segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Ártico começa a ter regras para evitar extrativismo destruidor


Ártico começa a ter regras para evitar extrativismo destruidor
05/10/2018 10h48  Atualizado há 3 dias



Foi inaugurada a temporada de acordos ambientais, o que é ótimo para quem se preocupa com os rumos do nosso planeta. São iniciativas que, geralmente, antecedem a Conferência das Partes convocada pelas Nações Unidas. Este ano a COP será de número 24 e vai acontecer na Polônia em novembro. Na quarta-feira (3), por exemplo, uma boa providência foi tomada para evitar a exploração excessiva dos peixes que vivem nas águas congeladas do Círculo Polar Ártico: um acordo assinado na Groenlândia proibiu a pesca comercial na região.

A preocupação é válida, já que, por conta das mudanças climáticas, uma vasta área de mar está se abrindo, o que pode atrair grandes empresas a fim de explorar a pesca. Segundo a reportagem do jornal britânico “The Guardian”, o Mar Ártico tem cada vez menos gelo e a tendência, claramente, é que os icebergs fiquem ainda menores, o que facilitaria, por exemplo, a navegação por lá. Já está acontecendo. Embora ainda não haja uma atividade pesqueira de peso, grandes navios já começam a circular.

“A Maersk, a companhia de navegação dinamarquesa, enviou, em agosto, o primeiro navio de contêineres através da rota anteriormente congelada , partindo da cidade russa de Vladivostok e chegando com segurança com sua carga de peixe congelado em São Petersburgo após uma viagem de 37 dias”, diz a reportagem.

Em 2015, nove nações - EUA, Rússia, Canadá, Noruega, Dinamarca, Islândia, Japão, Coréia do Sul e China - além da União Europeia, assinaram o acordo do Oceano Ártico Central em uma cerimônia na Groenlândia, depois de muitos anos de negociações. Era uma resposta ao derretimento do gelo, que pode atrair peixes que interessam ao comércio, como o bacalhau. Na época da assinatura do acordo, o secretário adjunto de Estado dos Oceanos e Pesca, David Balton, disse que a iniciativa servia para “evitar que um problema surja antecipadamente”.

Os estados do Ártico, assim, se comprometeram a proteger as águas internacionais, a partir de 200 milhas náuticas de suas costas. Mas é preciso mais do que isso, na visão da ativista do Greenpeace no Ártico, Sophie Allain:

“Esta região deve ser declarada um santuário marinho, onde todas as práticas extrativistas, incluindo a produção de petróleo, são proibidas ”, disse ela ao “The Guardian” na época da assinatura do Acordo.

Ainda não se chegou a isso, mas a proibição da pesca já é um bom caminho. A ideia é que sejam feitos estudos profundos para monitorar o ecossistema marinho da região antes de liberar qualquer tipo de extrativismo ali. Além da pesca, há muito medo, entre os ativistas ambientais, de que o Ártico passe a ser explorado por empresas de petróleo. Este Acordo, portanto, pode ser o primeiro passo para proteger o Ártico contra o extrativismo para usos comerciais. Como bem sabemos, para garantir o “desenvolvimento” e o “progresso”, em nome de mais “emprego” e “renda”, muitos absurdos contra o meio ambiente têm sido cometidos.

“Ironicamente, o maior impacto positivo do aquecimento provocado pela queima de combustíveis fíosseis é permitir a exploração de mais combustíveis fósseis, que causarão mais aquecimento. Estima-se que o Ártico tenha 30% das reservas não descobertas de gás natural do planeta e 13% das reservas não descobertas de petróleo. Com o degelo, campos de petróleo e gás offshore que há vinte anos eram economicamente inviáveis passam a ficar abertos por um período do ano longo o suficiente para permitir exploração”, escreve Claudio Ângelo, jornalista científico, em seu livro “A espiral da morte” (Ed. Companhia das Letras).

Claudio fez cinco viagens às regiões polares entre 2001 e 2014, entrevistou cientistas, moradores das regiões mais distantes, fez um voo de pesquisas da Nasa, visitou laboratórios de glaciologia para escrever o livro sobre o que até hoje já foi descoberto sobre os polos e o clima. Quanto ao Ártico, ele avisa:

“Estados Unidos, Canadá, Rússia, Noruega e Groenlândia já iniciaram a corrida a esse pote de ouro.”
Claudio também conta uma história que pode ajudar a refletir a respeito da necessidade de proteção ambiental e, ao mesmo tempo, sobre como esta medida pode render resultados pífios diante de um sistema que induz a produzir mais e mais para conseguir acumular capital. Em 2013, os groenlandeses elegeram pela primeira vez uma mulher como primeira-ministra, Aleqa Hammond.
“Aos 48 anos, ela assumiu em abril daquele ano prometendo conduzir o país à independência em relação à Dinamarca. E a maneira como ela pretende fazer isso é pelas mãos do capitalismo: abrindo seu país à eploração mineral e intensificando a polêmica em busca por petróleo no mar da Groenlândia”, diz ele.

Daí para abrir espaço a outras explorações, como o minério – ferro, ouro e cobre que se encontram naquelas terras gélidas – será um pulo.

No caso dos peixes, o Acordo recém-assinado talvez seja apenas o início de uma série de regulamentações estritas. Os países também iniciarão um programa conjunto para o monitoramento científico dos 2,8 milhões de quilômetros quadrados do Ártico, e a moratória pode ser ampliada de cinco em cinco anos, dependendo dos resultados, segundo a reportagem do “The Guardian”.

São cuidados que visam a restringir o afã extrativista sobre bens naturais. Não custa pensar que, se eles estão sendo tomados é porque os cientistas andam queimando as pestanas há décadas para mostrar os péssimos cenários – que já estamos vendo – com um acesso irrestrito e sem regulação a peixes, minérios, madeiras e outros bichos.

É do que se trata quando se reivindica que os governantes tenham uma visão atualizada, bem informada e conectada com o ambiente ao redor. Querer a cadeira presidencial apenas pensando em se perpetuar no poder é o pior do mundos.

Bom voto no domingo.

Amélia Gonzalez — Foto: Arte/G1
 Amélia Gonzalez  — Foto: Arte/G1

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