terça-feira, 12 de agosto de 2014

No DF, a média de estupros passa de dois por dia. Garota violentada e assassinada se juntou à estatística

Dor e revolta pela morte da jovem Leudiquele



carla.rodrigues@jornaldebrasilia.com.br


Os números revelam uma realidade assustadora. De janeiro até julho deste ano, foram registrados 464 casos de estupro no Distrito Federal, uma média de 66 por mês: mais de dois por dia. A jovem Leudiquele Santos da Conceição, de 17 anos, infelizmente, foi mais uma vítima da violência. Seu corpo foi encontrado no domingo em meio a três bananeiras, próximas a uma parada de ônibus. O pescoço da moça, contam familiares e amigos, estava roxo, coberto pelas marcas que indicaram um provável estrangulamento durante o crime. 


Agora, familiares e moradores do Setor O buscam uma solução para o caso. A comoção foi geral.  Revoltados, os moradores da cidade até cortaram as bananeiras que esconderam a ação dos criminosos e ainda fixaram um cartaz de luto no local, feito à mão


“Monstro”
“Os meninos que estavam jogando bola por perto viram o corpo. Quando a gente soube, não quisemos acreditar. Ela não saía, não bebia, era tranquila e trabalhadora. A gente não vai descansar enquanto esse monstro não for encontrado”, desabafa o tio da vítima, José Ferreira Júnior, 29 anos. 


Para ele, falta segurança na região. E, mais do que isso, quem for preso pelo crime precisa, de fato, cumprir a pena. “A polícia vai, encontra, prende e, se for menor, por exemplo, nem fica preso. Se for maior, não fica o tempo que precisa. O juiz vai e solta. É assim que funciona a Justiça para os pobres no Brasil. Enquanto isso, a família vai ficar aqui, sentindo a falta dela para sempre”, afirma José Ferreira, que trabalha como cozinheiro. 


A irmã da vítima, que se identificou apenas com Geilza, preferiu não falar. Muito abalada, ela resume a perda irreparável em poucas palavras. “Minha irmã era linda. Linda mesmo. Eu tenho uma filha pequena e fico pensando no futuro dela”. Sentada na calçada, à espera de uma notícia da polícia, ela mostrou algumas fotos recentes de Leudiquele. “Ela vivia sorrindo”, comenta, olhando para uma das imagens da adolescente. 


Comunidade reclama do descaso
 
Moradores da região apontam o descaso dos governantes como um dos responsáveis pelo crime. De acordo com eles, o bairro é mal iluminado e as árvores raramente são podadas. “Essa violência monstruosa aconteceu por causa da ausência do governo. O fato de não termos iluminação e as árvores não estarem podadas facilitou a ação desses monstros”, reclama a dona de casa Leonor Macial, 50 anos. 
 
 Sua amiga, Rosa Dália, de 45 anos, conta que a jovem era sua vizinha. “Tenho filho, ele também vem para essa parada de ônibus de manhã para ir trabalhar. O que me deixa com medo é o horário do crime. Ela estava indo trabalhar. Era uma menina linda, trabalhadora. Veio da Bahia para realizar seus sonhos aqui. É uma injustiça muito grande, e a gente exige uma solução para isso”, diz. 
 
 Outros moradores da quadra relatam a frequência com que acontecem crimes na região. “Aqui, volta e meia tem assalto, morte por assassinato. Mas, enquanto era entre eles, os bandidos, porque eles se matam toda hora, até aí tudo bem. O que nos choca e nos comove muito é saber que se trata de uma criança praticamente. Uma jovem, que estuda, trabalha, tenta a vida. E, por incrível que pareça, não é falta de polícia. Porque tem ronda. O problema é a Justiça, que dá brecha pros bandidos saírem da cadeia”, critica o motorista Ronildo Batista, 43 anos. 
 
 A dona de casa Maria Cristina Moreira, 60 anos, conta que é impossível caminhar de noite no local. “A insegurança não deixa, né? Se você precisar muito, até sai. Mas vai olhando todo mundo com cara de desconfiado. Infelizmente, essa é a nossa realidade. A gente está à mercê da violência. Aqui é terra de ninguém, e olha que conheço bem, porque moro no Setor O há mais de 20 anos. O cidadão de bem fica atento o tempo todo”, afirma. 
 
Quem pega ônibus na mesma parada que a jovem vítima diz ter medo. “Agora, é cuidado redobrado. Não dá para confiar mais. Eu ficava aqui tranquila, esperando meu ônibus, porque nunca nada do tipo aconteceu”, ressalta Jeane Soares, 41 anos. A servente diz que conhecia Leudiquele de vista e lamenta a violência. “Quando soube, vim aqui para ver quem era. O pescoço dela, a cena, que coisa mais triste. Ela estava toda roxa do sufocamento. Uma coisa horrível”, completa. 
 
Sobrou para o quiosque
 
Alguns moradores da quadra 20, onde morava a vítima, chegaram a citar um quiosque próximo ao local do crime como um “lugar de bagunça, ponto de drogas, que atrai pessoas ruins”. “Aqui nesse lugar só vem gente que quer beber e se drogar. Isso atrai traficante, bandido, tudo o que é ruim. A gente já até falou com a administração, mas ninguém faz nada. Agora, se você vem aqui de noite, sabe o que acontece”, critica ainda Rosa Dália. Assim como ela, Klitia Maria, de 46 anos,  acha que o local não é apropriado. 
 
“Tenho uma filha de 17 anos que pega ônibus aqui. Só que essa parada, colada nesse bar, é um problema. Porque ficam os tarados todos ali, de plantão. Aí, já viu né? Eu trago minha filha de manhã para evitar problemas maiores. Agora, isso é uma coisa que deviam investigar. Porque todo mundo sabe que ali não é coisa boa que tem. Isso todo mundo já sabe. A gente quer uma solução”, esbraveja. 
 
 A dona do espaço, Maria José Soares, 58 anos, se defende. Segundo ela, o local nem estava aberto no domingo. “É uma injustiça as pessoas citarem meu ganha-pão como uma coisa que pode ter influenciado o que aconteceu. É um absurdo. Quem cometeu esse crime nojento, horroroso, fez isso porque é ruim. Aí, as pessoas ficam dizendo que tem que derrubar o quiosque. Nada disso. Tem é que prender o bandido e ponto”, salienta . 
 
Vizinho aponta falta de segurança
 
O mecânico e morador da quadra David Peixoto, 23 anos, defende a dona do quiosque. “Um estupro não acontece porque existem bares nos locais. Um estupro acontece quando falta polícia, quando falta iluminação, quando não tem segurança. No domingo, a PM toda da Ceilândia estava sabe onde? No Maior São João do Cerrado. Você não via uma viatura por aqui. É assim que os crimes acontecem. Quem frequenta o quiosque não é bandido. Não é crime tomar cerveja”, ressalta. 
 
A dona da padaria onde Leudiquele trabalhava elogiou, no domingo, a funcionária. Ela se disse espantada com a violência  cometida contra a adolescente. 
 
O caso é investigado pela 24ª Delegacia de Polícia. A reportagem doJornal de Brasília foi até a DP para tentar conseguir mais detalhes a respeito da morte Leudiquele, mas não foi atendida. Procurada, a Divisão de Comunicação da Polícia Civil apenas disse que “a 24ª DP continua investigando o caso”. Assim que tiverem alguma novidade, devem repassar à imprensa. 
 
Durante o tempo em que o JBr estava na quadra 20, muitas viaturas policiais passaram. Segundo moradores, “eles estão observando a movimentação na quadra”.
 
Enterro na Bahia
 
O sepultamento da jovem será em Bom Jesus da Lapa, na Bahia, onde moram seus pais. Os irmãos e familiares que vivem em Ceilândia viajariam ainda ontem para o estado, acompanhar o enterro. 
 
Memória
 
No dia 4 deste mês, uma adolescente de 14 anos ficou em poder de dois criminosos por seis horas. A jovem, moradora da Candangolândia, foi ameaçada e diz ter sido estuprada pela dupla. Após ser abordada na cidade onde ela vive, os agressores partiram para o Gama. 
 
No ano passado, em julho, uma jovem de 20 anos foi estuprada e estrangulada dentro da secretaria da Catedral Anglicana, na quadra 309/310, na Asa Sul. Ela foi encontrada desmaiada. A vítima trabalhava havia poucos dias na igreja. 
 
Em 2012, uma mulher foi violentada na frente dos filhos na Cidade Ocidental (GO), na Região Metropolitana do DF. O crime aconteceu em janeiro.  De acordo com o agente de investigações da Polícia Civil Willian Alencar da Cunha, o autor estava trabalhando na limpeza de lotes no Setor Águas Claras.
 
 
 
 
Fonte: Da redação do Jornal de Brasília


1 Comentário
jose pedro da silva

Enquanto o congresso estiver enxergando a vítima como réu, e o bandido como vítima. a sociedade estará em mal lençois. Nada x nada tem sido feito em benefício da sociedade com relação a essa violência desenfreada que tomou conta do país. Estamos sendo vítimas também dos governantes, que não tem interesse nesse assunto, e em segundo lugar dos meliantes, Que às soltas, são endossados pelas nossas leis fragas e obsoletas, que não inibe nem bandido nenhum.
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