quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Manifesto defende manutenção da Fundação Parque Zoológico de São Paulo

 ((o))eco

 

Manifesto defende manutenção da Fundação Parque Zoológico de São Paulo

Duda Menegassi
segunda-feira, 17 agosto 2020 20:02
A Fundação Parque Zoológico de São Paulo está na lista de cortes proposta por 
Doria. Foto: Zoo SP/Facebook
Na última quinta-feira (13), o governo do Estado de São Paulo enviou um Projeto de Lei – em tramitação de urgência – para aprovar um plano de corte de gastos que o enxugamento de 10 institutos e fundações. O PL nº 529/2020, apesar de ter poupado a Fundação Florestal de uma controversa extinção, gerou manifestações contrárias da sociedade civil e organizações por propor a fusão de três institutos de pesquisa e o fim da Fundação Parque Zoológico de São Paulo.
Um manifesto produzido em defesa da Fundação Parque Zoológico destaca seu papel como aliada da conservação da biodiversidade, na medida em que exerce um relevante papel na manutenção de espécies ameaçadas de extinção. O texto destaca que a instituição usa seus recursos integralmente para manter mais de 2 mil animais, dois terços deles parte de programas de reprodução ex situ e de projetos de pesquisa.


“Somos referência no manejo reprodutivo e na manutenção de espécies nativas ameaçadas, como, por exemplo, micos-leões (Leontopithecus sp.), tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), Arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari), Perereca-dealcatrazes (Ololygon alcatraz) e Jararaca-ilhoa (Bothrops insularis) para subsidiar programas de conservação integrada in situ-ex situ, bem como no desenvolvimento de técnicas de criação artificial de filhotes órfãos e incubação artificial de ovos. A Fundação também participa de programas de reintegração de fauna em natureza, recentemente tendo enviado exemplares de Jacutinga (Aburria jacutinga). O corpo técnico também conta com equipe especializada em técnicas de promoção de bem-estar animal, como enriquecimento ambiental e condicionamento animal”, destaca o manifesto.


O manifesto faz referência também a história da Fundação, criada em 1958, e que desde então já recebeu mais de 93 milhões de visitantes e possui uma arrecadação anual de cerca de 30 milhões de reais.


Segundo proposto pelo Projeto de Lei enviado à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), “a operação das atividades voltadas à visitação pública, educação ambiental e conservação do patrimônio público e dos ativos ambientais realizada em suas instalações serão transferidas à iniciativa privada, por meio de procedimento licitatório adequado. As atividades relacionadas ao desenvolvimento de pesquisas, gestão de unidades de conservação, fiscalização do Zoológico, Jardim Botânico e demais atividades públicas serão transferidas a entidades de ensino e pesquisa que compõem a Administração” (PL nº 529/2020).


O manifesto destaca que independente da concessão de serviços à iniciativa privada, as “pesquisas e a proteção das espécies ameaçadas de extinção continuarão sob a responsabilidade do Governo do Estado e da Fundação Parque Zoológico, inclusive previstos em edital e seus anexos, com destaque à previsão de infraestrutura para equipe de fiscalização contratual”.


O texto é assinado por representantes do Instituto para Criação e Conservação da Fauna (ICFAU), do Instituto Arara-Azul, do Instituto Espaço Silvestre, e da empresa Nutropica.

Um abaixo-assinado virtual também foi criado para defender a manutenção da Fundação e já conta com mais de 4 mil assinaturas.

Abaixo-assinado contra fusão do Instituto Florestal

Outras ”vítimas” do corte de gastos previsto pelo governo paulista são os institutos Florestal, de Botânica e Geológico, que serão centralizados em um único centro de pesquisas ambientais. A decisão gerou uma manifestação contrária por parte de setores da sociedade, que também organizaram um abaixo-assinado que, até o fechamento desta edição, já contabilizava mais de 6 mil assinaturas.



Em contradição aos dados, Mourão declara que “a floresta não está queimando”

Salada Verde((o))eco


Em contradição aos dados, Mourão declara que “a floresta não está queimando”

Salada Verde
 
quarta-feira, 19 agosto 2020 20:14


Mourão durante sua apresentação no Fórum Amazônia +21. Foto: Reprodução
 
 
A apresentação feita nesta quarta (19) pelo vice-presidente General Mourão no Fórum Amazônia +21 reforçou mais uma vez o discurso adotado pelo governo que tenta minimizar os dados que comprovam a acelarada destruição da floresta. Mourão alegou que o desmatamento está todo concentrado nas áreas antropizadas da Amazônia, e o que normalmente se chama de Arco do Desmatamento, ele apelidou de “Arco de Humanização”. Não bastasse, reforçou que “a floresta não está queimando”, pois as queimadas só ocorrem nessas áreas “humanizadas”. Além disso, minimizou a exportação de gado oriundo de áreas desmatadas ilegalmente, louvou os esforços feitos na ditadura militar para “desenvolvimento” da região amazônica, e ainda alfinetou o ator Leonardo DiCaprio, com um convite para marchar com ele por 8 horas na selva e entender “como funcionam as coisas nessa imensa região”.

Durante sua apresentação, Mourão usou um mapa para apontar o que ele chamou de “Arco da Humanização”, que corresponderia aos 16% da floresta já desmatada. “Onde ocorre queimada na Amazônia é naquela área humanizada. A floresta não está queimando. E no entanto, a imagem que é passada para o resto do Brasil e da comunidade internacional é de que tem fogo na floresta, e não adianta você mostrar o mapa da NASA, o mapa do INPE que a turma não aceita o dado”, declarou durante sua fala no Fórum (assista na íntegra aqui)..

“Nós não somos os vilões da sustentabilidade, muito pelo contrário (…) temos mais de 60% do nosso território com a cobertura vegetal original e dentro da Amazônia, 84% da floresta está em pé, preservada”, argumentou o vice-presidente.

Em seu discurso, ele também diminuiu o avanço ilegal das atividades agropecuárias para cima da floresta e desmentiu que o país estivesse exportando essas commodities oriundas de áreas desmatadas. “Não existe essa situação de que o Brasil está exportando para o resto do mundo, produtos que saem ilegalmente da floresta. Se isso ocorre é numa percentagem ínfima”.
Na apresentação, o vice e também chefe do Conselho da Amazônia defendeu a aprovação do Projeto de Lei 2.633/2020 – a nova carapuça da MP da Grilagem – e listou, como é costumeiro a esse governo quando o assunto é proteção ambiental, uma série de metas vagas e sem nenhuma grande explicação sobre como o governo irá alcançá-las.

Durante o discurso de Mourão sobrou até para o ator americano e ativista ambiental, Leonardo DiCaprio. “Eu gostaria de convidar o nosso mais recente crítico, o ator Leonardo DiCaprio, para ir comigo até São Gabriel da Cachoeira. Nós fazemos uma marcha de 8 horas pela selva entre o aeroporto de São Gabriel e a estrada de Cucuí e ele vai aprender em cada socavão que ele tiver que passar que a Amazônia não é uma planície. E aí entenderá melhor como funcionam as coisas nessa imensa região”, ironizou o vice. Em que momento DiCaprio chamou a Amazônia de planície ou o que isso tem a ver com a defesa da Amazônia, nós também não sabemos, mas não é a primeira vez que o governo ataca o ator de Hollywood. Em 2019, o próprio Bolsonaro já havia acusado DiCaprio de financiar as ONGs que “tacavam fogo na Amazônia”. (Duda Menegassi)

Pantanal tem aumento de mais de 200% nas queimadas em julho em comparação a 2019

CONEXÃO PLANETA

 

Pantanal tem aumento de mais de 200% nas queimadas em julho em comparação a 2019

Pantanal tem aumento de mais de 200% nas queimadas em julho em comparação a 2019
Como mostramos aqui no Conexão Planeta recentemente, o Pantanal tem sofrido com os incêndios: os focos de calor no primeiro semestre já são os mais altos dos últimos 20 anos. Nas duas últimas semanas, vários órgãos dos governos estadual e federal uniram forças para tentar controlar o fogo.
A prova de que os incêndios estão mais intensos do que em anos anteriores foi confirmada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que divulgou dados ontem (03/08) revelando que as queimadas no mês de julho no Pantanal foram 240% maiores do que no mesmo período do ano passado.

De acordo com o instituto, foram registrados 1.684 pontos de incêndio no bioma no mês passado, o número mais alto para julho desde que se começou a coletar esses dados em 1998. No ano passado, foram observados 494 focos de calor.

Só no Mato Grosso do Sul, entre janeiro e julho deste ano foram detectados 3.623 mil focos de incêndio, um aumento de 88% em relação ao primeiro semestre de 2019.

No último dia 1o de julho, o governo do estado decretou emergência ambiental no Pantanal.
Os pantaneiros estão acostumados com a temporada das queimadas na região, que normalmente, começa em agosto e vai até outubro. O clima nessa época do ano fica mais seco, sem chuvas e os ventos são mais fortes. Mas estão assustados com a situação atual.

Na verdade, em março, a Nasa havia divulgado imagens de focos de incêndio “fora de hora” por lá.
Pantanal tem aumento de mais de 200% nas queimadas em julho em comparação a 2019
O fogo atinge regiões remotas, o que torna o controle mais difícil

Patrimônio da Humanidade e Reserva da Biosfera, o Pantanal é a maior planície alagável de água doce do mundo e abrange os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além de áreas da Bolívia e do Paraguai. O bioma é habitat de mais de 650 espécies de aves e 130 de mamíferos.

Em 15 de julho, o governo federal decretou uma moratória do fogo, proibindo queimadas por 120 dias tanto no Pantanal, como na Amazônia. O que ocorre é que muitos produtores colocam fogo em suas propriedades para “limpar” o solo e assim, poder plantar novamente e fazer pastagem para o gado. Como a vegetação já está seca, qualquer fagulha se torna o estopim para incêndios de grandes proporções.

Em 2019, o Pantanal também sofreu com o fogo. Dados do Inpe mostraram que no ano passado houve um salto de 493% nos focos de queimada, seis vezes maior do que em 2018 (leia mais aqui).

Fotos: Saul Schramm (abertura) e CBMS/Fotos Públicas
Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.

Brasil lidera ranking de países com maior perda florestal na última década

Brasil lidera ranking de países com maior perda florestal na última década

Brasil lidera ranking de países que mais tiveram perda florestal na última década
O mundo tem mais de 4 bilhões de hectares de florestas, o que representa 31% da área total da Terra. Mais da metade (54%) delas está em apenas cinco países – Rússia, Brasil, Canadá, Estados Unidos e China. E um novo relatório lançado pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês) revela quais são as nações que mais tiveram progresso em conter o desmatamento e as que ainda enfrentam dificuldades para reduzir a destruição florestal.
De acordo com a “Avaliação Global de Recursos Florestais”, as áreas com perdas florestais estão aumentando, mas a taxa de devastação diminuiu.

O mundo perdeu 178 milhões de hectares de florestas desde 1990, uma área equivalente ao tamanho da Líbia. Na grande maioria, essas terras foram convertidas em solo para a agricultura. Todavia, a taxa de perda diminuiu substancialmente na última década, devido a uma redução no desmatamento em alguns países, além de aumentos na vegetação em outros, através de processos de reflorestamento e expansão natural das florestas.

A taxa de perda líquida de florestas caiu de 7,8 milhões de hectares por ano, na década de 1990-2000, para 5,2 milhões anuais entre 2000 e 2010 e atingiu o patamar atual de 4,7 milhões nos últimos dez anos.

Os países que apresentaram os melhores índices de ganhos florestais foram China, Austrália, Índia, Chile, Vietnã, Estados Unidos, França, Itália e Romênia.

Outra boa notícia trazida pelo levantamento da FAO é que a área de florestas protegidas no planeta aumentou em 191 milhões de hectares, totalizando cerca de 725 milhões de hectares, 18% do volume de florestas na Terra.

“Embora a taxa de desmatamento tenha diminuído bastante nas últimas décadas, ainda permanece como uma fonte de grande preocupação. No ritmo atual, corremos o risco de não cumprir as metas para 2030 relacionadas ao manejo florestal sustentável”, ressaltou Anssi Pekkarinen, especialista da FAO em florestas.

“Precisamos intensificar os esforços para deter o desmatamento e assim, contribuir para a produção sustentável de alimentos, o alívio da pobreza, a segurança alimentar, a conservação da biodiversidade e as mudanças climáticas, mantendo a produção de todos os outros bens e serviços que as florestas fornecem”, enfatizou.
Brasil lidera ranking de países que mais tiveram perda florestal na última década
Gráfico mostra os países com maior áreas de florestas no mundo

Agora, as más notícias…

Na verdade, o relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação não traz nenhuma novidade. Outros levantamentos realizados por outras entidades já tinham apontado que o Brasil é o país que mais tem desmatado no mundo.

Há pouco mais de um mês,  um estudo com dados da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, publicado pelo Global Forest Watch, que divulgamos nesta outra reportagem, revelava que o Brasil aparecia em 1o lugar na lista das nações que tiveram maior perda árborea em 2019, assim como já havia acontecido em 2018. Nosso país contabilizou, sozinho, por um terço da redução global de florestas tropicais primárias no ano passado.

O levantamento da FAO confirma os demais estudos e coloca o Brasil no topo dos dez países que mais perderam florestas entre 2010 e 2020. Abaixo dele estão Congo, Indonésia, Angola, Tanzânia, Paraguai, Myanmar, Cambódia, Bolívia e Moçambique.
Brasil lidera ranking de países que mais tiveram perda florestal na última década
Ásia, Oceania e Europa tiveram aumento de suas florestas, enquanto África e América do Sul caminham em sentido oposto

*O relatório completo da FAO, com 186 páginas, você encontra neste link


Foto: Vinícius Mendonça/Ibama

Em série de vídeos, a atriz e produtora Alice Braga conta como o agronegócio está destruindo o planeta… e o que podemos fazer para impedir que isso aconteça



Em série de vídeos, a atriz e produtora Alice Braga conta como o agronegócio está destruindo o planeta… e o que podemos fazer para impedir que isso aconteça 

 https://youtu.be/AELP19ocg38?list=PLgypAGt9KjpAPT1jneZKS9aw4LagwBjn6

 https://youtu.be/VmuhQ3Wiqlk

 https://youtu.be/gzDw0uVJa3M




“Os vídeos a seguir foram feitos antes da crise da covid-19, mas hoje eles parecem mais relevantes do que nunca. Se há uma lição que estamos aprendendo, é que uma mudança está a caminho. Voltar ao que chamávamos de ‘normal‘, não é aceitável. Na verdade, a ‘normalidade’ era o que estava errado. Depende de nós lutar pelo futuro que precisamos, pelo futuro que queremos. Vamos seguir juntos e cuidar uns dos outros”.

É assim que a atriz e produtora Alice Braga apresenta a série de três vídeos (que você pode assistir no final deste post) intitulada Você sabe de onde vem sua comida?, que gravou a convite do Greenpeace – em português e inglês – para contar como o alimento chega ao nosso prato, sob a lógica cruel do sistema de produção de alimentos, liderado pelo agronegócio, responsável por 80% de todo desmatamento no planeta.


Foto: Victor Moriyama/Greenpeace
E, aqui, não falamos apenas da destruição das florestas, mas também de prados, de zonas úmidas e de outros ecossistemas essenciais para evitar o desequilíbrio do planeta: secas, enchentes, deslizes de terra… “Esses ecossistemas estão sendo rapidamente transformados em enormes zonas de monocultura e pastagens”, destaca Alice.


Mas justamente por não pactuar com a volta à normalidade, que a série não se limita a apresentar este cenário caótico. Seu objetivo é o engajamento para que, antes mesmo de a pandemia de covid-19 terminar, trilhemos um caminho diferente, tomemos atitudes que ajudem a frear a lógica atual de produção dos alimentos – que envolve as grandes empresas alimentícias – e seu impacto, que contribui para as mudanças climáticas.

“Quando os ecossistemas viram pastos ou plantações, param de absorver dióxido de carbono e a emitir mais carbono”.

Vida de commodities



Fotograma do documentário “Sob a pata do boi”
Para dar a dimensão do problema, Alice faz a conexão entre os alimentos que consumimos e commodities, como óleo de palma, soja, carne e laticínios – “existe um fluxo econômico que transforma tudo que comemos em commodities e que está totalmente fora de controle”-, destruição do meio ambiente e crise climática e apresenta números terríveis. Veja…


Você imagina que existem 1/2 bilhão de cabeças de gado no planeta? Esse número equivale à soma das populações da Rússia e dos Estados Unidos!! E a quantidade de galinhas? São 23 bilhões! Ou seja, “três galinhas por pessoa na terra” ou três vezes a população de humanos! Então, é preciso mais terras para produzir grãos e alimentar esses animais. E estamos falando apenas de gado e galinhas. Hoje, utiliza-se mais terra para “cultivar comida para os animais do que para as pessoas. E a gente não escolheu isso!”.


Nestlé, Hershey e Mars acusadas de usar óleo de palma de florestas desmatadas, denuncia ONG internacional
Em 2017, ONG denunciou Nestlé, Hershey’s e Mars de usar óleo de palma de florestas desmatadas
Como se não bastasse, com toda essa performance, o agronegócio é responsável por emissões de gases de efeito estufa (GEEs) em quantidade equivalente a emitida por todos os carros, trens, navios, ônibus e aviões juntos! Ou seja, por causa desse setor as alterações do clima só aceleram.
E o cenário é ainda mais tenebroso no Brasil: o atual sistema de produção de alimentos está amparado por leis governamentais e não só avança sobre os ecossistemas como também impacta os pequenos produtores rurais. A agricultura industrial utiliza agrotóxicos, muitas vezes em áreas invadidas (terras públicas griladas) e, assim, pode oferecer “comida mais barata” do que a cultivada pelos pequenos.


Nesse cenário, sem subsídios e produzindo alimento no tempo da natureza – sem acelerar nem alterar processos – os produtores familiares ainda levam a fama de produzir comida cara: por isso que ainda se ouve muito, por aí: “a comida orgânica é cara”.

Dá pra mudar um sistema quebrado?



Manifesto conclama empresas a apoiar o desmatamento zero no Cerrado
Foto: Alf Ribeiro, divulgação Mighty Earth
Depois de apresentar o panorama no qual vivemos e nos deixar atônitos, no segundo vídeo, Alice conta sobre como funcionam as grande empresas do agronegócio. “Agora, a gente já sabe que o mundo não pode sustentar a forma como a nossa comida está sendo produzida. Afinal, ela está literalmente incendiando o planeta”, salienta.

Se beneficiando deste sistema criminoso estão megaempresas como Unilever, Bunge, Cargil e JBS. A maioria com histórico de impactos sociais e ambientais. Apesar de não encontrar evidencias de envolvimento em violações dos direitos humanos, na semana passada, a Anistia Internacional denunciou a JBS, maior produtora de carne bovina do mundo, por incluir, em sua cadeia de fornecimento, gado criado ilegalmente em áreas protegidas na Amazônia.

Há dez anos, algumas das maiores empresas do mundo prometeram parar de contribuir com o desmatamento até 2020. Foi no Fórum de Bens de Consumo (The Consumer Goods Forum – CGF), durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Cancún. Isso aconteceu sob forte pressão da sociedade civil e da comunidade científica, que já alertava para a acelerada crise do clima e a necessidade de preservar as florestas.

“As companhias prometeram redobrar cuidados com fornecedores das commodities mais ligadas à destruição florestal: soja, gado, óleo de palma e papel e celulose”, conta o Greenpeace em seu site. Mas o prazo acabou e as florestas continuam sendo destruídas a um ritmo alarmante.

O Greenpeace pediu a 50 grandes empresas para que divulgassem a origem dos produtos utilizados em sua rede, mas apenas cinco atenderam à solicitação. Todas disseram que suas redes de abastecimentos são “muito complicadas”. Sim, em geral, suas redes de fornecedores são muito extensas, o que, muitas vezes, impede que se chegue ao produtor de origem.

Alice, então, insiste na necessidade de responsabilizá-las pelo que produzem e comercializam, afinal, vêm daí os impactos no meio ambiente e nas comunidades locais. Disputas de terra, conflitos, mortes, ameaças e contaminação destroem as comunidades tradicionais: indígenas, quilombolas e rurais. Em geral, por trás desse rastro de destruição está uma grande e poderosa empresa.

Grande marcas se comprometeram com a conservação ambiental, mas, como destaca Alice: “se estivessem mesmo comprometidas em parar o desmatamento, estariam rastreando suas compras do começo ao fim, protegendo as terras indígenas e financiando a restauração florestal”. Mas o dinheiro é que determina a proteção ou não da vida e do planeta. E, enquanto ele estiver garantido – no entender do antiministro do meio ambiente, Ricardo Salles, enquanto a boiada puder passar – nada será feito. Cabe, então, a nós, consumidores, pressionar essas empresas e boicotá-las. E pressionar o Governo também.

O que fazer para construir outro futuro

No último vídeo, o terceiro da série, Alice convida todos a participarem e indica que ações pontuais podem contribuir para “começar a desmontar esse sistema”. Nossas escolhas estão em prSempre ouvimos dizer que é “assim que as coisas são” e que esse é o sistema que funciona. Que é assim que a comida chega no nosso prato e que isso é “normal”. Que é “assim que as coisas são”. Que este sistema é que funciona. Mas, não!

Este é um sistema doente, um sistema de produção que está fora de controle, que alimenta o desmatamento e a crise climática. Mas o mais importante: ele não é inevitável porque foi planejado. Isto significa que, agora, depois da prova de sua falência comprovada – ele está nos matando! -, podemos projetar algo melhor, mais justo, mais humano.

Por isso, no último vídeo, o terceiro da série, Alice convida todos a participarem e indica que ações pontuais podem contribuir para “começar a desmontar esse sistema”. Nossas escolhas estão em primeiro lugar, claro. Nesse contexto, parar de comer carne ou, pelo menos, reduzir o consumo, é importante. O Greenpeace lidera a campanha #SegundaSemCarne lançada em outubro de 2009.

“Ficar um dia da semana sem consumir produtos de origem animal parece pouco, mas isso já provoca muitas consequências positivas”, indica a ONG em seu site. “Como apontou Monica Buava, gerente de campanhas da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), “a gente nem se dá conta, mas sim, a  


Segunda Sem Carne está mudando a realidade do consumo de carne e derivados no país”. Mais de 327 milhões de refeições vegetarianas e veganas foram oferecidas até hoje, graças à essa campanha, realizada com diversos parceiros. Acompanhe o perfil e a hashtag no Instagram.

Mas o que Alice indica no vídeo vai muito além das mudanças empreendidas por quem consome: para um resultado efetivo, essas mudanças devem ser feitas também por quem está no topo. É aí que entra nosso poder como cidadãos! E ela indica cinco ações de impacto:
  • Apoiar e defender os direitos dos povos indígenas e a luta pela terra em todo o mundo, afinal, essas comunidades estão sempre na “linha de frente” contra a “economia do apocalipse”. Basta lembrar que os indígenas estão aqui há mais de 500 anos e, desde a invasão dos portugueses, não fazem outra coisa do que lutar por suas vidas contra o famigerado desenvolvimento econômico;
  • Exigir – por meio de boicote e de cobranças nas redes sociais – que as empresas parem de comprar de quem destrói os ecossistemas. Já passou da hora de as empresas se responsabilizarem por suas redes de fornecedores. Ser sustentável e justo é exigir que todos que fazem parte da cadeia produtiva e de consumo façam sua parte;
  • Mas não é só se comprometer daqui em diante! As empresas precisam mitigar os efeitos dos danos provocados ao meio ambiente e se comprometer em restaurar o que foi destruído. Todos nós devemos cobrar e acompanhar, fiscalizar;
  • Mais: não basta se comprometer e mitigar, as empresas devem alterar seu modelo de negócio e reduzir a comercialização de produtos que provocam esses impactos, como a carne e os laticínios. Quanto menos espaço a agricultura industrial ocupar, mais espaço para a natureza e alimentos orgânicos (sem veneno e que respeitam o tempo) e para nós, humanos, não para alimentar animais destinados à comida ou para abastecer tanques de carros, aviões, caminhões… e
  • Por fim, a ação mais importante – e talvez a mais difícil: é preciso que todas as instâncias da sociedade – governos, empresas, cidadãos – aceitem que o crescimento econômico infinito e a proteção ambiental não combinam. Onde um está, o outro não tem lugar. Para nossa sobrevivência, é imprescindível reduzir o consumo e adotar e promover formas sustentáveis de produção: agroecologia, energia solar etc etc.
Desmatamento, queimadas, poluição de mares e rios, secas, enchentes, colocar animais em risco de extinção, entre outros impactos provocados pelo agronegócio devem ser considerados responsabilidade do governo e das empresas e assumidos por eles, publicamente. Inclusive o compromisso de alterar esse cenário. Esta é a única maneira para que possamos desenhar o caminho que nos levará a um futuro mais justo e saudável, verdadeiramente.

“Exigimos que os governos parem de colocar o lucro de alguns acima da vida de todos nós, e que as empresas forneçam comida saudável, de boa qualidade e acessível. Para todos”, defende o Greenpeace.

Há inúmeras outras formas de contribuir para que essa mudança aconteça, como apoiar campanhas e petições de ONGs socioambientais. O Greenpeace mantém diversas campanhas pelas florestas, pelos oceanos, pela alimentação saudável… uma delas é a petição Todos pela Amazônia, que destaca na divulgação da nova série. Ah, pode ser este o primeiro passo para você começar a mudar esta história.
Agora, assista aos vídeos da campanha do Greenpeace, com Alice Braga:


Fotos: Reprodução

Compartilhe isso:

Queimadas aumentam na Amazônia, desrespeitando a moratória do fogo


Queimadas aumentam na Amazônia, desrespeitando a moratória do fogo



Queimadas aumentam na Amazônia, desrespeitando a moratória do fogo
Um mês após começar a valer a Moratória do Fogo (decreto 10.424/2020), que proíbe queimadas na Amazônia Legal e no Pantanal por um período de 120 dias, a Amazônia segue registrando números altos de focos de calor, todos ilegais: entre 16 de julho e 15 de agosto foram 20.473 focos registrados no bioma. Somente nos 15 primeiros dias de agosto, foram mais de 15 mil focos.

Em sobrevoo realizado pela equipe do Greenpeace,em 16/8, domingo, foram registrados focos de calor no sul do Amazonas e em Rondônia. O fogo é uma das principais ferramentas utilizadas para o desmatamento, especialmente por grileiros e agricultores, que o usam para limpar áreas para uso agropecuária ou especulação.

A prática se tornou ainda mais comum com a falta de fiscalização e o desmonte dos órgãos ambientais, como ICMBio e Ibama.

Queimadas aumentam na Amazônia, desrespeitando a moratória do fogo
Focos de Calor no município de Lábrea (AM) / Foto: Christian Braga/Greenpeace
“Os números evidenciam que a estratégia adotada pelo governo federal é ineficiente para conter a destruição da floresta mais biodiversa do planeta. Proibir queimadas no papel não funciona sem um trabalho eficiente de comando e controle exercido por órgãos competentes”, afirma Cristiane Mazzetti, porta-voz da campanha de Amazônia do Greenpeace.

Uma análise do Greenpeace Brasil aponta que do total de focos de calor registrados nos primeiros 31 dias da moratória do fogo, 1120 ocorreram dentro de Terras Indígenas (TI), um aumento de 8% em relação ao ano passado, quando foram mapeados 1038.

Queimadas aumentam na Amazônia, desrespeitando a moratória do fogo
Queimada na Reserva Extrativista Jaci-Paraná, em Porto Velho (RO)
Foto: Christian Braga/Greenpeac
A TI Munduruku é a que registrou maior número de focos de calor (160), um aumento de 78% em relação ao ano passado. Além disso, 4.115 atingiram Unidades de Conservação, um aumento de 7% em relação ao mesmo período do ano passado. Territórios, estes, que deveriam estar protegidos.
O comparativo do período analisado (16/07 à 15/08) mostrou uma queda de 8% no número de focos de calor no bioma (22.250, em 2019, ante 20.473). No entanto, no mesmo período em 2019 não havia a Garantia de Lei e Ordem (GLO) em campo e nem uma moratória do fogo em vigência. “Em 2020, mesmo proibindo o uso do fogo e com as forças armadas em campo desde meados de maio, as queimadas continuam em ritmo acelerado”, comenta Mazzetti.

Grande concentração de focos de calor registrados hoje (17/8) nas regiões da rodovia Transamazônica, em Apuí (AM), na Terra do Meio (PA) e no entorno da BR-163 (PA), onde ocorreu o “Dia do Fogo” em 2019 (Dados da Nasa, Terra/Modis)
A temporada de queimadas agrava a atual crise sanitária, pois a fumaça e a fuligem das queimadas provocam doenças respiratórias. O caminho para reverter essa situação já é conhecido.


“O Brasil já fez um trabalho consistente no combate à destruição da Amazônia no passado mas os caminhos utilizados têm sido sistematicamente ignorados. A ausência de um plano e o desmantelamento da gestão ambiental no país são parte da estratégia do atual governo. Como resultado, o maior patrimônio ambiental dos brasileiros está sendo perdido, colocando o clima, a biodiversidade e mais vidas em risco, especialmente as dos povos indígenas”, completa Cristiane Mazzetti.

Queimadas aumentam na Amazônia, desrespeitando a moratória do fogo
Queimada na Reserva Extrativista Jaci-Paraná, em Porto Velho (RO)
Foto: Christian Braga/Greenpeace
Devido à situação dramática que se abate sobre a Amazônia, mais de 60 organizações da sociedade civil, incluindo o Greenpeace, apresentaram uma proposta com cinco medidas emergenciais para combater a destruição aos presidentes da Câmara e Senado. Detre elas estão o endurecimento das penas a crimes ambientais, a demarcação de Terras Indígenas, quilombolas e Unidades de Conservação e a reestruturação do Ibama, ICMBio e Funai.

*Texto publicado originalmente no site do Greenpeace, em 17/8/2020

O Greenpeace Brasil faz parte da organização não-governamental internacional, sem fins lucrativos, com mais de 30 anos de luta pacífica em defesa do meio ambiente. Atua no Brasil desde 1992 (Eco92) e em 30 países por meio de ativismo e de protestos pelo meio ambiente

Investimentos bilionários em extração de petróleo aumentam ameaça à preservação da biodiversidade da Amazônia

CONEXÃO PLANETA

Investimentos bilionários em extração de petróleo aumentam ameaça à preservação da biodiversidade da Amazônia

Investimentos bilionários em extração de petróleo aumentam ameaça à preservação da biodiversidade da Amazônia
*Por Maurício Angelo
Um estudo publicado recentemente pela ONG Amazon Watch revela que cinco das principais instituições financeiras do mundo investiram cerca de US$ 6 bilhões em projetos de extração de petróleo no oeste da Amazônia apenas nos últimos três anos, de 2017 a 2019.
Na linha de frente da iniciativa estão alguns dos bancos e fundos de investimento mais poderosos do planeta. Citigroup, JPMorgan Chase, Goldman Sachs, HSBC e BlackRock financiaram empresas envolvidas na exploração do combustível fóssil, como GeoPark, Amerisur, Frontera e Andes Petroleum.
Investimentos bilionários em petróleo aumentam ameaça à Amazônia
Investimentos (em bilhões de dólares) de instituições financeiras na exploração de petróleo na Amazônia. Fonte: Amazon Watch
Os projetos estão espalhados em 30 milhões de hectares no oeste da Amazônia, que englobam 25% da floresta distribuídos entre a Colômbia, o Equador e o Peru. A área é conhecida como Bacias Sagradas da Amazônia: é ali que nasce o Rio Amazonas, o maior em volume de água do planeta. Na região, considerada a mais biodiversa da Amazônia e do mundo, vivem cerca de 500 mil indígenas — muitos projetos petrolíferos estão dentro de territórios de diversos povos.

As reservas estimadas são de 5 bilhões de barris. Impedir que esses projetos avancem significaria evitar a emissão de 6 bilhões de toneladas métricas de dióxido de carbono — fundamental para alcançar a meta de limitar o aquecimento do planeta em 1,5 ºC. Para atingir essa meta, de acordo com o último levantamento da ONU, o ritmo da emissão de gases do efeito estufa precisa ser cinco vezes menor do que nos níveis atuais.

Essa é a receita para uma destruição em larga escala que contribui decisivamente para a crise climática global. Para Moira Birss, diretora de Clima & Finanças da Amazon Watch, só a pressão da sociedade civil pode fazer com que essas corporações parem de explorar recursos naturais sem garantir a conservação ambiental e o direito dos povos indígenas.

A questão é urgente, “especialmente em um momento em que governantes na Amazônia e nos Estados Unidos — onde esses bancos e fundos estão baseados — estão eliminando a proteção ao meio ambiente e aos indígenas”, diz Moira.
Investimentos bilionários em petróleo aumentam ameaça à Amazônia
As áreas de exploração petrolífera se sobrepõem a territórios indígenas na região onde nascem os rios formadores da Bacia Amazônica. Fonte: Amazon Watch

Grandes investimentos pressionam meio ambiente

No final de 2019, Donald Trump confirmou para as Nações Unidas a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris. Embora muitos desses financiadores tenham expressado publicamente compromissos com a responsabilidade corporativa socioambiental e com iniciativas climáticas como o Acordo de Paris, eles continuam financiando a destruição da Amazônia e a violação dos direitos territoriais indígenas, lembra o relatório da Amazon Watch.

Enfrentar o poder econômico e político dessas instituições financeiras não é tarefa simples. A BlackRock, por exemplo, é considerada o maior fundo global, com mais de US$ 7,4 trilhões sob sua gestão — é o maior investidor no mundo em commodities como petróleo, gás e carvão. O banco JPMorgan Chase investiu, desde 2016, mais de US$ 196 bilhões em empresas que exploram combustíveis fósseis.

Por isso, a Amazon Watch, em conjunto com outras instituições, lançou a campanha Stop The Money Pipeline. A ideia é buscar o engajamento da sociedade civil para pressionar esses bancos a parar de investir nesses projetos.

Outra iniciativa é o pedido para que, durante a pandemia de covid-19, seja implantada uma moratória na Amazônia para suspender todos os projetos de prospecção mineral, petróleo, madeira e agronegócio, assim como o proselitismo religioso que ronda os povos indígenas.
Investimentos bilionários em petróleo aumentam ameaça à Amazônia
O Rio Javari, na fronteira do Brasil com o Peru, é um importante afluente do Solimões, artéria central da Bacia Amazônica. Foto: Rhett A. Butler/Mongabay
A região já sofreu severas consequências com a contaminação ambiental de larga escala causada pela exploração petrolífera. Entre 1964 e 1990, a Texaco — comprada pela Chevron em 2001 — despejou ilegalmente mais de 59 bilhões de litros de resíduos tóxicos e 63 milhões de litros de petróleo bruto na Amazônia equatoriana, atingindo diretamente territórios indígenas.

Mais de 480 mil hectares de floresta foram poluídos e houve pelo menos 30 mil pessoas atingidas na ocasião. Os resíduos chegaram ao Brasil e ao Peru. Outra empresa, a Occidental Petroleum (OXY), que atuou no Peru entre 1975 e 2000, lançou bilhões de litros de resíduos tóxicos na floresta e em rios da região.

“As empresas de petróleo que operam na Amazônia tendem a usar táticas de dividir e conquistar para avançar em seus planos de perfuração, levando a mais desigualdade na região”, afirma Moira Birss.
A saúde das comunidades indígenas também é duramente afetada. Um estudo epidemiológico no Equador descobriu que, para pessoas que vivem em áreas produtoras de petróleo, o risco para diversos tipos de câncer era dezenas de vezes maior do que a média da população. Elementos altamente tóxicos são encontrados nas águas que estão perto de operações de petróleo na Amazônia, como cádmio, mercúrio, chumbo, cloreto de potássio, níquel, cobre e outros.

Na bacia do Rio Corrientes, no nordeste do Peru, um estudo do Ministério da Saúde constatou que 90% dos homens, mulheres e crianças indígenas do povo Achuar tinham níveis de metais pesados em sua corrente sanguínea muito acima do considerado seguro.

“Precisamos agir com rapidez, porque todos sabemos que a Amazônia está se aproximando rapidamente do ponto de inflexão, com mais incêndios e secas a cada ano. A floresta e as populações tradicionais, especialmente os povos indígenas, estão em sério perigo”, lembra Moira Birss.
Investimentos bilionários em petróleo aumentam ameaça à Amazônia
Laura Mendo, de uma comunidade do povo Cofán, no Equador, lembra-se de uma floresta saudável. Agora, rios estão contaminados, cultivos agrícolas não vingam e casos de câncer aumentaram. Foto: Caroline Bennett/Rainforest Action Network

Pandemia reforça o risco da dependência do petróleo

A pandemia do novo coronavírus atingiu diretamente o setor petrolífero. O barril de petróleo cru chegou ter custo zero no fim de abril, com a oferta superando em muito a demanda. No médio prazo, isso poderia frear os projetos previstos para a Amazônia e impedir que instituições financeiras continuem a despejar bilhões de dólares na região. Mas a diretora da Amazon Watch é cética.

Para Moira, a pandemia torna ainda mais clara a necessidade de governos e empresas respeitarem os direitos indígenas, já que a covid-19 mostra um efeito devastador em seus territórios, especialmente nos de povos isolados. “A pandemia exacerbou a crise já enfrentada pela indústria de petróleo e gás, tanto por causa das mudanças climáticas quanto por causa da má administração e do endividamento excessivo. Também deixa claro o quanto as comunidades locais são esquecidas nas promessas de ‘desenvolvimento’ feitas pelas empresas”, critica.
Pesquisadores monitoram o nível de contaminação da água na floresta peruana. Foto: Digital Democracy /CC BY-NC-SA.
No caso do Equador, a crise revelou a vulnerabilidade da economia do país e a dependência de commodities voltadas para exportação — sobretudo o petróleo. “Desde a década de 1960 e mesmo quando o barril estava cotado em US$ 120, o petróleo falhou em ser a panaceia econômica que o governo continua vendendo. Em vez disso, aprisionou o país em um ciclo de dívida e dependência”, avalia Moira.

Agora que ficou claro para todos que o petróleo e o gás não são apenas ruins para o clima e para os povos indígenas, mas também para o bolso dos investidores, acredita a diretora da Amazon Watch, “é o momento de investir em resiliência climática, alternativas lideradas por indígenas e em energia renovável”.
Centenas de espécies de anfíbios já foram descritas na Amazônia. Mas o estudo da enorme biodiversidade da maior floresta tropical do planeta apenas começou. Foto: Rhett. A. Butler/Mongabay.


Fotos: Arley Vargas/Creative Commons/Flickr (abertura) e demais Rhett A. Butler/Mongabay

Ampliação de hidrovia para transporte de soja e minério na Amazônia impactará habitat de botos e tartarugas



CONEXÃO PLANETA

Ampliação de hidrovia para transporte de soja e minério na Amazônia impactará habitat de botos e tartarugas



Ampliação de hidrovia para transporte de soja e minério na Amazônia impactará habitat de botos e tartarugas
*Por Tiffany Higgins 
O governo federal planeja escavar e dragar milhões de metros cúbicos de rochas e areia do leito de um dos mais importantes rios da Bacia Amazônica para ampliar a Hidrovia do Araguaia-Tocantins. O projeto aprofundará o Tocantins para permitir o transporte rápido de soja e minérios para a China e a Europa.

Além de ameaçar a subsistência de populações ribeirinhas, com implosão de áreas de pesca, a obra vai afetar praias fluviais onde tartarugas amazônicas depositam seus ovos. O boto-do-araguaia (Inia araguaiaensis), uma espécie ameaçada, também sofrerá o impacto da hidrovia, assim como espécies endêmicas de peixe.

A meta do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) é implodir e dragar um trecho total de 212 quilômetros do Rio Tocantins. A obra representará o derrocamento de 35 quilômetros de rochas de um trecho do Pedral do Lourenço, uma paisagem de importância histórica e biológica nessa região do Pará.

A bacia do Araguaia-Tocantins é a segunda maior do Brasil, com cerca de 3 mil quilômetros de “potencial navegável”, de acordo com o DNIT. Na estação seca, segundo o departamento, as rochas do Pedral do Lourenço são um “impedimento” ao tráfego de barcaças.

A empresa contratada para realizar a obra, a DTA Engenharia, de São Paulo (e sua parceira O’Martin Serviços e Locações Ltda.), diz que precisará remover 986.541 metros cúbicos de rocha ao longo de dois anos e meio – a previsão hoje é de início em 2021. Além disso, a DTA precisará dragar uma extensão de 177 quilômetros, escavando quase 6 milhões de metros cúbicos de areia e despejando o material nas praias onde as tartarugas desovam.

O Rio Araguaia nasce perto de Brasília, atravessa o Cerrado e segue para o norte em direção à Amazônia, onde deságua no Rio Tocantins pouco antes de Marabá, já no Pará. O rio então corre para o norte, passando pelo Pedral do Lourenço e pelas eclusas da barragem de Tucuruí até chegar ao porto industrial de Vila do Conde, perto de Belém, a 155 quilômetros do Oceano Atlântico. Para o DNIT, o porto da capital paraense tem uma “localização privilegiada”. Além de soja e milho, a hidrovia industrial transportaria para mercados estrangeiros petróleo, combustível, caminhões e produtos de mineração.

Ampliação de hidrovia para transporte de soja e minério na Amazônia impactará habitat de botos e tartarugas
A obra impactará 212 quilômetros de extensão do Rio Tocantins, entre Marabá e o reservatório de Tucuruí, e incluirá o derrocamento do Pedral do Lourenço, habitat de peixes endêmicos. Mapa: DNIT.

Tartarugas, botos e peixes sob ameaça

Em comunidades como Vila Belém, Praia Alta, Vila Redonda, Santo Antonino, Cajazeiras e Vila Tauiri, os ribeirinhos estão diante de um horizonte assustador. O Rio Tocantins é seu meio de transporte, sua fonte de renda e sua identidade. Mas as obras da hidrovia irão dinamitar, dragar, escavar o leito para construir portos industriais. Depois, o tráfego de barcaças limitará a pesca a uma faixa de 100 a 145 metros da largura do rio.

Antes de dinamitar cada trecho, a DTA Engenharia pretende disparar um tiro de alerta, que, alega a empresa, fará os peixes nadarem para longe. Para os pescadores, porém, o ruído alto vai paralisar os peixes, que depois fugirão para águas mais profundas no Pedral do Lourenço – e não para longe – para ali encontrar o seu fim.

O biólogo Alberto Akama, do Museu Paraense Emilio Goeldi, diz que os pescadores estão certos: os peixes que habitam as corredeiras não evoluíram para fugir, como a DTA acredita. “Ao contrário, os peixes entrarão mais fundo nas cavidades da rocha. É assim que se protegem. Então [a empresa] dinamitará as rochas, e todos os peixes morrerão.”

Para reduzir os custos da obra, a DTA planeja ainda despejar 5,6 milhões de metros cúbicos de areia do leito do rio nas praias onde tartarugas amazônicas depositam dezenas de milhares de ovos – em vez de transportar a areia para outro lugar.

Essa operação poderá ser o fim de um bem-sucedido programa de manejo feito pelas comunidades. Desde julho de 2017, pescadores colaboram com pesquisadores para coletar ovos de tartaruga, criar os filhotes e depois soltá-los. A barragem de Tucuruí, rio acima, formou um reservatório que inundou e eliminou os locais de desova, transformando as praias do Pedral do Lourenço num habitat crucial para a tracajá (Podocnemis unifilis) e a tartaruga-da-amazônia (Podocnemis expansa).

Ampliação de hidrovia para transporte de soja e minério na Amazônia impactará habitat de botos e tartarugas
Um boto-do-araguaia salta no Rio Tocantins perto do Pedral do Lourenço. A hidrovia poderá reduzir ainda mais a restrita população da espécie. Foto: Ernanes Coimbro.
Outra espécie emblemática da região e vulnerável ao projeto é o boto-do-araguaia. Em 2014, Mariana Paschoalini Frias, pesquisadora do Instituto Aquilie, ajudou a Fundação Omacha e o Instituto Mamirauá em uma pesquisa populacional no trecho de 500 quilômetros da futura hidrovia entre Marabá e Belém. O estudo, publicado em abril, revelou que restam ali apenas 1.083 botos-do-araguaia.

A população reduzida provavelmente se deve às sete grandes hidrelétricas da bacia. E a hidrovia poderá diminuir ainda mais o número de botos. Para Mariana, a intervenção provocará uma alteração enorme nos sedimentos do rio. “Haverá muito barulho e movimento intenso de navios. A diversidade e a abundância de peixes será afetada. Como resultado, os botos perderão seu habitat e a disponibilidade de alimentos”, explica a bióloga.

Peixes também estão ameaçados. Com as obras de dragagem, alerta Cristiane Cunha, bióloga da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará que conduziu anos de estudos com os pescadores de Tauiry, os peixes cascudos da família Loricariidae, que se alimentam de algas e detritos no fundo do rio, serão especialmente afetados.

“Os engenheiros alegam que vão dragar apenas uma vez e depois essa fase terminará”, diz Alberto Akama, “mas não é assim que esses rios funcionam”. Como os rios assoreiam com o tempo, explica o biólogo, a DTA “terá que dragar continuamente”, e isso certamente exterminará muitos dos peixes do rio.

Além disso, a empresa planeja depositar o material dinamitado na parte mais funda do rio – mais um problema, aponta o biólogo. “Há peixes que vivem em águas profundas. Se você joga rochas lá, tornando-o mais raso, isso acaba com o habitat dessas espécies.”

Akama e sua equipe concluíram a primeira pesquisa já realizada sobre os peixes do Pedral do Lourenço e das corredeiras de Marabá, nas proximidades. Mergulhando a até 30 metros de profundidade, eles avistaram o Baryancistrus longipinnis, que não é encontrado em nenhum outro lugar do mundo, e o Lamontichthys parakana, que habita apenas o Pedral do Lourenço e as corredeiras rio abaixo. No total, os cientistas coletaram e identificaram 12 espécies ameaçadas, incluindo quatro consideradas em perigo de extinção: Crenicichla jeguiPotamobatrachus trispinosusSartor tucuruiense e Teleocichla cinderella. Sabe-se que outras sete espécies ameaçadas vivem na parte baixa do Rio Tocantins.

Para Alberto Akama, o projeto da hidrovia “provavelmente exterminará todos esses peixes”.


Estudos de impacto ambiental: erros e omissões

Em setembro de 2019, ao divulgar um relatório de análise das milhares de páginas dos estudos de impacto ambiental enviados pela DTA Engenharia, o Ibama foi taxativo: o trabalho da equipe de analistas da empresa não está baseado em metodologia científica corrente.

A DTA realizou coletas de animais para avaliar os possíveis impactos da obra. Mas o Ibama concluiu que o estudo da empresa foi superficial e usou métodos incompletos que não refletem as práticas atuais de coleta científica nem são adequados aos peixes que habitam o Tocantins.

Houve erro na identificação de mais de uma dúzia de espécies. Vários peixes em perigo foram rotulados com o nome de não ameaçados. Quatorze espécies ameaçadas que sabidamente vivem na região não foram mencionadas nos estudos de coleta da DTA. Em vez disso, a empresa identificou dezenas de peixes que nem sequer vivem na bacia.

Além de tudo, nem o DNIT nem a DTA estudaram os impactos da hidrovia depois que ela entrar em operação – entre eles, a construção de portos de carga e os impactos diários do tráfego de barcaças.
O Pedral do Lourenço, que no total tem 43 quilômetros de labirintos pedregosos, constitui um ecossistema especializado no qual se reproduzem peixes, andorinhas e lagartos, entre outros animais. Contudo, o Ibama observa que não houve uma coleta específica de amostras ou um estudo sobre o local  – uma omissão por parte da companhia contratada para demolir as rochas.

As tartarugas poderão sofrer os maiores impactos da hidrovia, mas a DTA estudou apenas a pequena área adjacente à futura sede do projeto, deixando de pesquisar o habitat dos quelônios ao longo dos 212 quilômetros onde a dinamitação e a dragagem vão ocorrer.

O Ibama ordenou que a DTA refaça as coletas de peixes e conduza um novo estudo no Pedral do Lourenço. “Foi uma vitória, porque postergamos o projeto”, conclui Ronaldo Barros Macena, presidente da Associação da Comunidade Ribeirinha Extrativista da Vila Tauiri. Mesmo assim, os pescadores do Pedral do Lourenço temem que o governo ainda assim destrua o viveiro rochoso de peixes com o qual suas histórias de vida estão entrelaçadas.

Ampliação de hidrovia para transporte de soja e minério na Amazônia impactará habitat de botos e tartarugas
Em fevereiro, os moradores de Vila Tauiri soltaram 5.300 filhotes de tartaruga no Rio Tocantins. O programa de conservação é uma colaboração entre os pesquisadores e moradores, que resgatam os ovos das praias do rio, cuidam deles por 30 dias e depois soltam os filhotes das tartaruga. É um modelo de programa de conservação que ajudou a recuperar a população de quelônios no lugar. Foto: Associação da Comunidade Ribeirinha Extrativista da Vila Tauiri.
Projetos anteriores de infraestrutura na Amazônia explicam o trauma. “Há o risco de [a área] se tornar outra Belo Monte”, diz Cristiano Silva de Bento, doutorando e pesquisador em Antropologia e Sociologia na Universidade Federal do Pará, com possível colapso das populações de peixes e impactos devastadores sobre as comunidades tradicionais.

Os pescadores lembram com aflição de outra hidrelétrica da região. Em 1984, a usina de Tucuruí desabrigou ribeirinhos que não foram nem sequer indenizados. Peixes, tartarugas e castanheiras desapareceram. Os moradores alegam que os pagamentos que a operadora do projeto, a Eletronorte, faz em reparação por Tucuruí vão para as prefeituras e não chegam às comunidades, que continuam sem coleta de lixo, saneamento básico, ônibus, estradas pavimentadas, postos de saúde ou poços adequados.

No caso da nova hidrovia, havia uma demanda dos pescadores para serem consultados sobre o projeto, como é exigido pela Convenção C169 da Organização Internacional do Trabalho. Mas o Ibama negou, alegando que, diferentemente de quilombolas e indígenas, não há um protocolo no caso para os pescadores tradicionais.

O Ministério Público Estadual do Pará interveio e exigiu que Ibama, DNIT e DTA realizem a consulta formal aos ribeirinhos, observando a importância deles para a conservação dos ecossistemas onde residem. Apesar da nova determinação, o líder comunitário Ronaldo Barros Macena reclama do governo: “Eles nunca nos consultaram. Passaram por nós como um rolo compressor”.

Pescador navega ao raiar do dia no Rio Tocantins perto do Pedral do Lourenço. Foto: Tiffany Higgins.

DTA é criticada por falta de conhecimento técnico

Em 2016, o DNIT contratou a DTA Engenharia para desenvolver a hidrovia sem nenhuma avaliação ambiental preliminar – o que, de acordo com Brent Millikan, da ONG International Rivers, não é uma exigência para a construção de hidrovias, apesar do seu potencial de afetar comunidades humanas, a flora e a fauna. A DTA conseguiu o contrato porque apresentou o orçamento mais baixo entre as cinco concorrentes, um valor inferior até mesmo às projeções de custo do DNIT.

A Constran, que ficou em segundo lugar no processo de licitação, questionou a capacidade da DTA de realizar um projeto tão grande e complexo. E registrou que a empresa parceira da DTA, a O’Martin, acumulava uma dívida de R$ 4,2 milhões até 2014.

Contatada pela Mongabay, a DTA diz estar contratualmente proibida de dar entrevistas. Por isso, todas as informações desta reportagem vieram do DNIT.

Em email de janeiro, o DNIT diz que não vai descontratar a DTA neste ou em futuros projetos, já que cada processo de licitação é individualizado. Regis Fontana Pinto, do Ibama, acredita que um veto à hidrovia é improvável, já que o governo federal considera o projeto prioritário e “necessário”.
Enquanto isso, os ribeirinhos da região do Pedral do Lourenço aguardam os novos estudos e o desdobramento do caso – e esperam que, dessa vez, possam ser atores em sua própria história.
*Texto publicado originalmente em 10/08/20 no site do Mongabay Brasil