terça-feira, 10 de março de 2020

Parlamentares e organizações pedem que PL do vale-tudo em terras indígenas seja devolvido

Parlamentares e organizações pedem que PL do vale-tudo em terras indígenas seja devolvido



13 Fevereiro 2020     
 
 
Projeto enviado pelo Governo Federal expõe Amazônia a contaminação por mercúrio e agrotóxicos, rompimento de barragens, déficit hídrico, desmatamento, doenças e violência contra indígenas

Por Bruno Taitson


Movimentos indígenas, parlamentares, artistas e organizações da sociedade civil se reuniram nesta quarta (12/2) com o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), para pedir a devolução do PL 191/2020 ao Palácio do Planalto. A proposta governista estabelece um verdadeiro vale-tudo nas terras indígenas, abrindo os territórios para exploração por garimpo, mineração, agricultura em larga escala e empreendimentos de infraestrutura.

O deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da oposição, relatou como foi a reunião com o presidente da Câmara. “Dissemos ao presidente Rodrigo Maia que esse projeto deve ser devolvido. Trata-se de um projeto claramente inconstitucional e o presidente havia sinalizado que não admitiria a aprovação de matérias como essa. Ele disse que vai analisar nosso pedido e vai dar uma resposta. Nós vamos insistir na devolução do projeto".

Rodrigo Maia anunciou a intenção de criar uma comissão especial para analisar o projeto, com objetivo de promover uma discussão mais qualificada da matéria. Ainda não há prazo para a formação desse colegiado. 

As lideranças presentes na Câmara entendem que, se virar lei, o PL do vale-tudo vai ameaçar a existência dos povos indígenas. A atividade garimpeira, hoje, é o principal fator responsável pela contaminação por mercúrio de rios, nascentes e peixes, consumidos não somente na Amazônia, mas em todas as regiões do país.

O projeto apresenta uma série de aspectos inconstitucionais, dentre os quais o desrespeito à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário e que foi ratificada em 2004. Em seu artigo 6º, a Convenção estabelece que indígenas devem ser consultados antecipadamente “cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente”. 

Para a liderança Iracema Nascimento, da etnia Kaingang, o PL representa uma ameaça à saúde das populações originais. “Os indígenas estão adoecendo por causa da contaminação por mercúrio. Maia, faço um apelo, não deixe passar esse projeto”, observou.

A abertura das terras indígenas para arrendamento e prática de agricultura em larga escala, com uso de sementes transgênicas e aplicação de agrotóxicos, também está no PL 191/2020. Esse é outro dispositivo apontado como inconstitucional, por restringir o usufruto exclusivo pelos indígenas de seus territórios.

Outro temor exposto por parlamentares e especialistas é a amplificação do risco de tragédias como a de Brumadinho, a partir do rompimento de barragens de rejeitos e outros acidentes comuns à atividade minerária.

Para a deputada federal Joênia Wapichana (Rede-RR), a primeira indígena a ocupar uma cadeira no Parlamento brasileiro, tanto o garimpo quanto a mineração e a grande monocultura colocam em risco a sobrevivência dos povos originários. “O Brasil não tem demonstrado qualquer capacidade de fiscalizar o cumprimento de leis ambientais e impedir violações de direitos. Por isso não podemos admitir a aprovação de um projeto como este”, avaliou.

Segundo Cléber Buzatto, secretário-adjunto do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o projeto é uma agressão aos direitos fundiários e territoriais dos povos indígenas. “Se aprovado, tem o potencial de provocar grande devastação nas terras indígenas. Estamos contribuindo na luta dos povos para que esse projeto não seja aprovado”, observou.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) divulgou uma nota sobre o PL 191/2020, em que ressaltou o caráter etnocida da proposição.  “Trata-se de um projeto de morte para os povos indígenas, na forma de descaracterização de seus territórios, violação de seus direitos e perda de sua autonomia, conquistados por meio da Constituição e de tratados internacionais. O projeto é um caminho sem volta ao direito ao usufruto exclusivo dos povos indígenas sobre o seu território”, expressou a nota.
© Bruno Taitson/WWF-Brasil Enlarge

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