segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Agrotóxico usado em lavouras de soja e milho causou morte de abelhas em Santa Catarina

Agrotóxico usado em lavouras de soja e milho causou morte de abelhas em Santa Catarina

 Dagmara Spautz
06/05/2019 - 23h26 - Atualizada em: 07/05/2019 - 00h40
Foto: Divulgação Epagri
Foto: Divulgação Epagri
Um relatório preparado pela Cidasc comprovou que foi o uso de agrotóxicos em lavouras de soja e milho a causa da morte de 20 milhões de abelhas no Planalto Norte, no início do ano. Os técnicos visitaram propriedades, conversaram com agricultores e requisitaram receituários de aplicação de defensivos. 

Confirmaram o uso do fungicida trifloxistrobina e dos inseticidas triflumuron e fipronil, três substâncias encontradas nas abelhas mortas em testes de laboratório. 

O laudo não responsabiliza nenhuma das propriedades em especial. Considera que a contaminação das abelhas ocorreu de forma acidental, "sem um culpado de fato". Uma das hipóteses é que a aplicação tenha ocorrido no período de floração, quando ela não é recomendada.
Embora já se soubesse que a causa da perda das colmeias eram as três substâncias – em especial o fipronil, considerado altamente tóxico para as abelhas – era necessária a pesquisa de campo para confirmar se o foco foi mesmo a agricultura. Isso porque o produto é usado em diversas situações, inclusive para o controle de pulgas em animais domésticos.

SC pode restringir uso

Com a comprovação, a Cidasc e a Epagri pretendem levar adiante medidas de controle do fipronil – o que pode fazer de Santa Catarina o primeiro Estado no Brasil a restringir o uso do produto, já proibido em alguns lugares no mundo. A ideia é permitir o uso somente em sementes, quando é considerado mais seguro para as abelhas.
A proposta de regulamentação deve ser entregue ao Governo do Estado até o fim deste mês. Se concordar, a Secretaria de Agricultura e Pesca pode implantar as medidas por meio de portaria.

Fruticultura em risco

As 300 colmeias afetadas pela mortandade no Estado correspondem a uma fatia pequena da apicultura de Santa Catarina, que tem 315 mil colmeias em produção. Mas acendem o sinal de alerta: as abelhas não apenas produzem mel, mas são responsáveis pela polinização de diversas culturas, especialmente de frutas como a maçã, a ameixa e o pêssego. A preocupação com as colmeias, portanto, tem um forte respaldo econômico.

Avaliação

A Cidasc continua os levantamentos no Norte do Estado com relação às abelhas. A próxima visita técnica será no dia 22 deste mês, na companhia de especialistas. Pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) têm prestado apoio ao Estado na busca de solução para a convivência das abelhas com a atividade agrícola.

Floresta Amazônica: desmatamento afeta a rica biodiversidade e causa impactos no planeta




Floresta Amazônica: desmatamento afeta a rica biodiversidade e causa impactos no planeta



Floresta Amazônica: Depredação gera desequilíbrio ambiental e afeta a rica biodiversidade

A maior biodiversidade do mundo espalhada em cerca de sete milhões de quilômetros quadrados – essa é a Floresta Amazônica, que está presente no Brasil, Peru, Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. No país, a área é chamada de Amazônia Legal, com 5.217.423 km², e abrange os Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e pequena parte dos Estados do Maranhão, Tocantins e Mato Grosso. “A Amazônia é de longe o bioma mais diverso do planeta, com 10% de toda a flora. Para se ter uma ideia, enquanto a Amazônia possui 5.000 espécies de árvores, a América do Norte inteira possui apenas 650”, compara Magno Botelho Castelo Branco, doutor em Ecologia e Recursos Naturais e presidente da organização Iniciativa Verde.

“Com toda essa diversidade de climas, solos, relevos e ambientes distintos, conectados geograficamente ou não, a Amazônia é considerada a maior floresta tropical e maior banco genético do planeta, com mais de 1,5 milhões de espécies vegetais catalogadas, além de três mil espécies de peixes e 950 espécies de aves, e uma rica diversidade de répteis, anfíbios, mamíferos e insetos, muitos deles ainda nem catalogados pelos cientistas”, complementa Adriana Maria Imperador, doutora em Ciências da Engenharia Ambiental e professora da Universidade Federal de Alfenas (Unifal).

Há ainda muitos “tesouros” guardados na Floresta Amazônica. “É importante ressaltar que, devido a sua extensão, parte de sua biota (conjunto de seres vivos de um ecossistema) ainda não foi identificada, o que aumenta ainda mais sua importância para a biodiversidade mundial”, diz Branco. De acordo com Adriana, muitas destas espécies podem trazer benefícios imensuráveis ao homem, como a cura de doenças, servir como fonte de alimento, para a produção de remédios e cosméticos, além trazer benefícios ecológicos e ambientais.

A Amazônia, segundo a pesquisadora, também apresenta grande diversidade étnica com comunidades tradicionais indígenas, ribeirinhas e de seringueiros, que vivem dos produtos extraídos da floresta e são possuidoras de conhecimento empírico hoje muito valorizado e resgatado por estudiosos do mundo todo.

Desmatamento
Mas por que uma área tão rica em recursos naturais não recebe a proteção adequada e tem o desmatamento como sua maior ameaça? Conforme dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em 2011, a taxa de desmatamento da Amazônia Legal foi de 6.238 km². Já o acumulado de 1988 a 2011 chegou a 392.021 km². “O desmatamento realizado para a agropecuária ainda é a maior ameaça à floresta primária da Amazônia. Isto se deve principalmente ao tamanho das áreas desmatadas para a formação de pastagens e produção de grãos. Intervenções de minerações e de hidrelétricas são mais drásticas, porém a escala é sempre bem menor do que da agropecuária”, explica Niro Higuchi, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

Para o pesquisador, a exploração seletiva de madeira também representa uma importante ameaça à integridade da Amazônia. “Há uma lógica perversa que indica que os Estados da Amazônia que mais produzem madeira são também os que mais a desmatam”, ressalta.

Branco, por outro lado, acredita que atribuir à criação de gado o papel de grande vilã do desmatamento é injusto. “Outros vetores são também importantes. A pecuária se expande para as áreas de floresta por ser literalmente empurrada para essas áreas, visto que é uma das atividades que menos remunera a terra.

Quando ocorreu a expansão da cultura da cana-de-açúcar no Sudeste para a produção de etanol, por exemplo, tivemos um deslocamento da pecuária e de outras culturas para as áreas de terra com menor custo de oportunidade, o que inclui a Amazônia”, esclarece. O desmatamento é uma consequência de várias forças que resultam na ocupação sem planejamento da floresta. “A construção de estradas de rodagem é uma delas, pois as rodovias fomentam o desmatamento ao longo de seus eixos, o que ocorreria em intensidade muito menor se construíssemos ferrovias”, defende.

Já Adriana destaca as origens históricas do desmatamento: “a Amazônia ficou esquecida durante mais de quatro séculos e as populações que habitavam este ambiente permaneceram praticamente isoladas. Durante o governo de Getúlio Vargas (1930-1945), a ocupação foi estimulada por um programa de avanço das fronteiras”, aponta. Somente na década de 1970, expõe ela, a ocupação se deu de forma mais efetiva com a política de “integrar para não entregar”. “Desde então, muitos brasileiros migraram para o norte do país com a intenção de ganhos imediatos à custa da derrubada da floresta. Esta ocupação desordenada repercutiu no desmatamento com vistas à urbanização, à criação de gado e às práticas agrícolas”, destaca.
Impactos

O desmatamento reduz a biodiversidade, causa erosão dos solos, degrada áreas de bacias hidrográficas, libera gás carbônico para a atmosfera, reduz a umidade do ar, causa desequilíbrio social, econômico e ambiental. “A redução da umidade na Amazônia pode reduzir as chuvas na região centro-sul brasileira e até mesmo de outros países. Em 2005, quando a região amazônica sofreu com uma das maiores secas já registradas, o impacto atingiu áreas distantes e acarretou a perda de diversas culturas agrícolas no sul do Brasil e norte Argentina, com um prejuízo incalculável e perdas irreversíveis”, exemplifica Adriana.

Além das questões climáticas, o desmatamento causa também muitos prejuízos para a biodiversidade. “Com a perda de habitat, as espécies desaparecem, e com elas se perdem os serviços ambientais que nos prestam: metade da farmacopeia conhecida tem origem em extratos naturais e em substâncias presentes em diversos seres vivos. Compostos medicinais de origem natural são descobertos regularmente e, como parte da biodiversidade amazônica ainda é desconhecida, estamos perdendo esse patrimônio mesmo antes de conhecê-lo”, lamenta Branco.

Para Higuchi, as emissões causadas pelo desmatamento são irracionais. “Eu diria que o desmatamento na Amazônia contribui com 2/3 das emissões brasileiras. É difícil aceitar estas emissões como racionais porque a Amazônia contribui com menos de 8% na formação do produto interno (ou doméstico) bruto do Brasil”. Branco explica que a Floresta Amazônica se comporta como um enorme reservatório de carbono atmosférico: “Durante o seu crescimento, as árvores removem enormes quantidades de CO2 da atmosfera – metade da biomassa das árvores é constituída de carbono. Com o desmatamento, todo esse carbono é reemitido para a atmosfera, o que contribui ainda mais para o aumento do efeito estufa”, realça.

Como combater
Para coibir o desmatamento, de acordo com o pesquisador do Inpa, é necessário simplesmente cumprir as legislações vigentes. Ele acredita que as ações tomadas até agora não têm sido suficientes por falta de gente para impor as leis. Branco concorda: “As ações tomadas pelo poder público são vitais, mas não bastam. A grande iniciativa do governo consiste nas metas adotadas pela Política Nacional de Mudança do Clima, que prevê a redução do desmatamento para cerca de 20% dos níveis observados no período 1996-2005”, sinaliza. Para ele, é importante que a sociedade exija garantia de origem nos produtos que consome, por exemplo questionando as redes de supermercados se a carne que vendem é oriunda de área de desmatamento ilegal.

Adriana cita medidas adotadas no Acre em que a prática do manejo florestal é uma alternativa ao padrão de exploração dos recursos naturais na região. “Minha pesquisa de doutorado pela Universidade de São Paulo (USP), em parceria com a Embrapa, abordou aspectos da Certificação Florestal Comunitária para Produtos Florestais não Madeireiros e apontou que é possível desenvolver e ao mesmo tempo cumprir critérios que indiquem uma postura sustentável que seja ecologicamente correta e viável, e socialmente justa”. Ela destaca também a criação de unidades de conservação de uso sustentável, determinada pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC, 2000), que estimula o uso sustentável da floresta.

Créditos de carbono
Segundo Branco, ações de preservação na Floresta Amazônica podem gerar créditos de carbono. “Já existem alguns projetos demonstrativos em andamento. Em uma escala maior, há diversas propostas de como as empresas e mesmo unidades federativas podem cumprir metas de redução de emissões de carbono em parte financiando projetos que contribuam para a redução do desmatamento na região. Todas essas iniciativas estão em fase preliminar e, em um futuro próximo, teremos boas notícias sobre o assunto”, acredita.

Adriana pontua que a existência da floresta não confere ao Brasil hoje o direito de utilizar este grande mérito como crédito de carbono. “Porém, seria uma estratégia interessante do governo investir na inclusão de suas áreas florestais nessa proposta, pois serviria como incentivo à manutenção da Floresta Amazônica e demais áreas florestais contidas em seu território.”

Entretanto, Higuchi lembra que, quando o crédito de carbono surgiu como mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL), em 1997, no Protocolo de Quioto, houve grande expectativa para a proteção das florestas tropicais por meio, principalmente, da recuperação das áreas desmatadas. “No entanto, de 1997 até os dias atuais não há nenhum MDL-florestal aprovado na Amazônia. O crédito de carbono funcionou como ‘ouro de tolo’ naquela região”, lamenta.

Em relação à nova alternativa para proteger as florestas conhecidas como Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (Redd, em inglês), Higuchi defende que são necessários projetos consistentes. “O fracasso do MDL-florestal pode ser atribuído à falta de bons projetos. O mesmo pode ocorrer com o Redd se não houver bons projetos, porque esse mercado é muito exigente. Isso significa a utilização de métodos confiáveis, replicáveis e auditáveis”, finaliza.
Floresta Amazônica não é o pulmão do mundo

O mito de que a Floresta Amazônica é o pulmão do mundo surgiu associado ao mecanismo de fotossíntese e respiração das árvores, que têm capacidade de absorver o dióxido de carbono (CO2) e liberar o oxigênio (O2). Já o pulmão, ao contrário, absorve o oxigênio durante a inspiração e libera o dióxido de carbono durante a expiração. “Para enterrar de vez este mito, temos que pensar em escala também: na atmosfera há 21% de oxigênio e 0,04% de dióxido de carbono. Por mais que a Floresta Amazônica tivesse uma troca gasosa favorável com a atmosfera, a quantidade seria insignificante”, detalha Niro Higuchi, do Inpa.

“A grande maioria do oxigênio presente na atmosfera é produzida por algas nos oceanos, de modo que a contribuição das florestas em geral para a produção líquida desse elemento é pequena. Mas a Amazônia tem um papel importantíssimo para o clima global, que é a estocagem de enormes quantidades de carbono atmosférico”, acrescenta Magno Branco, da Iniciativa Verde.
Matéria de Patricia Piacentini, no pré-Univesp – Número 19 – Florestas, publicada pelo EcoDebate, 20/08/2012

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Terras indígenas da Austrália, Brasil e Canadá abrigam e protegem alta biodiversidade


Terras indígenas da Austrália, Brasil e Canadá abrigam e protegem alta biodiversidade




Terra Indígena Waimiri-Atroari
Terra Indígena Waimiri-Atroari. Foto: EBC/CIMI

Estudo destaca a importância de colaborar com comunidades indígenas para proteger a biodiversidade

Por Lou Corpuz-Bosshart * **
Mais de um milhão de espécies de plantas e animais em todo o mundo estão em extinção, segundo um recente relatório das Nações Unidas. Agora, um novo estudo conduzido pela UBC sugere que as terras administradas por indígenas podem ter um papel crítico em ajudar as espécies a sobreviver.
Os pesquisadores analisaram dados de terras e espécies da Austrália, Brasil e Canadá – três dos maiores países do mundo – e descobriram que o número total de aves, mamíferos, anfíbios e répteis era o mais alto em terras administradas ou co-geridas por comunidades indígenas.

Áreas protegidas, como parques e reservas de vida selvagem, tiveram o segundo maior nível de biodiversidade, seguido por áreas selecionadas aleatoriamente que não estavam protegidas.

O estudo, que focou em 15.621 áreas geográficas no Canadá, Brasil e Austrália, também descobriu que o tamanho de uma área e sua localização geográfica não afetam a diversidade de espécies.
“Isso sugere que são as práticas de manejo de terras de muitas comunidades indígenas que mantêm as espécies em alta”, disse o principal autor Richard Schuster, bolsista de pós-doutorado Liber Ero da Carleton University, que realizou a pesquisa na UBC. “No futuro, colaborar com os administradores das terras indígenas provavelmente será essencial para garantir que as espécies sobrevivam e prosperem”.

O estudo é o primeiro a comparar a biodiversidade e o manejo da terra em uma escala geográfica tão ampla, dizem os pesquisadores.

“Analisamos três países com climas e espécies muito diferentes, para ver se o padrão se aplica a essas diferentes regiões – e foi o que aconteceu”, disse o co-autor Ryan Germain, um pós-doutorado na Universidade de Cornell. “De sapos e pássaros canoros até grandes mamíferos como ursos pardos, jaguares e cangurus, a biodiversidade era mais rica em terras administradas por indígenas.”
Os programas tradicionais de conservação dependiam da designação de certas áreas como parques e reservas, e esses resultados destacam a importância de expandir a conservação além de suas fronteiras típicas, diz o autor sênior do estudo, Peter Arcese, professor de florestas da UBC .

“As áreas protegidas são um dos pilares da conservação da biodiversidade globalmente, mas os níveis atuais de proteção serão insuficientes para deter a crise de extinção planetária”, disse Arcese, presidente da Renovação de Florestas da BC em Biologia da Conservação na UBC. “Precisamos administrar uma fração maior da área do mundo de forma a proteger as espécies e levar a resultados positivos para as pessoas e as espécies nas quais eles dependem há milênios.”

Os pesquisadores notaram que, no passado, quando as áreas protegidas eram estabelecidas, os povos indígenas eram às vezes excluídos do uso de terras nas quais dependiam anteriormente para alimentos e materiais. Isso foi prejudicial para muitas comunidades indígenas e não atingiu necessariamente as metas originais de conservação.

“As terras administradas por indígenas representam um importante repositório de biodiversidade em três dos maiores países da Terra, e os povos indígenas atualmente administram ou têm estabilidade em cerca de um quarto da área terrestre do planeta”, disse o co-autor Nick Reo, professor adjunto. de estudos ambientais e estudos nativos americanos no Dartmouth College e um cidadão do Sault Ste. Marie, tribo de Ontário de índios Chippewa.

“À luz disso, colaborando com indígenas, comunidades e organizações podem ajudar a conservar a biodiversidade, assim como apoiar os direitos indígenas à terra, o uso sustentável dos recursos e o bem-estar.”
O estudo foi publicado na semana passada na Environmental Science & Policy .
Referência:
Vertebrate biodiversity on indigenous-managed lands in Australia, Brazil, and Canada equals that in protected areas
Richard Schusterab, Ryan R.Germaina, Joseph R.Bennett, Nicholas J.Reo, Peter Arcese
Environmental Science & Policy
Volume 101, November 2019, Pages 1-6
https://doi.org/10.1016/j.envsci.2019.07.002

* Com informações da University of British Columbia (UBC)
** Tradução e edição de Henrique Cortez, EcoDebate.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 02/08/2019
Terras indígenas da Austrália, Brasil e Canadá abrigam e protegem alta biodiversidade, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 2/08/2019, https://www.ecodebate.com.br/2019/08/02/terras-indigenas-da-australia-brasil-e-canada-abrigam-e-protegem-alta-biodiversidade/.

Solidariedade ao diretor do INPE demitido nesta sexta



Solidariedade ao diretor do INPE demitido nesta sexta



02 Agosto 2019   |   0 Comments
 
Lamentamos a exoneração do presidente do INPE, Ricardo Galvão, e nos solidarizamos a ele na defesa do INPE como instituição científica e na defesa da elaboração e da divulgação pública e apolítica dos dados de desmatamento. Vemos com preocupação a dispensa de um quadro técnico de alta e reconhecida excelência, esperando que não seja um prenúncio de que as informações --estratégicas sobre o desmatamento no nosso país-- serão censuradas ou alteradas.

Neste momento, o Palácio do Planalto e o Ministério do Meio Ambiente deveriam se preocupar em efetivamente combater o desmatamento descontrolado, uma chaga que aflige a sociedade brasileira e vem causando imensos prejuízos a todos, inclusive para a agricultura de regiões do centro-sul do país, que depende diretamente das chuvas produzidas pela floresta para poder existir.

Falas de Bolsonaro são como Viagra para desmatadores”, diz Sirkis

Falas de Bolsonaro são como Viagra para desmatadores”, diz Sirkis

Ex-coordenador do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima diz que presidente estimula crime ambiental e que tem dúvida sobre continuidade do fórum



Alfredo Sirkis (Foto: Brizza Cavalcante/Câmara dos Deputados)
Alfredo Sirkis (Foto: Brizza Cavalcante/Câmara dos Deputados)
O jornalista e ex-deputado federal Alfredo Sirkis foi exonerado em maio do cargo de secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima pelo ex-colega de Câmara, Jair Bolsonaro (PSL-RJ). A demissão do posto, que não é remunerado, ocorreu a pedido do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Novo-SP), cuja atuação Sirkis criticava (e ainda critica).

Desmobilizado durante o governo de Dilma Rousseff, o fórum passou seis meses acéfalo e foi remontado na gestão Temer, com Sirkis assumindo a secretaria-executiva em 2017. Nesse período, produziu uma proposta de plano de implementação da NDC, a meta do Brasil no Acordo de Paris, e começava a discutir um plano de longo prazo para a descarbonização da economia brasileira na metade do século. Com um governo que desmontou a agenda de clima, o futuro desses trabalhos é incerto.

Segundo Sirkis, a preocupação mais imediata para o país no clima é com a volta do desmatamento, que, segundo ele, pode ser mais “uma grande onda do que um repique”. Pior, essa onda é soprada pelo próprio Presidente da República, que, além de desmobilizar a fiscalização, dá sinais de estímulo ao crime ambiental ao dizer, por exemplo, que o Ibama não deve destruir equipamentos apreendidos de desmatadores. “Isso é como um Viagra para os grileiros de florestas públicas, devolutas ou em unidades de conservação, que agora vão ser desmatadas com mais voracidade, porque o ‘Mito’ liberou geral”, afirma.


Leia a entrevista.
*
O que tem a dizer sobre a mudança no fórum, com sua saída em maio?
Normal. Seria a quadratura do círculo coordenar um fórum presidido por um presidente da República mais seu entorno com convicções negacionistas. Fomos colegas por seis anos – dois, no Rio, como vereadores e quatro como deputados federais. Era uma relação adversária mas, em geral, pessoalmente cordial. Então eu o conheço muito bem. Sabe muito pouco, toma conhecimento dos temas de orelhada e mentalmente coloca mudanças climáticas e meio ambiente, pavlovianamente, na caixinha do “comunismo”.
Estar no poder obviamente piora mais ainda, vem aquela sensação de onipotência.


Bolsonaro vê a questão de mudança do clima como algo “da esquerda”…
Uma bobagem. A esquerda que nos anos 1980, 1990 era majoritariamente hostil – ecologia é preocupação pequeno-burguesa, desvia da luta de classes. Acabou adotando o tema depois do assassinato do Chico Mendes. Há ali ambientalistas sérios, mas uma boa parte enxergava nesses temas apenas “bandeiras de luta”, que tentam associar a um anticapitalismo nefilibata. A economia de mercado seria intrinsecamente antiecológica. Mas economia de mercado é o existe hoje no mundo inteiro. Pode ser mais, menos ou nada sustentável, mas é a realidade global. Quem visitou o “socialismo real”, antes da queda do Muro de Berlim, viu o desastre ecológico que era aquilo. Na verdade, Bolsonaro e sua turma ignoram que os pioneiros da ecologia no Brasil foram o Marechal Rondon, que dispensa apresentações, o major Archer, que fez o maior reflorestamento no planeta, antes dos atuais que estão sendo feitos pelos chineses, o almirante Ibsen Gusmão, Marcelo de Ipanema e José Lutzemberger – nenhum deles um “esquerdopata”, como eles dizem.


Mas a geração de vocês tinha essa tendência.
[Fernando] Gabeira, [Carlos] Minc e eu, que somos uma segunda ou terceira geração de ambientalistas, de fato viemos da esquerda, dos anos 1970, mas já com uma visão crítica dela. Por isso fundamos o PV, que acabou nas mãos da pequena política tradicional, embora ainda restem alguns abnegados como o Eduardo Jorge, o Rogério Medeiros e o André Fraga. Mudança climática não é nem de esquerda nem de direita, é sobre o futuro de nosso filhos, netos e bisnetos, para que não vivam num inferno sobre a Terra. A questão climática, muito mais que “ambiental” no sentido estreito da palavra, é uma agenda de desenvolvimento sustentável, onde a economia tem um peso central.

O negocionismo climático é de direita?
Já encontrei negacionistas de esquerda que achavam que era tudo uma farsa do imperialismo americano contra nosso desenvolvimento. Agora o Trump atribui à China. Negacionismo é burrice ou lobby, ponto. São como aqueles médicos, contratados pela indústria do tabaco, nos anos 1950 que iam à TV dizer que não havia “prova científica” que cigarro dava câncer. Aí era lobby, odioso, assassino.

Na ala da burrice são que nem os terraplanistas. No Brasil, nem o lobby do carvão nem o do petróleo são negacionistas. Aceitam a discussão de descarbonização mas em termos que não cabem numa trajetória nem de 2 graus. Negacionistas são os “olavetes” e a turma, criminosa, do desmatamento ilegal.


O desmatamento subiu mais de 200% em julho e fechará o ano bem acima da taxa do ano passado. O que fazer?
Temo que, mais que um repique, isso seja uma grande onda, mesmo. Temos um discurso presidencial de “liberou geral”, o desmantelamento da fiscalização. O Ibama, antes, já estava quase em colapso com metade do efetivo necessário e um concurso que tardava e não saía. 

Agora… é um enorme estímulo quando você proíbe a destruição in loco do equipamento das facções criminosas que desmatam e poluem rios com mercúrio e matam indígenas. Não pode destruir mais o trator com correntão, quebrar a motosserra ou o equipamento do garimpo ilegal. É legalmente autorizado, mas vai o Presidente na internet dizendo que não pode mais – o MP deveria verificar se ali não há um crime de responsabilidade dele. Isso é como um Viagra para os grileiros de florestas públicas, devolutas ou em unidades de conservação, que agora vão ser desmatadas com mais voracidade, porque o “Mito” liberou geral. Isso também estimula a indústria de falsificação cartorial para “esquentar” o produto desse desmatamento e se apropriar de terras da República. Vejo o assunto no colo do ministro Sérgio Moro.


E desmatamento legal?

Aí precisamos encontrar mecanismos de estimulo econômico, como o pagamento por serviços ambientais e a precificação positiva. Esse estímulo tem de servir tanto para a população pobre da floresta ser desestimulada, para ajudar a evitar que se envolvam com atividades ilegais, quanto para o empresário do Cerrado, por exemplo, que pode legalmente desmatar, mas passa a ter um estímulo para não fazê-lo. Há projetos no Congresso, é uma questão complexa, mas precisa ser enfrentada.


Como vê o futuro do fórum?
O Oswaldo Lucon é uma pessoa com conhecimentos técnicos, uma boa visão ambiental e climática. Está numa missão dificílima. Não pode ficar subordinado a este ou aquele ministério, precisa se relacionar com os oito ou nove ministérios que participavam do GEx, o grupo executivo para mudanças climáticas. Volto a repetir: clima não é uma questão “ambiental” mas de desenvolvimento.
Precisa manter a interlocução com as o setor empresarial, as ONGs e a academia sem se dobrar a pressões idiossincráticas ou ideológicas. E, sobretudo, precisa dar continuidade ao que vinha sendo feito. Passamos dois anos preparando, com aporte de 214 organizações desses quatro setores e   537 pessoas da Proposta Inicial para a Implementação da NDC Brasileira. É, de fato, um documento fruto de um trabalhoso consenso e serve de base para discussão com o governo, qualquer governo, inclusive esse. Tem também a discussão de longo prazo para o qual existe o estudo Brasil Carbono Neutro em 2060 e A Estratégia de Longo Prazo para 2050.


O que acontece com a agenda do fórum, que incluía a revisão da NDC?
Não sei. Me ofereci para ajudar numa transição harmônica, desde que o fórum não seja deturpado ou rebaixado. Este ano estaria programada a discussão de metas setoriais e a de uma proposta mais avançada de NDC, para 2020, pois sabemos que o somatório das atuais nos coloca numa trajetória de 3 graus. O primeiro documento nos oferece dicas de como poderíamos ir mais longe. Acho que uma nova NDC brasileira deveria ser condicional a um Fundo Garantidor internacional que financie maciçamente projetos de descarbonização ao menor juro existente no mercado internacional com o melhor prazo de carência. Os governos do países ricos devem oferecer garantias a esse fundo, junto com os entes multilaterais. E temos de avançar no conceito da precificação do menos-carbono. Nós colocamos isso no Acordo de Paris: as ações de mitigação possuem um valor econômico intrínseco: o menos-carbono vale dinheiro.


E a questão subnacional a que você vem se dedicando?
Independentemente do fórum, mas desejando seu apoio, entre outros, estou trabalhando com os governos de Estado, prefeituras e iniciativa privada num ente subnacional. Isso já era crucial antes desse governo. Envolve a ABEMA, a ANAMA, o ICLEI, as associações diversas de prefeitos, organizações empresariais como o CEBDS, a Ethos. Envolve um diálogo com a FIESP, a FIRJAN e outros.
Mesmo que fosse outro tipo de governo, seria crucial melhorar muito a performance nos Estados. Há males que vem para o bem, vou ter mais tempo para isso.


Que outras iniciativas?
Estou terminando de escrever meu novo livro. Chama-se Descarbonário. Embora no jogo de palavras assim pareça não se refere ao tema de Os Carbonários, meu best seller de já lá se vão 40 anos, premio Jabuti, em 1981. É sobre minha ação na descarbonização, como fui entendendo a questão da mudança do clima, que, inicialmente, considerava apenas uma dentre muitas questões “ambientais” virou tão importante para mim. Foi a partir de 2005, ouvindo uma líder esquimó, que passei a vê-la como a grande questão civilizacional contemporânea. Conto também de algumas questões e folclores da política brasileira, no último período em que participei dela, quando deputado federal. Analiso os antecedentes da atual situação.

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Declaração do secretário executivo do Observatório do Clima sobre a exoneração de Ricardo Galvão

02 - agosto - 2019

Declaração do secretário executivo do Observatório do Clima sobre a exoneração de Ricardo Galvão

A exoneração de Ricardo Galvão é lamentável, mas era esperada. Ele selou seu destino ao não se calar diante das acusações atrozes de Jair Bolsonaro ao Inpe.

Foto: Google
Foto: Google
A exoneração de Ricardo Galvão é lamentável, mas era esperada. Ele selou seu destino ao não se calar diante das acusações atrozes de Jair Bolsonaro ao Inpe.

Ao reagir, Galvão também preservou a transparência dos dados de desmatamento, ao chamar a atenção da sociedade brasileira e da comunidade internacional para os ataques sórdidos, autoritários e mentirosos de Bolsonaro e Ricardo Salles à ciência do Inpe.

A imagem do Brasil já está irremediavelmente comprometida por essa cruzada contra os fatos. Nos próximos meses, Bolsonaro e seu ministro do Ambiente descobrirão, do pior jeito, que não adianta matar o mensageiro, nem aparelhar o Inpe: a única maneira de evitar más notícias sobre o desmatamento é combatê-lo.”