sábado, 8 de junho de 2019

A Questão Ambiental como Elemento Central, Integrador e Articulador de um Novo Modelo de Desenvolvimento para o Brasil e para o Mundo,

A Questão Ambiental como Elemento Central, Integrador e Articulador de um Novo Modelo de Desenvolvimento para o Brasil e para o Mundo, artigo de Angelo José Rodrigues Lima


[EcoDebate] Estamos em 2019 no mês do meio ambiente, o qual no dia 5 de junho é comemorado o Dia Mundial do Meio Ambiente e se este ano não temos absolutamente nada para comemorar no Brasil, muito pelo contrário, pode ser um ótimo momento para fazer uma profunda reflexão sobre a URGÊNCIA de que a questão ambiental seja o elemento central e integrador de um novo modelo de desenvolvimento para o país e quiçá para o mundo.

Ousaria dizer que esta urgência é para o mundo, porém, o exercício deste artigo se limitará mais ao Brasil, pois de outro lado, é fundamental que primeiro façamos o dever de casa.
E a urgência para o mundo e para o Brasil, é também demonstrada pelo Relatório de 2019 do Institute for Public Policy Research (IPPR), de Londres, que segundo este “os impactos humanos negativos no meio ambiente vão além das mudanças climáticas para abranger a maioria dos outros sistemas naturais, conduzindo um processo complexo e dinâmico de desestabilização ambiental que atingiu níveis críticos. Esta desestabilização está ocorrendo em velocidades sem precedentes na história humana e em consequência disso entramos na idade do colapso ambiental (the age of environmental breakdown)”.

Alguns dados deste relatório informam que:
Os sistemas naturais globais estão sofrendo desestabilização em uma escala sem precedentes:
Os 20 anos mais quentes desde o início dos registros, em 1850, foram nos últimos 22 anos, sendo os últimos quatro anos os mais quentes já registrados.

A população de vertebrados caiu em média 60% desde a década de 1970.

Mais de 75% da terra da Terra está substancialmente degradada

A desestabilização de sistemas naturais está ocorrendo a uma velocidade sem precedentes:
Desde 1950, foram observadas mudanças em muitos eventos meteorológicos e climáticos extremos, incluindo um provável aumento na frequência de ondas de calor em grandes partes da Europa, Ásia e Austrália, e a frequência ou intensidade de eventos de precipitação pesada na América do Norte e Europa. 

As taxas de extinção aumentaram para entre 100 a 1.000 vezes a “taxa de base” da extinção.

A camada superficial do solo está sendo perdida 10 a 40 vezes mais rapidamente do que é reabastecida por processos naturais e, desde meados do século XX, 30% da terra arável do mundo tornou-se improdutiva devido à erosão; 95% das áreas terrestres da Terra podem se degradar até 2050.

E esta reflexão se dará tanto pelos aspectos negativos, a nossa crise civilizatória e ambiental, como pelo aspecto positivo ou mesmo da oportunidade que temos ao inserir o tema ambiental como central, integrador e articulador de um modelo de desenvolvimento para o país e do mundo.
Pelo aspecto negativo, ao longo dos últimos anos podemos contabilizar diversas perdas de vida, conforme o Escritório das Nações Unidas para a Redução de Riscos e Desastres alertou que em 2015 quase 100 MILHÕES de pessoas tiveram suas vidas destruídas ou desestruturadas por desastres “naturais”, dentre esses desastres, contam-se 32 secas extremas que atingiram mais de 50 milhões de pessoas.

Outro exemplo que é mais próximo ao Brasil, é a proliferação global do Aedes aegypti e do Aedes albopictus que se deve não apenas às mudanças climáticas e à destruição pelo homem dos habitats silvestres, mas também ao colapso em curso das populações de insetívoros: aves, anfíbios, peixes e répteis.

E os desastres “naturais” ou outros também causam prejuízo econômico, como por exemplo, a crise hídrica que Barcelona sofreu entre 2007 e 2008 onde a cidade precisou trazer quatro navios de água da França por dia, com 250 mil metros cúbicos de água em cada navio para poder fornecer água à população. Essa crise causou um prejuízo de um bilhão de euros para a economia catalã, representando cerca de 0,87% do PIB da Catalunha em dois anos.

Em 2017, em todo o Brasil, 872 cidades tiveram reconhecimento federal de situação de emergência causada por um longo período de estiagem. A região mais afetada foi a do Nordeste e o estado da Paraíba, que concentrou o maior número de municípios, com 198 que comunicaram o problema à Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (Sedec).

Cada vez mais temos fatos que cruzam a questão ambiental, a economia e a questão social.
A crise hídrica na Região Sudeste, em especial no Estado de São Paulo, onde a hidrovia do Tietê fechou por seis meses e isso representou a perda de 5 mil empregos diretos que trabalhavam na hidrovia e outros indiretos e na mobilização de 10 mil caminhões para transportar o que a hidrovia transportava.

As tragédias ambientais da SAMARCO e da VALE também reforçam a importância do debate para um novo modelo de desenvolvimento.

Os Relatórios do Fórum Econômica Mundial, desde 2015, reconhecem como elementos de grandes riscos para negócios, a crise da água, eventos extremos, mudança climática, crise na produção de alimentos e outras crises como a da migração que tem uma grande relação com as já mencionadas.
Novamente cruzando a questão ambiental com a questão social temos a ocupação da maior parte dos leitos hospitalares com doenças que tem origem na má qualidade da água e esses leitos são ocupados por pessoas de baixa renda.

Situação que se explica, pela ausência de saneamento, onde no Brasil cerca de 35 milhões de brasileiros não tem acesso à rede de água potável; 95 milhões de brasileiros não tem coleta de esgotos e 54% dos esgotos não são tratados.

Estudos recentes comprovam que moradores de locais sem saneamento básico ganham salários menores do que a população com acesso a água, coleta e tratamento de esgoto, por isso, também estão mais vulneráveis a doenças comuns em áreas em que essa infraestrutura inexiste ou é precária – e o efeito disso é uma elevação nas despesas com saúde pública, que na realidade são despesas com doenças, não de fato com saúde.

A figura abaixo demonstra como estava a distribuição da riqueza em 2013. 

A riqueza da humanidade adulta (cerca de 4,7 bilhões de pessoas) é de 240,8 trilhões de dólares (2013). Mais de dois terços (68,7%) dos indivíduos adultos situados na base da pirâmide da riqueza, possuem 3% (7,3 trilhões de dólares) da riqueza global, com ativos de no máximo 10 mil dólares. No topo da pirâmide, 0,7% de adultos possui 41% da riqueza mundial (98,7% trilhões de dólares). Somados os dois estratos superiores da pirâmide – 393 milhões de indivíduos ou 8,4% da população adulta – detêm 83,3% da riqueza mundial.

Pirâmide global da riqueza em 2013
Figura – Pirâmide global da riqueza em 2013. Baseado em The Crédit Suisse Global Weath Report 2013 (em rede). Observação: Riqueza é aqui entendida como o conjunto dos ativos de um indivíduo adulto. (livro Capitalismo e Colapso Ambiental – 2ª edição)

Este é um dos desafios para a questão ambiental, pois a distribuição da riqueza está associada à satisfação de suas necessidades. 

Para satisfazer a avidez de 393 milhões de indivíduos – os 8,4% da população mundial adulta detentora de 83,3% da riqueza mundial –, move-se a economia do planeta, máquina produtora de crises ambientais, a começar pelas mudanças climáticas: “os 500 milhões de pessoas mais ricas do mundo produzem metade das emissões de CO2, enquanto os 3 bilhões mais pobres emitem apenas 7%”.

Com a rápida degradação ambiental, a maioria esmagadora da humanidade, nem mesmo os mais ricos, poderão não ter mais acesso na melhora da qualidade de vida, pois isto não é possível num meio ambiente em rápida degradação.

De outro lado, pelo aspecto positivo, o Brasil tem excelentes oportunidades de refletir sobre um novo modelo de desenvolvimento que pode colocar a questão ambiental como central para integrar e articular um desenvolvimento baseado nas suas riquezas naturais, na sua diversidade e na existência de diferentes biomas (Amazônico, Pantanal, Mata Atlântica, Cerrado, Pampa, Caatinga).
O Brasil abriga a maior biodiversidade do planeta. Esta abundante variedade de vida – que se traduz em mais de 20% do número total de espécies da Terra – eleva o Brasil ao posto de principal nação entre os 17 países megadiversos (ou de maior biodiversidade).
 
Além disso, pelo fato do Brasil ter cerca de 13% da água do mundo, quantidade que aumenta para 18% considerando ainda as vazões oriundas de território estrangeiro que ingressam no país da Região Amazônica, Uruguai e Paraguai (RAUBER; CELLA, 2008).

O Brasil ainda possui Unidades de Conservação que contribuem para regulação da quantidade e qualidade de água para consumo; fertilidade dos solos e estabilidade das encostas (relevo); equilíbrio climático e manutenção da qualidade do ar; alimentos saudáveis e diversificados; base para produção de medicamentos para doenças atuais e futuras; áreas verdes para lazer, educação, cultura e religião; fornecer matéria-prima para tudo o que se possa imaginar, ou seja, elas oferecem oportunidades para novos tipos de negócios.

Portanto, o Brasil com tanta riqueza natural, apresenta uma excelente oportunidade para todos nós que trabalhamos na área ambiental e também para a sociedade brasileira de fazer a reflexão mais profunda e urgente do momento:

– Repensar o Modelo de Desenvolvimento para o país, de forma que ele incorpore no centro do debate a questão ambiental articulando a economia e melhorando a qualidade de vida para toda a sociedade.

Os fatos acima e outros que são inumeráveis, demonstram esta urgência. Tenho esperança que tenhamos a sabedoria dos “loucos” para fazer este debate.

* Por Angelo José Rodrigues Lima –Biólogo (UFRRJ), Mestre em Planejamento Ambiental (UFRJ), Doutor em Geografia em Análise Ambiental e Dinâmica Territorial (UNICAMP).
REFERÊNCIAS 

Capitalismo e Colapso Ambiental. Marques Filho, Luiz César. 2.ed.rev. e ampl – Campinas SP: Editora da Unicamp, 2016.

Secas no Brasil – Política e gestão proativas. Organizadores. De Nys, Erwin e outros. CGEE. 2016.
Um século de secas: PORQUE AS POLÍTICAS HÍDRICAS NÃO TRANSFORMARAM O SEMIÁRIDO BRASILEIRO. Catarina de Oliveira Buriti e Humberto Alves Barbosa. Chiado Books, 2018.
UNIDADES DE CONSERVAÇÃO: CONSERVANDO A VIDA, OS BENS E OS SERVIÇOS AMBIENTAIS. São Paulo – 2008


in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 06/06/2019

A Questão Ambiental como Elemento Central, Integrador e Articulador de um Novo Modelo de Desenvolvimento para o Brasil e para o Mundo, artigo de Angelo José Rodrigues Lima

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