terça-feira, 24 de dezembro de 2019

Em meio a desmatamento recorde, projetos tentam recuperar a Amazônia

Em meio a desmatamento recorde, projetos tentam recuperar a Amazônia

 22 Dec 2019

ANA LUCIA AZEVEDO* Enviada especial ala@oglobo.com.br CANARANA (MT) * A repórter viajou a convite da Conservação Internacional

Em meio a um dos piores anos da história recente da Amazônia, em que o desmatamento cresceu 29,5% —o maior percentual em duas décadas —, um angelim abraça um jatobá num rincão do Brasil onde o domínio da floresta só existe no mapa. Na terra, reina a soja.

Os dois brotaram juntos numa floresta nascida por obra humana, na Bacia do Xingu, Mato Grosso, uma das áreas mais desmatadas do país. O abraço das árvores mostra que é possível restaurar a Amazônia sem prejuízo para a produção. Além de possível, é necessário. Estudo publicado na semana passada na revista “Science Advances” mostrou que áreas da Amazônia, como a região do Xingu, já caminham para a savanização, com consequências para o clima local. E a forma de evitar o desastre é justamente restaurar a mata.  

A restauração é resultado do trabalho pioneiro do Instituto SocioAmbiental (ISA) e da Rede de Sementes do Xingu, iniciado há 12 anos, e que já plantou cerca de 6 mil hectares de florestas. Eles agora estabeleceram parceria com a Conservação Internacional (CI) para restaurar 296 hectares ou 800 mil árvores no Xingu ao custo de R$ 3 milhões. O projeto contempla levar para outras áreas a bem-sucedida iniciativa, que combina ciência e conhecimento tradicional e coloca no mesmo barco produtores rurais, agricultores familiares e povos indígenas. Juntos, eles têm semeado florestas e colhido água.

A cadeia produtiva da restauração oferece renda para os coletores de sementes e possibilita aos produtores rurais se regularizarem de acordo com o Código Florestal, além de proteger e recuperar recursos hídricos, salienta Heber Queiroz Alves, coordenador de Restauração Florestal do ISA na Bacia Xingu-Araguaia. Em meio a uma das mais importantes regiões de produção de soja do Brasil — o Mato Grosso responde por 28% da safra 2018-19 —, o trabalho se insere num projeto mais amplo da CI, para restaurar 100 mil hectares em ações diretas e outro tanto em apoio a parcerias e fortalecimento do Código Florestal na Amazônia até 2025. Chamado de Amazônia+, é o mais ambicioso projeto de restauração do bioma. Ainda assim, pouco perto do que foi perdido.

Só neste ano, o Brasil desmatou cerca de um milhão de hectares. O tempo de derrubar se conta em dias; o de restaurar, em séculos. — Restaurar 100 mil hectares é um imenso desafio. Mas precisamos conectar a paisagem, ligar os fragmentos e recuperar serviços da mata, como água e controle de erosão e do clima —explica Bruno Coutinho, diretor de Gestão do Conhecimento da CI. —Para recompor a biodiversidade serão necessários, talvez, séculos. A estrutura da floresta não volta logo, mas os serviços, em alguns anos, sim.

UM BOM NEGÓCIO

Os pesquisadores calculam que cada hectare restaurado de floresta tenha até 7 mil plantas e custe R$ 10 mil, sendo R$ 2,4 mil em sementes na técnica do ISA/Rede. Um custo pequeno para os grandes produtores, mas inalcançável para os pequenos, diz Coutinho.

É aí que entra a Articulação para a Restauração da Amazônia, que reúne mais de 50 instituições, como CI e ISA, para conciliar interesses e captar recursos. — É um bom negócio para os produtores envolvidos e eles precisam ser reconhecidos. Não é correto que carreguem má fama e tenham prejuízos decorrentes das ações daqueles que agem com irresponsabilidade — observa Alves.

Ele acrescenta que, neste ano, o desmatamento voltou a crescer na região, onde é considerado consolidado, e, na verdade, sobrou pouca Amazônia para derrubar. Canarana (MT), um dos principais municípios, segundo o Prodes/Inpe, teve o maior desmatamento de Floresta Amazônica desde 2008. Eloir Bólico, gerente-geral da fazenda de soja Rancho 60, do grupo AFB, em Bom Jesus do Araguaia, lamenta que o produtor rural seja visto como inimigo. Na Rancho 60 é feita a restauração de Áreas de Preservação Permanente (APPs, que protegem matas ciliares, nascentes e cursos d’água) há 12 anos. Entre elas está a floresta do angelim e do jatobá que se abraçam.

— Não é justo. Produzimos alimentos e temos nos comprometido em recuperar nossas APPs. Vimos os benefícios da restauração, como água mais limpa, menos erosão, mais polinizadores. O clima do planeta está bagunçado, a seca tem avançado, a gente tenta se adaptar —diz Bólico.

IMPÉRIO DA SOJA

Visto do céu, o nordeste do Mato Grosso, onde o Cerrado se encontra com a Amazônia, é um oceano de soja pontilhado por ilhotas do que restou de floresta, mantida em APPs e reservas legais por obra e graça do Código Florestal.

A floresta do angelim e do jatobá é uma dessas ilhotas, cercadas por soja até além de onde a vista alcança. Ali, a Amazônia em quase nada lembra a selva majestosa mais ao Norte. A florestinha foi semeada para proteger um curso d’água, uma APP, num dos primeiros trabalhos do ISA e da Rede do Xingu na região.

O teto verde de copas frondosas, 30 a 40 metros acima do solo, que nem o sol consegue atravessar e é típico da Amazônia, nela ainda é um telhadinho, que não passa de 15 metros de altura. Mas, ainda assim, oferece trégua para o calor escorchante dos campos de soja, onde a única sombra é a nossa. Protege a água e atrai animais tão grandes quanto onças e antas, duas rainhas das selvas brasileiras. A cientista Joice Ferreira, da Embrapa Amazônia Oriental, em Santarém (PA), explica que as matas restauradas levarão séculos para recuperar a biodiversidade e os serviços ambientais das nativas. Ainda assim, são essenciais. O melhor e mais barato é não desmatar. Mas as matas restauradas são muito melhores do que nada, frisa. Se deixada em paz, a floresta restaurada vicejará. Um dia, daqui a muitas décadas, o angelim deixará o jatobá, seu irmão de criação, para trás e se tornará um dos gigantes amazônicos. Um exemplar de sua espécie detém o recorde de árvore mais alta da Amazônia, pois, neste ano, foi encontrado uma de 88 metros de altura, no Pará. Euclides da Cunha disse certa vez que a Amazônia era “a última página ainda a escrever-se do Gênesis”. Quem viver, literalmente, verá.

Corredores verdes: plantar árvores para baixar 2°C a temperatura nas cidades

Corredores verdes: plantar árvores para baixar 2°C a temperatura nas cidades

Medellin
Plantar árvores é uma forma eficaz de reduzir as temperaturas nos centros urbanos e várias experiências mundo afora o comprovam. No entanto, uma iniciativa colombiana, premiada na edição 2019 do Ashden Awards, provoca uma reflexão a respeito de outros pontos positivos do investimento público em áreas verdes.


O projeto Corredores Verdes, implantado em Medellín, vem demonstrando os impactos positivos na qualidade de vida da população local, não apenas sob o ponto de vista ambiental, mas também sócioeconômico, como explicou o prefeito da cidade Frederico Gutierres:
“O [projeto] Corredores Verdes é uma forma de nos adaptarmos às necessidades ambientais da cidade. Em 1991, Medellín chegou a ser a cidade mais violenta do mundo. Quando tomamos a decisão de plantar os 30 corredores verdes, nos concentramos naquelas áreas da cidade que mais necessitavam de aporte ambiental. Hoje, com essa intervenção, conseguimos reduzir a temperatura em mais de dois graus centígrados e o cidadãos já o sentem. Muitos lugares da cidade haviam se transformado em lixeiras, haviam se tornado lugares de consumo de drogas porque eram lugares abandonados, isolados. O que fizemos foi transformá-los em jardins. As crianças voltaram, voltaram as famílias. A comunidade cuida, lhes dá carinho, e as pessoas sabem que é delas, fizemos para elas. Nós contratamos muito mais jardineiros, e isso nos permitiu capacitar muita gente que não tinha trabalho”.
A iniciativa dos vizinhos colombianos vai na contramão do pensamento ainda presente em muitas administrações locais brasileiras, que veem nas árvores uma fonte de problemas por “sujarem” calçadas e estragarem fiação pública e carros. No entanto, elas são capazes também de cooperar com a reprodução de insetos polinizadores, cuja redução de população vêm preocupando ambientalistas, além de melhorar a qualidade do ar, diminuir a temperatura e aumentar o bem-estar em geral.
“Quando você vê as abelhas, quando você vê os pássaros de novo nesses corredores, onde já não estavam, aí se pode entender que a vida regressou”.

Alternativa para conter as ondas de calor

Atualmente, 30% da população mundial está hoje exposta a temperaturas muito altas no verão e 12.000 pessoas morrem devido ao calor excessivo a cada ano. Diante desse cenário, multiplicam-se os projetos, no mundo inteiro, visando a redução das temperaturas nas grandes cidades.

Milão, por exemplo, pretende cobrir os telhados da cidade de verde, plantando uma área de 13 milhões de metros quadrados para combater o aumento da temperatura e da poluição. Além disso, em 2018, foi lançado na cidade italiana o programa ForestaMi, idealizado pelo Politecnico di Milano, que tem o objetivo de plantar, até 2030, três milhões de árvores, uma para cada habitante da cidade. Até hoje, no entanto, só foram plantadas 16 mil, uma vez que cada hectare de vegetação custa ao município milanês a cifra de um milhão de euros.

No entanto, a urgência da crise climática pode potencialmente pressionar cada vez mais as administrações a incluir na equação os inevitáveis custos de longo prazo do aquecimento global.
Por isso lamentamos cada árvore derrubada. Nenhuma árvore a menos. Milhões de árvores a mais. Este é o nosso desejo!

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Ingressou no curso de Ecologia pela UNESP e formou-se em Direito pela UNIMEP. É redatora-chefe e co-founder de GreenMe Brasil.

Mato Grosso em via de ampliar o limite para extração de madeira sem contrapartida de reflorestamento

Mato Grosso em via de ampliar o limite para extração de madeira sem contrapartida de reflorestamento

desmatamento
Mato Grosso, que é um dos chamados estados amazônicos do centro-oeste, é um dos principais desmatadores do bioma amazônico, ficando atrás apenas do Pará.


Isso se deve, sobretudo, à atividade madeireira na região, sobre a qual um projeto do atual governo estadual decreta uma espécie de “licença para derrubar árvores”.

O projeto de lei trata de dar permissão a empresas que fazem uso da madeira como matéria-prima consumir até 297.000 árvores, anualmente, sem necessidade de fazer a reposição florestal. Isso significa um consumo de superior de 49.500 metros cúbicos anuais. Essa quantidade equivale ao produto comercializado de forma legal, como informa uma reportagem do El Pais.

Sanção 

O projeto ainda precisa passar pela sanção do governador e, caso seja aprovado, o Mato Grosso (MT) será o primeiro estado amazônico a adotar o novo sistema.

O Ministério Público estadual fez um estudo no qual constatou que nenhuma empresa chegou a consumir mais do que 24.000 metros cúbicos por ano – valor que estaria bem abaixo do previsto pelo projeto de lei. Entretanto, o alerta de organizações ambientais é que essa margem incentive ainda mais o desmatamento. “Diante dos dados, a conclusão a que se chega é que se criou um limite muito alto”, avalia Vinicius Silgueiro, coordenador do Núcleo de Inteligência Territorial do Instituto Centro Vida (ICV), que é uma entidade referência na área ambiental no Mato Grosso.

O alerta se fundamenta por causa de um contexto no qual não apenas os incêndios na Amazônia têm aumentado, como o estado de Mato Grosso é o maior produtor de madeira tropical da região amazônica e, consequentemente, o segundo principal desmatador do bioma. Somente de janeiro a setembro de 2019, foram desmatados 1.617 quilômetros quadrados do território, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

O pesquisador do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Paulo Amaral, vê com ressaltas o projeto:
“Este momento tão crítico, em que o desmatamento e os incêndios aumentam, não é o mais adequado para se discutir uma lei que flexibiliza a exploração da floresta”.

Resistência

Uma pesquisa do ICV com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente revelou que 39% da madeira produzida no Mato Grosso é originária do desmatamento ilegal. 

Para complicar ainda mais o debate sobre o desmatamento no MT, está a autorização para a derrubada da árvore do pequi, o pequizeiro. O corte e a comercialização da madeira do pequizeiro são proibidos por uma lei complementar, que também inclui a castanheira e a seringueira. De acordo com o projeto de lei, o pequizeiro estaria protegido apenas no bioma do cerrado. O problema é que um terço da área do Mato Grosso é de transição entre Amazônia e cerrado, o que deixaria a árvore em vulnerabilidade por ser difícil definir onde começa e termina este último.

De acordo com o deputado estadual Lúdio Cabral, que se opôs ao projeto, o governo, com tal medida, prevê facilitar o desmatamento para privilegiar áreas para a lavoura e o pasto de rebanhos. O pequizeiro funciona como um obstáculo para uma prática comum na Mato Grosso, o “correntão”, técnica que consiste em fazer uso de uma corrente ligada a dois tratores que derrubam toda a vegetação que encontram pela frente.

A oposição ao projeto no estado de Mato Grosso é bem pequena, o que sinaliza que o governador, Mauro Mendes, não encontrará muita resistência para sancioná-lo.

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Doutora em Estudos de Linguagem, Mestra em Linguística e Especialista em Ensino de Língua Portuguesa, escreve para GreenMe desde 2015.

73 milhões de árvores para reflorestar a Amazônia




73 milhões de árvores para reflorestar a Amazônia

É o maior e mais importante projeto de reflorestamento de todos os tempos. No coração da Amazônia brasileira serão plantadas 73 milhões de árvores que cobrem uma área de mais de 28 mil hectares. Uma boa notícia para fazer contrapeso ao desmatamento que não nos dá trégua.

O novo projeto deve ajudar a prevenir - ou pelo menos abrandar - as mudanças climáticas e o aquecimento global. Nos próximos seis anos, a Conservation International dará lugar ao maior projeto de restauração tropical da história.

E o lugar onde os 73 milhões de árvores serão plantadas é realmente significativo. É o chamado "arco do desmatamento", uma área que faz fronteira com alguns dos estados do Brasil, incluindo Amazonas, Acre, Pará, Rondônia e toda a Bacia do rio Xingu. O plano de curto prazo é restaurar uma grande área, equivalente a 30.000 campos de futebol, na qual as árvores foram eliminadas para abrir espaço às pastagens de gado da pecuária intensiva.

"Se o mundo estiver chegando aos 1,2°C ou 2°C a mais de aquecimento que todos nós acordamos em Paris, então a proteção das florestas tropicais, em particular, deve ser uma parte importante", disse M. Sanjayan, CEO da Conservation International ao site Fast Company.

“Não são apenas árvores, mas também o tipo que eles escolheram. Se você pensar em reduzir o dióxido de carbono, então as florestas tropicais são as que farão melhor".

De acordo com a Conservation International, bastaria simplesmente parar o desmatamento, para permitir que as florestas existentes absorvam até 37% das nossas emissões anuais de CO2. Obviamente, a reconstrução de áreas degradadas seria crucial para combater as mudanças climáticas.
Este é um projeto muito importante, onde tudo será verificado no menor detalhe para entender como ele pode ser replicado em outros lugares.

Ao longo dos últimos 40 anos, cerca de 20% da floresta amazônica foi cortada ou destruída, e os cientistas temem que outros 20% da floresta se perderão nas próximas duas décadas.

O projeto baseia-se em uma técnica local chamada muvuca. A estratégia muvuca prevê que sementes de mais de 200 espécies florestais nativas se espalhem por cada metro quadrado de terras queimadas e abandonadas. As sementes são adquiridas pela Xingu Seed Network, uma associação de proteção ambiental que, desde 2007, fornece sementes naturais recolhidas por 400 pessoas, muitas das quais mulheres indígenas e jovens.

Claro, apenas algumas dessas sementes sobreviverão, mas esse tipo de seleção natural é crucial para perceber o que os locais chamam de "magia muvuca". Várias sementes germinarão, lutando entre si por nutrientes e luz solar, e as mais fortes, eventualmente se tornarão grandes árvores.

De acordo com um estudo realizado pela Food and Agriculture and Bioversity International, mais de 90% das espécies de plantas nativas plantadas com esta estratégia de germinação são particularmente resistentes à seca por até seis meses.

Somente para dar uma idéia, com técnicas tradicionais de reflorestamento, obtém-se uma densidade de cerca de 160 plantas por hectare, enquanto com a muvuca o resultado inicial é de 2.500 espécies por hectare. E depois de 10 anos, pode-se chegar a 5.000 árvores por hectare.

O projeto também gerará empregos para as populações locais. Em cada hectare, 2.000 pessoas estarão trabalhando ativamente para reutilizar as terras agrícolas sejam elas privadas que governamentais e dos povos indígenas.

Dois milhões de árvores já foram plantadas neste momento. E os povos indígenas podem conservar o reconhecimento das terras, sendo os seus legítimos proprietários.

Desmatamento na Amazonia aumenta 88% este ano, mas ainda dá tempo de corrigir.


Desmatamento na Amazônia sobe 88% este ano. Mas ainda há tempo de acertar
12.12.2019 • Notícias


Com a pergunta “Será que voltamos aos anos 1990?” pesando na sala, membros da coletiva organizada pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), e realizada hoje na 25ª Conferência do Clima da ONU (COP25), alertaram para a crise ambiental que o Brasil enfrenta atualmente: acréscimos de 88% nas taxas de desmatamento na Amazônia, entre janeiro e novembro deste ano, segundo dados dos alertas que monitoram as alterações na região.

Baseado nas informações do Prodes – sistema oficial de monitoramento do desmatamento na Amazônia –, divulgadas em novembro pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) –, a pesquisadora e diretora de Ciências do IPAM, Ane Alencar, destacou, contudo, que o dado que mais chamou a atenção é que cerca de 30% dos focos de incêndios em 2019 ocorreram em terras não designadas e sem informação. “Em termos de desflorestamento, esse número representa 40% de todas as derrubadas que tivemos. Isso significa que essas áreas estão sem governança”, alertou Alencar. “Estamos perdendo nosso principal patrimônio, nosso tesouro, que são as florestas, para a grilagem”, lamentou

Nesse sentido, a pesquisadora afirmou ainda que, apesar do fogo ter diminuído nessas áreas, o desmatamento continua avançando e formando dentro da Amazônia uma bomba latente pronta para queimar o solo.  “Nós ainda temos florestas que foram colocadas no chão, que estão desmatadas, mas que ainda não foram queimadas. Isso pressupõe que, se nada for feito, teremos muitos incêndios no próximo ano”, alertou a pesquisadora. “Se não fizermos nada agora, nós iremos, sim, alcançar os números dos anos 1990”, advertiu.

Endossando o discurso, o diretor executivo do IPAM, André Guimarães, salientou que é fundamental considerar não apenas a importância do bioma amazônico para o Brasil e para o mundo, como também para o futuro da espécie humana: “A Amazônia recicla o carbono, a água e armazena a biodiversidade”, destacou. “A floresta guarda uma em cada cinco ou seis condições que a vida encontrou para existir neste planeta pelos últimos três bilhões de anos. Essa é a importância da Amazônia para a biodiversidade”, completou Guimarães.

O Brasil já sabe o caminho
A ex-ministra do Meio Ambiente e conselheira honorária do IPAM, Marina Silva, também presente na coletiva, afirmou, no entanto, que o Brasil já possui conhecimento, tecnologia e modelos de políticas públicas eficientes para reduzir as derrubadas e as emissões de CO². “Isso já foi feito. Em 2004, conseguimos fazer com que a criminalidade de queimadas, desmatamentos e explorações de madeira ilegais fossem combatidas de forma incisiva, colocando mais de 725 pessoas criminosas na cadeia, aplicando R$ 4 bilhões em multas e apreendendo um milhão de m³ de madeira”, relembrou a ministra.

Na ocasião, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-PE) apresentou um relatório elaborado pela Comissão do Meio Ambiente do Senado Federal que trazia conclusões a respeito da PNMC (Política Nacional de Mudanças Climáticas) – instituída em 2009 pela lei 12.187 – e das metas a serem atingidas pelo Brasil em 2020.

De acordo com o documento, a análise, feita por especialistas do próprio Senado e da sociedade civil e por acadêmicos, concluiu que o país não irá alcançar no próximo ano os números acordados com diversas conferências – especialmente a de Paris – na redução de 80% das taxas de desmatamento e da emissão do gás carbônico. Apesar da visão pessimista, Rodrigues também reconheceu que o passado brasileiro já demonstrou que é possível virar esse jogo, a partir de uma governança e um ordenamento territorial bem elaborados.

Laser ajuda cientistas a estudarem o Cerrado típico com mais precisão

20.12.2019 • Notícias
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Um estudo inédito publicado por pesquisadores do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), da UnB (Universidade de Brasília), da UEG (Universidade Estadual de Goiás) e da agência de pesquisa australiana Csiro (Commonwealth Scientific and Industrial Research Organisation) – mostra o potencial da tecnologia LiDAR (Laser Detection And Rangingou Sistema de Varredura a Laser) para melhor compreender a vegetação do Cerrado típico, com árvores retorcidas e mais baixas. É a primeira vez que essa tecnologia é aplicada no bioma.
Em artigo científico publicado na revista “Forest Ecology and Management”, os autores descrevem como o LiDAR pode, por exemplo, otimizar e dar melhor precisão às estimativas de biomassa das árvores, especialmente onde a estrutura da vegetação é esparsa. Isso é importante para, por exemplo, saber qual é o impacto do desmatamento de uma área de Cerrado típico para o agravamento das mudanças climáticas, ou quanto de carbono a regeneração tira da atmosfera.
Os métodos mais comuns para medir a composição e estrutura da vegetação – como o diâmetro ou a altura das árvores – são os de campo, nos quais os pesquisadores realizam as medições de forma manual. Essa coleta pode ser destrutiva ou não destrutiva. Na primeira, tem-se o corte da árvore, a partir do qual mede-se o seu diâmetro, a sua altura, o seu peso e a densidade da madeira. Esse é o método mais preciso e é com ele que os cientistas criam uma equação que será usada como referência pelo método não destrutivo. Neste último – o mais utilizado pelos pesquisadores – uma área de savana é definida – conhecida como “parcela”, geralmente medindo 20×50 metros –, na qual não há corte da árvore e são feitas as coletas dos dados de altura e diâmetro. Após definido os dois parâmetros, aplica-se a equação de referência para a estimativa de biomassa e, posteriormente, a quantidade de carbono de cada árvore.
Segundo o estudo, no caso da varredura por laser terrestre, esses processos manuais, se realizados em florestas de Cerrado típico, podem ser acelerados, obtendo resultados em 3D bem mais precisos
 “Ter métodos que meçam a biomassa de forma precisa e rápida é muito importante nesse contexto de degradação e desmatamento. Precisamos saber o que estamos perdendo. Essa otimização aparece como uma aliada para desenvolver mais conhecimento acerca dessas ameaças”, explica a pesquisadora do IPAM e uma das autoras do estudo, Barbara Zimbres. “Compreender as variações estruturais nos ecossistemas, como eles funcionam, quais são suas respostas a perturbações e a mudanças ambientais ajudam no planejamento de medidas de mitigação dos impactos induzidos pelo homem”, complementa.
Pesquisadora do IPAM, Bárbara Zimbres, utilizando o LiDAR para estimar a biomassa no Cerrado. Foto: Divulgação/IPAM
Pesquisadora do IPAM, Bárbara Zimbres, utilizando o LiDAR para estimar a biomassa no Cerrado. Foto: Divulgação/IPAM
Até onde a luz alcança
A pesquisa foi realizada em três áreas do Cerrado cujas formações são distintas: o Jardim Botânico do Distrito Federal, uma área protegida onde há o Cerrado típico (árvores mais dispersadas); a Fazenda de Água Limpa, propriedade da UnB, em Brasília, que abriga mata de galeria (aquela que acompanha cursos d’água); e a Fazenda Clementino, em Goiás, com vegetação arbórea mais densa e alta do que o Cerrado típico, também chamada de “Cerradão”.
“No Cerrado típico, conseguimos calibrar com o LiDAR um modelo bem preciso para a biomassa. Nas outras fisionomias, contudo, essa varredura foi menos certeira. Por serem mais altas, com sub-bosque mais denso, é possível que o scanner não tenha conseguido capturar pontos da parte mais elevada das árvores, resultando em um modelo pouco adequado”, afirma Zimbres.
Confira o vídeo feito pelos pesquisadores utilizando o LiDAR: