Por Claudio Angelo
- quinta-feira, 27 agosto 2015 19:46
Área de desmate recente na Amazônia. Foto: Araquém Alcântara/Imazon
O número de alertas de desmatamento na Amazônia cresceu 63% em 2014 em comparação com o ano anterior. O dado foi divulgado nesta quinta-feira pelo Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia).
Segundo o SAD, o sistema do Imazon que estima em tempo real a
velocidade da devastação, entre agosto de 2014 e julho de 2015 a maior
floresta tropical do mundo perdeu 3.322 quilômetros quadrados. Isso
equivalente a pouco mais de duas vezes a área da cidade de São Paulo. No
período entre agosto de 2013 e julho de 2014, a perda foi de 2.044
quilômetros quadrados.
O que mais chama atenção nos dados, porém, é a chamada degradação
florestal – ou seja, as florestas que foram muito alteradas mas que não
sofreram corte raso naquele ano. Esse desmatamento “a prestação”, que se
converterá em corte raso no futuro, teve um aumento de 207% em 2014.
Alguns especialistas atribuem a maior degradação na Amazônia a uma
mudança no padrão da devastação: os desmatadores deixam algumas árvores
em pé para manter parte do dossel e plantam capim sob a copa das
árvores. Na prática, essas florestas estão tão empobrecidas que não
preservam mais a biodiversidade, nem retêm carbono.
“É o chamado engana-satélite”, afirma Adalberto Veríssimo,
pesquisador-sênior do Imazon. Como os pontos (pixels) de florestas
degradadas não aparecem nas imagens de satélite como corte raso, os
desmatadores usam esse recurso para driblar a vigilância do Ibama.
“A velha e conhecida grilagem de terras e a expansão das atividades
produtivas, em especial a pecuária, estão se adaptando a essa nova
situação de estarem submetidas a monitoramento contínuo”, diz Valmir
Ortega, consultor ambiental e ex-secretário do Meio Ambiente do Pará.
“A
melhor forma de reduzir o risco de fiscalização e punição é mascarar
esses processos, mantendo uma cobertura florestal altamente empobrecida,
mas que não se caracteriza como desmatamento. A análise de dados de
sensoriamento remoto deveria ter um olhar mais acurado sobre isso”,
prossegue.
Segundo Adalberto Veríssimo, a taxa de degradação já viu melhores
momentos na Amazônia, mas também já viu piores. Em 2014, porém, a
sinalização é preocupante, porque o número de alertas de desmatamento
também indica forte alta.
Lentes diferentes
O desmatamento na Amazônia é medido por diversos satélites. Cada um
deles olha a floresta de um jeito e conta a mesma história de uma forma
diferente.
A taxa oficial anual, aferida de agosto de um ano a julho do ano
seguinte, é dada pelo sistema Prodes, do Inpe (Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais). O Prodes usa imagens de satélites como o
sino-brasileiro CBERS e o americano Landsat, que têm alta resolução, mas
observam a floresta com menor frequência. O número é divulgado todo fim
de ano – quando indica queda, o governo faz questão de divulgá-lo
durante as conferências do clima da ONU.
O desmatamento em tempo (quase) real é medido pelos sensores Modis, a
bordo dos satélites americanos Terra e Aqua, que em compensação são
“míopes”: não enxergam desmatamentos pequenos. Suas imagens são usadas
em dois sistemas: o Deter, do Inpe, que alimenta a fiscalização do
Ibama, e o SAD, do Imazon.
Nenhum dos dois é usado para fazer cálculo de área desmatada, mas
ambos dão boas pistas sobre se a taxa oficial daquele ano será maior ou
menor.
Até recentemente, os pesquisadores do Imazon conseguiam produzir
estimativas razoáveis da taxa oficial usando o SAD. Isso mudou no ano
passado, quando o sistema de alerta da ONG apontou uma ligeira alta na
taxa e o Prodes mostrou uma queda de 15%.
Segundo Veríssimo, a discrepância provavelmente se explica pela
mudança no padrão de desmate: “O SAD era mais preciso no passado porque
havia grandes polígonos de desmatamento”, afirma. Agora, as derrubadas
estão mais pulverizadas pela região, em maior número, mas em menor área –
mais perto do limite de detecção do Modis.
“Desta vez acho muito pouco provável que o Prodes dê um número que
não vá para cima”, diz Veríssimo. O El Niño de 2015, se vier com a força
prometida, pode também elevar a taxa de 2015, ao secar a floresta e
aumentar o número de incêndios em matas já impactadas pela degradação.
Em 2014, Mato Grosso foi o Estado campeão em alertas de desmatamento,
com um aumento de 152% em relação ao ano anterior. O Pará ficou em
segundo lugar, apesar de uma queda de 14% na velocidade da devastação. O
maior aumento proporcional, de 165%, ocorreu em Rondônia, terceiro
Estado que mais desmatou. Na contramão de quase todos os outros Estados,
o Tocantins teve uma queda de 86% na taxa de desmatamento.
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Este artigo foi publicado originalmente no site do Observatório do Clima, republicado em O Eco através de um acordo de conteúdo.