terça-feira, 6 de agosto de 2019

Ricardo Galvão: exportações serão 'violentamente afetadas' se Inpe parar de medir desmatamento

Ricardo Galvão: exportações serão 'violentamente afetadas' se Inpe parar de medir desmatamento

  • 5 agosto 2019


O físico Ricardo Magnus Osório Galvão, 71 anos, deixou na sexta-feira (02) o comando do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O instituto é a principal ferramenta do governo brasileiro para estudos de sensoriamento remoto - que são usados, entre outras coisas, para medir o desmatamento na Amazônia e outros biomas. 

Agora, em entrevista à BBC News Brasil, Galvão diz que a crise que culminou com sua demissão é fruto de um longo desgaste com o ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) - o ministro chegou a anunciar que poderia contratar uma empresa privada para substituir o Inpe no monitoramento.

Para Galvão, afastar o Inpe das medições do desmatamento pode afetar "violentamente nossas exportações". Isto porque há grande pressão de consumidores e governos de países desenvolvidos (como países europeus) contra produtos agrícolas que sejam produzidos às custas do desmatamento da Amazônia.

O ex-diretor disse ainda que o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, ignorou alertas feitos por ele desde janeiro deste ano, de que havia um problema de interlocução entre o Inpe e Salles.
A crise se tornou mais aguda a partir do dia 19 de julho, quando o presidente Jair Bolsonaro pôs em dúvida os dados do Instituto e disse que Galvão estaria "a serviço de alguma ONG".
No dia seguinte, o diretor do Inpe concedeu entrevista defendendo as informações produzidas pelo instituto e criticando as declarações do presidente. Finalmente, na manhã da sexta-feira (02), Galvão foi informado por Marcos Pontes de que seria demitido.
Leia abaixo a entrevista na íntegra.

BBC News Brasil - Como foi a cadeia de eventos que terminou com a demissão do senhor?
Ricardo Galvão - Essa história é meio longa. Vem desde que o governo assumiu, em janeiro, com um posicionamento bastante forte de críticas do ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) aos dados providos pelo Inpe sobre o desmatamento da Amazônia.

Essas críticas elas foram respondidas sempre pelo Inpe de forma bastante cortês, com documentos. Colocamos na página (do instituto) notas técnicas e etc.

Mas as críticas (de Salles) continuaram.

Ao contrário do que havia nos anos passados, desde há muito tempo, que nós tínhamos uma grande interação com o MMA (Ministério do Meio Ambiente), com o Ibama, desde a entrada deste governo essa interação foi cortada.

E nós já tínhamos alertado várias vezes o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações sobre esse embate que estava havendo entre o MMA e nós (do Inpe), e que isso ia trazer problemas sérios no futuro. Sugerimos ao Ministro do Meio Ambiente que voltasse a abrir canais de comunicação nossa com o MMA para explicar os dados etc.

Mas isso não ocorreu. E na verdade, quando chegou em junho, o Inpe começou a publicar mais dados mostrando que os nossos alertas de desmatamento estavam tendo um aumento substancial, e que isto ia representar um problema no futuro.

Eu mandei, então, um ofício ao ministro do MCTIC (Marcos Pontes) em 3 de julho, alertando-o desse problema e sugerindo que fosse reaberto o canal de comunicação com o MMA, com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), de forma que o Inpe pudesse explicar em detalhe a metodologia e como deveriam ser usados os dados.

E inclusive que poderia desenvolver as ferramentas computacionais que eles julgassem necessárias, para que eles fizessem a análise que eles considerassem mais relevante, do jeito que eles queriam.
Mas não houve resposta (de Pontes). Então, quando houve o pronunciamento do presidente da República naquela coletiva que ele deu à imprensa internacional, no dia 19 de julho, eu fiquei realmente bastante indignado.

Porque se o presidente pelo menos tivesse dito que os dados poderiam ter problema, que deveria explicar melhor, inclusive ele tendo bastante acesso, como presidente da República, a tudo que quisesse… Mas ele não entrou em contato conosco e disse, naquela entrevista coletiva, que os dados do Inpe eram mentirosos, categoricamente mentirosos.

Nesta (ocasião) eu realmente fiquei muito indignado. Porque uma acusação dessa, para um servidor público, significa que ele está cometendo crime de falsidade ideológica. Acusação gravíssima. Inclusive alguns colegas se preocuparam e pensaram em entrar logo na Justiça contra ele. Eu falei 'não, vamos esperar'. Esperei um tempo para ver se o Ministério (da Ciência e Tecnologia) entrava em contato comigo, mas não entrou.

E ele (Bolsonaro) disse também que eu estava a serviço de uma ONG internacional. Ou seja, me acusou explicitamente de estar traindo o país, a serviço de interesses outros.

Foi tudo um erro. Foi uma reação errada do governo, porque o que acontece? O Inpe tem esses dados de alerta de desmatamento que foram criados aí na gestão da ministra Marina Silva, em 2003.

BBC News Brasil - Qual é a origem desses dados de alertas de desmatamento? 

Galvão - Desde 2004, esses dados são usados e foram usados muito bem nas gestões da Marina Silva, do Carlos Minc, para fazer uma redução drástica (do desmatamento).

Se olhares os gráficos, de 2004 a 2012, a taxa de desmatamento da Amazônia sofreu uma redução drástica. Por quê? Porque nós tínhamos um acordo de colaboração técnica com o Ibama.
Fornecíamos os alertas e eles, antes de atuar, se precisassem de mais detalhes sobre uma área antes de enviar a fiscalização, entravam em contato conosco, e tudo funcionava perfeitamente.
Infelizmente, a partir da entrada do ministro Salles esse relacionamento foi cortado, e ele anunciou para os jornais que ia contratar uma empresa estrangeira para fazer isso que o Inpe faz.

BBC News Brasil - O que vocês acham dessa possível contratação de uma empresa estrangeira para fazer o monitoramento da Amazônia?
Galvão - Isso nós achamos muito errado. Porque a razão da credibilidade que os dados do Inpe têm, que as ações dos governos anteriores tinham, é que o Inpe, que pertence ao MCTIC, é o encarregado de prover os dados e fazer a medida real de desmatamento, e quem deve fazer a fiscalização é o Ibama, que está em outro ministério.
Então, não havia conflito de interesses.
Agora, naturalmente, (se) o Ministério do Meio Ambiente contratar a empresa ele mesmo, há conflito de interesses. A empresa vai dar os dados que eles quiserem.

BBC News Brasil - É preocupante, então?
Galvão - Toda a sociedade acha preocupante.
Então, na hora que o presidente fez aquela acusação muito grave, eu considerei que era importantíssimo reagir de maneira contundente na mesma hora, e foi o que eu fiz.

BBC News Brasil - O que significaria para o país se o Inpe perdesse realmente a atribuição de fazer o monitoramento do desmatamento?
Galvão - Seria a perda total de credibilidade do provimento de dados sobre o desmatamento da Amazônia.
A primeira consequência seria afetar violentamente as nossas exportações.
Até agora eles (MMA) não tomaram nenhuma medida contundente a respeito do desmatamento. Eles reclamam dos dados mas não têm mandado ninguém lá para fazer a fiscalização e punir os culpados. Muito poucas atividades em sítio.

Então, se crescer o desmatamento da Amazônia, é uma perda irreparável para o mundo. E para o Brasil em particular.
Eles não percebem que a Amazônia não é só para explorar minerais. A selva nativa que tem lá é importantíssima para os ciclos meteorológicos no Brasil todo, para as chuvas em todos os lugares. As consequências seriam enormes para a biodiversidade.
Seria seríssimo se eles dessem continuidade a isso.

BBC News Brasil - Como foi a reunião na qual o ministro Marcos Pontes comunicou seu afastamento? Ricardo Salles estava presente?
Galvão - A conversa foi só com o ministro Marcos Pontes. Foi muito construtiva, no começo… aliás, durante toda a conversa. Falamos durante mais de uma hora.
A conversa foi muito boa. Eu expliquei toda a situação a ele, mostrei a ele que nós tínhamos atendido a todas as demandas, alertei sobre esse ofício que tinha mandado a ele avisando que o embate (com o MMA) era desnecessário para o país e ia causar sérios problemas a nível nacional e internacional.
Esse ofício foi agora, no dia 3 de julho, depois que o general (ministro chefe do Gabinete do Segurança Institucional Augusto) Heleno falou contra os dados do Inpe. Lembrei ele disso e disse que o ministério não tomou nenhuma ação. Não entraram em contato comigo, não se preocuparam.
Eu tenho a impressão de que o ministro do Meio Ambiente não tinha ideia clara, até acontecer todo esse problema, da dimensão do Inpe e da respeitabilidade internacional que tem.
E aí quando o presidente falou (contra os dados do Instituto), eu pensei com calma e resolvi dar uma resposta contundente, porque eu fiquei com muito medo de que eles acabassem tirando do Inpe toda essa atividade de monitoramento do desmatamento na Amazônia, que nós temos desde 1988.

BBC News Brasil - O sr. pensa em interpelar judicialmente o presidente por causa das declarações dele?
Galvão - Foi proposto por dois advogados, que eu não vou dizer o nome, de grande prestígio. Mas não o farei. Acho que seria muito prejudicial ao país e eu não tenho interesse de fazer isso.
Mesmo porque a ação que eu tomei já teve o efeito desejado. Toda a comunidade científica está atenta, agora mesmo vou atender a um jornalista dos Estados Unidos. Estão todos muito atentos (aos acontecimentos no Inpe e na área ambiental). E o efeito principal para o Brasil eu já tive, com essa ação.
A não ser que ele continue me acusando, porque ontem ele me acusou de traidor novamente. Mas não pretendo tomar nenhuma atitude não.

BBC News Brasil - O ministro Ricardo Salles disse em coletiva que os dados do (sistema) Deter-B estavam sendo mal interpretados porque eram apenas dados de alerta de desmatamento e não de desmatamento efetivo. O sr. pode explicar essa diferença?
Galvão - Nisso ele está correto. Está na página do Inpe. Isso foi a razão de toda a má interpretação da parte da imprensa.
O sistema de alerta que nós chamamos de Deter-B é um que tira (as informações de forma) mais rápida e mais grosseira para detectar rapidamente os indícios de desmatamento. Então, nós usamos apenas imagens ópticas de satélite para verificar onde está ocorrendo o desmatamento.

Estas imagens de satélite são produzidas pelo próprio Inpe e são imagens que têm uma varredura de área de 800 km de largura, com uma definição de imagem da ordem de 60 metros.

Então, é mais ou menos como numa foto: quando você abre o campo de imagem, perde em foco, se quiser fazer uma analogia. São essas imagens que nós usamos para dar alertas ao Ibama.

Essas imagens são sempre colocadas na página do Inpe porque somos obrigados por lei, inclusive pela Lei de Acesso à Informação, a disponibilizar esses dados de forma aberta.

Pois bem. Nessas informações de alerta, existe acoplado à localização de cada alerta uma área aproximada que nós detectamos onde estaria ocorrendo o desmatamento. Por que colocamos essa área lá? Porque são muitos alertas. Só em janeiro foram 1.300 alertas repassados ao Ibama.
Então, para o Ibama tomar uma decisão e priorizar as suas ações, ele tem que ter uma ideia das áreas principais. Por isso que a área está colocada lá. Mas está escrito na página do Inpe que essas áreas não podem ser usadas para computar exatamente quanto foi desmatado naquele mês, em relação a outros meses.

Por quê? Podemos detectar desmatamento em uma área, e depois aquilo não se consolida, a leitura foi influenciada por nuvens, etc.

Então, essa consolidação das áreas realmente desmatadas nós fazemos com satélites de maior precisão, de maior resolução, e usando também satélites com imagem de radar. Porque o radar penetra através das nuvens.

Só que isso é um sistema muito mais complexo, que exige muito mais tempo de computação e que não daria para fazer um alerta dia a dia. Essa informação nós fazemos ano a ano. Aquilo sim é o dado consolidado, oficial do Brasil, produzido pelo Inpe e considerado pelo mundo todo, de quanto houve desmatamento. É o chamado sistema Prodes.

O que aconteceu é que a AGU (Advocacia-Geral da União) entrou no nosso site e somou os dados e disse que, do mês de junho de 2018 para o mês de julho de 2019 houve um acréscimo de 88% da área desmatada. Eles concluíram isso, mas na verdade era uma acréscimo no número de alertas. O Inpe nunca disse isso, e o presidente interpretou que nós tínhamos passado para a imprensa esse dado errado. Essa foi a origem da confusão.

BBC News Brasil - Se o sr. tivesse de responder a essa alegação do presidente da República a respeito de ONGs e de interferência estrangeira, o que o sr. diria?
Galvão - Não há nada do que ele possa me acusar e eu inclusive o desafiei a comprovar isso.
Se ele tinha (evidências), como ele disse, de que eu estava a serviço de ONGs, como presidente da República, o que ele deveria ter feito? Aberto imediatamente uma sindicância investigativa para apurar isso, de tal maneira inclusive que eu pudesse responder levando advogados. Mas ele não fez nada disso. O que ele fez foi me acusar em público. Se ele tinha essa indicação e não o fez, ele cometeu o que a gente chama de prevaricação.

(Prevaricação ocorre quando) o gestor público não faz, sabendo de coisas erradas, não toma as medidas corretas. Ele não acusou (formalmente) porque ele não tem (evidências).

Não existe nada disso, nem para mim nem para ninguém no Inpe, de prestar serviço para ONGs, ainda mais ONGs internacionais.

Eu só queria dizer que todo este embate está me afetando fortemente, e à minha família, me causando preocupação. Mas eu estou satisfeito. (O que eu fiz) foi mais do que a defesa do Inpe, (foi) uma defesa da ciência nacional e da importância dos cientistas manterem seus dados verdadeiros. E divulgá-los independentemente das pressões políticas.

Rios do Paraná estão contaminados por antibióticos, revela pesquisa

A descoberta dos antibióticos no início do século XX causou uma verdadeira revolução na saúde. Os medicamentos “milagrosos”, como eram chamados na época, possibilitaram a cura de doenças até então fatais, como pneumonia, tuberculose e febre reumática. Milhões de vidas foram e ainda são salvas graças a eles.

O remédio “mocinho”, no entanto, também tem um lado “vilão”. Pesquisadores constataram que o uso excessivo de antibióticos afeta não somente a saúde humana, como também a natureza. Em contato com o meio ambiente, os antibióticos podem criar bactérias resistentes, romper o frágil equilíbrio ecológico de rios e até afetar processos biológicos.

Os efeitos negativos já podem ser vistos, inclusive, nos rios do Paraná, segundo Eliane Carvalho de Vasconcelos, pesquisadora e professora do programa de Mestrado e Doutorado em Gestão Ambiental da Universidade Positivo. “Possivelmente todos os rios do estado que recebem efluente de estações de tratamento, ou aqueles que recebem diretamente os dejetos, estão contaminados por antibióticos”, diz a professora, que também é doutora em Ciências – na área de concentração química analítica – pela Universidade de São Paulo (USP).

A Organização das Nações Unidas (ONU) alerta que “instalações para o tratamento de esgoto não conseguem remover todos os antibióticos e bactérias resistentes da água”.

Rios do Paraná  

Nos últimos anos, Eliane tem feito pesquisas nos rios do Paraná envolvendo estudantes de graduação e mestrado. Em um dos estudos, feito no rio Passaúna, na Região Metropolitana de Curitiba, os alunos usaram cebolas orgânicas – geralmente utilizadas como bioindicadores ambientais – para verificar o potencial tóxico da água.

“Foi constatado que havia cafeína, o que indica a presença de substâncias farmacêuticas, como antibióticos e hormônios, uma vez que a cafeína é usada como marcador”, afirma.

Na pesquisa não foi avaliada a quantidade exata de antibiótico no rio, mas, segundo Eliane, já foi possível verificar que a presença dessas substâncias na água afetou processos biológicos da cebola, como a divisão celular, essencial para o crescimento e a manutenção do organismo.

Crise global

A contaminação das águas por antibióticos é um problema mundial. Em maio deste ano, pesquisadores da Universidade de York, no Reino Unido, divulgaram um estudo alarmante sobre o tema, que acendeu o alerta de países, estados e organizações internacionais. Os pesquisadores
analisaram 701 amostras de águas coletadas em 72 países e encontram antibióticos em 65% delas.

Uma das consequências desse fenômeno é a resistência aos antibióticos, que acontece quando determinada bactéria se modifica em resposta ao uso ou à exposição excessiva a esses medicamentos. A ONU já classificou a resistência a antibióticos como uma crise global e a meta da entidade, agora, é alcançar níveis de uso adequado de antibiótico em humanos e animais até 2050.

No Brasil, a compra de antibióticos apenas com receita foi um grande avanço para frear o consumo do remédio no país, de acordo com Eliane, e, consequentemente, a presença do medicamento na natureza. Mesmo assim, o consumo ainda é alto por aqui. O brasileiro usa, em média, 22 mil doses de antibióticos todos os dias, o que coloca o país como o 19º maior consumidor do mundo, na frente dos países da Europa, Canadá e Japão, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Como 80% dos antibióticos são excretados sem ser metabolizados pelo organismo, segundo a ONU, boa parte vai para o esgoto e para a natureza.

“Precisamos continuar reforçando a importância do uso consciente entre seres humanos e na agricultura, que também utiliza antibióticos. Além disso, é preciso continuar com campanhas sobre a importância do descarte correto”, diz a professora.

Descarte

A Secretaria de Estado da Saúde do Paraná e a Prefeitura de Curitiba alertam que antibióticos e outros medicamentos precisam ser descartados em locais adequados, não em vasos sanitários, lixo comum, pias ou locais a céu aberto. Na capital, por exemplo, a coleta de remédios vencidos acontece periodicamente nas proximidades dos terminais de ônibus. Mais informações e o calendário podem ser consultados no site Coleta Lixo. Além disso, as farmácias da cidade também têm pontos específicos para depósito desse tipo de material.

MESTRADO E DOUTORADO – Por meio da realização de pesquisa aplicada para a solução de problemas ambientais, o programa de Mestrado e Doutorado em Gestão Ambiental da Universidade Positivo visa complementar a formação de profissionais que querem contribuir para a utilização adequada dos recursos naturais do planeta. O curso, em seu 15° ano, tem nota 5 na Capes (Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior) e parcerias internacionais.
Foto capa: Barragem do rio Passaúna | Sanepar/Divulgação

Dados do Inpe de desmatamento são sólidos e confiáveis

WWF

 

 

Dados do Inpe de desmatamento são sólidos e confiáveis



05 Agosto 2019   |   0 Comments
Por WWF-Brasil

O WWF Brasil vem a público manifestar sua preocupação com a exoneração do Diretor Presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – Inpe, Ricardo Galvão, a qual ocorre em meio a uma clara tentativa do Presidente Jair Bolsonaro e de seu Ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, de desqualificar os dados desse importante instituto científico, de forma a acobertar o aumento do desmatamento na Amazônia brasileira.

Não há fundamento para se duvidar da seriedade e acurácia dos dados produzidos pelo Inpe, que há mais de 30 anos se especializou em monitoramento remoto do desmatamento. O DETER, sistema que vem sendo questionado pelo governo, existe desde 2004 e atualmente é capaz de identificar alterações na cobertura florestal de aproximadamente 1 hectare, em tempo quase real. Sua função principal é avisar aos órgãos de controle federais e estaduais, bem como à sociedade em geral, o local e a magnitude do desmatamento, para que possam agir a tempo de paralisar uma ação ilegal. É reconhecido internacionalmente como um dos mais robustos e transparentes sistemas de monitoramento do desmatamento de florestas tropicais, o que promoveu o Brasil a exportador de conhecimento e tecnologia na área de sensoriamento remoto.

O Ministério do Meio Ambiente tenta desqualificar os dados do sistema do Inpe sob a alegação de que ele faria “dupla contagem” de áreas desmatadas e contabilizaria derrubadas feitas em um determinado mês apenas nos meses seguintes. Em recente coletiva de imprensa, Ricardo Salles apresentou supostas evidências dessas falhas, sem, no entanto, apresentar qualquer estudo científico que fundamentasse suas alegações e, mais, que certificasse que, se existentes, essas falhas comprometem os resultados do monitoramento feito pelo instituto.

Em função da cobertura de nuvens, o sistema pode contabilizar apenas em junho uma área que tenha sido desmatada em abril. Isso, no entanto, não altera a realidade de que aquela área foi efetivamente desmatada. O fato de ela haver sido desmatada em abril e não em junho torna-se estatisticamente irrelevante quando os dados são olhados no agregado de vários meses, sobretudo quando comparados com os mesmos períodos de anos anteriores. Qualquer um que entrar na plataforma do Terra Brasilis pode fazer esse cálculo. Desde que o governo Bolsonaro tomou posse, em janeiro, até o final de julho deste ano foram desmatados, segundo o Deter, 4.133 km2 apenas na Amazônia Legal. Essa área é 45% maior do que a maior área desmatada no mesmo período (entre janeiro e julho) dos últimos quatro anos. Veja o gráfico abaixo:


Portanto, não importa para o sistema se uma determinada área foi desmatada neste ou naquele mês, mas sim saber se ela foi efetivamente desmatada e se, no acumulado de meses, está havendo um aumento, diminuição ou estabilização no desmatamento. No caso em específico, o desmatamento em 2019 está explodindo.

Importante lembrar que o DETER-B não é o único sistema de detecção do desmatamento no país. O próprio Inpe tem um outro sistema de monitoramento, chamado Programa de Cálculo do Desflorestamento da Amazônia (PRODES), que se utiliza de imagens produzidas por outro satélite (Landsat) e entrega resultados com uma periodicidade anual. Outras organizações de pesquisa também fazem esse monitoramento, utilizando imagens de outros satélites e com periodicidade mensal, assim como o DETER. Se as falhas apontadas pelo Palácio do Planalto fossem reais e afetassem o resultado final, elas seriam expostas numa simples comparação entre os dados do DETER e desses outros sistemas, pois haveria incongruência. Uma análise comparativa entre o DETER e o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), mantido pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON), mostra que, apesar de serem numericamente distintos, os dados produzidos pelos diferentes sistemas são historicamente coerentes entre si, conforme série temporal apresentada a seguir.



A distinção metodológica entre o Deter e o SAD não influencia na identificação dos registros de desmatamento, uma vez que ambos conseguem indicar uma mesma área desmatada cumulativa. Há uma margem de variabilidade dos dados aceitável, suportados pela ausência de diferença estatística entre as informações geradas pelos dois sistemas de monitoramento. Assim, a discrepância resultante dos métodos utilizados não pode ser considerada como inconsistência, pois ambos identificam um único padrão de desmatamento. Essa congruência nos dados pode ser observada na figura abaixo, na qual apresenta os registros de desmatamento dos dois sistemas, no período de Agosto de 2016 à Junho de 2019, informando que não há distinção na mediana dos valores obtidos por cada um.



Infelizmente, não há escapatória: a tendência de aumento no desmatamento no ano de 2019 é evidente, qualquer que seja o tipo de satélite ou metodologia utilizada para monitoramento. A alegação de inconsistência nos dados feita pelo governo não mudará a realidade. Também não fará a menor diferença a contratação de um novo sistema de monitoramento, com imagens de alta resolução, como anunciado pelo governo. Esse sistema, que não será operado pelo Inpe, significará não só uma perigosa duplicação de esforços, mas um desnecessário gasto de escassos recursos públicos, já que, para fins de fiscalização, o DETER é totalmente suficiente. Não é por falta de alerta que o desmatamento vem crescendo. É por falta de ação do Governo Bolsonaro, que não só diminuiu seu esforço de punição aos infratores, como vem reiteradamente anunciando que adotará medidas para favorecer justamente aqueles que continuam a desmatar.

Enquanto Bolsonaro e sua equipe não saírem do atual estado que os fazem enxergar a Floresta Amazônica como um obstáculo ao desenvolvimento nacional, e não como um motor para tanto, o problema continuará aumentando, correndo o risco de ficar fora de controle. Se isso acontecer, não será apenas a imagem internacional do país que será afetada, o que pode trazer consequências indesejadas para a conclusão de importantes acordos comerciais.

Será a própria sociedade brasileira que terá  prejuízos irreparáveis, dado que estaremos destruindo, de maneira irresponsável, nosso principal ativo, que não só guarda enormes quantidades de carbono e biodiversidade, mas fornece, gratuitamente, a chuva que irriga as lavouras do Paraná, enche os reservatórios do Rio de Janeiro e permite o funcionamento da indústria de São Paulo.

Não é, portanto, apenas a credibilidade do Inpe que está em jogo, mas o próprio futuro do Brasil.

Com calor recorde, no final de julho de 2019, grande derretimento se espalhou pelo manto de gelo da Groenlândia


Com calor recorde, no final de julho de 2019, grande derretimento se espalhou pelo manto de gelo da Groenlândia


Earth Observatory/NASA*
O clima quente leva o derretimento importante à Groenlândia
No final de julho de 2019, um grande evento de derretimento se espalhou pelo manto de gelo da Groenlândia. Bilhões de toneladas de água entraram no Oceano Atlântico ao longo do mês, contribuindo direta e imediatamente para o aumento do nível do mar.

O derretimento foi provocado por uma bolha de ar quente que se deslocou sobre a Groenlândia depois de entregar temperaturas excepcionalmente quentes para a Europa . O mapa acima mostra a anomalia de temperatura a curto prazo sobre a Groenlândia; Ele mostra o quanto a temperatura do ar em 30 de julho de 2019 estava acima ou abaixo da média da semana anterior (20 de julho a 26 de julho). Note como a parte central da camada de gelo é banhada pelo ar quente.

O mapa foi derivado do modelo Goddard Earth Observing System (GEOS) e representa a temperatura do ar a 2 metros (cerca de 6,5 pés) acima do solo. O modelo GEOS-5, como todos os modelos climáticos e climáticos, usa equações matemáticas que representam processos físicos (como precipitação e processos na nuvem) para calcular o que a atmosfera fará. Medições reais de propriedades físicas, como temperatura, umidade e ventos, são rotineiramente dobradas no modelo para manter a simulação o mais próxima possível da realidade medida. Dados modelados oferecem uma visão ampla e estimada de uma região onde as estações meteorológicas terrestres são esparsas.
Existem alguns instrumentos baseados em terra que fazem medições, incluindo um na Summit Station . Como fica na maior altitude da ilha, na parte central da camada de gelo, a estação raramente vê as temperaturas atingirem o ponto de congelamento (0 ° C). Mas em 30 de julho, as temperaturas do ar permaneceram acima de zero ou acima de zero. Isso é quase o dobro da quantidade de tempo que as temperaturas permaneceram ou acima de zero durante o último grande evento de fusão, em 11 de julho de 2012.

Os eventos de fusão em julho de 2012 e julho de 2019 seguiram um padrão similar, em que o evento principal foi precedido por um dia quente que não chegou ao ponto de congelamento e seguido por um dia de resfriamento. A diferença é que, em 2019, o principal evento de fusão durou dois dias, com algumas horas de fusão também ocorrendo em 31 de julho.

“Esses dados de temperatura, fornecidos pelo Laboratório de Pesquisa do Sistema Terrestre da NOAA, ilustram a importância da posição da Summit Station no topo da camada de gelo, onde as variáveis ​​do clima de medição ilustram o clima incomum”, disse Christopher Shuman, da Universidade de Maryland. no Goddard Space Flight Center da NASA.

Temperaturas quentes fazem com que a água derretida se acumule na superfície da camada de gelo. A imagem de cor natural acima, adquirida em 30 de julho de 2019, com o Operational Land Imager (OLI) no Landsat 8 , mostra um lago de degelo no noroeste da Groenlândia, perto da borda da camada de gelo. O verão derretendo ao longo da periferia é típico. Em contraste, uma área de fusão que totaliza quase 1 milhão de quilômetros quadrados da camada de gelo, como ocorreu em 30 e 31 de julho, é menos comum.

Ainda assim, a extensão do derretimento da superfície neste ano cobre uma área menor do que em 2012. Uma razão pode ser a trajetória incomum da massa de ar quente, que se aproximou do leste este ano, em vez da abordagem mais tradicional do oeste.

Imagens do Observatório da Terra da NASA, de Joshua Stevens , usando dados do GEOS-5 do Escritório de Modelagem e Assimilação Global no NASSF GSFC, e dados Landsat do US Geological Survey . Texto de Kathryn Hansen .

* Tradução e edição de Henrique Cortez, EcoDebate.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/08/2019

Com calor recorde, no final de julho de 2019, grande derretimento se espalhou pelo manto de gelo da Groenlândia, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 5/08/2019, https://www.ecodebate.com.br/2019/08/05/com-calor-recorde-no-final-de-julho-de-2019-grande-derretimento-se-espalhou-pelo-manto-de-gelo-da-groenlandia/.

Estudo indica a contribuição humana para a onda de calor recorde de julho de 2019 na Europa




Estudo indica a contribuição humana para a onda de calor recorde de julho de 2019 na Europa


Após o calor extremo que ocorreu na última semana de junho de 2019, uma segunda onda de calor recorde atingiu a Europa Ocidental e a Escandinávia no final de julho de 2019.

Em junho, novos recordes de todos os tempos foram estabelecidos em vários lugares da Europa Ocidental. Em julho, os registros foram quebrados novamente, embora em diferentes áreas. Mais uma vez, o papel da mudança climática na produção de eventos de alta amplitude foi questionado.


Classificação das temperaturas máximas anuais observadas na Europa em 2019, em comparação com 1950 a 2018, com base no conjunto de dados E-OBS (Haylock et al., 2008, versão 19, estendido com atualizações mensais e diárias até 30 de julho de 2019)
Classificação das temperaturas máximas anuais observadas na Europa em 2019, em comparação com 1950 a 2018, com base no conjunto de dados E-OBS (Haylock et al., 2008, versão 19, estendido com atualizações mensais e diárias até 30 de julho de 2019). Esta figura é feita com dados preliminares e deve ser tomada com cuidado, pois algumas medidas ainda não foram validadas.
Este estudo avalia como as mudanças climáticas induzidas pelo homem alteraram a probabilidade e a intensidade do evento de julho ou eventos similares. Ele usa um grande número de simulações climáticas que estavam disponíveis no momento do estudo (8 conjuntos de 10 para mais de 100 simulações cada). Definimos o evento como a classe de eventos que excedem os valores observados de temperaturas médias diárias em média durante 3 dias para alguns locais na Europa Ocidental. Três dias seguidos de altas temperaturas são frequentemente considerados como o comprimento mínimo para uma magia quente ter potenciais impactos na saúde.

Combinamos informações de longas séries de observações e simulações de modelos climáticos para obter as melhores estimativas de mudanças na probabilidade e intensidade de um evento como (ou mais severo que) as temperaturas extremas observadas em julho na Europa Ocidental atribuíveis a mudanças climáticas induzidas pelo homem .

Os poucos locais de observação foram selecionados para incluir uma grande assinatura de onda de calor de julho e ter registros longos e homogêneos com as menores perturbações dos efeitos das ilhas de calor urbanas. Utilizamos modelos estatísticos de extremos, como o modelo Generalized Extreme Values, e os aplicamos a observações e simulações. Isso nos permite avaliar (i) a habilidade dos modelos em simular extremos e (ii) como a mudança climática alterou as chances de extremos. Modelos que não representaram bem as ondas de calor foram retirados da análise.

Principais conclusões

  • Uma segunda onda de calor recorde de 3-4 dias ocorreu na Europa Ocidental na última semana de julho de 2019, com temperaturas superiores a 40 graus em muitos países, incluindo Bélgica e Holanda, onde as temperaturas acima de 40 ° C foram registradas pela primeira vez. . No Reino Unido, o evento foi de curta duração (1-2 dias), mas uma nova temperatura máxima diária histórica foi registrada, excedendo o recorde anterior estabelecido durante a perigosa onda de calor de agosto de 2003.
  • Em contraste com outras ondas de calor que foram atribuídas na Europa Ocidental antes, este calor de julho também foi um evento raro no clima atual na França e na Holanda. Lá, as temperaturas observadas, em média ao longo de 3 dias, foram estimadas para ter um período de retorno de 50 anos a 150 anos no clima atual. Observe que os períodos de retorno das temperaturas variam entre diferentes medidas e locais, portanto, são altamente incertos.
  • Combinando informações de modelos e observações, descobrimos que tais ondas de calor na França e na Holanda teriam períodos de retorno que são cerca de cem vezes maiores (pelo menos 10 vezes) sem a mudança climática. Na França e na Holanda, essas temperaturas teriam uma chance muito pequena de ocorrer sem a influência humana no clima (períodos de retorno superiores a ~ 1000 anos).
  • No Reino Unido e na Alemanha, o evento é menos raro (períodos de retorno estimados em torno de 10 a 30 anos no clima atual) e a probabilidade é cerca de 10 vezes maior (pelo menos 3 vezes) devido à mudança climática. Tal evento teria períodos de retorno de algumas dezenas a algumas centenas de anos sem mudança climática.
  • Em todos os locais, um evento como o observado teria sido de 1,5 a 3 ºC mais frio em um clima inalterado.
  • Quanto à onda de calor de junho, descobrimos que os modelos climáticos apresentam vieses sistemáticos na representação das ondas de calor nessas escalas de tempo e mostram tendências 50% menores do que as observações nesta parte da Europa e variabilidade ano a ano muito maior do que as observações. Apesar disso, os modelos ainda simulam mudanças muito grandes de probabilidade.
  • Ondas de calor durante o auge do verão representam um risco substancial para a saúde humana e são potencialmente letais. Esse risco é agravado pelas mudanças climáticas, mas também por outros fatores, como o envelhecimento da população, a urbanização, a mudança das estruturas sociais e os níveis de preparação. O impacto total só é conhecido após algumas semanas, quando os números de mortalidade foram analisados. Planos eficazes de emergência de calor, juntamente com previsões meteorológicas precisas, como as emitidas antes dessa onda de calor, reduzem os impactos e estão se tornando ainda mais importantes à luz dos riscos crescentes.
  • Vale ressaltar que todas as ondas de calor analisadas até o momento na Europa nos últimos anos (2003, 2010, 2015, 2017, 2018, junho de 2019, neste estudo) mostraram ser mais prováveis ​​e mais intensas devido à mudança climática induzida pelo homem. Quanto mais depende muito da definição do evento: localização, época, intensidade e duração. A onda de calor de julho de 2019 foi tão extrema sobre a Europa Ocidental continental que as magnitudes observadas teriam sido extremamente improváveis ​​sem a mudança climática.
Leia o relatório completo (pdf, 1,7 MB).

Referência:
Human contribution to the record-breaking July 2019 heat wave in Western Europe (pdf, 31 pages, 1.7 MB).
https://www.worldweatherattribution.org/wp-content/uploads/July2019_VF.pdf

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/08/2019
Estudo indica a contribuição humana para a onda de calor recorde de julho de 2019 na Europa, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 5/08/2019, https://www.ecodebate.com.br/2019/08/05/estudo-indica-a-contribuicao-humana-para-a-onda-de-calor-recorde-de-julho-de-2019-na-europa/.

Brasil mata e desmata, artigo de José Eustáquio Diniz Alves


Brasil mata e desmata, artigo de José Eustáquio Diniz Alves


“A floresta precede os povos. E o deserto os segue”
François-René Chateaubriand (1768-1848)

desmatamento na Amazônia

[EcoDebate] O Brasil é o país que mais mata e desmata no Planeta. As forças retrógradas da nação brasileira persistem e insistem no delito do ecocídio e nos homicídios contra os defensores do meio ambiente, agravando o holocausto biológico. O Brasil é campeão da prática dos crimes socioambientais e ecossociais.

Segundo a “Global Forest Watch” o Brasil liderou o desmatamento de florestas primárias no mundo em 2018. Cerca de 12 milhões de hectares de florestas tropicais desapareceram em 2018, o equivalente a 30 campos de futebol por minuto. Só no Brasil, foi desmatado 1,3 milhão de hectares de florestas – sendo o país que mais perdeu árvores no ano passado. Mas o que estava ruim em 2018 piorou ainda mais em 2019, com o agravamento da defaunação.



Segundo a “Global Witness” o Brasil ficou em primeiro lugar entre os países que mais matam ativistas e defensores da terra e do meio ambiente entre 2002 e 2017. Em 2017, pelo menos 207 líderes indígenas, ativistas comunitários e ecologistas foram assassinados mundo afora por protegerem seus lares e comunidades dos efeitos da mineração, da agricultura em grande escala e de outras atividades que ameaçam sua subsistência e seu modo de vida.

O Brasil foi o país com o maior número de ativistas ambientais assassinatos: 57, dos quais 80% defendiam os recursos na Amazônia.

Em 2018, o Brasil foi o quarto país que mais matou ambientalistas. Segundo o levantamento da Global Witness, 20 ambientalistas foram assassinados em 2018 no País. O Brasil ficou atrás de Filipinas (30 assassinatos), Colômbia (24) e Índia (23). No total, foram registrados 164 mortes de defensores do meio ambiente em 2018. Mas entre 2002 e 2018 foram assassinados 653 ambientalistas no Brasil, que ficou com o título de país que mais matou no mundo, no período. Além disto, o Brasil é um dos campeões mundiais em homicídios e acidentes de trânsito. Ou seja, o “Patropi” tem taxas escandalosas de mortes violentas.


O Brasil possui a maior reserva ambiental absoluta do mundo, segundo a Global Footprint Network. Contudo, o superávit ambiental era bem maior em 1961 (quando começaram os cálculos), cerca de 3 vezes o superávit atual. Ou seja, o Brasil perde biodiversidade e vê seus ecossistemas serem degradados na medida em que avançam as atividades antrópicas e os indicadores de desenvolvimento humano.

Como mostraram Alves e Martine (2017), toda a riqueza natural deste imenso país está sendo ameaçada pelo descuido, degradação e exploração selvagem dos ecossistemas. O aumento da poluição nas cidades, a destruição dos rios, o uso generalizado de fertilizantes e agrotóxicos, a construção de hidrelétricas, toda a cadeia produtiva industrial, a rede de comércio e serviços, a acidificação dos solos e das águas, a desertificação, a expansão da agricultura e da pecuária, o desmatamento, a malha de rodovias, os incêndios e queimadas, a exploração da biomassa, dentre outros tipos de degradação.

A Mata Atlântica ocupava uma área de aproximadamente 1.300.000 km2, estendendo-se por 17 estados do território brasileiro. Hoje, os remanescentes de vegetação nativa estão reduzidos a cerca de 22% de sua cobertura original e encontram-se em diferentes estágios de regeneração. Apenas cerca de 8% estão bem conservados em fragmentos acima de 100 hectares. Além de ser um dos biomas mais ricos do mundo em biodiversidade, a Mata Atlântica tem importância vital para aproximadamente 120 milhões de brasileiros que vivem em seu domínio, onde são gerados aproximadamente 70% do PIB brasileiro. O Brasil desmatou a ferro e fogo a Mata Atlântica.

O Cerrado é o segundo maior bioma da América do Sul, ocupando uma área de 2.036.448 km2, cerca de 22% do território brasileiro. Em seu espaço, encontram-se as nascentes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul (Amazônica/Tocantins, São Francisco e Prata), o que resulta em um elevado potencial aquífero. Depois da Mata Atlântica, o Cerrado é o bioma brasileiro que mais sofreu alterações com a ocupação humana. O Brasil desmatou mais de 70% do Cerrado.

O Pantanal é considerado uma das maiores extensões úmidas contínuas do planeta. A sua área aproximada é 150 mil km², ocupando assim 1,76% da área total do território brasileiro. Em seu espaço territorial, o bioma é influenciado por rios que drenam a bacia do Alto Paraguai. O Pantanal mantêm 86,8% de sua cobertura vegetal nativa. Apesar de sua beleza natural exuberante o bioma vem sendo muito impactado pela ação humana, principalmente pela atividade agropecuária. Apenas 4,4% do território encontra-se protegido por unidades de conservação. O Brasil desmatou 13% do Pantanal.

A caatinga ocupava uma área de cerca de 844 mil quilômetros quadrados entre o norte de Minas Gerais e o Nordeste, o equivalente a 11% do território nacional. Apesar da sua importância, a Caatinga tem sido desmatada de forma acelerada nos últimos anos, devido, principalmente, ao consumo de lenha nativa e a conversão de áreas naturais para pastagens e agricultura. O Brasil desmatou cerca de 50% da Caatinga.

O Pampa, localizado no estado do Rio Grande do Sul, ocupa uma área de 176.496 km², correspondendo a 63% do território estadual e a 2,07% do território nacional. Porém, a progressiva introdução e expansão das monoculturas e das pastagens com espécies exóticas têm levado a uma rápida degradação e descaracterização das paisagens naturais do bioma. O Brasil já desmatou 54% do Pampa.

A Mata de Araucária ocupava 36,7% da área do estado do Paraná (ou 73 mil km²), 60,1% do estado de Santa Catarina (ou 57 mil km²), 21,6% da área do estado de São Paulo (ou 53 mil km²) e 17,4% do estado do Rio Grande do Sul (ou 48 mil km²). Atualmente, os últimos remanescentes da mata está em perigo, pois foi excessivamente explorada, a maioria das vezes de forma ilegal. O Brasil desmatou impressionantes 99% da Mata de Araucária.

Os Mangues desempenham um importante papel como exportador de matéria orgânica para os estuários, contribuindo para a produtividade nas zonas costeiras. Por essa razão, constituem-se em ecossistemas complexos e dos mais férteis e diversificados do planeta. A destruição dos manguezais gera grandes prejuízos, inclusive para a economia, direta ou indiretamente, uma vez que são perdidas várias importantes funções ecológicas desempenhadas por esses ecossistemas. O Brasil desmatou cerca de 25% dos manguezais somente nos anos 2000.

A Mata de Cocais está situada entre uma zona de transição dos biomas da Amazônia e da caatinga nos estados do Maranhão, Piauí, Ceará, Pará e norte do Tocantins. O bioma é naturalmente fragilizado, e a procura de solos férteis, extração de minérios e de madeira, além de instalações industriais e comerciais estão poluindo o aquífero Tocantins-Araguaia e acelerando o desmatamento. A maior parte deste bioma está em processo de ser savanizada ou desertificada. O Brasil já desmatou cerca de 35% da Mata de Cocais.

A Floresta Amazônica é o maior bioma do Brasil: num território de 4,196.943 milhões de km2 crescem 2.500 espécies de árvores (ou um terço de toda a madeira tropical do mundo) e 30 mil espécies de plantas (das 100 mil da América do Sul). A bacia amazônica é a maior bacia hidrográfica do mundo, cobrindo uma área de cerca de 6 milhões de km2 e e tem 1.100 afluentes. O rio Amazonas lança ao mar cerca de 175 milhões de litros d’água a cada segundo. Água e floresta formam um ecossistema inigualável.

Dados do Prodes do INPE, mostram que o desmatamento, de 1988 a 2014, atingiu o montante de 408 mil km². Essa área desflorestada é maior do que a soma dos territórios dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Alagoas, Sergipe e Distrito Federal. No total, as seis Unidades da Federação possuem uma área de 393.462 km². Outros 400 mil km² foram destruídos entre 1965 e 1988. O Brasil já desmatou mais de 20% da Floresta Amazônica.

Todos estes números são assustadores, mas ao invés de estabelecer a meta de desmatamento zero e começar a investir na regeneração das florestas e dos ecossistemas, o atual governo brasileiro ataca as instituições que medem o grau de desmatamento e aquelas que defendem o meio ambiente e os povos da floresta.

O artigo “O novo presidente do Brasil e ‘ruralistas ameaçam o meio ambiente, povos tradicionais da Amazônia e o clima global” de Lucas Ferrante e Philip Fearnside, do INPA, publicado no sítio do IHU, resume a agenda antiambiental do atual governo e diz: “Jair Bolsonaro, que assumiu o cargo em 1º de janeiro de 2019 como o novo presidente do Brasil, tomou medidas e fez promessas que ameaçam a floresta amazônica brasileira e os povos tradicionais que a habitam. Os ruralistas, nomeadamente os grandes proprietários de terras e os seus representantes, que são uma parte fundamental da base política do novo presidente, estão a avançar uma agenda com impactos ambientais que se estendem a todo o mundo”.

O garimpo e a mineração são duas grandes ameaças à Amazônia. No dia 22 de julho, garimpeiros invadiram a Terra Indígena Waiãpi, no oeste do Amapá, e mataram de forma violenta o cacique Emyra Waiãpi, confirmando que o Brasil desmata e mata em volumes absurdos e de forma violenta, como o desmatamento em unidades de conservação na bacia do rio Xingu.

A revista britânica “The Economist” publicou a matéria “Relógio da Morte para a Amazônia” (01/08/2019) onde diz: “Em nenhum lugar as apostas são maiores do que na bacia amazônica – e não apenas porque contém 40% das florestas tropicais da Terra e abriga 10 a 15% das espécies terrestres do mundo. A maravilha natural da América do Sul pode estar perigosamente próxima do ponto de inflexão além do qual sua transformação gradual em algo mais próximo do estepe não pode ser impedida ou revertida. O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, está apressando o processo – em nome, ele afirma, do desenvolvimento. O colapso ecológico que suas políticas podem precipitar seria sentido com mais intensidade nas fronteiras de seu país, que circundam 80% da bacia – mas também ia muito além delas. Deve ser evitado”.

“The Economist” publicou a matéria “Relógio da Morte para a Amazônia”

Segundo dados do Deter, houve, até o dia 26 de julho, crescimento de 212% nas áreas desmatadas da Amazônia em relação ao mesmo mês do ano passado. De acordo com o sistema gerenciado pelo Inpe, a devastação de florestas neste período corresponde a 1.864 quilômetros quadrados, área maior do que o município de São Paulo. O desmatamento já tinha crescido 88% no mês de junho, na comparação com o mesmo mês de 2018.

Contudo, o governo federal contestou os dados sobre desmatamento, apontados por imagens de satélite usadas no monitoramento ambiental pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, apresentou estudo feito pela pasta alegando inconsistências nos dados de desmatamento obtidos pelo Deter.

Mas comunicado à imprensa do INPE mostra que a Instituição prestou os devidos esclarecimentos e que “O INPE reafirma sua confiança na qualidade dos dados produzidos pelo DETER. Os alertas são produzidos seguindo metodologia amplamente divulgada e consistentemente aplicada desde 2004. É amplamente sabido que ela contribuiu para a redução do desmatamento na região amazônica, quando utilizada em conjunto com ações de fiscalização”.

Quanto à saída do Diretor do INPE, o Observatório do Clima divulgou a seguinte mensagem: “A exoneração de Ricardo Galvão é lamentável, mas era esperada. Ele selou seu destino ao não se calar diante das acusações atrozes de Jair Bolsonaro ao Inpe. Ao reagir, Galvão também preservou a transparência dos dados de desmatamento, ao chamar a atenção da sociedade brasileira e da comunidade internacional para os ataques sórdidos, autoritários e mentirosos de Bolsonaro e Ricardo Salles à ciência do Inpe. A imagem do Brasil já está irremediavelmente comprometida por essa cruzada contra os fatos. Nos próximos meses, Bolsonaro e seu ministro do Ambiente descobrirão, do pior jeito, que não adianta matar o mensageiro, nem aparelhar o Inpe: a única maneira de evitar más notícias sobre o desmatamento é combatê-lo.”

Ou seja, o maior país da América do Sul já destruiu cerca de 90% da Mata Atlântica e grande parte dos outros biomas. Agora caminha para destruir a Amazônia, enfraquecer as instituições que fornecem dados sobre o desmatamento e eliminar as pessoas que lutam para manter a floresta de pé e garantir a sobrevivência dos povos da região.

O Brasil é o país que mais mata e desmata. E o governo brasileiro em vez de evitar o desastre ambiental tem atuado no sentido de acelerar a destruição ecossocial e as bases da biodiversidade.
Na semana de 20 a 27 de setembro de 2019 haverá a greve global contra a destruição da natureza e em defesa do futuro. Será a Greve Global pelo Clima. O povo brasileiro precisa se inspirar na greve dos adolescentes contra as mudanças climáticas e iniciar um grande movimento de massas para defender o meio ambiente e não derrubar árvores, mas sim governos incompetentes e que contribuem para a destruição da base ecológica da vida na Terra.

José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382


Referências:

ALVES, JED. MARTINE, G. Population, development and environmental degradation in Brazil. In: LENA, P. ISSBERNER, LR. Brazil in the Anthropocene: conflicts between predatory development and environmental policies”, Londres, NYC, Routledge, 2017
https://www.chapters.indigo.ca/en-ca/books/brazil-in-the-anthropocene-conflicts/9781138684201-item.html
FOWKS, Jacqueline. Brasil, o país mais letal para defensores da terra e do meio ambiente, El País, 24/07/2018
https://brasil.elpais.com/brasil/2018/07/23/internacional/1532363870_921380.html
MCGRATH, Matt. Brasil liderou desmatamento de florestas primárias no mundo em 2018, BBC, 25/04/2019 https://www.bbc.com/portuguese/geral-48046107
The Economist. Deathwatch for the Amazon, London, 01/08/2019
https://www.economist.com/leaders/2019/08/01/deathwatch-for-the-amazon
Lucas Ferrante e Philip Fearnside. “O novo presidente do Brasil e “ruralistas” ameaçam o meio ambiente, povos tradicionais da Amazônia e o clima global” INPA, IHU, 02/08/2018
http://www.ihu.unisinos.br/591256-o-novo-presidente-do-brasil-e-ruralistas-ameacam-o-meio-ambiente-povos-tradicionais-da-amazonia-e-o-clima-global
INPE. Comunicado à imprensa, São José dos Campos, 01/08/2019
http://www.inpe.br/noticias/noticia.php?Cod_Noticia=5178
Global Week For Future 20-27 sept
https://fridaysforfuture.org/

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/08/2019

Brasil mata e desmata, artigo de José Eustáquio Diniz Alves, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 5/08/2019, https://www.ecodebate.com.br/2019/08/05/brasil-mata-e-desmata-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/.