terça-feira, 6 de agosto de 2019

Dados do Inpe de desmatamento são sólidos e confiáveis

WWF

 

 

Dados do Inpe de desmatamento são sólidos e confiáveis



05 Agosto 2019   |   0 Comments
Por WWF-Brasil

O WWF Brasil vem a público manifestar sua preocupação com a exoneração do Diretor Presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – Inpe, Ricardo Galvão, a qual ocorre em meio a uma clara tentativa do Presidente Jair Bolsonaro e de seu Ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, de desqualificar os dados desse importante instituto científico, de forma a acobertar o aumento do desmatamento na Amazônia brasileira.

Não há fundamento para se duvidar da seriedade e acurácia dos dados produzidos pelo Inpe, que há mais de 30 anos se especializou em monitoramento remoto do desmatamento. O DETER, sistema que vem sendo questionado pelo governo, existe desde 2004 e atualmente é capaz de identificar alterações na cobertura florestal de aproximadamente 1 hectare, em tempo quase real. Sua função principal é avisar aos órgãos de controle federais e estaduais, bem como à sociedade em geral, o local e a magnitude do desmatamento, para que possam agir a tempo de paralisar uma ação ilegal. É reconhecido internacionalmente como um dos mais robustos e transparentes sistemas de monitoramento do desmatamento de florestas tropicais, o que promoveu o Brasil a exportador de conhecimento e tecnologia na área de sensoriamento remoto.

O Ministério do Meio Ambiente tenta desqualificar os dados do sistema do Inpe sob a alegação de que ele faria “dupla contagem” de áreas desmatadas e contabilizaria derrubadas feitas em um determinado mês apenas nos meses seguintes. Em recente coletiva de imprensa, Ricardo Salles apresentou supostas evidências dessas falhas, sem, no entanto, apresentar qualquer estudo científico que fundamentasse suas alegações e, mais, que certificasse que, se existentes, essas falhas comprometem os resultados do monitoramento feito pelo instituto.

Em função da cobertura de nuvens, o sistema pode contabilizar apenas em junho uma área que tenha sido desmatada em abril. Isso, no entanto, não altera a realidade de que aquela área foi efetivamente desmatada. O fato de ela haver sido desmatada em abril e não em junho torna-se estatisticamente irrelevante quando os dados são olhados no agregado de vários meses, sobretudo quando comparados com os mesmos períodos de anos anteriores. Qualquer um que entrar na plataforma do Terra Brasilis pode fazer esse cálculo. Desde que o governo Bolsonaro tomou posse, em janeiro, até o final de julho deste ano foram desmatados, segundo o Deter, 4.133 km2 apenas na Amazônia Legal. Essa área é 45% maior do que a maior área desmatada no mesmo período (entre janeiro e julho) dos últimos quatro anos. Veja o gráfico abaixo:


Portanto, não importa para o sistema se uma determinada área foi desmatada neste ou naquele mês, mas sim saber se ela foi efetivamente desmatada e se, no acumulado de meses, está havendo um aumento, diminuição ou estabilização no desmatamento. No caso em específico, o desmatamento em 2019 está explodindo.

Importante lembrar que o DETER-B não é o único sistema de detecção do desmatamento no país. O próprio Inpe tem um outro sistema de monitoramento, chamado Programa de Cálculo do Desflorestamento da Amazônia (PRODES), que se utiliza de imagens produzidas por outro satélite (Landsat) e entrega resultados com uma periodicidade anual. Outras organizações de pesquisa também fazem esse monitoramento, utilizando imagens de outros satélites e com periodicidade mensal, assim como o DETER. Se as falhas apontadas pelo Palácio do Planalto fossem reais e afetassem o resultado final, elas seriam expostas numa simples comparação entre os dados do DETER e desses outros sistemas, pois haveria incongruência. Uma análise comparativa entre o DETER e o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), mantido pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON), mostra que, apesar de serem numericamente distintos, os dados produzidos pelos diferentes sistemas são historicamente coerentes entre si, conforme série temporal apresentada a seguir.



A distinção metodológica entre o Deter e o SAD não influencia na identificação dos registros de desmatamento, uma vez que ambos conseguem indicar uma mesma área desmatada cumulativa. Há uma margem de variabilidade dos dados aceitável, suportados pela ausência de diferença estatística entre as informações geradas pelos dois sistemas de monitoramento. Assim, a discrepância resultante dos métodos utilizados não pode ser considerada como inconsistência, pois ambos identificam um único padrão de desmatamento. Essa congruência nos dados pode ser observada na figura abaixo, na qual apresenta os registros de desmatamento dos dois sistemas, no período de Agosto de 2016 à Junho de 2019, informando que não há distinção na mediana dos valores obtidos por cada um.



Infelizmente, não há escapatória: a tendência de aumento no desmatamento no ano de 2019 é evidente, qualquer que seja o tipo de satélite ou metodologia utilizada para monitoramento. A alegação de inconsistência nos dados feita pelo governo não mudará a realidade. Também não fará a menor diferença a contratação de um novo sistema de monitoramento, com imagens de alta resolução, como anunciado pelo governo. Esse sistema, que não será operado pelo Inpe, significará não só uma perigosa duplicação de esforços, mas um desnecessário gasto de escassos recursos públicos, já que, para fins de fiscalização, o DETER é totalmente suficiente. Não é por falta de alerta que o desmatamento vem crescendo. É por falta de ação do Governo Bolsonaro, que não só diminuiu seu esforço de punição aos infratores, como vem reiteradamente anunciando que adotará medidas para favorecer justamente aqueles que continuam a desmatar.

Enquanto Bolsonaro e sua equipe não saírem do atual estado que os fazem enxergar a Floresta Amazônica como um obstáculo ao desenvolvimento nacional, e não como um motor para tanto, o problema continuará aumentando, correndo o risco de ficar fora de controle. Se isso acontecer, não será apenas a imagem internacional do país que será afetada, o que pode trazer consequências indesejadas para a conclusão de importantes acordos comerciais.

Será a própria sociedade brasileira que terá  prejuízos irreparáveis, dado que estaremos destruindo, de maneira irresponsável, nosso principal ativo, que não só guarda enormes quantidades de carbono e biodiversidade, mas fornece, gratuitamente, a chuva que irriga as lavouras do Paraná, enche os reservatórios do Rio de Janeiro e permite o funcionamento da indústria de São Paulo.

Não é, portanto, apenas a credibilidade do Inpe que está em jogo, mas o próprio futuro do Brasil.

Nenhum comentário: