segunda-feira, 2 de março de 2015

Opinião: Farra com o meu, o teu, o nosso dinheiro

BLOG do SOMBRA

Causa indignação a insensibilidade apresentada logo na abertura dos trabalhos de 2015


A decisão do comando da Câmara de aumentar as regalias dos deputados repercutiu mal, muito mal.


Eduardo Cunha engordou o já gordo kit mordomia posto à disposição dos parlamentares. Robusteceu o auxílio-moradia e a ajuda para a atividade parlamentar. A verba de gabinete, destinada à livre contratação de servidores, passou de R$ 78 mil para R$ 92 mil. Mais: devolveu privilégio cassado há seis anos. Cônjuges voltarão a ter passagens pagas pelo erário. No total, as benesses atingirão o montante de R$ 150 milhões anuais. ...

Cunha explicou que não se trata de aumento nos gastos da Casa. Trata-se de correção monetária. Desde julho de 2012, os valores não são corrigidos. É verdade. É verdade também que há muita gordura para ser queimada. Considerado o delicado momento que a economia atravessa, incrementar mordomias soa como acinte aos brasileiros, que veem o mês se alongar e o salário se reduzir. Mais atentos à realidade nacional, os 64 deputados do PSDB e do PPS anunciaram que recusam a bolsa-cônjuge.

É de lamentar o ocorrido, que vai de encontro às urgências do Brasil. A reconquista da credibilidade é um dos grandes desafios do Congresso. Talvez seja o maior. No sistema representativo, o eleitor escolhe o candidato que supõe faça o que ele faria em situações cruciais para a sociedade e o país. Senadores e deputados, ao receber o mandato, assumem simbolicamente a identidade do cidadão que confiou na pessoa e nas palavras do postulante ao cargo.

 Decepções vêm se sucedendo. Entre os efeitos nocivos da ditadura, sobressai o rebaixamento do Legislativo. Os governos militares lhe desidrataram o poder. Como compensação, multiplicaram as benesses que não pararam de crescer. Gabinetes, passagens, residências, viagens, gasolina, carros oficiais, verbas para contratação de servidores, franquias postais e telefônicas contribuíram para criar um parlamento obeso, sem musculatura.

O regime de exceção passou. Mas o Congresso manteve a atrofia em relação ao Executivo e ao Judiciário. Eduardo Cunha, na disputa da Presidência da Câmara, levantou a bandeira de independência e recuperação do prestígio do Poder que legisla e fiscaliza. A proposta mereceu aplausos. Com razão. O Legislativo constitui um dos tripés da democracia. Fragilizado, fragiliza o regime de franquias.

Causa indignação a insensibilidade apresentada logo na abertura dos trabalhos de 2015. Os membros da Mesa Diretora da Câmara dão prova de total alienação da realidade. São pessoas que não sabem ler o tempo em que vivem. Extemporâneas, ressuscitaram cadáver enterrado em 2009 no féretro da farra das passagens.

Fonte: Correio Braziliense - 01/03/2015 - - 21:09:15

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