Contaminação de
funcionários, irregularidades na produção e doações para bancada
ruralista compõem histórico das multinacionais do mercado de
agrotóxicos; menos conhecidas, corporações nacionais também foram
beneficiadas pelas liberações do governo Bolsonaro
Por Julia Dolce O recorde de novos
pesticidas certificados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (Mapa) em menor período, batido pelo governo Bolsonaro
após aprovar 86 novos produtos em pouco menos de dois meses,
é comemorado por um grupo seleto de empresas. Além de colecionarem
pedidos de registros, as corporações por trás desses agrotóxicos e seus
sócios — ambos negligenciados pela imprensa brasileira — têm em comum
históricos de conflitos agrários, processos e denúncias de contaminação. Quais são elas?
Riscos para os trabalhadores e para o ambiente. (Foto: Reprodução)
Na lista das que mais tiveram novos produtos registrados
estão multinacionais e empresas brasileiras pouco conhecidas do público
em geral, como a israelo-chinesa Adama, sétima maior produtora de
químicos agrícolas do mundo (com faturamento anual no Brasil estimado em
US$ 600 milhões). Ela é a responsável pelo pedido de dois novos
produtos classificados como classe I ou extremamente tóxicos, o Voraz EC
e o Hexazinona Técnico Adama BR, além de dois produtos altamente
tóxicos e um medianamente tóxico. A empresa alemã Helm teve o pedido de
dois venenos classe I aceitos pelo Mapa.
Entre as campeãs em novas certificações desponta uma velha
conhecida: a Syngenta Proteção de Cultivos Ltda. A multinacional suíça,
cujo faturamento total, por ano, chega a US$ 10 bilhões, foi adquirida
em 2017 pela estatal chinesa ChemChina. No Brasil, é responsável pelo
pedido de dois produtos “extremamente tóxicos”: o Elatus Trio, indicado
para as culturas de milho e soja, e o Avicta 500 FS PRO, indicado para
as mesmas culturas, além dos plantios de algodão e cana-de-açúcar.
Esse último pesticida é produzido com o ingrediente ativo
abamectina, que já teve a legalidade de seu uso questionada pelo
Ministério Público Federal (MPF), em março de 2015, e pela 7ª Vara da
Justiça Federal do Distrito Federal, no ano passado, por causar danos à
saúde humana e ao ambiente.
A relação traz ainda empresas brasileiras como a Agroimport do Brasil
Ltda, pertencente ao Grupo Ferrarin, responsável por uma variação do
glifosato conhecida como Topatudo, outro pesticida extremamente tóxico
aprovado neste ano. Confira na outra reportagem da série: “Um dos agrotóxicos liberados em janeiro pelo governo Bolsonaro chama-se Topatudo“.
E o número de pedidos e aprovações só cresce: em 2005 foram apenas 91
registros deferidos; em 2018, esse número saltou para 450. A
perspectiva é que o Brasil chegue neste ano à primeira centena somente
nos primeiros meses do mandato de Bolsonaro. Em janeiro foram 131
solicitações divulgadas. No dia 4 de fevereiro, o Mapa teve 78 novas
solicitações de registro de agrotóxicos. No dia 15, onze dias depois,
foram feitos mais 31 pedidos.
‘EXTREMAMENTE TÓXICOS COLOCAM EM RISCO OS TRABALHADORES’
No caso dos produtos classificados
pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) como extremamente
tóxicos, 21 deles foram aprovados pelo atual governo em quatro atos
publicados no Diário Oficial da União (DOU) em janeiro e fevereiro. De
acordo com o procurador do trabalho Pedro Luiz Serafim, coordenador do
Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, a legislação
brasileira determina que os novos agrotóxicos registrados pelo Mapa
sejam cada vez menos perigosos:
– A Constituição diz que a lei
deve procurar substitutivos cada vez menos tóxicos, o contrário do que
está acontecendo. Os extremamente tóxicos colocam em risco os
trabalhadores – nas etapas de fabricação, transporte, aplicação – e o
meio ambiente. Não existe uso seguro, por isso queremos trabalhar para
que cada vez mais as empresas sejam responsabilizadas, dando
instrumentos ao Estado para proteger a saúde das pessoas.
Meirelles, da Fiocruz, diz que produtos “extremamente tóxicos” são subnotificados. (Imagem: Reprodução/YouTube)
A avaliação da categoria “extremamente tóxico” no Brasil é
baseada no perigo agudo que a substância representa, o que já indica uma
subnotificação dos riscos crônicos causado pelos químicos.
“Os piores venenos também estão nos menores frascos”,
afirma Luiz Cláudio Meirelles, pesquisador e professor em saúde pública
da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Ele ocupou por treze anos o cargo de
gerente geral de toxicologia da Anvisa. “Ou seja, é preciso uma dose
muito pequena para causar muito dano, é isso que norteia a
classificação”, explica. “Mas há também riscos crônicos de doenças
congênitas e outros danos diversos à saúde”. Meirelles foi exonerado em
2012 após denunciar um esquema de corrupção na agência.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), segundo ele, vem
recomendando, há tempos, que os pesticidas altamente perigosos sejam
retirados do mercado: “Não é interessante para o país autorizar uma
série de substâncias que caiam nesse perfil, não é adequado do ponto de
vista do risco sanitário, o que impacta até mesmo em questões
econômicas”.
ASSASSINATO, CONTAMINAÇÃO DE CRIANÇAS E PERSEGUIÇÕES
A Syngenta foi condenada em dezembro pelo homicídio do sem-terra
Valmir Mota de Oliveira e pela tentativa de assassinato da camponesa
Isabel Nascimento de Souza. A decisão, confirmada em segunda instância
pelo Tribunal de Justiça do Paraná, determinou que a empresa deveria
indenizar as famílias das vítimas por danos morais e materiais. O
assassinato ocorreu no município de Santa Tereza do Oeste, em um campo
de experimentos com transgênicos. A área estava ocupada por 150
integrantes da Via Campesina, articulação de movimentos sociais do
campo, que denunciava a suposta ilegalidade das pesquisas da
transnacional. Os militantes foram atacados a tiros por cerca de
quarenta agentes de uma empresa contratada, a NF Segurança.
O sem-terra Valmir Mota de Oliveira, assassinado por seguranças contratados pela Syngenta. (Foto: MST)
Também no ano passado, a Syngenta foi condenada a indenizar
em R$ 150 mil os 92 alunos, professores e funcionários da Escola
Municipal Rural São José do Pontal, em Rio Verde (GO), atingidos em 2013
pela pulverização aérea do agrotóxico EngeoTM. Usando serviços da
Aerotex Aviação Agrícola, a empresa despejou o veneno em uma cultura de
milho localizada ao lado da escola municipal, que faz parte do Projeto
de Assentamento Pontal dos Buritis, em uma área da União, como explicou
De Olho nos Ruralistas em reportagem publicada na época.
A Syngenta já teve mais de 1 milhão de quilos e 150 mil
litros de agrotóxicos apreendidos pela Anvisa em 2009, no município de
Paulínia (SP), devido a uma série de irregularidades encontradas nos
produtos, como datas de fabricação e validade adulteradas. Em 2006, a
multinacional teve 143 hectares de terra, irregularmente utilizados para
testes com soja e milho transgênicos, desapropriados pelo governo do
Paraná. Em 2017, a Anvisa proibiu a comercialização de um dos principais
herbicidas da Syngenta, o paraquat, relacionado ao desenvolvimento de
câncer e Parkinson.
Em outros países a corporação foi considerada responsável
por irregularidades e contaminação. Seus pesticidas, proibidos, devido à
sua extrema toxicidade. Em maio, a Syngenta foi condenada a indenizar
produtores de milho nos EUA em US$ 1,5 bilhão, após vender uma semente
modificada para a China antes de o país asiático aprovar sua
regulamentação, o que gerou prejuízo aos produtores dos Estados Unidos. A
empresa se envolveu em polêmicas também no Reino Unido, após a
descoberta de que uma de suas fábricas na região exportava o agrotóxico
Gramoxone, cujo princípio ativo é o paraquat, proibido na ilha.
Tyrone Hayes foi perseguido após provar ação nociva de agrotóxico da Syngenta. (Foto: Universidade da Califórnia)
Um dos casos mais graves atribuídos à multinacional é a
perseguição ao cientista Tyrone Hayes, difamado pela Syngenta após um
estudo realizado a pedido da própria empresa, sobre o herbicida
atrazina. Nos anos 80, o pesquisador concluiu que o agrotóxico impedia o
desenvolvimento sexual dos sapos. A empresa tentou comprar os dados da
pesquisa para mantê-los em segredo. Sem sucesso, deu início a uma ampla
campanha para destruir a reputação profissional do cientista, como
relatou a revista New Yorker, em reportagem publicada em 2014.
À frente do Ministério da Agricultura, a ruralista Tereza
Cristina, apelidada de “musa do veneno”, possui ligações indiretas com a
Syngenta. Sua campanha ao cargo de deputada federal nas últimas
eleições teve como um de seus maiores financiadores o empresário Celso
Grieseang, um dos proprietários da Sementes Tropical, empresa que
comercializa fungicidas em parceria com a Syngenta, e doou R$ 37,5 mil à
candidatura da ministra.
COMPONENTE DO AGENTE LARANJA É PRODUZIDO NO SUL
De Olho Nos Ruralistas pesquisou o histórico das demais
empresas, brasileiras e multinacionais, por trás dos novos agrotóxicos
aprovados neste ano, na média de dois a cada três dias, que, em breve,
contaminarão a comida e o solo dos brasileiros.
Uma delas, a Adama, já entrou em conflito com camponeses. A
empresa teve sua fábrica ocupada pelo Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem-Terra (MST) em 2010. A ação foi parte da Jornada Nacional de
Lutas das Mulheres Camponesas da Via Campesina em defesa da soberania
alimentar, como forma de denúncia contra o modelo de agronegócio que
consideram prejudicial à vida das camponesas.
A multinacional é uma das maiores empresas de agroquímicos
do sul do país, produtora de princípios ativos de agrotóxicos para
sementes, incluindo o 2,4-D, que já foi proibido no Brasil por ser
cancerígeno. O ingrediente é um dos principais componentes do agente
laranja, arma química utilizada no Vietnã, responsável até hoje pelo
nascimento de crianças com malformações congênitas no país asiático.
Camponesas ocuparam fábrica da Adama em 2015. (Foto: MST)
Uma fusão da brasileira Milena Agrociências com o grupo
israelense Makhteshim Agan, posteriormente comprada pela ChemChina, a
Adama já foi multada pela adulteração de 2,5 milhões de litros de
agrotóxicos, em 2010, após uma fiscalização realizada nas fábricas
localizadas nos municípios de Londrina (PR) e Taquari (RS). O CEO da
Adama Brasil, Rodrigo de Souza Dias Gutierrez, é pecuarista e
administrador da empresa Lucas de Souza Dias Gutierrez, que controla uma
fazenda de criação de gado no município de Platina (SP).
A empresa está por trás da doação de dinheiro para
representantes da bancada ruralista no Congresso. Nas eleições de 2014, a
empresa doou R$ 75 mil para o PR, repassados à campanha do ex-deputado
federal Alex Canziani (PTB-PR), parlamentar que integrava a bancada. Em
uma entrevista
de 2012, o pesquisador Meirelles apontava Canziani como um dos maiores
lobistas da Câmara para a liberação de agrotóxicos, sendo o deputado que
mais pressionava técnicos da Anvisa para a aprovação de registros.
Nas mesmas eleições, a empresa doou R$ 60,2 mil para o PSD,
repassados para a campanha do falecido deputado federal Rômulo Gouveia
(PSD-PB), integrante da Comissão Especial sobre os pesticidas, destinada
a dar parecer ao Projeto de Lei (PL) que mudava a palavra utilizada
para descrever os produtos, de agrotóxicos para “defensivos
fitossanitários”.
NO CEARÁ, ANEMIA, DEPRESSÃO E SUICÍDIO
Na opinião do procurador Serafim, os parlamentares
ruralistas incorporam cada vez mais a linguagem dos fabricantes de
agrotóxicos:
– Eles vêm com o discurso de quem está ganhando mais
com a venda do produto, que é o fabricante. É importante que a sociedade
tenha a compreensão de que o agronegócio reproduz essa fala, mesmo
colocando em risco a saúde dos brasileiros e do meio ambiente e
atrapalhando até mesmo a subsistência da atividade deles. As
multinacionais dominam de várias formas, e a interferência na questão
política é uma das principais. Nós precisamos tomar medidas para
interromper isso.
A empresa australiana Nufarm, responsável pela produção do
“extremamente tóxico” Tamiz, doou R$ 35 mil, em 2014, para a campanha do
deputado federal Raimundo Matos (PSDB-CE), que já ocupou o cargo de
vice-presidente dessa Comissão Especial, agora responsável por analisar o
projeto apelidado como PL do Veneno, que propõe a flexibilização da
regulamentação de agrotóxicos no Brasil. Em seu sexto mandato, o
ruralista foi acusado, no ano passado, de receber R$ 100 mil em propinas
da JBS, segundo delação de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de
abastecimento da empresa, como também reportou o observatório.
Em 2007, a Nufarm comprou a brasileira Agripec Química e
Farmacêutica S.A, adquirindo seu portfólio de agrotóxicos. A empresa
pertencia à família de Jorge Alberto Vieira Studart Gomes, conhecido
como Beto Studart, que concorreu ao cargo de vice-governador do Ceará em
2006. Na época, ele possuía terras utilizadas como haras e declarou
possuir um total de R$ 449 milhões em bens.
A Nufarm foi acusada de contaminar o ambiente e intoxicar
pessoas no município de Maracanaú, sede de uma de suas das fábricas. Em
2006, o Ministério Público do estado solicitou um estudo à Universidade
Federal do Ceará para avaliar o nível de poluição emitido pela empresa,
após moradores denunciarem um cheiro “insuportável” vindo do prédio da
indústria, que produzia o inseticida Strom, cujo princípio ativo é o
químico metamidofós. Uma agente de saúde registrou aumento no casos de
anemia, depressão, suicídio e malformações congênitas entre os moradores
da região.
Contra a Nufarm, de origem australiana, pesam casos de depressão e anemia associados à substância Strom. (Foto: Divulgação)
O relatório do estudo, entregue em 2009, foi produzido em
cooperação científica com a Fundação Jorge Duprat Figueiredo, de
Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro-MG) e trazia como solução
efetiva para a eliminação do risco a suspensão da produção do
inseticida. Também em 2006, a empresa foi apontada como responsável pelo
descarte de material tóxico na estrada da Cascalheira, em Camaçari
(BA), e denunciada ao MP estadual. Três anos depois, a Agripec foi
condenada na 1ª Vara Civil de Resende (RJ) a pagar um salário mínimo a
cada pescador do Rio Paraíba do Sul, impedidos de exercer suas
atividades profissionais em consequência de vazamento de produtos
tóxicos por parte da empresa.
A Sipcam Nichino Brasil S.A. é formada por 50% do capital
Sipcam, empresa do Grupo Sipcam-Oxon, atuante no mercado agroquímico
brasileiro desde 1979, e por 50% do capital da Nihon Nohyaku Co. Ltd,
tradicional companhia japonesa. Fabricante dos produtos classe I
Difenoconazole Técnico SUP e Difenoconazole Técnico SNB, ela teve o
parecer técnico de um consultor – contratado pela própria empresa, na
época pertencente à italiana Isagro – adotado pelo Mapa. O documento
argumentava contra o banimento do agrotóxico cihexatina, utilizado na
citricultura.
A adoção do parecer de uma iniciativa privada gerou
polêmica, mesmo com uma recomendação da Anvisa para que o produto não
fosse mais utilizado por fazer mal à saúde de consumidores e lavradores.
Dois anos depois, em 2010, a Anvisa apreendeu 50 mil litros irregulares
da fábrica da empresa em Uberaba (MG), encontrando problemas que iam
desde a adulteração nos prazos de validade até a falta de controle de
qualidade dos produtos.
Outras multinacionais responsáveis pelos registros de
agrotóxicos categorizados como classe I são relativamente pouco
conhecidas. Entre elas está a Arysta Lifescience do Brasil, dos Estados
Unidos, recentemente vendida para a indiana Platform Specialty Products,
que conseguiu a aprovação dos agrotóxicos Agile e Metomil Técnico
Volcano. A alemã Helm do Brasil Mercantil teve os produtos
Difenoconazole JS Técnico Helm e Diquat ZF Técnico Helg aprovados no
segundo ato sobre agrotóxicos registrados pelo Mapa, no dia 17 de
janeiro.
A Rotam do Brasil, com sede em Hong Kong, é autora do
pedido do pesticida Abamectin, aprovado no terceiro ato, publicado no
dia 4 de fevereiro. Finalmente, a chinesa Rainbow Defensivos Agrícolas,
com sede brasileira em Porto Alegre, produz do classe I Sonyaguard XTRA.
EMPRESA TEVE PRODUTO BANIDO DO RIO GRANDE DO SUL
Não apenas as multinacionais do ramo dos agrotóxicos têm
seu currículo manchado. A brasileira BRA Agroquímica (BRA Defensivos
Agrícolas), com sede em Piracicaba (SP) e filial em Redenção (PA), é
produtora dos “extremamente tóxicos” Zardo e Clorotalonil Técnico. Ela
tem, entre seu corpo de sócios, empresários envolvidos com a política
institucional e com empresas que atuam em áreas opostas à da produção
dos agrotóxicos.
É o caso do sócio Milton Alexandre Teixeiras Vargas, que,
nos anos 2000, foi um dos donos de uma empresa já fechada de consultoria
ambiental, a Bioagri Consultoria Ambiental. Ou de Jorge Luiz Alberici,
do MDB de Londrina (PR) e sócio de uma consultoria de registro de
produtos, a AG Brasil Consultoria e Registro de Produtos. O sócio Álvaro
Augusto Teixeira Vargas é presidente do Museu de Ciência e Tecnologia
de Piracicaba.
A América Latina Tecnologia Agrícola Ltda (Alta), que
conseguiu a certificação de uma variação do 2,4-D, apesar de brasileira,
tem imbróglios a nível internacional. A empresa faz parte do grupo
Agrihold Management Corp, offshore baseada em Bahamas denunciada como
uma das offshores mapeadas no escândalo do Panamá Papers. O
representante legal da Agrihold Investments Ltd no país, Ernesto Eugênio
Bellotto, trabalhou em outras distribuidoras de agrotóxicos, como Sinon
e a Sipcam, além das multinacionais Monsanto, Dow e Dupont.
Em maio, a empresa teve a comercialização de um produto, o
herbicida Paraquate Alta 200 SL, banido do Rio Grande do Sul por decisão
do Supremo Tribunal Federal (STF). Na época, a ministra Cármen Lúcia
considerou comprovada a ameaça de grave risco à saúde e ao ambiente. Com
isso ela suspendia os efeitos de liminar concedida à empresa pelo
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que permitia a comercialização
do agrotóxico.
O início da controvérsia ocorreu após a Fundação Estadual
de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler negar o cadastramento do
produto, que já havia obtido registro junto ao Ministério da
Agricultura. A empresa, então, impetrou um mandado de segurança,
alegando o direito de vender o agrotóxico no estado gaúcho.
A BRASILEIRA NORTOX E O ENVENENAMENTO DE INDÍGENAS
A Nortox S.A é outra companhia brasileira que compila
irregularidades. Seu produto “altamente tóxico” 2,4-D Técnico Nortox CH,
de origem chinesa, foi aprovado na última leva de certificações do
Ministério da Agricultura, publicada no Diário Oficial da União em 18 de
fevereiro. A empresa já registrou neste ano dois outros produtos
medianamente tóxicos e um altamente tóxico.
Em Arapongas (PR), a fábrica da Nortox recebeu a
fiscalização após o superaquecimento de um reator provocar o lançamento
de gases que causaram mau cheiro no município paranaense. O resultado da
fiscalização, realizada pela Anvisa, foi a interdição de 370 mil litros
de agrotóxicos após a identificação de alterações de componentes que os
tornavam diferentes dos registros autorizados pelo governo.
Uso do Nortox comprometeu a saúde de indígenas no MT, segundo relatório da ONG Repórter Brasil. (Foto: MPF).
A contaminação humana faz parte do histórico da empresa brasileira. Ela foi citada no relatório da ONG Repórter Brasil sobre
envenenamento de indígenas no Mato Grosso do Sul. As principais vítimas
foram crianças da Terra Indígena Guaiviry. “Quando eles passam veneno
nas lavouras, geralmente o Nortox, as pessoas passam muito mal”,
afirmou Cirso Jorge, liderança local.
“Principalmente as crianças. Pega
em todo mundo, dá umas fístulas cheias de pus, depois a pele da gente
fica toda marcada”.
A empresa entrou em conflito com o MST em 2006, quando
aproximadamente cem integrantes do movimento interromperam o tráfego na
BR-369 para protestar contra a doação da Nortox à campanha do deputado
federal Abelardo Lupion (PFL-PR, hoje DEM). Foram R$ 50 mil doados em
1998, segundo o movimento campesino, “com o objetivo de flexibilizar a
utilização de agrotóxicos no Brasil”. Os manifestantes protestaram nas
proximidades da Fazenda Santa Rita, propriedade do político em Santo
Antônio da Platina (PR).
A empresa foi autuada em 2 de fevereiro de 2009 e 29 de
junho de 2010 por produzir o pesticida Endossulfan Técnico Nortox de
forma diferente da autorizada pela Anvisa. Considerado de risco Classe
I, o agrotóxico teve seu uso associado a problemas reprodutivos e
endócrinos identificados em trabalhadores rurais. No fim do ano passado,
a Nortox teve uma de suas unidades fechadas em Rondonópolis (MT), por
não apresentar o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental.
A empresa foi vencedora do Prêmio Chico Mendes de
Responsabilidade Socioambiental por três anos consecutivos (2014, 2015 e
2016), por seu projeto socioambiental Olho D’água, que tem como
objetivo recuperar minas e nascentes.
Outra brasileira responsável pelos pedidos de químicos
registrados pelo governo Bolsonaro é a Companhia das Cooperativas
Agrícolas do Brasil (CCAB Agro S.A), associada ao grupo francês InVivo
Agrosciences desde 2016 e ao grupo Louis Dreyfus, para comercialização,
desde 2011. A empresa movimenta 90 bilhões de euros por ano, congrega
mais de duzentas cooperativas e registrou o extremamente tóxico
Difenoconazol Técnico CCAB, além de dois outros produtos considerados
medianamente tóxicos.
A gaúcha Cropchem conseguiu o registro de seus produtos
Kasan Max 750 WG e Taura 200 EC. Nos últimos dois anos, a empresa
triplicou seu portfólio de agrotóxicos. Seu CEO, José Luis Harlacher de
Leão, possui duas empresas de comércio de pesticidas, a Green Power, e a
Crystal Agro, ambas em Porto Alegre.
NOVOS PEDIDOS AGUARDAM NA FILA DA AGENDA DA MINISTRA
Além dos pedidos já deferidos, a entrada de Tereza
Cristina e sua sinalização positiva aos agrotóxicos está incentivando
empresas a entrar com novos registros. Nas solicitações deste ano, os
nomes das empresas destacadas nesta reportagem se repetem algumas vezes.
A Adama entrou com pedido de vinte novos produtos; a Nortox, sete; a
BRA Defensivos Agrícolas, quatro.
Nomeação da “musa do veneno” alavancou pedidos de registro de agrotóxicos no governo Bolsonaro. (Imagem: Reprodução/You Tube)Embora o mercado dos agrotóxicos se restrinja a um
número pequeno de multinacionais, o crescimento dessas empresas
brasileiras no ramo preocupa o toxicologista Meirelles. “Temos
cerca de 60% do mercado controlado por cerca de seis grandes empresas, é
um mercado muito concentrado”, analisa.
“Quanto mais empresas tivermos
produzindo substâncias extremamente tóxicas, mais difícil será para os
órgãos reguladores revisar a liberação desses produtos no futuro, porque
haverá uma gama forte de empresas confrontando o governo”. Segundo ele,
a última lista de revisão feita no país foi em 2008, “e a ciência
avançou muito desde então”.
O dado explica ainda o alto número de companhias
pedindo o registro de cópias do mesmo veneno ou ingredientes ativos.
Segundo o Ministério da Agricultura, todos os ingredientes que compõem
os produtos já eram comercializados no Brasil, mas agora terão sua
aplicação em novas culturas ou serão formulados em diferentes
composições e combinações químicas.
Uma instrução normativa lançada no ano passado (nº
40 da Secretaria de Defesa Agropecuária) garantiu plenos poderes aos
engenheiros agrônomos para determinarem, com liberdade, misturas de
diferentes agrotóxicos para a produção de novas receitas.
Independentemente do desconhecimento de seus efeitos e riscos.
Para o procurador Pedro Serafim, o alto número de
registros representa um movimento de recuperação do mercado
internacional, a partir da flexibilização do registro de agrotóxicos no
Brasil:
– A legislação externa tem sido cada vez mais
restrita, principalmente na União Europeia. O setor do agronegócio diz
ao governo que os pedidos de registro são aprimoramentos de tecnologia,
mas são cópias de princípios ativos banidos em outros países. Então é
uma questão de mercado, para colocar o Brasil como celeiro, ou
cemitério, dos agrotóxicos. (Colaborou Bruno Stankevicius Bassi)
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Um processo simples e econômico para fabricar janelas "duplamente inteligentes" e flexíveis em larga escala acaba de ser desenvolvido por uma equipe da Universidade de Ciência e Tecnologia da China.
As telas são capazes de, simultaneamente, ajustar a intensidade da luz que passa por elas, inclusive a porção infravermelha (calor) e filtrar a poeira, deixando de fora o material particulado atmosférico.
Essa dupla funcionalidade resultou da fusão de duas tecnologias: (1) Eletrodos transparentes flexíveis que alteram sua transmitância em resposta a estímulos elétricos ou térmicos ajustam a intensidade da luz que passa e (2) a própria malha em que esses eletrodos são tecidos captura com alta eficiência o material particulado PM2,5 - partículas que medem menos de 2,5 micrômetros.
O professor Yu Shuhong contou que custou exatos U$15,03 dólares e levou 20 minutos para fabricar 7,5 m2das janelas transparentes flexíveis.
Sem qualquer modificação, o material apresentou uma resistência de de 8,87 Ω sq-1e uma transmitância óptica de 86,05%.
Foto de um dos protótipos e o material depositado sobre a malha de nylon (alto à direita). [Imagem: YU Shuhong]
Luz, calor e poeira
A tela é feita de fios de nylon revestidos com nanopartículas de prata e uma tinta termocrômica, capaz de reter não apenas a luz visível, mas também parte da radiação infravermelha (calor).
Os protótipos apresentaram excelente estabilidade mecânica, com o desempenho permanecendo estável mesmo após 10.000 ciclos de flexão com um raio de curvatura mínimo de 2,0 mm e 1.000 ciclos de deformação de estiramento com tensão mecânica de 10%.
A eficiência na remoção do material particulado 2,5 apresentou 99,65% de eficiência, mantendo a estabilidade após 100 ciclos de filtração e lavagem, para limpeza das partículas de poeira coletadas.
Bibliografia:
Mass Production of Nanowire-Nylon Flexible Transparent Smart Windows for PM2.5 Capture Wei-Ran Huang, Zhen He, Jin-Long Wang, Jian-Wei Liu, Shu-Hong Yu iScience
Indivíduos, empresas e cidades em 188 países e territórios em todo o
mundo aderiram à Hora do Planeta para falar sobre a natureza e inspirar
ações urgentes para o meio ambiente. Enquanto a Hora do Planeta passava
ao redor do globo, milhares de monumentos ou pontos importantes apagavam
suas luzes em solidariedade ao planeta.
Por meio do apelo global do maior movimento popular pelo meio ambiente,
as hashtags #EarthHour e #Connect2Planet se tornaram trend topics em 26
países, com pessoas em todo o mundo gerando mais de 2 bilhões de
impressões para mostrar sua preocupação com a natureza. No Brasil, as
hashtags #HoradoPlaneta e #ConectadoNoPlaneta tiveram mais de 800
impressões.
“A participação em massa na Hora do Planeta mostrou que as pessoas
demandam globalmente ações urgentes pela natureza”, disse Marco
Lambertini, diretor-geral do WWF International.
Do Equador ao Marrocos e à Indonésia, a Hora do Planeta 2019 mobilizou
pessoas em todos os continentes para falar sobre questões como estilos
de vida sustentáveis, oceanos livres de plástico, desmatamento e
conservação da água. Luzes em milhares de monumentos, incluindo a Sydney
Opera House (Sydney), Tokyo Skytree (Tóquio), Brandenburg Gate
(Berlim), Empire State Building (Nova York), as Pirâmides do Egito
(Cairo), Rashtrapati Bhavan (Nova Delhi), a estátua do Cristo Redentor
(Rio de Janeiro) e a Torre Eiffel (Paris).
Os impactos da aceleração da perda da natureza e das mudanças climáticas
no planeta são sérios, assim como as consequências para a humanidade.
Foram várias as personalidades políticas que se pronunciaram a respeito
da Hora do Planeta e da importância de proteger a natureza. Entre eles
estão: o Secretário-Geral da ONU, António Guterres; Kristalina
Georgieva, presidente interina do Banco Mundial; Greta Thunberg, a
ativista climática de 16 anos; os cosmonautas da Estação Espacial
Internacional; o Primeiro Ministro da Espanha, Pedro Sánchez, além de
celebridades como Bear Grylls, Mark Ruffalo, Amitabh Bachchan, Claudia
Bahamon, Hebe Tien e Yoko Ono.
A Hora do Planeta no Brasil
O Brasil começou a sediar a Hora do Planeta em 2009 e desde então tem
feito isto todos os anos, envolvendo poder público e diferentes setores
da sociedade. Em 2019, décima primeira edição do evento no país, foram
feitas mais de 1300 inscrições no site oficial da campanha, sendo 147
prefeituras, incluindo todas as capitais; 160 empresas; 71 instituições
de ensino, 55 de terceiro setor, 285 inscrições individuais, 20 grupos e
668 grupos de escoteiros. A parceria dos Escoteiros do Brasil envolveu,
de acordo com a própria organização, mais de 20 mil crianças e jovens,
que promoveram alguma ação para a Hora do Planeta. Entre os monumentos
apagados, se destacam o Arco do Anhangabaú (São Paulo), Cristo Redentor e
Bondinho (Rio de Janeiro), Congresso Nacional (Brasília), além de
diversos outros pontos públicos ou privados.
De acordo com o diretor executivo do WWF-Brasil, Mauricio Voivodic, o
grande número de adesões à Hora do Planeta ressalta a importância que a
sociedade brasileira dá ao cuidado com a natureza, o que deve fortalecer
mais ações ao longo do ano.
“A Hora do Planeta não terminou às 21h30 de sábado. A partir de agora, é
importante transformar o apoio em prática: mudar nossos hábitos para
diminuir os impactos das nossas ações na natureza”, diz Voivodic. “No
dia 5 acontecerá o lançamento do 'Nosso Planeta', nova série da Netflix
coproduzida pela Silverback Films em colaboração com o WWF, uma produção
fantástica que mostra a riqueza da nossa biodiversidade em todo mundo.
Quem puder, assista à série e veja a importância de combatermos as
mudanças climáticas e a perda de biodiversidade. Se não agirmos agora, a
vida de todo planeta continuará em risco”.
A campanha de 2019 contou com o apoio de jovens da organização
Engajamundo e de voluntários, que apoiaram no contato com as prefeituras
e no registro das ações no sábado. Celebridades e influenciadores
brasileiros também participaram. Além dos cantores Lenine, Ana Rafaela e
Gabriel Sater (embaixadores da campanha), a atriz Leandra Leal, a
apresentadora Mary Moon, o professor Jubilut e a Turma da Mônica
postaram a campanha amplamente em suas redes sociais. Até o momento, já
foram quase 500 citações na imprensa.
Outra novidade neste ano foi a realização de cinco eventos pela equipe
do WWF-Brasil. Em Brasília, a Hora do Planeta abriu as portas do
escritório panda e trouxe mais de mil pessoas para as diferentes
atividades, que movimentaram a Asa Sul das 12h às 21h30; em Campo
Grande, a pedalada por monumentos históricos reuniu 230 ciclistas; em
Rio Branco, foram cerca de 300 pessoas no evento do Palácio Rio Branco;
Noronha teve um grupo de 30 crianças envolvidas na atividade de
conscientização sobre plástico nas praias e um número semelhante na
observação de estrelas à noite. Por fim, São Paulo contou cerca de 100
pessoas presentes no show de luzes na casa Bandeirista (casa histórica,
possível de ver de carro na movimentada Av. Faria Lima) e centenas na
apresentação da cantora Ana Rafaela (embaixadora da Hora do Planeta) e
abertura da banda O Porto no McDonalds da Henrique Schaumann.
Próximos eventos - Nosso Planeta (série da Netflix): Seguindo os passos
da Hora do Planeta, chega a ansiosamente aguardada série Nosso Planeta
Netflix, que será lançada em 5 de abril. Os espectadores assistirão a
imagens impressionantes e inéditas da vida selvagem e de seus habitats -
ao mesmo tempo em que descobrem por que o mundo natural é importante
para todos nós e que medidas devem ser tomadas para preservá-lo.
Produzido em parceria com a WWF, a série histórica é narrada pelo
renomado radialista e historiador natural Sir David Attenborough.
- Desafio das Cidades: Para as cidades, já estão
abertas as inscrições para o Desafio das Cidades 2019/2020. A
iniciativa, é um projeto internacional capitaneado pelo WWF com apoio do
ICLEI e busca incentivar e reconhecer esforços de governos locais rumo a
um futuro mais verde e justo. Para esta edição, os temas são eficiência
energética em prédios públicos e esforços da cidade para limitar o
aquecimento global a 1,5 ºC em média do Período Pré-Industrial.
- Hora do Planeta 2020: Para quem já está com saudades,
a próxima edição da Hora do Planeta será realizada no sábado dia 28 de
março de 2020, às 20h30.
Análise mostra que há uma tendência de perda de corpos hídricos. Em média, foram perdidos 350km2 de
área coberta por ambientes aquáticos por ano. Alteração nos
ecossistemas aquáticos é influenciada por intervenções humanas como
desmatamento, obras de infraestrutura e mudanças climáticas
Por Denise Oliveira
Imagens do satélite Landsat coletadas durante 33 anos (1985 a
2017), novas tecnologias de processamento de dados em nuvens de
computadores e uma análise dedicada de pesquisadores tornaram possível
um novo olhar sobre a Amazônia, agora na perspectiva das transformações
que vem ocorrendo nos corpos hídricos da região.
Assim como o Prodes nos mostra anualmente como está a supressão da
vegetação natural dos ecossistemas terrestres, o novo estudo teve como
objetivo avaliar as dinâmicas de transformação na superfície de água na
Amazônia. Esse pode ser o pontapé inicial para um acompanhamento anual e
regular sobre o estado dos corpos hídricos – rios, lagos, áreas úmidas
inundáveis etc.
Mas os resultados obtidos não são positivos: A análise realizada
pelo WWF-Brasil e Imazon, no âmbito do Projeto MapBiomas, e com apoio do
Google Earth Engine, mostra que há uma tendência de redução da
superfície hídrica na Amazônia brasileira. Em média foram perdidos 350
km2 de área coberta por ambientes aquáticos por ano.
O resultado da análise foi publicado na terça-feira (19/3) em
edição especial da revista científica Water (MDPI) sobre a situação dos
recursos hídricos nas Américas, trazendo dados inéditos para o bioma.
Esta foi a primeira vez que um estudo dessa magnitude foi realizado na
escala do bioma Amazônia.
Vetores e impactos
Bernardo Caldas, analista do Programa de Ciências do WWF-Brasil e um dos
autores do estudo, explica que existe uma correlação entre a perda de
superfície de água na região Amazônica e a construção de hidrelétricas e
desmatamento.
As intervenções humanas como a construção de pequenas centrais
hidrelétricas (PCHs), açudes, barramentos de rios por grandes ou
pequenas obras, a formação de lagos para piscicultura somadas, assim
como as grandes obras de infraestrutura, afetam a dinâmica natural e
geram alterações nos corpos hídricos e fluxos de água que impactam todo o
sistema. A faixa onde estão mais evidenciadas essas múltiplas
intervenções humanas coincidem com o chamado arco do desmatamento, na
porção sul da Amazônia.
O barramento de rios (interrupção de seu curso natural) afeta o pulso de
inundação. Os efeitos cumulativos de muitos barramentos podem levar o
curso d’ água a entrar em colapso e, assim, subsequentemente, interferir
na dinâmica e serviços ecológicos da bacia hidrográfica como um todo.
As áreas mais afetadas com essa perda de superfície são as áreas de
inundação (várzeas) e lagoas que se formam com o pulso de cheias e
vazantes dos rios. A bacia Amazônica forma uma rede de ecossistemas
aquáticos, diferenciados e interligados. Esses ecossistemas são
fundamentais para a biodiversidade, a reprodução de peixes e outras
espécies aquáticas.
“A perda desses habitats dinâmicos, que são influenciados pelo
bombeamento natural e pelos fluxos de água, coloca em risco espécies
como os botos, peixes, incluindo os ornamentais, os quelônios, entre
muitas outras espécies que dependem desses locais para se reproduzirem.
Ou seja, estamos perdendo os berçários da vida na Amazônia.
Consequentemente, as comunidades que dependem dessa biodiversidade
também serão afetadas”, explica Bernardo Caldas.
Bernardo Caldas, do WWF-Brasil, lembra que a água não respeita barreiras
político-administrativas estaduais ou mesmo federais. A unidade é a
bacia hidrográfica, o sistema de rios e os fluxos naturais de água.
“É necessário um macroplanejamento ambiental estratégico que considere
não só as grandes infraestruturas, mas também o impacto de um conjunto
de milhares de pequenas obras que cumulativamente pode afetar os
serviços ambientais prestados por determinada bacia hidrográfica. Entre
esses serviços estão o abastecimento de água para a população local, a
dessedentação de animais, a produção agropecuária, a segurança alimentar
de comunidades, o turismo e a própria necessidade dos ecossistemas de
terem espaço e tempo para sua auto-manutenção”, completa.
Desafios
Os principais desafios para a realização do estudo foram a escala e
complexidade da região e o extenso período histórico analisado. Carlos
Souza, pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia
(Imazon), explica que esse estudo só foi possível por conta dos recentes
avanços técnicos para o processamento de grandes volumes de dados que
estão disponíveis atualmente. “Utilizamos o Google Earth Engine e seus
servidores de computadores espalhados pelo mundo para processar um
volume impressionante de imagens de satélites. O que seria uma tarefa
quase impossível há alguns anos atrás”, comenta.
Próximos passos
Este estudo faz parte de uma série de trabalhos que vem sendo conduzidos
pelo WWF-Brasil e que incluem uma análise sobre a fragmentação dos rios
da Amazônicos e os impactos decorrentes. Realizada em conjunto com
diversos parceiros na região, essa análise visa integrar aspectos
hidrológicos e de biodiversidade em uma visão transfronteiriça.
O conjunto de estudos possibilitará o desenvolvimento de estratégias
públicas e privadas que garantam o desenvolvimento sustentável da
região.
Uma Amazônia ecologicamente saudável, que possa continuar fornecendo
produtos e serviços dos ecossistemas terrestres e aquáticos para todos,
localmente e globalmente, é imprescindível. Os estudos desenvolvidos
pelo WWF-Brasil e parceiros contribuem para a compreensão e conservação
desse complexo sistema natural.
Seu corpo é sua internet - E ela pode ser hackeada
Redação do Site Inovação Tecnológica - 26/03/2019
Um dispositivo mantém os sinais de comunicação dentro do corpo, para que ninguém possa invadir equipamentos médicos, como os marcapassos. [Imagem: Debayan Das et al. - 10.1038/s41598-018-38303-x]
Internet do corpo
Desde que aparelhos médicos - como marcapassos, desfibriladores, bombas de insulina etc. - começaram a incorporar a tecnologia de transmissão de dados sem fios, especialistas em segurança da informação vêm alertando sobre o risco de interceptação desses dados e, eventualmente, do controle dos aparelhos por pessoas mal-intencionadas.
Ainda não há registro de que isso tenha acontecido na vida real - nos laboratórios há várias demonstrações.
Antes do primeiro crime, contudo, pesquisadores da Universidade Purdue, nos EUA, reforçaram a segurança dessa nascente "internet do corpo".
Os fluidos corporais transportam sinais elétricos muito bem. Até agora, as chamadas "redes de área corporal" têm usado a tecnologia Bluetooth para enviar sinais ao redor do corpo. Essas ondas eletromagnéticas podem ser captadas a até 10 metros de uma pessoa.
A nova tecnologia consiste em manter os sinais de comunicação dentro do próprio corpo.
A tecnologia consiste em não deixar que os sinais viajem muito além da superfície da pele. [Imagem: Purdue University image/Erin Easterling]
Rede corporal
Debayan Das e colegas desenvolveram uma maneira de manter a comunicação a no máximo um centímetro da pele, e usando 100 vezes menos energia do que a comunicação Bluetooth tradicional.
Isto foi possível por meio de um dispositivo que conecta sinais na faixa eletro-quasistática, que é muito mais baixa no espectro eletromagnético.
A demonstração, feita com um protótipo de relógio, envolveu a recepção de sinais de qualquer parte do corpo, desde as orelhas até os dedos dos pés. A espessura da pele ou do cabelo também não fazem diferença na qualidade do sinal.
"Nós mostramos pela primeira vez um entendimento físico das propriedades de segurança da comunicação do corpo humano para permitir uma rede corporal secreta, para que ninguém possa bisbilhotar informações importantes," disse o professor Shreyas Sen.
O grupo já está trabalhando com financiamento do governo e parceria com a indústria para incorporar essa tecnologia em um circuito integrado ultraminiaturizado.
Bibliografia: Enabling Covert Body Area Network using Electro-Quasistatic Human Body Communication Debayan Das, Shovan Maity, Baibhab Chatterjee, Shreyas Sen Nature Scientific Reports DOI: 10.1038/s41598-018-38303-x