sexta-feira, 9 de março de 2018

Efetividade do CAR em reduzir o desmatamento é parcial

Efetividade do CAR em reduzir o desmatamento é parcial

09.03.2018Notícias
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Com base em nova metodologia, estudo mostra que as propriedades dentro do Cadastro Ambiental Rural (CAR) reduziram as taxas de desmatamento em algumas classes fundiárias por um determinado período, mas não foi um efeito sistemático ao longo do tempo e espaço. O artigo científico publicado em janeiro na revista “Elementa” indica que a efetividade do CAR em reduzir o desmatamento é parcial.

Foram analisados os cadastros de Mato Grosso e Pará, estados que implementaram seus cadastros em 2009 e 2008, respectivamente, com o objetivo de acelerar o processo de conformidade com o Código Florestal e melhorar as capacidades de monitoramento dos estados.

Este estudo tem implicações políticas e metodológicas. Na frente política indica que o CAR não foi capaz de reduzir o desmatamento durante certo período e nas propriedades como um todo, o que ratifica a necessidade de incentivar os produtores a se registrarem no CAR, e combater o desmatamento, informando a população sobre a capacidade do governo em monitorar e evitar o desmatamento. Do ponto de vista metodológico os modelos estatísticos propostos apresentam algumas vantagens em relação aos modelos que atualmente são aplicados para avaliar as políticas ambientais.

“É uma nova forma de responder uma pergunta inspirada em outros campos metodológicos. Esse artigo representa o avanço da ciência, ao responder de uma forma nova e mais robusta, a relação entre o cadastro e desmatamento”, afirma um dos autores do estudo e pesquisador do IPAM, Marcelo Stabile.

O CAR visa a documentar o grau de conformidade ambiental de mais de cinco milhões de propriedades rurais no Brasil. O registro no CAR é uma iniciativa voluntária do proprietário, embora obrigatória no Código Florestal. Os benefícios de se juntar ao CAR incluem uma menor chance de receber multas por não cumprir as leis ambientais, oportunidade de vender para cadeias de fornecimento que possuem acordos de desmatamento, como os da soja e do gado.

“Para melhorar as práticas de governança ambiental e garantir avanços, é crucial determinar os caminhos mais assertivos com base metodológica, por isso a importância deste estudo”, finaliza Stabile.

Área na Amazônia maior que a região Sul está à mercê do desmatamento

Área na Amazônia maior que a região Sul está à mercê do desmatamento

05.03.2018Notícias
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Cristina Amorim, do IPAM
Uma área maior do que toda a região Sul do Brasil – 70 milhões de hectares – coberta por florestas está hoje à mercê de grileiros e desmatadores ilegais na Amazônia. Destinar essa área para conservação e uso sustentável pode ser o melhor caminho para protegê-la e permitir que o Brasil cumpra sua meta de reduzir a emissão de gases de efeito estufa, dentro do combate global às mudanças climáticas.

Essa é a defesa que os pesquisadores Claudia Azevedo-Ramos, do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (Naea/UFPA), e Paulo Moutinho, do IPAM, fazem num artigo que será publicado na edição de abril da revista “Land Use Policy”, já disponível na versão on-line (www.sciencedirect.com/journal/land-use-policy).

Com o sugestivo título de “Terra de ninguém na Amazônia”, os dois elencam justificativas e caminhos para tornar essas florestas públicas, federais e estaduais, em áreas protegidas. Hoje elas não estão destinadas a nenhum tipo de uso, apesar de sua importância para o equilíbrio climático.

Esses 70 milhões de hectares estocam 25 bilhões de toneladas de gás carbônico (CO2), equivalente à soma da emissão brasileira de gases do efeito estufa por 14 anos. É motivo mais do que suficiente para manter as florestas como estão. Isso é especialmente importante quando leva-se em conta a meta climática que o Brasil se comprometeu internacionalmente: atingir, até 2025, uma emissão anual de 1,38 bilhão de toneladas de CO2, ou uma queda de 87% à taxa registrada em 2014, segundo cálculos do IPAM.

“As florestas públicas não destinadas na Amazônia hoje atuam como um grande sistema de irrigação e um verdadeiro ar-condicionado gigante, dos quais dependem a produção agrícola da região”, diz Moutinho. “Deixar essa área à mercê do desmatamento pode colocar em risco a pujança futura do agronegócio e a ambição brasileira de tornar o país o ‘celeiro do mundo.”

O tempo urge
O alerta dos pesquisadores contém outro número impressionante: 25% do desmatamento registrado na Amazônia entre 2010 e 2015 aconteceu dentro dessas áreas públicas desprotegidas. A taxa, traduzida em emissões de CO2, chega a 200 milhões de toneladas, volume equivalente a quase metade do que o setor de energia no Brasil emitiu em 2016, de acordo com dados do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa).

Os autores do estudo defendem que os governos destinem os 70 milhões de hectares para conservação e para usos sustentáveis dos recursos naturais, de forma a manter a cobertura florestal que, por sua vez, permite ao regime de chuvas ficar minimamente estável.
“Não há nenhuma justificativa econômica suficientemente forte para defender que essas áreas com florestas públicas sejam convertidas em lavoura ou pasto frente à área já desmatada na Amazônia”, afirma Moutinho. Cerca de 10 milhões de hectares já foram derrubados na região e estão subutilizados. É terra suficiente para aumentar o crescimento de produção agrícola almejado pelo governo brasileiro.

Para evitar longos e burocráticos processos de criação de unidades de conservação, os pesquisadores propõem um sistema escalonado de destinação, com uma fase de transição em que grandes trechos de terra seriam declarados sob a responsabilidade de uma única agência do governo, apropriada a este fim.

“A declaração oficial de que o governo está presente e cuida dessas florestas ajuda, por si só, a afastar ações ilegais”, explica Azevedo-Ramos. “Mas não se pode parar por aí. Estudos detalhados posteriores devem definir seu correto e definitivo destino, seja ele social, econômico ou de proteção.”

Segundo os autores do artigo, a ideia não “cercar” todas essas áreas para afastar invasores, mas associar a proteção às atividades sustentáveis, para fomentar a economia local. “Estimular uma economia de base florestal, por exemplo, é essencial para garantir a conservação de largas extensões de florestas na Amazônia”, diz a pesquisadora.


“Uma área protegida de uso sustentável, por exemplo, tem a vantagem de incluir pessoas, fomentar o uso econômico e ser melhor aceita pelos estados, pelos municípios e pela sociedade do entorno. Portanto, possui maior probabilidade de ser criada em curto prazo e de apresentar benefícios locais.”

Atual ritmo de desmatamento vai intensificar aquecimento global, alerta estudo

Em artigo na Nature Communications, grupo internacional afirma que a continuação do desmatamento de 7 mil Km² anuais poderá anular esforços para redução de emissões

FAPESP



Forçamentos radiativos médios anuais globais devido a mudanças nas concentrações de forcers climáticos de curta duração (SLCFs) sob cenários de desmatamento global ( a ) e regional ( b - d ). As barras representam o forçamento radiativo líquido de SLCFs (laranja) eo forçamento radiativo direto de aerossóis (DRF, em vermelho), primeiro forçamento radiativo indireto de aerossol (IRF, em azul) e RF devido a alterações em O 3 (verde) e CH 4 ( roxa)
Forçamentos radiativos médios anuais globais devido a mudanças nas concentrações de forcers climáticos de curta duração (SLCFs) sob cenários de desmatamento global ( a ) e regional ( b – d ). As barras representam o forçamento radiativo líquido de SLCFs (laranja) eo forçamento radiativo direto de aerossóis (DRF, em vermelho), primeiro forçamento radiativo indireto de aerossol (IRF, em azul) e RF devido a alterações em O 3 (verde) e CH 4 ( roxa)

O processo de aquecimento global pode ocorrer de forma ainda mais intensa do que o previsto originalmente caso não se consiga frear o desmatamento – particularmente nas regiões tropicais do planeta. O alerta foi publicado na Nature Communications por um grupo internacional de cientistas.


“Se continuarmos destruindo as florestas no ritmo atual – cerca de 7 mil km² por ano no caso da Amazônia -, daqui a três ou quatro décadas teremos uma grande perda acumulada. E isso vai intensificar o processo de aquecimento do planeta independentemente do esforço feito para reduzir as emissões de gases de efeito estufa”, disse Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IFUSP).


Alcançando a conclusão
O grupo chegou à conclusão após conseguir reproduzir matematicamente as condições atmosféricas atuais do planeta, por meio de modelagem computacional que usou um modelo numérico da atmosfera (https://www.metoffice.gov.uk/research/modelling-systems/unified-model) desenvolvido no Met Office, agência nacional de meteorologia do Reino Unido.


Tal modelo incluía fatores como concentrações de aerossóis, compostos orgânicos voláteis (VOCs, na sigla em inglês) antropogênicos e biogênicos, ozônio, dióxido de carbono, metano e também os outros itens que influenciam na temperatura global – entre eles o chamado albedo de superfície (a fração da radiação solar refletida de volta para o espaço em comparação à fração absorvida, que muda de acordo com o tipo de cobertura da superfície).


O trabalho, coordenado pela pesquisadora Catherine Scott, da Universidade de Leeds (UK), também se baseou em anos de análise e levantamento sobre o funcionamento das florestas tropicais e temperadas, os gases emitidos pela vegetação e seus impactos na regulação do clima. A coleta de informações sobre florestas tropicais foi coordenada por Artaxo, no âmbito de dois Projetos Temáticos apoiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP: “GoAmazon: interação da pluma urbana de Manaus com emissões biogênicas da Floresta Amazônica” e “Aeroclima: efeitos diretos e indiretos de aerossóis no clima da Amazônia e Pantanal”. Os dados sobre as florestas temperadas foram obtidos na Suécia, na Finlândia e na Rússia, sob a coordenação de Erik Swietlicki, da Universidade de Lund (Suécia).


Entendendo como a floresta tropical controla a temperatura
“Depois que conseguimos regular o modelo para reproduzir as condições atuais da atmosfera terrestre e o aumento da temperatura do planeta ocorrido desde 1850, fizemos uma simulação em que o mesmo cenário era mantido, mas todas as florestas eram eliminadas. O resultado foi uma elevação significativa de 0,8 °C na temperatura média. Ou seja, hoje o planeta estaria em média quase 1 °C mais quente se não houvesse mais florestas”, comentou Artaxo.


Os estudos revelaram ainda que a diferença observada nas simulações se deve principalmente às emissões de BVOCs (compostos orgânicos voláteis biogênicos) pelas florestas tropicais.


“Ao serem oxidados, os BVOCs dão origem a partículas de aerossol que esfriam o clima refletindo parte da radiação solar de volta ao espaço. Uma vez que a floresta é derrubada, ela deixa de emitir BVOCs e este resfriamento deixa de existir, levando a um aquecimento futuro. Este efeito não estava sendo levado em conta em modelagens anteriores”, comentou Artaxo.


Segundo o pesquisador, as florestas temperadas produzem VOCs diferentes e com menor capacidade de dar origem a essas partículas esfriadoras.


Como destacado no artigo, atualmente a vegetação cobre um terço da área continental do planeta – fração bem menor do que a existente antes da intervenção humana. Grandes áreas florestais na Europa, Ásia, África e América já foram derrubadas.


“Vale ressaltar que não tratamos neste artigo do impacto direto e imediato das queimadas, como a emissão do carbono negro [considerada um fator importante no aquecimento global devido à alta capacidade dessa partícula de absorver a radiação solar]. Ele existe, mas dura somente algumas semanas. Estamos olhando para efeitos de longo prazo na variação da temperatura”, afirmou Artaxo.


Segundo o professor do IFUSP, o desmatamento altera em definitivo a quantidade de aerossóis e de ozônio na atmosfera do planeta, o que muda todo o balanço radiativo da atmosfera.


“A partir deste estudo aumentou a importância relativa de se manter a floresta em pé. Não só é urgente parar a destruição, como também pensar em políticas de reflorestamento em larga escala, principalmente em regiões tropicais. Caso contrário, pouco vai adiantar o esforço para reduzir as emissões de gases estufa provenientes da queima de combustíveis fósseis”, disse Artaxo.
Referência:
Impact on short-lived climate forcers increases projected warming due to deforestation
C. E. Scott, S. A. Monks, D. V. Spracklen, S. R. Arnold, P. M. Forster, A. Rap, M. Äijälä, P. Artaxo, K. S. Carslaw, M. P. Chipperfield, M. Ehn, S. Gilardoni, L. Heikkinen, M. Kulmala, T. Petäjä, C. L. S. Reddington, L. V. Rizzo, E. Swietlicki, E. Vignati & C. Wilson
Nature Communicationsvolume 9, Article number: 157 (2018)
doi:10.1038/s41467-017-02412-4
https://www.nature.com/articles/s41467-017-02412-4

Da FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 09/03/2018

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Uso de agrotóxicos. A falta de fiscalização e ética profissional aumentam os problemas

Uso de agrotóxicos. A falta de fiscalização e ética profissional aumentam os problemas




Uso de agrotóxicos. A falta de fiscalização e ética profissional aumentam os problemas. Entrevista especial com Juliano Ritter, Fernando da Silva e Alexandre Russini

IHU
O uso de agrotóxicos na produção agrícola é sempre um risco para produtores e consumidores e, por isso, seu uso deve ser reduzido ao máximo. Entretanto, em algumas formas de cultivo o uso zero ainda não é uma realidade. O problema ainda se torna mais grave quando, além do uso de agrotóxicos, é feita uma má aplicação, utilizando substâncias desse tipo sem a menor necessidade. Situação similar a essa ocorre nas lavouras de todo o país, em particular nos campos da fronteira oeste do Rio Grande do Sul. Na sua monografia de Especialização em Produção Vegetal da Universidade Federal do Pampa – UnipampaJuliano Goulart Ritter detectou que nessa região de alta produção de arroz são usados agrotóxicos indicados para o cultivo de tomate e batata, culturas que sequer existem na fronteira oeste.


Com a orientação dos professores da Unipampa Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini, a pesquisa aponta que o problema tem duas origens. A primeira é relacionada à falta de fiscalização de órgãos competentes. “Seria necessário ter maior número de fiscais, bem como maior disponibilidade de recursos (veículos, combustível, manutenção, dentre outros fatores), o que prejudica e muitas vezes impossibilita os servidores de realizarem uma fiscalização periódica tanto no sentido de orientação aos produtores, quanto na observação do cumprimento da legislação vigente”, analisam em entrevista por e-mail à IHU On-Line.


Já a segunda causa pode ser apontada como má-fé de responsáveis técnicos que se associam ao comércio de agrotóxico. “Para que o produto possa ser comercializado tem que ter a receita assinada por um profissional, como, por exemplo, um engenheiro agrônomo. O que ocorre, na prática, é a assinatura de receituário em branco, sendo que este é preenchido por pessoas sem competência, com o determinado produto que julgam ser adequado”, explicam. E acrescentam: “nota-se ainda importante papel do comércio, que, de certa forma, através de técnicas persuasivas de marketing, estimula a aplicação de uma série de produtos, muitas vezes, desnecessários, no sentido de alavancar seus lucros principalmente durante a safra”.

Juliano Goulart Ritter é fiscal Agropecuário Estadual da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Irrigação – Seapi do Rio Grande do Sul.

Fernando Felisberto da Silva é professor do curso de Agronomia da Universidade Federal do Pampa – Unipampa.

Alexandre Russini é doutor em Engenharia Agrícola, professor Adjunto da Unipampa, Campus Itaqui.


Confira a entrevista.
IHU On-Line – Em pesquisa recente, constatou-se algo já recorrente quanto ao uso e aplicação de agrotóxicos: a falta de fiscalização. Mas como isso é revelado nesse trabalho? E a que se pode atribuir essa falta de fiscalização?
Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini – A falta de fiscalização observada se deve, em parte, à grande extensão territorial da fronteira oeste do Rio Grande do Sul, a qual abrange diversos municípios, sendo que a maior parte das lavouras se encontra em localidades cujos acessos não são pavimentados. Seria necessário ter maior número de fiscais, bem como maior disponibilidade de recursos (veículos, combustível, manutenção, dentre outros fatores), o que prejudica e, muitas vezes, impossibilita os servidores de realizarem uma fiscalização periódica tanto no sentido de orientação aos produtores, quanto na observação do cumprimento da legislação vigente. Atualmente a fronteira oeste conta com dois fiscais estaduais agropecuários para atender uma área de mais de 25.572,8 km².


IHU On-Line – Quais são as particularidades do uso de agrotóxicos na fronteira oeste do Rio Grande do Sul?
Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini – A maior particularidade deve-se à aplicação aérea de agrotóxicos na cultura do arroz irrigado, por meio da utilização de aviões agrícolas, sendo aproximadamente 70 aviões na fronteira oeste. A aplicação terrestre ou tratorizada somente é utilizada nos tratos culturais no início da implantação da cultura do arroz, sendo que, após a entrada da água de irrigação e formação da lâmina, não é mais possível a entrada de tratores com pulverizadores acoplados e/ou pulverizadores autopropelidos.
Essa é a principal particularidade, sendo que, muitas vezes, a aplicação aérea de agrotóxicos é seriamente criticada, mas quando é realizada de forma correta, observando os preceitos da tecnologia de aplicação, pode ser considerada extremamente eficiente. Claro que toda a aplicação de algum produto químico sempre tem algum efeito no ambiente, independentemente da forma como foi aplicado.

IHU On-Line – Em que medida a falta de informação dos produtores rurais, que muitas vezes ignoram as orientações agronômicas, impacta no uso demasiado de agrotóxicos?
Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini – Realmente a falta de informações é um dos principais fatores que levam à ocorrência desse problema. Mas um fator que chama a atenção é que a maior parte das propriedades dispõe de assistência técnica, sendo que esses profissionais registrados conforme exige a legislação realizam a recomendação e aplicação de produtos sem observar a real ocorrência de determinada praga e/ou nível de dano em que seja necessária uma intervenção. Geralmente esse profissional já tem o que se chama de “pacote”, em que deve utilizar tais produtos. Neste sentido, nota-se ainda importante papel do comércio, que, de certa forma, através de técnicas persuasivas de marketing estimula a aplicação de uma série de produtos, muitas vezes, desnecessários, no sentido de alavancar seus lucros principalmente durante a safra.

A simples observação desses fatores reduziria de forma considerável o uso demasiado de agrotóxicos. Em grande parte das propriedades fiscalizadas, a assistência técnica é realizada por profissionais vinculados a comerciantes de agrotóxicos, sendo que os produtores deixam as decisões sobre o que aplicar e quando aplicar a critério desses profissionais. Se os produtores buscassem informações sobre a real necessidade de aplicação de agrotóxicos, seguindo os critérios do manejo integrado de pragas, como nível de dano econômico, condições climáticas, fenologia da planta, estágio de desenvolvimento das pragas, entre outros, o uso de agrotóxicos certamente seria menor.

IHU On-Line – Com relação ao comércio de agrotóxicos, quais as principais irregularidades apontadas e como combatê-las?
Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini – Um dos principais problemas é a recomendação de agrotóxicos para cultura inexistente, com 79,1% das infrações. Em algumas situações, a recomendação era para culturas que não existem na região, como tomate e batata; em outras, havia desvio de uso, sendo que o agrotóxico era recomendado para a cultura da soja e o produtor cultivava apenas arroz irrigado.

Para que o produto possa ser comercializado tem que ter a receita assinada por um profissional, como, por exemplo, um engenheiro agrônomo. O que ocorre, na prática, é a assinatura de receituário em branco, sendo que este é preenchido por pessoas sem competência, com o determinado produto que julgam ser adequado. Ressalta-se que isso é uma prática ilegal, sendo passível de punição, conforme a legislação, tanto do profissional que assinou, quanto do estabelecimento que comercializou o produto, bem como do produtor (este por não utilizar o produto recomendado para a cultura).
A forma mais adequada de combate a este tipo de irregularidade é por meio da fiscalizaçãoe autuação dos estabelecimentos e principalmente dos profissionais, já que estes não podem alegar desconhecimento, pois tiveram inúmeras disciplinas ao longo do seu processo de formação que remetem diretamente à observação desses critérios. Na verdade, o que ocorre é o desvio de uso com consentimento do responsável técnico (agrônomo ou técnico agrícola). O próprio responsável técnico sabe que as culturas não existem; não é o caso de deixar a receita assinada em branco, eles fazem a recomendação para cultura inexistente. Como o próprio trabalho já demonstrou, este tipo de infração reduziu drasticamente, em função da atuação da fiscalização atuante da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Irrigação – Seapi. O Sistema Integrado de Gestão de Agrotóxicos – Siga será mais uma importante ferramenta para controlar este tipo de infração.

IHU On-Line – Quais os desafios para redução dos riscos de contaminação ambiental por agrotóxico na fronteira oeste gaúcha?
Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini – O fator mais importante é a manutenção da ética profissional, que, muitas vezes, é deixada de lado mediante a ganância em razão do maior volume de produto comercializado. É prática comum o profissional receber comissões pela venda de produto ou determinados “pacotes” de produtos, pouco importando se a aplicação seria realmente necessária. É aquela velha questão: “quanto mais eu vender, mais eu ganho”. Isso ocorre por pressões de diferentes origens, podendo levar à realização de procedimentos incorretos como os já descritos anteriormente. Estas irregularidades, quando constatadas pelos agentes fiscalizadores ou na ocorrência de erros de aplicação, podem ser penalizadas, sendo que pode ocorrer inclusive a cassação do registro profissional. Na universidade trabalhamos diariamente com nossos alunos para que observem todos esses problemas, no intuito de formarmos profissionais extremamente competentes e comprometidos com as questões ambientais e éticas.

Outro fator recai sobre a fiscalização, que deve ser mais atuante e presente. Entretanto, diante das inúmeras dificuldades financeiras e de pessoal que se encontram os órgãos públicos, isso parece uma realidade distante.

IHU On-Line – Como, dentro da realidade da fronteira oeste do Rio Grande do Sul, conceber outras formas de produção que não dependam do uso de agrotóxicos?
Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini 

 Afronteira oeste se caracteriza pela pecuária e pela produção de arroz irrigado. Recentemente iniciou-se o cultivo de soja em algumas áreas. Essa região produz a maior parte do arroz consumido no Brasil, caracterizando-se por extensas áreas de cultivo, com utilização intensiva de máquinas e implementos. Devido às particularidades da cultura do arroz, principalmente a questão de plantas daninhas, solo inundado, dentre outros fatores, torna-se praticamente impossível abolir o uso de alguns agrotóxicos, mas eles podem ter seus usos racionalizados e reduzidos mediante a adoção de manejo envolvendo novas tecnologias, a observação do nível de controle de pragas, bem como o atendimento dos requisitos da tecnologia de aplicação.

IHU On-Line – De que forma a produção agroecológica vem sendo desenvolvida na fronteira oeste? Quais seus maiores entraves?
Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini – A produção agroecológica na fronteira oeste recai praticamente aos pequenos produtores de hortaliças e frutas, na maior parte destinadas ao consumo local. Esses agricultores têm apoio de instituições de pesquisa, órgãos de extensão e prefeituras. A produção orgânica ou com ênfase agroecológica de arroz na região é praticamente inexistente.
Acreditamos que um dos entraves para um maior desenvolvimento da produção agroecológica ainda é o elevado custo, a falta de informação da população, bem como de incentivo a esses agricultores, problemas esses que não são exclusivos desta região. Desta forma, a viabilidade técnica também seria comprometida devido à extensão das áreas de produção, ressaltando-se as particularidades da cultura, sendo que a atual demanda de arroz do mercado nacional seria seriamente prejudicada.

IHU On-Line – De que forma os senhores avaliam a legislação ambiental no que diz respeito ao uso e comércio de agrotóxicos no país hoje?
Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini – A legislação ambiental brasileira é uma das melhores do mundo, porém é necessário um maior cumprimento pelos envolvidos no sistema de produção. Recaímos sempre na conscientização visando a preservação dos nossos recursos naturais e a garantia da continuidade das nossas gerações futuras. Se a legislação fosse cumprida, certamente não estaríamos discutindo a respeito desses problemas de forma recorrente. Atualmente os agrotóxicos seguem determinações legais dos Ministérios da Agricultura, Saúde e Meio Ambiente. Quando um agrotóxico tem uso liberado legalmente, considera-se que o mesmo passou por análises de eficiência agronômica, impactos à saúde do homem (usuário e consumidor) e ao meio ambiente, neste caso seguindo protocolos internacionais em relação aos chamados POPs (poluentes orgânicos persistentes).
Não podemos, considerando a eficácia dos procedimentos realizados para a sua liberação, dizer que nossa legislação é omissa ou deficiente. Especificamente acreditamos que a legislação ambiental cumpre seu papel, o problema são os atores envolvidos, neste caso, tanto produtores como quem presta assistência aos mesmos, que não dão a devida atenção à legislação. O problema não está na legislação ambiental, mas sim no cumprimento da mesma.

IHU On-Line – Desejam acrescentar algo?

Juliano Goulart Ritter, Fernando Felisberto da Silva e Alexandre Russini –Na atualidade sempre se atribui à agricultura o fato de ser um processo que degrada os recursos naturais, utiliza vastas quantidades de agrotóxicos e é extremamente nociva ao ambiente. Essa ideia é que temos que aos poucos repensar e desmitificar perante a sociedade que não é bem assim. Toda e qualquer atividade antrópica causa danos ao ambiente, como uma mineradora, uma cidade, a construção de uma rodovia, a emissão de poluentes pelos veículos automotores, uma hidrelétrica, dentre outros. A grande questão é que temos agricultores e profissionais nos diferentes pontos do país, bem como na região da fronteira oeste, extremamente comprometidos com as questões ambientais, atendendo todos os preceitos de uma agricultura dinâmica, segura e sustentável. Tomamos esses agentes como referência e devemos incentivá-los a se tornarem elementos difusores para outros produtores e profissionais, mostrando que é, sim, possível produzir de forma correta, viável economicamente, permitindo, dessa forma, garantir a sustentabilidade do sistema produtivo.

(EcoDebate, 09/03/2018) publicado pela IHU On-line, parceira editorial da revista eletrônica EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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Agro-homeopatia, artigo de Roberto Naime

Agro-homeopatia, artigo de Roberto Naime


artigo

[EcoDebate] Aumentar a resistência da planta e sua massa de forma homogênea e o controle de pragas, contribuindo para que um novo modelo de agricultura surja e se desenvolva, permitindo o consumo de alimentos saudáveis, a preservação do meio ambiente e a sustentabilidade.

Este é o objetivo de Gerson Vitor Dalmolin, médico homeopata com título de especialista pela Associação Médica Brasileira e especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela Associação Médica Brasileira que se dedica a pesquisas na área de Agro-homeopatia.
Perguntado sobre como funciona a Agro-Homeopatia, Gerson Vitor Dalmolin argui que “vem a ser o uso dos ensinamentos de Samuel Hanemann, fundador da homeopatia e seus princípios que o regem, e permite o uso de medicamentos preparados segundo a farmacopeia homeopática, na agricultura, pecuária, avicultura, suinocultura. Com o intuito de obtenção de sanidade e maior qualidade, agro-fitossanitária e sustentabilidade“.

Sobre como a agro-homeopatia surgiu e qual tem sido, neste período, seu desenvolvimento, se manifestou “agro-homeopatia surgiu com pesquisas de vários autores anônimos, que vem fazendo experimentos com preparados homeopáticos, que aos poucos vão apresentando os seus trabalhos para a sociedade.

Sobre qual o cenário da agro-homeopatia no Brasil e como ela vem se desenvolvendo nos últimos anos e quais são, em sua opinião, os desafios que ainda devem ser superados, Gerson Vitor Dalmolin disse “no Brasil ainda é tímido, pois o ceticismo e a cultura pelo uso de agrotóxicos são muito grandes. A agro-homeopatia é um novo modelo, que entra em conflito com o modelo atual, que partes de um sistema devem ser exterminados, para que o resultado final financeiro e quantitativo seja vantajoso, sem ver a outra parte do sistema que vem sofrendo várias consequências no âmbito do ecossistema e na saúde de todos os seres vivos. O resultado final que satisfaça a sociedade em todos os aspectos, econômicos, sustentabilidade e qualidade agro-fitossanitária”.

Questionado sobre as pesquisas e experimentos na área de agro-homeopatia na Universidade Estadual de Mato Grosso, referiu “venho fazendo experimento há sete anos. Mas tudo começou com a ideia de desenvolver um medicamento que aumentasse a resistência do organismo humano, mandei fazer o preparado homeopático que chamei de GG-RIL, e usei nas potências 6CH, 15 CH e 30CH, mas a utilização em seres humanos de forma experimental era muito complexa. Optei por fazer os experimentos na minha horta, com brócolis, cenoura, cebolinha verde e alface. Percebi que estes vegetais tinham um bom desenvolvimento e não sofriam com as pragas, normais deles, que sempre necessitavam de algum inseticida ou fungicida. Os insetos estavam presentes, porém não provocavam infestação e também não causavam danos a estas plantas. Também se observou que a massa e a altura destas plantas eram maiores que o lado testemunha, em que não usei o medicamento homeopático. Devido a este fato, os experimentos foram se estendendo para outros vegetais e o resultado se repete sempre”.

Continua ele “tive grande dificuldade para que este trabalho fosse feito em uma instituição de ensino, no setor específico de Agronomia. No ano passado, um jovem estudante do primeiro ano que teve interesse de fazer estas pesquisas no setor de Agronomia da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, mandou o projeto na qual foi classificado para desenvolver estas pesquisas com preparados homeopáticos, inclusive o GG-RIL. 

Desenvolver o trabalho já é um grande avanço. Em um ano já tivemos resultados positivos e também novas descobertas dos preparados homeopáticos. Conseguimos medir as suas potências e também a melhor atuação entre elas. Mas a dificuldade maior está no setor financeiro, pois todos os gastos inerentes aos experimentos foram orçados por mim, e continua este dilema, não consegui, neste período todo, alguma entidade ou empresa que financiasse este evento”.

Perguntado sobre as conquistas e quais são as perspectivas e expectativas manifestou a maior conquista é a comprovação de que o preparado homeopático teve o resultado de aumentar a resistência da planta e sua massa de forma homogênea e o controle de pragas.


 As perspectivas são de um novo modelo na agricultura brasileira, onde existam alimentos saudáveis, preservação do meio ambiente e a sustentabilidade.

Referência:
http://www.ecomedicina.com.br/site/conteudo/entrevista28.asp

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 08/03/2018

"Agro-homeopatia, artigo de Roberto Naime," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 8/03/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/03/08/agro-homeopatia-artigo-de-roberto-naime/.

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à fonte primária da informação

Entidades alertam sobre desmonte do Licenciamento Ambiental

nota pública

Entidades alertam sobre desmonte do Licenciamento Ambiental

Apesar da tragédia em Barcarena, Câmara pode afrouxar regras para licenciamento ambiental
São Paulo, 06 de março de 2018 – Um grupo de 46 organizações representativas do movimento socioambiental, incluindo membros do Ministério Público, divulga nota pública contra projeto de lei que muda regras de licenciamento ambiental. O grupo, do qual participam o WWF-Brasil, o Greenpeace, o Instituto Socioambiental e SOS Mata Atlântica, entre outras 43 entidades, exige que “órgãos técnicos, comunidade científica, comissões ambientais, populações atingidas e a sociedade em geral sejam ouvidos”.

Segundo as entidades, trata-se de um desmonte da legislação. O projeto, que tramita na Câmara dos Deputados, pode ir a votação no plenário ainda este mês, segundo o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Enquanto isso, a população de Barcarena, no Pará, sofre as consequências de vazamento tóxico de mineração. “Trata-se de uma triste e trágica demonstração de que as regras para o licenciamento ambiental deveriam, na verdade, se tornar mais rígidas, e não mais permissivas, como quer o PL em questão”, diz o coordenador de Políticas Públicas do WWF-Brasil, Michel Santos.

“Caso aprovada a proposta na forma como se encontra, esta e outras tragédias, como o rompimento da barragem em Mariana, em Minas, ficariam mais propensas a ocorrer, atingindo de forma ainda mais brutal as populações locais”, diz um trecho da nota.

E continua: “O texto do PL proposto pela bancada ruralista e outros setores que desejam mudar as regras de licenciamento ambiental do país deixa o meio ambiente vulnerável ao recomendar a dispensa de licenciamento para atividades agropecuárias a qualquer título e independentemente de seu impacto; ao criar o licenciamento autodeclaratório e flexibilizar as exigências ambientais; ao deixar inteiramente na mão de Estados e municípios a decisão sobre o grau de rigor da licença ambiental — que pode ser nenhum se prefeitos e governadores assim entenderem; e ao retirar a obrigatoriedade da consulta a populações potencialmente atingidas — uma clara violação aos direitos de povos indígenas e de comunidades locais, além de representar ameaças a áreas protegidas”.

Colaboração de Beatriz Ambrosio, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 09/03/2018

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