos povos indígenas; a falta de proteção aos mananciais de água; o uso abusivo e incorreto da água no agronegócio; a falta de proteção ao Pantanal e aos Aquíferos Guarani e Alter do Chão; a proteção de minorias; a violência urbana; as riquezas da Amazônia Verde e Azul; e até a prisão de líderes políticos.

Verificamos, portanto, que usando o princípio da “Responsabilidade de Proteger”, pretextos para aventuras internacionais em nosso território não faltam. [9]

De tudo apresentado e buscando dentre as nações que dispõem de poder, creio que teremos um real, possível e provável argumento para desenvolvermosinteressantes e preocupantes Hipóteses de Conflito do Brasil.

“Ao governo, as Forças Armadas, e aos Diplomatas, responsáveis pela defesa externa do país, não cabe “achar que não é possível” ou dar preferência às suas simpatias. Cabe-lhes tomar providência para nunca ser surpreendido ou derrotado, apesar de todas as carências.”
 
Assunto Relacionado:

Gen Ex Pinto Silva - A nova Doutrina da ONU "Responsabilidade de proteger" versus os interesses Nacionais Brasileiros




[1]Carlos Alberto Pinto Silva / General de Exército da reserva / Ex-comandante do Comando Militar do Oeste, do Comando Militar do Sul e do Comando de Operações Terrestres; Membro da Academia de Defesa e do CEBRES.
 
[2] Princípio da “Responsabilidade de Proteger”.
 
[3] “A soberania não deve ser um escudo atrás do qual os governos ou os grupos armados possam se esconder, a discussão com relação à soberania está em evolução.” Richard Feinberg – ex-assessor do então Presidente Bill Clinton para Segurança Nacional e Preside.
 
[5] Ex-docente de Economia na Universidade Cândido Mendes e na UERJ, membro da Academia Brasileira de Defesa e do CEBRES.
 
[6] O Professor visitante de Engenharia Hidráulica na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Link: https://thoth3126.com.br/a-nova-ameaca-a-soberania-brasileira-na-amazonia-projeto-triplo-a/
 
[8] Planalto vê Igreja Católica como potencial opositora. Jornal o Estado de São Paulo ,10/03/2019 - https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,planalto-ve-igreja-catolica-como-potencial-opositora,70002714758

Disponibilizado no DefesaNet  Link

 

Fogo já engoliu as florestas de Rondônia.Ttratava-se de um incêndio criminoso, o fogo ateado de propósito à beira das rodovias para implantação de loteamentos.


Fogo já engoliu as florestas de Rondônia

Em 1998, reportagem do Estado de Minas viu de perto a destruição criminosa de 20% das reservas florestais do estado, na Amazônia Resultado de imagem para fogo Rondonia imagens










As imagens da Amazônia fumegante correm o mundo hoje: a copa das árvores envolta em fumaça como sentinelas do fim do mundo, o círculo do fogo ampliando seus tentáculos mata adentro e os olhos da humanidade atônitos diante da destruição. Cenas dramáticas que comprometem o presente e põem em risco a vida futura, pois há um passado tenebroso. Há 21 anos, em março e abril de 1998, o quadro era tão dilacerante como agora e o foco principal estava em Roraima, onde chegaram cerca de 1,4 mil bombeiros de vários estados brasileiros para tentar apagar as labaredas. O Exército montou uma operação de guerra tal as dimensões do território atingido, e bombeiros venezuelanos e argentinos cooperaram nos dias e noites de combate.

No fim de março de 1998, 20% de Roraima já tinha sido devastado, conforme registrou a equipe enviada pelo Estado de Minas ao Norte do Brasil. E pior: o fogo ameaçava as aldeias indígenas. Caminhando ou olhando do helicóptero do Batalhão de Missões Especiais da Polícia Militar de Minas Gerais, a região amazônica ardia e clamava por salvação. Chuvas esporádicas traziam algum alívio, mas nada de acabar com o suplício da natureza e da população.

As autoridades federais e estaduais levantaram diversas hipóteses para o incêndio monumental, sempre com uma certeza: tratava-se de um incêndio criminoso, o fogo ateado de propósito à beira das rodovias para implantação de loteamentos. As investigações apontavam também para as queimadas pré-plantio, prática antiga e altamente nociva para o solo e todo o meio ambiente. Ao mesmo tempo, deputados federais integrantes das comissões da Amazônia e Desenvolvimento Regional e do Meio Ambiente, da Câmara, “queriam saber se houve falha na mobilização do governo federal para traçar o plano de socorro a Roraima”.

Numa manhã quente e enfumaçada, a equipe do EM flagrou um homem de 82 anos, morador de Vila Iracema, a 90 quilômetros de Boa Vista, riscando um fósforo e pondo fogo no mato. Juntando folhas e pedaços de pau, o senhor, protegido do sol com seu chapéu de palha, contou aos repórteres, meio sem jeito, que estava “tentando apagar o fogo”. Mas a situação era outra, tanto que, assustado, bateu logo em retirada para deixar entregue à sorte a vereda de buritis. Em pouco tempo, a propriedade de 90 hectares começou a evaporar e o ar a ficar ainda mais contaminado.

Nesse cenário sombrio, os indígenas não queriam perder tempo, e aguardavam a chegada de um pajé de Mato Grosso para a famosa dança da chuva – eles chegaram com sua cultura, tradição e mistérios. Fizeram chover. Usando cipós e pedaços de bambus, os índios caiapós Kukrit (xamã) e Mati-I conduziram um ritual, com duração de 40 minutos, na madrugada de 30 para 31 de abril, às margens do Rio Branco. A área foi cercada a estranhos para não haver “interferências espirituais”, conforme explicaram.

AJUDA EXTERNA

A tenebrosa seca na região amazônica e consequente incêndio florestal sensibilizou autoridades da Alemanha, que enviou alimentos aos “flagelados do fogo”, antecipando-se ao socorro do Comunidade Solidária, programa social criado três anos antes na gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Caminhões carregados com 51 toneladas de cestas básicas foram enviados ao Noroeste de Roraima, a fim de atender a cerca de 2 mil famílias indígenas dos povos mucuxi wapixana. Os recursos, também para compra de remédios, foram mandados pela Agência de Cooperação Técnica (GTZ) do governo alemão.

Depois da chuva, veio a confirmação de que o incêndio estava sob controle – pelas imagens do satélite operado pela Embrapa em parceria com o Exército, havia apenas 5% de focos. Assim, os bombeiros argentinos e venezuelanos voltavam para casa, enquanto os militares brasileiros faziam o rescaldo. Mas parece que a lição de cinzas não foi aprendida. Quem sabe, esquecida.

Depoimento

Fogo no paraíso

“Não parece que foi ontem – parece que foi hoje de manhã, tal a clareza de imagens na cabeça. Numa segunda-feira ensolarada, embarcamos, o fotógrafo Marcelo Sant'Anna e eu, do Estado de Minas, para a cobertura do incêndio que transformava Roraima em centro do mundo, atraindo repórteres de todos os paíse, com os mais modernos (para a época) equipamentos de transmissão de dados. Do aeroporto da Pampulha, junto com os bombeiros de Minas e integrantes do Batalhão de Missões Especiais, transportados num avião Hércules da Força Aérea Brasileira (FAB), seguimos rumo a Fortaleza. Nessa capital, ganhamos a companhia dos bombeiros cearenses.

Chegamos a Boa Vista (RR) tarde da noite. No dia seguinte, o comandante do Exército responsável pelas ações explicou que estava montada ali uma operação de guerra. O inimigo: o fogo. E como ele era avassalador e destemido. Labaredas destruíam árvores frondosas da floresta tropical em questão de minutos, caminhos ficavam interditados e a fumaça tornava o ar quase irrespirável.

Ver um homem colocando fogo no mato foi um choque – aí vimos que o fogo tinha aliados. A cena nunca despregou da memória, pois tenho certeza de que o senhor com seu chapéu de palha aprendeu tal prática com o pai. Pode ser que tenha ensinado ao filho e ao neto. Nesse dia, demos carona a dois repórteres ingleses que estavam meio perdidos no caminho e, de imediato, documentaram o flagrante.

No dia seguinte, foi nossa vez de ficar perdido. A floresta é um universo mágico, pois encanta, confunde, num misto de raios de luz e muitas sombras. Por sorte, encontramos os bombeiros do Ceará, em barracas, que nos levaram para Boa Vista. Curiosamente, tudo se tornava moeda. Perguntamos a um homem, numa rua da capital, sobre a direção de uma cidade e ele queria nos cobrar R$ 5... isso em 1998. Recusamos.

Um dos momentos mais fortes da cobertura, sem dúvida, foi o encontro com os indígenas caiapós, que, com seus rituais, “chamavam” a chuva. Mistérios de homens que conhecem os ciclos da Terra e, principalmente, respeitam cada palmo do seu chão. E não é que, logo depois, choveu?” (Gustavo Werneck)

Com aprovação de mais agrotóxicos à base de Sulfoxaflor, apicultores temem novo extermínio de abelhas


Com aprovação de mais agrotóxicos à base de Sulfoxaflor, apicultores temem novo extermínio de abelhas


Última leva de aprovações do governo Bolsonaro incluiu seis produtos com Sulfoxaflor; pesticida é apontado como causador de morte de enxames

abelha morta

Por Pedro Grigori, Agência Pública/Repórter Brasil


A Pública

Se o número de abelhas mortas desde o final do ano passado assusta – foram mais de 500 milhões em três meses –, apicultores brasileiros se preparam para uma realidade ainda pior este ano.
Isso porque, além dos agrotóxicos que já causam mortandade segundo diversos estudos, o governo de Jair Bolsonaro aprovou nada menos que seis produtos à base de Sulfoxaflor, ingrediente ativo que causa polêmica nos Estados Unidos e Europa devido ao potencial risco às abelhas.

“Estamos ainda mais preocupados agora devido à aprovação de tantos pesticidas neste ano”, conta Professora aposentada de química na Universidade Federal de Goiás (UFG) e presidente e sócia-fundadora da Associação dos Apicultores do Estado de Goiás (Apigoiás), Maria José Almeida. “No Centro Oeste, mais mortes ocorrem na época da dessecação da soja, que começa agora. Aplicam venenos altamente tóxicos para as abelhas, e o resultado são apiários inteiros mortos. No último ano chegamos a pegar pelo estado entre 60 e 80 caixas com todas as abelhas mortas”. Cada caixa pode abrigar entre 30 mil e 100 mil abelhas.

“Na nossa região são muitas as causas de morte de abelhas. A associação foi criada em 1980, e sempre foi algo comum termos casos onde morrem um enxame ou outro, mas nunca na proporção que vem ocorrendo nos últimos anos”, diz.

Em Pernambuco, a situação é semelhante. No começo do mês, o Ministério Público estadual recebeu denúncia de mortandade de abelhas no Vale do Rio São Francisco. Segundo a Associação dos

Criadores de Abelhas de Petrolina, há três anos, os 32 associados retiravam anualmente cerca de 30 toneladas de mel, número que caiu para 20 toneladas.

Os apicultores ouvidos pela reportagem reclamam que os inseticidas relacionados ao massacre do último ano, o Fipronil e os neonicotinoides Clotianidina, Imidacloprid e o Tiametoxam, ainda continuam no mercado, sem a conclusão da Avaliação do Potencial de Periculosidade Ambiental (PPA) feita pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Além disso, a chegada de pesticidas à base de Sulfoxaflor ao mercado brasileiro também preocupa. Trata-se de um produto que faz parte do grupo químico das sulfoxaminas, desenvolvido pela Dow AgroSciences desde 2013. Rapidamente, o inseticida tornou-se um fenômeno de vendas, aprovado em mais de 80 países, como Estados Unidos, Canadá, Austrália, Japão e China.

No Brasil, o produto técnico Sulfoxaflor teve a aprovação publicada no 1º ato de 2019 da Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins do Ministério da Agricultura. Segundo o governo, o ingrediente ativo foi aprovado no ano passado, pelo antigo Governo, mas a publicação no Diário Oficial ocorreu apenas em 10 de janeiro.

Já em 22 de julho, seis produtos agrotóxicos à base de Sulfoxaflor obtiveram a permissão para serem comercializados. Eles foram classificados como “medianamente tóxicos” e “perigosos ao Meio Ambiente” e liberados para as culturas de algodão, citros, feijão, melão, melancia, soja, tomate e trigo.

Os novos agrotóxicos chegarão às lojas com os nomes Verter SC, Exor SC, Closer SC, Exor, Verter, Closer, todos comercializadas pela Corteva Agriscience — empresa que antes pertencia à gigante DowDupont (fusão da Dow AgroSciences com a Dupont) mas que foi desmembrada e se tornou, este ano, um braço independente para cuidar apenas da área agrícola, incluindo agrotóxicos. No entanto, apesar de a comercialização ser feita pela Corteva, as patentes dos produtos são da Dow, que fez o pedido antes da fusão. A Agência Pública e Repórter Brasil perguntaram à Corteva quando os produtos chegarão aos prateleiras, mas, alegando motivos comerciais e estratégicos, a empresa não revelou a data de lançamento.


Estudos são sigilosos
Para evitar o impacto nas abelhas, o Ibama impôs regras para o uso do Sulfoxaflor. Entre elas, a restrição de aplicação em períodos de floração das culturas, o estabelecimento de dosagens máximas do produto e de distâncias mínimas de aplicação em relação à bordadura para a proteção de abelhas não-apis, sem ferrão funcional. Essas restrições constarão na rotulagem dos produtos e são estabelecidas de acordo com cada ingrediente e cultura.

“Do ponto de vista da saúde humana, o Sulfoxaflor está entre os inseticidas 20% menos tóxicos hoje aprovados. Há um possível impacto sobre insetos polinizadores, por isso a importância da avaliação do Ibama. Foram apresentados estudos técnicos sobre o impacto dos resíduos nas abelhas para determinar o que pode ou não ser aprovado. O Ibama tem a liberdade técnica de aprovar ou reprovar o produto ou estabelecer restrições de uso que garantam a segurança para os insetos polinizadores”, explicou à reportagem o coordenador-geral de Agrotóxicos e Afins da Secretaria de Defesa Agropecuária, Carlos Venâncio.

Para entender melhor os potenciais impactos, a reportagem solicitou via Lei de Acesso à Informação ao Ministério do Meio Ambiente os estudos técnicos do Sulfoxaflor, mencionados pelo coordenador. O pedido foi negado pelo órgão, com base na Lei 10.603 de 2002, que estabelece que novos produtos aprovados para comercialização têm proteção de 10 anos de sigilo nas informações.

Tanto o Sulfoxaflor quanto pesticidas neonicotinóides funcionam atingindo o sistema nervoso central dos insetos. A professora da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília (UnB), Cristina Schetino explica que, no caso dos neonicotinóides, o efeito nas abelhas ocorre alterando a capacidade de aprendizagem e memória. Algumas inclusive não conseguem encontrar o caminho de volta para a colmeia.

“O Sulfoxaflor, portanto, vem sendo considerado como uma alternativa aos neonicotinóides, que foram banidos de vários países, tendo em vista seu reconhecido impacto sobre polinizadores. Uma das vantagens atribuídas ao Sulfoxaflor está no fato de que ele apresenta residual mais curto: após 5 dias da aplicação, a concentração residual do chega a cair em até 20 mil vezes”, diz Cristina Schetino. Porém, diz ela, estudos recentes já mostram consequências do uso do Sulfoxaflor nas abelhas.

O principal deles é de 2018, feito por professores da Universidade de Holloways, em Londres, e publicado na revista científica Nature, alertando para os riscos do Sulfoxaflor para as abelhas. No experimento, abelhas Bombus terrestris, conhecida no Brasil como mamangaba-de-cauda-amarela-clara, foram submetidas ao inseticida, o que levou a uma redução da capacidade de reprodução e da taxa de crescimento das colônias.

A especialista acrescenta que existem riscos na aplicação mesmo fora da época de floração. “Há espécies vegetais, que também têm glândulas de nectário nas folhas, tornando-as atrativas para as abelhas até mesmo na época onde só há a planta”, explica.

Por meio da assessoria de imprensa, a Corteva Agriscience enviou nota à Agência Pública e Repórter Brasil garantindo que os produtos à base de Sulfoxaflor que chegarão ao mercado brasileiro passaram por todos os testes necessários. “Foram realizados pela companhia diversos estudos laboratoriais para avaliar a toxicidade aguda e crônica para abelhas adultas e larvas; estudos de resíduos em néctar e pólen; e análise sobre o impacto em colônias de abelhas. Os estudos conduzidos seguiram as normas de qualidade reconhecidas internacionalmente e comprovaram que não há efeitos sobre o desenvolvimento das colônias de abelhas quando expostas aos resíduos de pólen e néctar”, escreveu a companhia.

“A empresa enfatiza, ainda que, antes de solicitar o registro de qualquer um de seus produtos, realiza uma série de pesquisas para averiguar o desempenho de suas novas tecnologias, avaliando, inclusive, todo possível impacto ambiental. Dessa maneira, a companhia assegura que, quando usado de acordo com as recomendações da bula, Sulfoxaflor não representa risco para as abelhas”, afirma a nota.
Questionados na justiça, produtos da Dow Agrosciences voltam ao mercado durante governo Trump

Desde 2015, o Sulfoxaflor está envolvido em polêmicas. Naquele ano, organizações que defendem abelhas levaram ao Tribunal de Apelações de São Francisco, nos Estados Unidos, a denúncia de que o uso do inseticida estaria ligado ao extermínio de abelhas, pedindo a suspensão da venda de produtos à base do químico. Segundo a Agência de Proteção Ambiental Americana (EPA), “o tribunal considerou que o registro não era apoiado por evidências que demonstrassem que o produto não era prejudicial às abelhas, e por isso retiraram o registro”.

Mas o produto não ficou muito tempo longe das prateleiras. Em 2016, a EPA aprovou uma nova licença, com requisitos adicionais para proteger as abelhas. A partir daí, o produto passou a ser proibido para culturas de sementes, e só pode ser utilizado em plantações que atraem abelhas após a época do florescimento.

Três anos depois, veio uma nova decisão. Em julho de 2019, já no governo de Donald Trump, a EPA expandiu a liberação de uso do Sulfoxaflor para mais culturas. A agência concluiu que o pesticida desaparece da atmosfera mais rápido do que as demais alternativas utilizadas, diminuindo assim os riscos para os enxames.

A nova decisão rendeu protestos de organizações da sociedade civil americana e levantou suspeitas – especialmente porque a Dow AgroSciences, que detém a patente do Sulfoxaflor e é ligada à Corteva, doou US$ 1 milhão para garantir as festividades da posse de Trump, segundo reportagem publicada pela Associated Press em 2017. A reportagem revelou também que o CEO da Dow, Andrew Liveris, é amigo pessoal do presidente americano.

Agrotóxicos demoram a sair do mercado
Em março, a reportagem da Agência Pública e da Repórter Brasil mostrou que uma das principais ações do governo para resolver o problema da mortandade de abelhas é a reavaliação de agrotóxicos relacionados aos casos.

O Ibama iniciou o processo em 2012, com a reavaliação do neonicotinoides Imidacloprid, o mais usado do grupo. Simultaneamente, o Instituto está reavaliando também os neonicotinoides Clotianidina e o Tiametoxam, e ao fim dos três processos iniciará os testes com o Fipronil.

Em outubro de 2017 o Ibama respondeu ação civil pública na 9ª Vara Federal de Porto Alegre, que dava o prazo de seis meses para a autarquia concluir as reavaliações. O Ibama respondeu ter dificuldade para concluir o processo no prazo. A equipe que realiza as reavaliações é composta por apenas cinco analistas ambientais: três biólogos, um químico e um zootecnista.
Cinco meses após a publicação da reportagem, os processos de reavaliação ainda não foram concluídos. Nem Ibama nem Ministério do Meio Ambiente deram alguma previsão de encerramento da reavaliação dos neonicotinoides.

Pressão do Ministério Público e da sociedade
Enquanto o processo de revisão dos agrotóxicos apontados como vilões das abelhas segue em andamento na esfera federal, há pressão nos demais poderes e da sociedade civil. A Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre encaminhou no dia 14 de agosto pedido de suspensão para que o Governo do Rio Grande do Sul avalie a possibilidade de restrição do uso do inseticida Fipronil no estado, através da suspensão provisória do registro do produto no Cadastro Estadual de Registro de Agrotóxicos – 400 milhões de abelhas foram mortas no Estado em apenas três meses, conforme revelaram Agência Pública e Repórter Brasil.

Em junho deste ano o Ministério Público do Rio Grande do Sul estadual propôs que as empresas produtoras do inseticida suspendessem voluntariamente a comercialização de produtos à base de Fipronil no estado. As multinacionais Basf e a Nufarm concordaram. “O fato é significativo porque, mesmo que outras tantas não concordassem com a proposição ancorada apenas na questão de que o princípio ativo possui registro, duas das maiores produtoras reconhecem, especificamente pela mortandade de abelhas, os danos que a versão foliar do Fipronil representa”, destacou promotor de Justiça Alexandre Saltz no pedido de suspensão.

“Impõe-se avançar na limitação da sua comercialização e uso, especialmente às vésperas do início da safra”, concluiu.

O Fipronil age nas células nervosas dos insetos e, além de utilizado contra pragas em culturas como maçã, soja e girassol, é usado até mesmo em coleiras antipulgas de animais domésticos. Muitas vezes esse veneno é aplicado em pulverização aérea, o que o expõe diretamente as abelhas. Um estudo feito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 2018 analisou 30 casos de grandes baixas em enxames no estado. Os resultados mostram que cerca de 80% ingeriram ou tiveram contato com Fipronil antes de sucumbir.

“Estamos animados com essa movimentação judicial. O Fipronil é o maior matador de abelhas. Usar ele na época da florada é um grave crime ambiental”, conta o apicultor Salvador Gonçalves, presidente da Apicultores de Cruz Alta (Apicruz).

O município gaúcho foi um dos que mais sofreu com mortes de abelhas — mais de 20% de todas as colmeias foram perdidas apenas entre o Natal de 2018 e o começo de fevereiro deste ano. Cerca de 100 milhões de abelhas apareceram mortas, segundo levantamento da Apicruz.

Mas a repercussão das denúncias chamou atenção para o problema. Em maio, o Greenpeace lançou a #SalveAsAbelhas, um abaixo assinado contra o extermínio de polinizadores por uso de agrotóxicos — foram 10 mil assinaturas de apoio em uma semana.

Quase um ano depois, o sentimento é de esperança de que a repercussão traga mudanças efetivas. “Dentro de alguns dias começa a dessecagem nas lavouras de milho, então estamos muito preocupados. Mas houve uma sensibilização muito grande por parte dos produtores rurais que nos faz esperar uma diminuição da mortandade de abelhas neste período de primavera”, diz Salvador Gonçalves.

Em resposta, o setor de defensivos agrícolas, sob governança do Sindicato Nacional das Indústrias de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), criou o Colmeia Viva, um movimento para incentivar o diálogo entre agricultores e criadores de abelhas. O grupo coloca como um dos objetivos promover o uso correto de defensivos agrícolas para diminuir o impacto na apicultura.

Por sua vez, em julho foi a vez dos deputados agirem. No dia 4, parlamentares lançaram no Congresso Nacional a Frente Parlamentar Mista da Apicultura e da Meliponicultura. O grupo irá acompanhar e fiscalizar as atividades de criação de abelha e produção de mel no país, além de propor alternativas para solucionar os problemas da categoria. 256 deputados federais e nove senadores assinaram o requerimento de criação. O presidente da frente é o deputado Darci de Matos (PSD-SC) e o vice é o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) — ambos também são membros da Frente Parlamentar da Agropecuária.

Membros da Frente Parlamentar da Apicultura reuniram-se neste mês com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, para discutir as principais pautas do setor, incluindo a mortandade de polinizadores. “Passamos para ela a nossa preocupação em relação aos agrotóxicos que tem em sua base o Fipronil e os neonicotinoides. São agrotóxicos que já foram banidos na Europa, e aqui apareceram no caso de mortalidade de 500 milhões de abelhas no ano passado em quatro estados. Precisamos agir, pois sem abelha não tem alimento”, relata o deputado Darci de Matos.

A frente também pretende se reunir com Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente para falar da reavaliação dos agrotóxicos tendo em vista o perigo as abelhas. “Estamos estudando a possibilidade de fazer um projeto de lei propondo a proibição desses agrotóxicos. É um assunto bem complexo, e o PL seria a opção mais radical, mas adiante poderá ser possível, porque não podemos continuar deixando milhões de abelhas morrendo”, diz Darci. Além disso, o deputado acrescenta o interesse em criar um mapeamento de colméias no Brasil. “O objetivo é descobrir onde estão as colmeias, para quando você for autorizar um agrotóxico, o receituário mostre onde não é permitido fazer a aplicação”, explica.

Esta reportagem faz parte do projeto Por Trás do Alimento, uma parceria da Agência Pública e Repórter Brasil para investigar o uso de Agrotóxicos no Brasil. A cobertura completa está no site do projeto.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 27/08/2019
Com aprovação de mais agrotóxicos à base de Sulfoxaflor, apicultores temem novo extermínio de abelhas, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 27/08/2019, https://www.ecodebate.com.br/2019/08/27/com-aprovacao-de-mais-agrotoxicos-a-base-de-sulfoxaflor-apicultores-temem-novo-exterminio-de-abelhas/.