quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Herois mirins

Valentia que vai além da idade

Menino escapou ileso de um assalto a van, se escondendo no veículo. E garoto salvou a mãe de naufrágio
 
Patrícia Fernandes
patricia.fernandes@jornaldebrasilia.com.br


Aos 11 anos de idade, João (nome fictício) só conhecia os vilões dos desenhos animados. Mas após perceber que sua vida e a de uma amiga estavam em perigo, o menino demonstrou coragem e esperteza de gente grande. 

Eles escaparam de um roubo a uma van escolar ao se esconderem dentro do veículo enquanto dois ladrões, um deles armado, anunciavam o assalto. Durante os momentos de pânico,  a maior preocupação do menino era com a integridade da colega. Mas João não é um caso isolado. 

Assim como ele, Pedro Henrique, de seis anos, conseguiu salvar a mãe no naufrágio que matou sete pessoas  em Corumbá III,  no último sábado.
Emocionado, João relata que a ação dos criminosos foi rápida. 
Segundo ele, ao ser rendido, o motorista conseguiu salvar apenas uma criança de três anos que estava no veículo. 


Sem perceber que eles estavam no banco de trás, os assaltantes seguiram com a van até pararem na DF-250, próximo ao Núcleo Rural Rajadinha.

"Ele pensou que a van estivesse   vazia, mas nós ficamos atrás. Aí, ficamos em silêncio”, relembra. Segundo Mateus, durante o trajeto os criminosos discutiam e afirmavam que iam parar perto de casa. “Tive medo, sim, mas só pensava em salvar as nossas vidas. Parei, pensei e tomei a atitude que achava mais inteligente”, salienta o garoto, de vocabulário vasto para a sua idade.

Celular
Segundo ele, o momento em que os criminosos pararam o veículo  foi o de maior tensão. “Eu peguei meu celular, diminuí a luminosidade e liguei para a minha mãe. Falei mais ou menos onde estávamos. Elas nos orientou a ficar dentro do veículo até que a polícia chegasse”, diz.

No entanto, o menino decidiu seguir sua própria intuição e saiu da van em companhia da colega. Seu principal medo era que os assaltantes ateassem fogo no automóvel. “Resolvemos tentar chegar na BR e pedir ajuda, pois eles nos deixaram no lugar muito isolado”, frisa.

Após percorrerem mais de dois quilômetros,   conseguiram uma carona. “Demos sinal para vários carros, mas ninguém parou. Até que   explicamos o que aconteceu e uma pessoa nos levou até a delegacia”.

Segundo motoristas de vans escolares da região, os assaltos dessa modalidade são cada vez mais comuns. “Nas últimas três semanas, três veículos foram roubados. O meu e os de mais dois colegas”, afirma o motorista R.M., que prefere não se identificar por temer represálias.

Para chamar atenção de autoridades do setor, motoristas que circulam nas cidades de Itapoã e Paranoá  fazem hoje, a partir das 8h, uma passeata. “A situação não pode continuar dessa maneira. Esses criminosos usam métodos muito parecidos, não duvido que seja uma quadrilha organizada”, destaca.

Missão cumprida
Na delegacia, ao encontrar  a mãe, o “super-herói” retirou a armadura e voltou a ser   uma criança. “Foi um alívio tão grande. Eu tive que cuidar da minha amiga e ser racional. Ver minha mãe foi como encontrar um porto-seguro”, diz João.   


Com um olhar de admiração ao observar o relato do filho, a assessora Edileusa Campos, 32 anos, elogia o equilíbrio do rebento. “Ele sempre foi uma criança muito sensata, desde muito pequeno. Até o fato de ele ter me desobedecido ao sair da van  mostra a maturidade dele. Ele tomou a atitude correta”, afirma.

Segundo Edileusa, o momento em que soube que o menino estava na mira de criminosos  foi um dos piores de sua vida. "Faltou chão. Falava para ele não desligar o telefone, que eu iria ajudá-lo", disse. 

Para o futuro, a mãe frisa que, apesar do susto, o menino permanecerá com a mesma rotina. “Ele vai continuar na van. Eu entendo que foi uma fatalidade. O problema está na sensação de insegurança que nos ronda. Vivemos um verdadeiro desgoverno”, argumenta.

Ela frisa, ainda, que o motorista da van também foi vítima. “Em momento algum passou pela minha cabeça que seria uma irresponsabilidade. Se ele pudesse, teria tirado todos, sem dúvidas”, enaltece.

 De acordo com a Edileusa, a criminalidade na região é alta. “O contingente de policiais é muito baixo para a população”, avalia.

Pense  nisso
 Os feitos das crianças mencionadas nesta reportagem são quase inacreditáveis. Todas demonstraram maturidade em suas atitudes, reflexo, muitas vezes, atribuído à criação dada pelos pais. 

Mas é preciso lembrar que, tratando-se de segurança, deve-se  tomar o cuidado de não se colocar em uma situação que coloque em risco a própria vida. Isso vale para qualquer idade. Em relação a crianças, porém, a atenção quanto a isso é  dobrada.

Episódio não abala confiança em serviço
Para o motociclista Valdivino da Paixão, 37 anos, pai da outra criança vítima do assalto à van,  o episódio é reflexo da sensação de insegurança que norteia a rotina dos brasilienses. “Infelizmente, a onda de violência está em todos os pontos da cidade”, afirma.


Ele frisa que sua filha, mesmo abalada, também voltará à mesma rotina. “Ela vai voltar para a escola. Tenho que mantê-la na van, pois eu e minha esposa trabalhamos fora. Então, temos que seguir em frente”, conclui.


A van foi localizada pelos policiais em uma quadra próxima. Os assaltantes levaram um GPS e o som do carro, além do celular, carteira e documentos do motorista. 

Para a polícia, os bandidos queriam desmanchar a van para vender as peças. Até o fechamento da edição, a polícia não havia localizado os suspeitos. 


A reportagem não conseguiu contato com o motorista da van.

Exemplo de coragem em Corumbá
O naufrágio em Corumbá III, que resultou na morte de sete pessoas de uma mesma família, mostrou a força e perseverança do garoto Pedro Henrique, de seis anos. Ele era o único que vestia colete salva-vidas. 

A mãe dele, Joseane Rodrigues da Silva, de 24 anos, conseguiu se agarrar ao menino e flutuou com ele até uma das margens. Os dois sobreviveram, mas o marido e a filha, de quatro anos, não conseguiram se salvar. 

Todos os ocupantes do barco pertenciam à mesma família e moravam em Santa Maria. O acidente aconteceu na tarde de sábado, mas os bombeiros só começaram os trabalhos de resgate no domingo, por causa da forte chuva que atingiu a região. 

Havia 11 pessoas na embarcação, incluindo o dono, que pilotava o barco, mas apenas quatro sobreviveram. De acordo com os bombeiros, todos os corpos foram encontrados submersos, próximos à barragem e perto da canoa. 

A família ainda se recupera da tragédia.  Ontem, a mãe de Pedro, Joseane, precisou de atendimento no Hospital Regional de Santa Maria (HRSM), onde foi medicada e não precisou de internação, segundo informações da Secretaria de Saúde. 

Já Núbia da Silva Ribeiro, de 28 anos, que perdeu três filhos no naufrágio, chegou ao Pronto Socorro do hospital regional  com tremores e enrigecimento dos membros. A pasta informou que a paciente também foi medicada e liberada.

Investigação
A Polícia Civil abriu inquérito para investigar as circunstâncias do acidente. Exames no piloto,  Januário Silva dos Santos, de 53 anos, indicaram que ele não havia consumido álcool. 

Porém, diversas irregularidades foram constatadas: a embarcação estava com o registro junto à Capitania Fluvial vencido, houve superlotação e falta de coletes salva-vidas e de habilitação do condutor. 

Um Inquérito Sobre Acidentes e Fatos da Navegação (IAFN) deve ser instaurado e o resultado será divulgado em até 90 dias.
Os corpos das vítimas foram enterrados na última segunda-feira,  no cemitério Parque Memorial, em Novo Gama (GO), na Região Metropolitana do Distrito Federal.

Pequenos super-herois
Em Caxias do Sul (RS), os irmãos, Daniel, 3 anos, e João Pedro, 5, conseguiram salvar o aposentado Armindo Gargioni, 65 anos, que estava se afogando numa piscina do condomínio. 

Os pequenos teriam ficado sob a supervisão do idoso enquanto a mãe deles teria ido buscar toalhas. Foi quando o homem deu um mergulho e não voltou à superfície.

As crianças teriam percebido e entrado na água. A ideia do salvamento foi de Daniel, o mais novo. Um dos garotos teria puxado pelo braço do idoso e outro, pego a cabeça do homem e colocado sobre a borda da piscina. Quando a mãe dos meninos chegou, chamou por socorro. 

Armindo ficou cinco dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e, ao sair, recebeu a visita dos meninos, vestidos com roupas de super-heróis . 

Apesar de orgulhosos com o ato heroico dos filhos, os pais de Daniel e João Pedro disseram que ficarão em alerta, pois a história poderia não ter acabado bem.

Fonte: Da redação do Jornal de Brasília

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