sábado, 28 de junho de 2014

Maria Elizabeth Rocha, presidente do STM, quer mais igualdade entre os militares

A primeira mulher a presidir o STM também luta contra discriminação a homossexuais nas Forças Armadas

eric.zambon@jornaldebrasilia.com.br

 
Primeira mulher a presidir o Superior Tribunal Militar (STM), Maria Elizabeth Rocha, mineira de 54 anos, quer o fim do preconceito contra homossexuais dentro das Forças Armadas e punições mais rigorosas para crimes de gênero.  

Além disso, ela tem como umas das prioridades a mudança da legislação militar, que considera retrógrada, e a digitalização de processos históricos, principalmente para dissociar a Corte de imagem da ditadura militar. Maria Elizabeth assumiu o cargo após a aposentadoria do general do Exército, Raymundo Nonato Cerqueira Filho, em 16 de junho, e terá nove meses – tempo para completar o mandato do antigo presidente – para colocar suas ideias em prática. 

Como o STM segue esquema de rodízio para definir lideranças, ao fim de sua gestão, ela deve dar lugar a um oficial da Aeronáutica. Para ter chance de ser eleita, dessa vez por todo um mandato, a ministra deve esperar nova rodada de comando.


Crimes de gênero fazem parte dos processos que você têm de julgar como ministra do STM?

Julgo, não com muita frequência, violência de um homem militar contra uma mulher militar. Na gestão, eu procuro abrir espaço para que mulheres possam se destacar. Conheço muitas competentes e fiz questão de chamá-las para compor minha curta administração com intuito de dar exemplo e não ficar apenas no discurso.

A aplicação da Maria da Penha no meio militar é parte da sua motivação para querer alinhar a Justiça Militar com a Justiça Comum?

Com certeza. Esse alinhamento passa por uma reforma da Legislação. É preciso que a legislação militar, vanguardista em seu tempo, se atualize nos moldes da nova Constituição e sociedade que temos. O código editado em 1969 está defasado. Minha ideia é trazer para dentro dessa justiça especializada as leis penais esparsas.


 A lei Maria da Penha é uma delas, mas tem também a lei do estupro, da pedofilia, dos crimes hediondos. Enfim, toda essa gama de legislação que foi oriunda de uma conquista social e que nós infelizmente não podemos aplicar porque não faz parte do nosso universo legislativo

Vossa Excelência tomará posse por nove meses. É uma possibilidade concreta alcançar esses objetivos ou espera pelo menos dar o pontapé inicial?

Bom, se eu não conseguir, quero iniciar esse trajeto. Minha ideia é criar uma comissão para a reforma do código no Senado. Para isso vou procurar o presidente do Senado e também encaminhar para o Congresso propostas pontuais de alteração. Reconheço que modificar um código leva tempo. 

Até que porque ele se ramifica em outros meios do direito, que não é só o Direto Penal Militar. Tenho consciência de que, realmente, promover uma mudança no código é uma tarefa que não caberia em nove meses. Mas aprovar, por meio de uma lei ordinária, pontos específicos de uma legislação é possível fazer.

E como será trabalhada a discriminação de homossexuais dentro das Forças Armadas?


Em primeiro lugar, nos meus discursos eu defendo com veemência a igualdade entre humanos. Já tive oportunidade de votar nesse sentido, então tenho um discurso coerente desde minha posse, em 2007. Eu sou minoria, portanto eu tenho obrigação de me solidarizar e sentir os efeitos da discriminação. 

Não que eu tenha sido discriminada nesse tribunal, mas de uma forma geral, nas questões de gênero, tenho plena consciência das desigualdades que permeiam nossa sociedade. Nesse sentido procurarei buscar nos meus pronunciamentos, nas minhas relações institucionais, defender essa causa que eu acho tão importante para a República.

Vossa Excelência considera o meio militar machista?

Não sei se machista é uma palavra adequada. É um meio muito masculino, apesar de ter mulheres que integram as Forças Armadas. A meu modo de ver isso vai ser ultrapassado com o tempo e políticas afirmativas que possam igualar as mulheres aos homens dentro das Forças Armadas. 

Por exemplo, na Marinha, as mulheres não podem ser fuzileiras nem integram a armada. No exército, elas não são cavaleiras, infantes e artilheiras. Então, ainda há algumas conquistas e espero que, nesse meu convívio com as Forças Armadas, esses paradigmas possam ser paulatinamente alterados.


Por que é importante a inclusão da Justiça Militar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ)? O que mudaria na prática?


Mudaria tudo. Nós somos submetidos ao CNJ, aplicamos as resoluções do CNJ, mas não temos voz nem assento no CNJ, o que é uma grande inconstitucionalidade. Ora, o Conselho foi criado como um órgão externo de controle do Poder Judiciário. Todos os órgãos que integram esse poder estão ali representados, com a exceção da Justiça Eleitoral e Militar. 


Ao longo de toda a trajetória constitucional brasileira, a Justiça Militar fez parte do Poder Judiciário, então não tem explicação lógica que nos retire a possibilidade de também participarmos da construção desse controle que é tão importante para a sociedade.


Qual seria a importância do acesso digitalizado a processos históricos do Tribunal?


Primeiro que a transparência é uma marca da República. Depois possibilitaria a abertura da história brasileira aos pesquisadores, estudantes, historiadores, cientistas políticos e interessados. 


É um movimento importantíssimo de mostrar a história, de mostrar qual foi o papel e atuação desse tribunal que sempre honrou a democracia, ao contrário do que muitos incautos que desconhecem a atuação da Justiça Militar pensam.


Fonte: Da redação do Jornal de Brasília




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