Por Ciro Barros e Iuri Barcelos
- quarta-feira, 04 maio 2016 19:42
No ato de assinatura do Acordo de Paris, em 22 de abril, na sede da
ONU em Nova York, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o desmatamento
na Amazonia será erradicado até 2030.
Mas dados recentes do INPE
(Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) indicam que o desmatamento
zero é um grande desafio. Embora tenha recuado acentuadamente ao longo
da década passada, o desmatamento na região parou de cair de maneira significativa e manteve-se numa faixa de 5.8 mil a 7 mil km2 entre 2009 e
2015 — apenas no ano passado a Amazônia perdeu uma área equivalente a
583 mil campos de futebol em cobertura vegetal.
E uma das razões para o freio no ritmo de queda é o desmatamento
dentro de assentamentos de reforma agrária. Não por outra razão,
o Ministério Público Federal (MPF) elegeu, em julho de 2012, o maior
desmatador da Amazônia: Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (Incra). Quatro anos depois, no início deste abril de 2016, o
Tribunal de Contas da União (TCU) pediu a paralisação da reforma agrária
no país, por irregularidades em quase 500 mil benefícios concedidos
pelo órgão ligado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário.
Para
entender melhor como é o trabalho do Incra na Amazônia Legal e
investigar quais são os maiores desafios e limites da atuação do órgão, a
Pública consultou diversos documentos produzidos por órgãos de
controle e organizações da sociedade civil e entrevistou procuradores,
funcionários do Incra, assentados e representantes de movimentos sociais
da região.
A reportagem compilou e cruzou bancos de dados. E a
conclusão da investigação jornalística é que falhas e irregularidades do
Incra acabam por alimentar conflitos violentos e impactam diretamente o
desmatamento da região.
Um dos fatos identificados pela apuração é uma concentração de
homologações irregulares de beneficiários de reforma agrária na Amazônia
Legal. A
Pública teve acesso a dados desagregados da última
fiscalização feita pela Controladoria-Geral da União (CGU) no Sistema de
Informações de Projetos de Reforma Agrária (Sipra) e detectou que os
estados amazônicos são campeões de homologações indevidas: das dez
superintendências do Incra que mais concentram irregularidades na
história, apenas uma não está na região amazônica.
Com essa prática, o
Incra vem regularmente cedendo lotes de reforma agrária a um público sem
perfil para recebê-los (como funcionários públicos, políticos,
empresários, pessoas de renda elevada etc.), e isso é mais frequente na
Amazônia Legal.
Atuação do Incra pode estar ligada a acirramento de conflitos e desmatamento na Amazônia Legal.Foto: Ascom/Terra de Direitos
Os dados do próprio Incra mostram também um processo acentuado de
criação de assentamentos nos anos 2005 e 2006. O Incra nunca criou
assentamentos para tantas famílias na região amazônica em toda a sua
história como nesse período.
Segundo fontes ouvidas pela
Pública,
esse fato pode estar ligado ao cumprimento das metas do segundo Plano
Nacional de Reforma Agrária (PNRA), que vigorou entre 2003 e 2007. As
homologações irregulares na Amazônia também se concentram no biênio
2005-2006, e os dados analisados na reportagem mostram as consequências
dessa alta de criação de assentamentos sem rigor técnico.
A pressão para o atingimento de metas e as irregularidades detectadas
pelos órgãos de controle podem estar na origem da alta da participação
dos assentamentos no total de desmatamento na Amazônia.
O desmatamento
caiu 77% na região entre 2004 e 2011. Entretanto, dentro dos
assentamentos de reforma agrária, os índices não acompanharam a queda
com a mesma intensidade. Isso fez com que sua participação no
desmatamento total na Amazônia Legal crescesse a partir da última
década.
A Superintendência do Incra em Santarém é um exemplo desse caos
fundiário gerado pelas homologações indevidas realizadas em
assentamentos criados sem rigor técnico.
“Encontrei um quadro catastrófico”, diz ex-superintendente do Incra em Santarém
O ex-superintendente, Claudinei Chalito, deparou-se com conflitos e irregularidades durante sua gestão. Foto: Ascom/Incra
Com uma década de experiência no Incra como servidor de carreira, o
engenheiro agrônomo Claudinei Chalito da Silva topou abrir mão de um
cargo de diretoria no Incra do Paraná para assumir, em setembro do ano
passado, uma das superintendências mais problemáticas de todo o Brasil: a
SR-30, sediada em Santarém, no Pará.
Chalito vibrou com a ideia de pela primeira vez comandar um núcleo
regional do Incra, mas sabia que era um desafio. Seu antecessor no
cargo, Luiz Bacelar Guerreiro, que geriu a Superintendência entre
novembro de 2012 e agosto de 2015, havia saído do cargo preso na
Operação Madeira Limpa, da Polícia Federal.
Segundo o MPF, Bacelar
permitia que empresários explorassem ilegalmente os assentamentos de
reforma agrária e unidades de conservação na região. O prejuízo aos
cofres públicos chega, no mínimo, a R$ 31,5 milhões, segundo a PF.
O legado da gestão Bacelar, porém, era só uma parte dos problemas que
Chalito tinha pela frente. “Encontrei um quadro catastrófico. Se for
colocar uma escala de gravidade, eu diria que de 0 a 100, chegou bem
perto de 100”, resume.
Deflagrada
em 2015 pela PF, Operação Madeira Limpa em Santarém desmantelou um
esquema de exploração ilegal de assentamentos. Foto: Reprodução/Youtube
“Encontrei muitos conflitos internos entre servidores, um clima bem
tenso. Havia uma enorme quantidade de processos de criação de
assentamentos feitos de forma irregular que estavam, inclusive, na mesa
do superintendente só esperando fazer o despacho. Tive de barrar vários
processos por vícios em outras etapas. Havia mais de 12 mil
beneficiários bloqueados após uma fiscalização feita pela CGU no ano
passado.
Mais de 15 convênios estavam paralisados por falta de parecer
técnico, prestação de contas. Havia irregularidades em praticamente
todos os assentamentos, eram bem poucos os que não tinham problemas
graves de reconcentração de terra, com ‘fazendeiros’ dentro deles, o que
gerava muito conflito e extração ilegal de madeira.
Muitos casos de
sobreposição de assentamentos com terras indígenas, unidades de
conservação ou até outros assentamentos por falta de rigor técnico no
processo de criação. Havia mais de 9 mil famílias que moravam em área de
várzea, literalmente dentro dos rios, onde o Incra não conseguiu levar
créditos de apoio e fomento”, relata o ex-superintendente.
Chalito parece se cansar. Ele retoma o fôlego antes de concluir.
“Você precisaria multiplicar aquela superintendência por mais de dez
para resolver os problemas de lá. Tem muitos conflitos em que há risco
de morte ali dentro, casos em que a floresta amazônica está se
transformando em cinzas porque os madeireiros estão tomando conta. É uma
região que não vai se estabilizar em cinco nem em dez anos”, conta.
A fábrica de “assentamentos de papel”
Em dezembro de 2007, quatro procuradores da República propuseram uma
ação civil pública contra a Superintendência do Incra em Santarém, a
mesma que seria comandada por Chalito anos mais tarde. Na ação, os
procuradores constataram que dois terços dos assentamentos da
superintendência (144 de um total de 218) haviam sido criados somente
nos anos de 2005 e 2006. Esses assentamentos abrigavam 70% das famílias
beneficiárias da reforma agrária na região, mais ou menos 51 mil. À
época, esse número era equivalente à população da cidade de Santarém
distribuída em uma área do tamanho do estado da Paraíba.
O conluio com os madeireiros, escancarado anos mais tarde na gestão
Bacelar, já era apontado pelo MPF. Segundo a ação, a superintendência
criou nesse período vários projetos de assentamento diferenciados, como
PAEs e PDSs (Projetos de Assentamento Agroextrativistas e Projetos de
Desenvolvimento Sustentável), em que é permitida a extração de madeira
por práticas de manejo sustentável. Muitos desses assentamentos foram
criados pela superintendência em área de floresta primária para um
público sem perfil de reforma agrária. Das cerca de 14 mil pessoas
assentadas nos PDSs, apenas 5 mil teriam de fato o perfil para serem
beneficiárias desse tipo de projeto. Entre as demais haveria pessoas
ligadas às empresas madeireiras. “Os documentos apontam a ingerência do
setor madeireiro no processo de criação de Projetos de Desenvolvimento
Sustentável. Dos autos emerge a interferência direta do setor privado na
destinação de terras públicas federais da ordem de 2.232.837 hectares,
uma área equivalente ao estado de Sergipe”, relata a ação.
Para o MPF, o processo de criação massiva de assentamentos nesses
dois anos também passou por cima de vários procedimentos técnicos
necessários. “Todos os assentamentos na gestão do atual superintendente
foram criados sem a emissão de licença prévia”, afirma, em letras
maiúsculas, a ação do MPF. E 72% dos assentamentos também foram criados
sem os laudos agronômicos, documentos que asseguram a adequação da área a
um projeto de assentamento.
Trecho da ação judicial movida pelo MPF contra o Incra em 2007. Foto: MPF
Os funcionários do Incra ouvidos na ação reconhecem as
irregularidades em depoimentos. “A depoente dizia ao superintendente que
faltavam peças técnicas, mas, como o agrônomo não as entregava, o
superintendente dava ordem de publicar as portarias de criação”, diz a
servidora Érica Luana Braga. “A procuradoria do INCRA foi omissa a todo
momento […]”, relata, em depoimento ao MPF, o servidor Juliano Gallo,
que apontou a criação de um PAC — o PAC Nova União – como exemplo de
assentamento “criado sem nenhum parecer”. Outro documento, um memorando
interno do Incra, afirma que a “criação acelerada de assentamentos no
final de 2006, para cumprir as metas estabelecidas para a
Superintendência em Santarém, fizeram com que estes assentamentos fossem
criados sem que houvesse a devida atenção às áreas anteriormente
destinadas à conservação”.
Fontes de vários setores (movimentos sociais, MPF, servidores do Incra) ouvidas pela Pública
afirmam que esse processo de criação desenfreada de assentamentos
também pode estar relacionado ao cumprimento das metas da segunda
Política Nacional de Reforma Agrária (PNRA), que vigorou entre 2003 e
2007. “É uma discussão que depois de dez anos a gente entende que tem
três lógicas… Tinha uma lógica que era defendida pela gestão do Incra na
época, que era a de ganhar as terras públicas não destinadas para a
reforma agrária, mas tinha outra lógica que era a de atender
financiamento de campanha, de dinheiro de madeireira. Teve áreas de
reserva de madeira nobre em que os madeireiros chegaram a indicar onde
seria feito o assentamento”, analisa um servidor do Incra ouvido sob
anonimato que em 2006 já trabalhava no órgão. “Outra lógica também era
fazer números com os movimentos sociais e com a PNRA.”
Há casos de várias criações de assentamento pela superintendência de
Santarém no mesmo dia. Só em 27 de dezembro de 2006, foram criados 20
assentamentos, com uma área equivalente a 528.000 campos de futebol. Só
nesse dia, o número de famílias cadastradas é o mesmo que a região Sul
inteira assentou em todo o ano.
A ação do MPF foi acolhida pelo juízo federal em Santarém, ainda em
2007. Quatro anos depois, 106 assentamentos criados no período tiveram
suas portarias canceladas ou ficaram interditados judicialmente,
restringindo a ação do Incra nesses assentamentos.
“Foram criados muitos assentamentos na região nessa época sem
licenciamento ambiental e sem o rigor técnico adequado. Mas, quando
houve a interdição, os problemas naqueles assentamentos foram crescendo.
Os madeireiros foram tomando conta das áreas e o desmatamento e os
conflitos se avolumaram demais”, relembra o ex-superintendente Chalito.
“O desmatamento ali era descomunal, com queimadas enormes. No mês de
novembro, depois que eu fui para lá, a gente sentia o cheiro da fumaça
de dentro do Incra. De noite e de madrugada era sufocante aquilo. Houve
muita ameaça desses grandes posseiros ligados aos madeireiros, expulsão
de beneficiários legítimos. Fora a pobreza com que essas famílias das
áreas interditadas tiveram que conviver sem o apoio do Incra. Algumas
até abandonaram os lotes. E a gente estava de mãos atadas.”
Dez anos depois, nenhum assentamento criado entre 2005 e 2006 chegou à
fase final de desenvolvimento, segundo os critérios do Incra. E eles
são líderes de desmatamento na Amazônia Legal.
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Amazônia Legal, campeã de homologações indevidas
O processo de criação de assentamentos da superintendência que
Chalito assumiu é semelhante ao de outras regiões. Assim como em
Santarém, as outras 11 superintendências do Incra na Amazônia Legal
tiveram uma grande alta na criação de assentamentos de reforma agrária
em 2005 e 2006. As retificações das portarias de criação de
assentamentos também começaram a aparecer com frequência muito maior do
que nos anos anteriores, ampliando ainda mais a capacidade dos
assentamentos.
A alta nas criações foi acompanhada por um crescimento no número de beneficiários cadastrados de maneira irregular. A
Pública
teve acesso aos dados da última fiscalização feita pela CGU no Sistema
de Informações de Projetos de Reforma Agrária (Sipra). Os estados da
Amazônia Legal são campeões de homologações indevidas: das dez
superintendências do Incra que mais concentram irregularidades na
história, apenas uma não está na região. Os anos com maior número de
cadastros indevidos na relação de beneficiários são justamente 2005 e
2006.
Um acórdão divulgado em abril pelo TCU confirma que as
superintendências do Incra na Amazônia Legal concentram o maior número
de irregularidades. O órgão fez basicamente a mesma fiscalização feita
pela CGU no fim do ano passado e determinou a paralisação do Programa
Nacional de Reforma Agrária por ter identificado mais de 500 mil
beneficiários irregulares.
Desmatamento na Amazônia mudou de perfil
O ritmo do desmatamento na Amazônia Legal apresentou forte
desaceleração a partir de 2004, com o início do Plano de Prevenção e
Combate ao Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm).
O PPCDAm, uma
iniciativa conjunta de 15 ministérios, nove governos estaduais e 13
ONGs, centralizou seus esforços em atividades de monitoramento e
controle ambiental. Nos primeiros anos do plano, o resultado foi um
sucesso.
O desmatamento caiu 77% na Amazônia Legal entre 2004 e 2011.
Entretanto, dentro dos assentamentos de reforma agrária os índices não
acompanharam a queda com a mesma intensidade. Isso fez com que sua
participação no desmatamento total na Amazônia Legal crescesse a partir
da última década.
Uma avaliação da segunda fase do plano feita pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontou o ordenamento
fundiário como o principal gargalo a ser enfrentado no combate ao
desmatamento na Amazônia Legal.
Desmatamento
em assentamentos cai em ritmo menor que fora de assentamentos.
Ao longo
do últimos anos aumentou a participação dos assentamentos no total de
área desmatada. Fonte: IMAZON
Esses assentamentos, que eram responsáveis por 18% do desmatamento da
Amazônia em 2003, passaram a responder por 30% do total em 2014. Entre
2005 e 2011, houve uma alta de 13% na contribuição dos assentamentos
para o desmatamento na região. Os dados são do estudo “Desmatamento nos
assentamentos da Amazônia: histórico, tendências e oportunidades”,
desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Ambiental na Amazônia (Ipam) e
lançado em fevereiro.
O estudo também alerta para um desmatamento incomum dentro das áreas
dos assentamentos. Segundo o instituto, o desmatamento compatível com as
atividades dos beneficiários da reforma agrária seria de até 10
hectares por ano.
Apesar desse parâmetro, “quase 72% da área desmatada
dentro dos assentamentos está ocorrendo em polígonos maiores que 10 ha
(21% em polígonos maiores que 50 ha). O fato de a maioria da derrubada
de florestas dentro dos assentamentos ser feita em grandes blocos
(polígonos) surge como um forte indicador do processo de reconcentração
de lotes dentro dos assentamentos”, afirma o relatório.
Um dos fatores da maior participação dos assentamentos no
desmatamento da Amazônia pode estar relacionado à falta de rigor técnico
na atuação do Incra na região em 2005 e 2006. Na década de 1990 até
2004, o órgão homologava irregularmente 1.500 beneficiários em média.
Nos dois anos seguintes, esse número subiu para 7 mil.
1,500 famílias
Média anual de homologações indevidas -> 1990-2004
7,000 famílias
Média anual de homologações indevidas -> 2005-2006
Os assentamentos campeões de desmatamento em oito dos dez anos entre
2001 e 2010 apareciam também nas primeiras posições do ranking de
assentamentos com mais beneficiários irregulares.
Ao longo do tempo, esses projetos com grande quantidade de
irregularidades nos cadastros também registram um desmatamento mais
intenso. Comparando projetos de tamanho semelhantes, o grupo de
assentamentos com irregularidades apresentou taxas de desmatamento médio
sempre maiores que nos assentamentos em geral.
Os prejuízos das irregularidades nas ações do Incra vão além do
desmatamento. A exploração de madeira ilegal nos assentamentos da
Amazônia Legal também se concentra nos projetos criados entre 2005 e
2006.
Um novo diagnóstico surge com crescente importância dos assentamentos
de reforma agrária no desmatamento da Amazônia: o perfil do
desmatamento mudou. Agora ele acontece em pequenos focos, distribuídos
em áreas menores – com capacidade para escapar dos sensores instalados
durante as primeiras fases do PPCDAm.
A partir de 2012, durante a terceira e última fase do plano, uma das
principais funções do Incra seria reverter esse cenário. Para tanto, o
órgão anunciou o Programa Assentamentos Verdes (PAV).
O programa apoia
práticas sustentáveis e continua com as ações de regularização,
monitoramento e controle ambiental em aproximadamente 2.500
assentamentos. Em outra frente de trabalho, o Sistema de Informações de
Projetos de Reforma Agrária (Sipra) foi implementado para melhorar o
processo de inclusão de beneficiários.
Antes do Sipra, o procedimento
era feito com menos controle. Hoje, é necessário incluir uma série de
documentos no sistema, que é informatizado e unificado. No entanto,
segundo o TCU, as irregularidades no cadastro de beneficiários ainda
atingem aproximadamente 30% da base total.
Vítima da governabilidade
No último dia 29 de março, Chalito foi exonerado do comando da
Superintendência Regional do Incra em Santarém. Segundo ele, sua saída
estaria ligada ao recente desembarque do PMDB da base aliada do governo
federal. “Minha saída veio no âmbito da crise institucional que nós
vivemos.
A gente tem informações de que o novo superintendente tem
ligações com um deputado federal do município lá de Santarém, que é o
deputado Francisco Chapadinha [PTN-PA]. Nesse arranjo de forças dos
partidos saindo da base aliada e outros entrando, o meu cargo foi
repassado nesse esforço de recompor o governo”, afirma.
Para atrair o PTN (Partido Trabalhista Nacional) e tentar recompor
sua base às vésperas da votação do impeachment na Câmara dos Deputados, o
governo ofereceu o cargo a Adaías Gonçalves, ligado ao deputado federal
Francisco Chapadinha (PTN-PA), o único deputado federal eleito por
Santarém. A informação coincide com
uma nota do jornal O Globo.
Após a divulgação do acordo pela imprensa, Chapadinha negou que
estivesse negociando seu voto. “Fui acusado de que votaria a favor da
presidente em troca de cargos no governo federal, o que não é verdade.
Todos os cargos que indiquei foram feitos desde o início do mandato e
somente agora as indicações começaram a sair.
Em nenhum momento me foi
condicionado o apoio à presidente em troca de cargos”, afirmou o
deputado em nota à imprensa paraense. Coincidência ou não, dois dias
após o voto favorável de Chapadinha à admissibilidade do processo de
impeachment pela Câmara, o governo exonerou Adaías Gonçalves. À frente
da SR-30 está agora a servidora de carreira Elita Beltrão.
Em entrevista à
Pública, a atual superintendente do
Incra em Santarém afirma que o Incra trabalha para sanar os erros
apontados pela reportagem. Com relação à ação civil pública dos
“assentamentos de papel”, movida pelo MPF em 2007, ela afirma que a
superintendência já constituiu um Grupo de Trabalho para regularizar os
assentamentos denunciados. “Esse GT já revisou 12 processos de
assentamentos citados na ação.
Em sete desses 12 processos, os
assentamentos já foram até desinterditados judicialmente. A ideia agora é
continuar a revisão”, diz. Ela também realça que o órgão trabalha no
combate ao desmatamento em assentamentos casando seu planejamento com o
Programa Assentamentos Verdes. “Todo o nosso planejamento é para atuar
nesses assentamentos em que houve denúncias de desmatamento, em que já
houve supervisão ocupacional que identificou ocupantes irregulares que
também promovem desmatamento”, garante.
Elita Beltrão também informa que o Incra trabalha para penalizar os
envolvidos na antiga gestão Bacelar, acusada de corrupção pela Operação
Madeira Limpa, da Polícia Federal. “Instalamos uma comissão para apurar o
envolvimento tanto do Bacelar, quanto de outros servidores nessas ações
de desmatamento, compra e venda de lotes e outras irregularidades. Há
também uma ação penal aberta nesse sentido.
Nós pautamos para este ano a
supervisão ocupacional de todos os assentamentos que foram alvo de
ações dessas pessoas que estão envolvidas na Operação Madeira Limpa.
Estamos também reestruturando todas as diretorias da Superintendência”,
ressalta. Segundo Elita, todos os procedimentos técnicos para a
homologação de assentados e para a concessão de planos de manejo
sustentável passarão diretamente pelo gabinete dela para haver mais
controle dos procedimentos.
A superintendente afirma, porém, que a SR-30 sofre com a falta de
recursos. “A circunscrição da superintendência abrange 19 municípios.
São mais de 50 mil famílias. Nós temos uma quantidade de servidores bem
aquém a essa demanda. Desde 2012, nós estamos sofrendo com um
contingenciamento muito grande de recursos. Boa parte das ações
previstas não são realizadas por esses dois fatores”, protesta.
Exoneração “política” de Chalito motivou protestos
Na manhã do dia 4 de abril, representantes de sindicatos, associações
de moradores dos assentamentos de Santarém e movimentos sociais
ocuparam a sede da SR-30 em protesto contra a exoneração de Claudinei
Chalito.
“A exoneração do Claudinei Chalito foi completamente sem
critério. Nós tememos muito os acordos que estão por trás desta
indicação política, que podem ter interesses de madeireiros,
latifundiários, grileiros e mineradoras”, afirmou no dia Lígia
Fernandes, representante de uma das associações de assentados. No dia 30
de março, quando foi publicada a exoneração de Chalito no
Diário Oficial da União, mais de 60 organizações da região divulgaram uma nota de apoio à gestão dele.
Movimentos ocupam a sede da SR-30 em protesto contra a exoneração de Chalito. Foto: Ascom/Terra de Direitos
“Fico feliz de ter deixado um GT de regularização fundiária junto com
o MPF para rever a situação daqueles assentamentos que foram alvo da
ação dos ‘assentamentos de papel’ e também que conseguimos formalizar a
Ouvidoria Agrária Regional, que vai conseguir mapear melhor a questão da
violência da região. Mas infelizmente fomos surpreendidos por essa
exoneração”, afirma Claudinei Chalito, que retomará suas funções no
Incra do Paraná.
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