terça-feira, 24 de julho de 2018

Projeto resgata e faz doação de plantas abandonadas em imóveis no Rio


Projeto Regador foto'1 (Foto: Rodrigo Souza)Projeto resgata e faz doação de plantas abandonadas em imóveis no Rio


O Projeto Regador dá os “primeiros socorros” para as plantinhas que foram deixadas para trás por quem muda de casa. Depois faz a doação em praças da cidade.



Por Marion Monteiro, G1 Rio

24/07/2018 05h00  Atualizado há 1 hora

Empresário do setor de locação de imóveis, Rodrigo Souza, de 36 anos, perdeu a conta de quantas vezes viu vasinhos com plantas secas serem deixados para trás por moradores que mudaram de casa. Foi por isso que ele resolveu criar o Projeto Regador, que resgata plantas abandonadas em imóveis no Rio de Janeiro para serem doadas em locais públicos para quem gosta e tem tempo de cuidar.

O Projeto Regador não tem nem um mês: foi lançado no último dia 3 de junho, um domingo, na Praça São Salvador, no bairro do Flamengo, na Zona Sul do Rio de Janeiro. E, para surpresa dos idealizadores, em menos de uma hora de exposição em uma barraquinha, foram "adotadas" 28 plantas.

“O objetivo é resgatar as plantas e doar para os que têm consciência de que é um ser vivo”, afirma. E o primeiro passo antes da doação é fazer com que as plantinhas recebam os “primeiros socorros”, como a rega e a troca de terra.

Depois de conseguir 30 doações, desde antúrios até samambaias, o empresário levou, a pedido do G1, o Projeto Regador a um local bem movimentado na Zona Sul carioca: o Largo do Machado. Perto da estação do metrô e de uma unidade do projeto Academia para a Terceira Idade, a barraquinha gerou muita curiosidade de quem passava por lá.

Quem adorou a iniciativa foi o servidor público José Reinaldo Carvalho dos Reis, que já tem oito orquídeas cultivadas no seu apartamento, e diz que se sente muito bem ao tratar delas. Para ele, o fato de ter uma adoção de plantas em plena praça já é uma forma de mudar a rotina das pessoas e até conseguiu “barganhar” mais uma muda. “Um pequeno ato como doar uma muda de orquídea torna o cotidiano mais rico”, afirmou.

Ao passar pelo local, Raimunda Maria Santos Silva também conseguiu uma plantinha e elogiou o projeto. “É uma maneira de recuperar as plantas e passar para a frente para quem gosta delas”, disse a técnica de enfermagem aposentada, que ganha sempre uma muda dos amigos.

Já a aposentada Sueli Alves de Souza e Silva é uma doadora de plantas e está engajada no projeto. Ela está mudando de uma casa grande em Maricá, município da Região Metropolitana do Rio, para um apartamento no Catete, na Zona Sul. Para não deixar as plantas para trás, resolveu fazer doações de mudas para outras pessoas e também faz replantio.

“Acho importante o projeto. Quem ama plantas não consegue vê-las destruídas. Cuidar de planta e pegar na terra acalma,” afirmou.

Rodrigo, idealizador do projeto, conta que é um apaixonado pelas plantas desde a infância em Alagoas, onde foi criado. “Lá, a gente sempre está em contato com a natureza”, diz. Como a adesão vem crescendo, pensa agora em levar o projeto para outros bairros do Rio e para pessoas de outros estados que estão abraçando a ideia.

“A gente quer pessoas que possam se organizar e divulgar o projeto em suas regiões e conscientizar a sociedade sobre o abandono das plantas e que gere um mecanismo de doação, de forma natural", diz.

O projeto já conseguiu o resgate e doação de mais de 70 plantas, não só de apartamentos, mas também de restaurantes, que descartam quando acham que elas já estão fora dos “padrões estéticos” da casa.

Macacos-prego em área urbana expõem riscos das mudanças do clima e ocupação desordenada



Filhote de macacaco prego


https://www.youtube.com/watch?v=EpfUHM3efYY

Outro video bonitinho sobre macacos.

Por Amelia Gonzalez, G1

23/07/2018 21h40  Atualizado há 8 horas

Uma turma de macacos-prego tem alvoroçado a minha vizinhança. Como tenho dois cachorros pequenos, não quero correr o risco de promover, mesmo de maneira involuntária, um encontro deles com outros seres peludos de espécie distinta. Ando, portanto, tomando minhas precauções. Janelas fechadas, num ambiente tão carente de ar fresco, me entristecem. Mas, no caso, é absolutamente necessário tentar impedir que o bando se sinta convidado a entrar, o que pode acontecer até por causa de uma distraída penca de bananas à mercê, na fruteira.

Hoje pela manhã, alguns fizeram a festa. Sempre andam acompanhados, e vi uns seis subindo e descendo um prédio ao lado do meu. Aonde tinha janela aberta, eles entravam. Fiquei um tempo acompanhando o movimento, ouvindo a barulheira que a criançada fez ao descobrir. E, o que no início era uma diversão, acabou me deixando jururu. Foi me dando uma vontade tremenda de pedir desculpas àqueles bichos, que pareciam tão pouco apropriados numa paisagem tão urbana.

Além do homem, sempre o maior predador de todas as espécies, já que pode usar armas para matar, o macaco-prego tem como inimigos apenas a Harpia, os felinos (e não estou falando de gatos domésticos, claro), jacarés... 

Ou seja, aqui pela cidade, poucos são capazes com esses bichos, que se adaptam bem à esfera urbana. 

E assustam, é claro, quando invadem casas à procura de alimentos.


Este é o ponto: eles invadem à procura de alimentos. E é o que me deixa com vontade de pedir desculpas. Porque, se lhes falta alimentos na floresta é porque estamos invadindo cada vez mais seu espaço, fazendo casas para morarmos, descuidando da necessidade que eles têm de comer. É certo que são uns glutões, disse ninguém duvida. Mas estariam precisando comer pães, biscoitos ou comidas prontas, com sabores aos quais podem acabar se viciando, se tivessem a seu dispor uma quantidade suficiente de frutas, coquinhos e outros produtos que os satisfazem?

Outro ponto: o aquecimento global, também provocado pelo homem, anda transfigurando produtos da floresta, deixando solos mais secos ou mais molhados. Nada disso está previsto no DNA do macaco-prego.

Sim, isto me deixa jururu. Não só a mim, mas a muita gente. A ocupação urbana desordenada aliada à mudança de clima são dois inimigos de vários animais silvestres, não só de macacos, Gambás, corujas, e até répteis como cobras e lagartos também estão nesta lista. Serão detonados se tiverem a má sorte de enfrentar um humano violento e capaz. Uma morte besta, por nada, só por... existir.


Se você também se sente incomodado com isso, vai gostar de saber que está marcada, para o dia 8 de setembro, uma mega manifestação global para se falar disso tudo. Uma só não, várias, no planeta todo, para exigir que os líderes locais de cidades se comprometam a a construir um mundo livre de combustíveis fósseis, que coloque as pessoas à frente do lucro. O movimento se chama “Una-se pelo Clima” e está sendo puxado, até agora, por mais de 30 organizações ambientais e socioambientais.



Se você, caro leitor, não está percebendo o que tem a ver um mundo com menos combustíveis fósseis com o drama dos macacos-pregos e outros bichos, que precisam invadir a área urbana em busca de comida, eu já me explico. As metas definidas no Acordo de Paris, conseguido a duras penas na Conferência do Clima de 2015 (COP-21), exigem uma mudança estrutural para que se possa viver sem energia fóssil, com base em fontes renováveis de energia. E, se conseguirmos alcançar algo próximo disso, é sinal de que a humanidade vai estar, de fato, muito mais perto de pensar nas pessoas, nos bichos, em preservar florestas, mares, rios e lagos, do que no dinheiro e no desenvolvimentismo econômico.


Para isso, será preciso mudar muita coisa. A começar pela escolha dos dirigentes, que precisarão apresentar em suas plataformas de governo muito mais do que planos econômicos para elevar PIBs e baixar inflações, mas algo que realmente reúna, num só golpe, as preocupações socioambientais e econômicas. O planejamento urbano, para ficarmos no foco dos macacos-prego que descem da floresta em busca de comida, terá que ser pensado de maneira diferente do que é hoje.



Neste sentido, recebi uma publicação elaborada pelo WRI Brasil – o escritório local do World Resources Institute (instituto internacional que se destina a pensar assuntos ligados ao tema da sustentabilidade) que pode ajudar a refletir. Trata-se do Documento Orientado ao Transporte Sustentável (DOTs), que analisa a articulação do uso e ocupação do solo, com o tempo que se gasta para se movimentar nele. Em foco, os 172 milhões de brasileiros que hoje vivem em áreas urbanas. Número que só tende a crescer.


Trata-se de um crescimento urbano 3D: distante, disperso e desconectado, escrevem os especialistas que se debruçaram em estudos para formatar o documento. E trazem informações que me refrescam a memória e transformam em quase nada o drama dos macacos-prego fujões aqui da vizinhança: mais de 100 milhões de pessoas, desses 172 milhões que vivem em áreas urbanas, não têm acesso à rede de esgoto. Isto, sim, uma tragédia sem limites e que igualmente requer uma mudança profunda de hábitos e de prioridades de gestão.


O guia do WRI traz propostas para planos diretores que possam melhorar a qualidade de vida dos humanos que vivem nas cidades. E consta, entre as diretrizes que devem ser pensadas pelos governantes, a preocupação em aumentar o valor ambiental das áreas verdes. Mas há também, paradoxalmente, a necessária observação de que as cidades, por serem locais mais atrativos, que reúnem mais possibilidades, devem ser mais democráticas, abertas a todos. É verdade. Mas, como conseguir conciliar espaço, pessoas, bichos e plantas?


É preciso revistar o Plano Diretor do Rio, e é disso que se trata o estudo. Vou ler o estudo mais lentamente e trarei notícias mais detalhadas sobre as propostas que nos fazem. Gosto do tema. As cidades e suas contradições me instigam porque podem expor mais cruamente, no dia a dia, a dificuldade de transformar em prática a retórica dos acordos e tratados internacionais que se comprometem a preservar meio ambiente e baixar emissões.

Brasil possui quatro cidades entre os dez piores transportes públicos do mundo, aponta estudo Notícia

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Rio de Janeiro ficou na última colocação dos dez piores transportes públicos do mundo entre as 74 cidades analisadas

O instituto de pesquisa Expert Market produziu um levantamento sobre o transporte público nos 74 principais centros urbanos do mundo. Você não está satisfeito com a qualidade do transporte na sua cidade? Então, você não irá se surpreender com o resultado da pesquisa.

A pesquisa avaliou a mobilidade de cidades do mundo inteiro e levou em consideração indicadores com o tempo de viagem, espera para pegar a condução, baldeações, distância total e o custo mensal do transporte relacionado ao salário médio da população.
Brasil possui quatro cidades entre os dez piores transportes públicos
E as cidades brasileiras foram mal avaliadas na pesquisa. São quatro cidades brasileiras entre as dez últimas colocadas. Brasília ocupa a posição 68, Salvador a posição 70, São Paulo ocupa a posição 72 e o Rio de Janeiro a posição 74, o último lugar entre as cidades analisadas.

No Rio, o quesito que mais chamou a atenção foi o alto custo do transporte público em relação ao salário médio das pessoas que vivem na cidade. Os dados analisados indicaram que os gastos com passagens representam cerca de R$ 160 por mês, que equivale a 9,4% do salário médio, segundo o levantamento.

O estudo ainda sinalizou que na cidade do Rio de Janeiro os passageiros passam, em média, 19 minutos por dia esperando a condução chegar e que os passageiros passam em torno de uma hora e meia por dia dentro de ônibus e trens.

Ainda segundo a pesquisa, Brasília apresenta o segundo pior tempo médio de espera por ônibus ou metrô no mundo. A média de espera dos brasilienses é de 28 minutos. Apenas Salvador tem situação pior, com 33 minutos.

Reportagem, Paulo Henrique Gomes, Agência Rádio Mais


in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 23/07/2018

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Pressão pró-desmatamento e barganhas políticas comprometem metas brasileiras de emissão de gás carbônico

Pressão pró-desmatamento e barganhas políticas comprometem metas brasileiras de emissão de gás carbônico


Colniza, MT, Brasil: Área degradada no município de Colniza, noroeste do Mato Grosso. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Pressão pró-desmatamento e barganhas políticas comprometem metas brasileiras de emissão de gás carbônico. Entrevista especial com Raoni Rajão

IHU
Apesar de a política brasileira de combate ao desmatamento ter sido aprimorada nos últimos anos, um estudo recente realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG e da Universidade de Brasília – UnB demonstra que as barganhas concedidas pelo Estado brasileiro até 2016 podem reverter os índices de desmatamento no país e comprometer a meta brasileira de redução das emissões de gás carbônico assumidas no Acordo de Paris. Segundo um dos coautores da pesquisa, Raoni Rajão, da UFMG, embora o governo tenha fortalecido as políticas de controle ao desmatamento, de outro lado “houve uma pressão e uma sinalização pró-desmatamento maior, que acabou anulando ou se sobrepondo à pressão antidesmatamento. O que tentamos mostrar neste estudo é justamente essa situação paradoxal, na qual a capacidade de controle do desmatamento se manteve, mas, ao mesmo tempo, a pressão pró-desmatamento aumentou”, explica.


Entre as sinalizações que favoreceram o desmatamento, Rajão destaca a aprovação do Código Florestal em 2012 e a não criação de novas Unidades de Conservação. “Um marco importante foi a aprovação do Código Florestal em 2012. Inclusive a reforma do Código Florestal surgiu a partir do momento em que o Código antigo começou a ser implementado e começou a ‘doer no bolso’ do produtor e daqueles que desmatam, e esse setor se organizou para, dado que a regra estava ficando difícil, mudá-la”, frisa na entrevista a seguir, concedida por telefone à IHU On-Line.



Na avaliação dele, o novo Código Florestal foi “uma grande colher de chá para o setor produtivo, porque se perdoou tudo o que aconteceu no passado. Tanto é assim que 60% do desmatamento ilegal feito até 2008 foi perdoado pelo Código de 2012. Agora, o problema é que isso acabou sendo lido pelo setor produtivo que está ligado ao desmatamento como uma mensagem de que se ele conseguiu vencer o governo e anular o desmatamento feito no passado, futuramente poderia haver um novo perdão”. E adverte: “É preocupante passar essa mensagem de que com pressão e articulação no governo se consegue reverter leis ambientais, que é algo inclusive inconstitucional, porque não se pode diminuir a proteção em áreas ambientais”.
Raoni Rajão | Foto: Waldemir Barreto / Agência SenadoRaoni Rajão | Foto: Waldemir Barreto / Agência Senado
Raoni Rajão é professor de Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia no departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG e membro do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Produção da mesma instituição. Também atua nos programas de Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais da UFMG e Social and Political Sciences of the Environment (Radboud University/Holanda).


Ele é graduado em Ciência da Computação pela Universidade de Milão-Bicocca (Itália) e mestre e doutor em Organização, Trabalho e Tecnologia pela Universidade de Lancaster (Inglaterra). Desde o mestrado se dedica ao estudo da relação entre tecnologia, ciência e políticas públicas, com ênfase na avaliação de políticas de controle do desmatamento e de pagamento por serviços ambientais.


Confira a entrevista.
IHU On-Line – Na semana passada, noticiou-se na imprensa um estudo feito pelo senhor e pelo professor Britaldo, juntamente com pesquisadores da Coppe/UFRJ e da UnB, acerca das barganhas políticas feitas a partir de 2016 e o modo como elas afetaram o controle do desmatamento na Amazônia e no Cerrado. Em que consiste esse estudo e quais dados o fundamentam?
Raoni Rajão – Esse estudo surgiu da percepção de uma contradição. Seria errado dizer que houve uma reversão ou um enfraquecimento das políticas de desmatamento nos últimos anos. Na verdade, elas se mantiveram, com alguma flutuação de orçamento, mas nada que não tivesse acontecido nos anos anteriores. Isso porque o governo tem dificuldade de manter o fluxo de recursos, mas de maneira geral foram mantidos aprimoramentos pontuais e, inclusive, ajudamos o Ibama a realizá-los. Então, o ponto do nosso estudo foi o seguinte: por que o desmatamento aumentou se a política de desmatamento continuou e melhorou? Para responder a essa questão, analisamos as políticas de controle de desmatamento para entender que estamos num contexto mais amplo de governança ambiental, que são as ações de controle do desmatamento do Ministério do Meio Ambiente e também as ações dos outros ministérios, as ações do setor privado, as sinalizações políticas que são dadas pelo Congresso e pela presidência.


Então, o que ajudou a explicar a queda do desmatamento nos períodos anteriores foi a concomitância de uma estruturação da política de controle de desmatamento, que praticamente não existia antes de 2004. Depois se teve um contexto político favorável, com tolerância zero ao desmatamento, mas na sequência, mesmo com a manutenção da política do desmatamento, houve uma pressão e uma sinalização pró-desmatamento maior, que acabou anulando ou se sobrepondo à pressão antidesmatamento. O que tentamos mostrar neste estudo é justamente essa situação paradoxal, na qual a capacidade de controle do desmatamento se manteve mas, ao mesmo tempo, a pressão pró-desmatamento aumentou.


A partir dessa constatação, tentamos olhar para o futuro, pensando num cenário no qual existe uma sinalização política antidesmatamento, no qual se pode diminuir o desmatamento conforme as metas assumidas pelo país em 2009. Nesse sentido, não estamos propondo que o Brasil assuma uma nova meta, nem estamos sugerindo que se faça uma política de desmatamento zero.


O cenário intermediário que vemos como tendencial é o de manutenção das políticas de controle de desmatamento. Mas com a erosão e a diminuição da capacidade gradual que vem ocorrendo por causa do teto dos gastos, da aposentadoria dos funcionários do Ibama e da não reposição do quadro de funcionários através de novos concursos, prevemos um cenário pior, no qual o Ministério do Meio Ambiente seria extinto e se transformaria numa secretaria do Ministério da Agricultura e, portanto, estaria submetido a esse ministério, como já foi sinalizado por um dos candidatos à Presidência. Se essa situação se concretizar, a política de controle do desmatamento será desmontada e as consequências serão piores.


IHU On-Line – Quais foram as principais barganhas concedidas pelo Estado aos ruralistas e como elas contribuíram para o aumento do desmatamento na Amazônia e no Cerrado?
Raoni Rajão – É difícil, quando se faz uma análise política, relacionar uma ação específica do governo e como isso gerou um aumento do desmatamento. Entretanto, é possível perceber que foram feitas sinalizações importantes e, nesse sentido, um marco foi a aprovação do Código Florestal em 2012. Inclusive a reforma do Código Florestal surgiu a partir do momento em que o Código antigo começou a ser implementado e começou a “doer no bolso” do produtor e daqueles que desmatam, então esse setor se organizou para, dado que a regra estava ficando difícil, mudá-la.


É claro que, no que diz respeito ao Código Florestal, existe uma discussão mais ampla, porque alguns argumentaram à época que era melhor ter uma regra mais fácil e 100% aplicada do que ter uma regra muito forte e que nunca seria aplicada. De certa forma isso ajudou a justificar, para alguns ambientalistas, a construção do novo Código Florestal, que foi uma grande colher de chá para o setor produtivo, porque se perdoou tudo o que aconteceu no passado. Tanto é assim que 60% do desmatamento ilegalfeito até 2008 foi perdoado pelo Código de 2012. Agora, o problema é que isso acabou sendo lido pelo setor produtivo que está ligado ao desmatamento como uma mensagem de que se ele conseguiu vencer o governo e anular o desmatamento feito no passado, futuramente poderia haver um novo perdão.


É preocupante passar essa mensagem de que com pressão e articulação no governo se consegue reverter leis ambientais, que é algo inclusive inconstitucional, porque não se pode diminuir a proteção em áreas ambientais. Apesar de muitos alertarem para o fato de que se trata de algo inconstitucional, o STF acabou dando um parecer favorável ao Código Florestal, inclusive em aspectos mais controversos como, por exemplo, a anistia por desmatamentosanteriores a 2008, para pequenas propriedades. Existiu ali uma sinalização que foi muito negativa.


Outra sinalização importante ocorreu assim que Dilma Rousseff assumiu o governo: ela diminuiu radicalmente o número de criação de Unidades de Conservação e demarcação de terras indígenas. Inclusive, no nosso artigo, fizemos um levantamento das áreas de Unidades de Conservação criadas ano a ano, que evidencia uma diminuição radical já no governo Lula, mas quando Dilma assume o governo, essa diminuição chega próximo a zero.


No final do governo, ela fez algumas benesses para compensar essa situação, mas ficou evidente a sinalização, pois até então uma estratégia muito clara do governo Lula, no período da Marina Silva, consistia em pegar as áreas devolutas, que são áreas do governo, e ali criar Unidades de Conservação ao invés de deixá-las sem atribuição, o que permite a grilagem das terras. Então tal política sinalizava que essas áreas seriam difíceis de ser griladas e roubadas do governo. Mas essa estratégia foi interrompida. Além disso, no governo Temer foi aprovada uma medida provisória, por pressão dos ruralistas, a qual expandiu benefícios para grileiros, os quais hoje conseguem legalizar, a um preço irrisório, áreas de até 2.500 hectares. São grandes latifúndios de terras públicas — ou seja, nosso patrimônio — que estão sendo desmatados por pessoas que depois conseguem a propriedade dessas terras e as vendem por preços exorbitantes.


A Renca, por exemplo, que é uma reserva de minério de cobre no Pará, não tem uma função ambiental direta, mas acaba tendo uma função indireta, porque ela limita os tipos de uso daquela área. Por causa disso, dentro da Renca foram criadas Unidades de Conservação estaduais pelo Estado do Pará. Mas a partir do momento em que o governo federal quis desfazer essa área, o Estado do Pará também poderia querer desfazer as suas unidades estaduais de conservação e permitir a exploração dessas áreas. Nesse caso, a iniciativa de desfazer a Renca foi fruto do lobby da própria Vale. Depois houve uma pressão internacional enorme e o governo voltou atrás, e o mesmo aconteceu com Jamanxim. Apesar de o governo ter voltado atrás, o sinal para quem quer desmatar está claro: basta pressionar que o governo vai lá e assina o que alguns setores querem e isso gera uma expectativa pró-desmatamento.


Tanto é que no contexto do Jamanxim houve uma explosão de desmatamento nas Unidades de Conservação, porque já estava se esperando que no apagar das luzes do governo Temer se daria uma canetada e se conseguiria desfazer aquelas áreas, facilitando a tomada delas, que a partir de então estariam legalizadas. A diferença entre o legal e o ilegal é uma caneta. Como essa caneta está na mão de quem quer fazer barganha, isso acaba tendo um impacto muito grande na expectativa de quem quer desmatar.


IHU On-Line – Segundo o estudo, somente por desmatamento o Brasil emitiria 1,8 bilhão de toneladas líquidas de gás carbônio em 2030. O que esse percentual representa em comparação com a meta interna assumida pelo país na Conferência do Clima de Paris? Como é feita essa projeção?
Raoni Rajão – Isso mostra que só com o desmatamento o Brasil vai superar o que ele promete em termos de emissão nesse período, o que significa que o país, em 2030, não alcançará as próprias metas internas que foram prometidas no acordo de Paris.


É importante enfatizar que uma das nossas preocupações é que o governo escolha quais setores poderão emitir gás carbônico. Nesse caso, alguns setores poderiam desmatar, porque o governo quer usar a meta de emissão de gás carbônico para esses setores, mas se for assim, como fica o resto da economia brasileira? Essa sim precisa emitir para produzir, porque para produzir carne, soja, um carro, para produzir energia elétrica, é preciso emitir gás carbônico também, então, o governo estará prejudicando outros setores da economia que precisam emitir para produzir. Ou seja, o governo irá permitir a emissão de gás carbônico para um setor da economia que não gera PIB. O problema é um pouco esse e funciona como uma espécie de orçamento: se gastamos todo o orçamento do governo num setor, não teremos recursos para outros. A mesma coisa acontece em relação ao carbono: se gastarmos em barganha política gerando desmatamento, gerando grilagem de terra, não teremos possibilidade de oferecer barganhas para o setor produtivo, que também irá gerar as taxas de emissões. Esse é o “x da questão”.


IHU On-Line – O senhor defende que o desmatamento deveria ser controlado para permitir que outros setores da economia, que geram um PIB maior, possam usar a cota de emissões de gás carbônico?
Raoni Rajão – Exato. A tendência é gerarmos uma economia de baixo carbono, de maneira mais efetiva, mas pelo menos nos próximos 50 anos, até que se faça a transição para a economia de baixo carbono, teremos que emitir para poder crescer. Então, temos que poder emitir num lugar que gere crescimento. É importante ter noção disso, porque quando alguém desmata, há uma perda para todo mundo, inclusive para a agropecuária moderna. Não se trata de uma briga do ambientalista preocupado em salvar as árvores contra a agropecuária. O governo poderia permitir o desmatamento legal em áreas de expansão de algumas culturas que têm alto valor agregado e não em áreas de fronteira onde é economicamente inviável produzir alimentos. Os que estão desmatando essas áreas fazem isso para grilar as terras e depois tomá-las do Estado, para depois vendê-las sem produzir alimento e PIB.


IHU On-Line – Considerando essas barganhas já concedidas pelo governo, que tipo de política o Brasil deveria implementar para alcançar suas metas de redução das emissões de gás carbônico?
Raoni Rajão – Um dos pontos centrais está ligado às terras devolutas; são 80 milhões de hectares de terras públicas não designadas na Amazônia. O problema é que enquanto essas terras não estiverem designadas, elas estarão abertas para serem usadas por grileiros que as desmatam e depois são usadas pela especulação imobiliária. É absolutamente urgente pensar formas para que essas áreas tenham um destino específico, porque à medida que elas entram no mapa, quem grila terra vai ficar atento e não irá naquelas áreas.


Além disso, é absolutamente essencial que seja sinalizado que acabou a farra de se desfazerem as Unidades de Conservação. Isso porque a partir do momento que se cria a expectativa de que com pressão política a Unidade de Conservação é desfeita, aí vira moda e todos vão querer fazer a mesma coisa, vão querer pressionar também no âmbito estadual, porque os estados também têm um papel importante na criação de Unidades de Conservação.


Também é importante que se continue com o aprimoramento das plataformas políticas de controle do desmatamento. O Ibama tem feito um bom trabalho, mas, infelizmente, toda vez que relatamos situações de desmatamento, a tendência é falar que isso acontece porque não há fiscalização — essa é a narrativa típica. Porém, ela é incorreta porque a situação é mais complexa do que isso. De todo modo, é preciso continuar aprimorando a fiscalização, é preciso fazer investimentos, promover concursos, por exemplo, porque faz anos que não há concurso do Ibama, e hoje a quantidade de fiscais é 50% menor do que há alguns anos, logo, isso impacta a capacidade de ação do órgão.


Também é importante pensar em incentivos para a legislação. Se acabássemos com o desmatamento ilegal na Amazônia, seria possível reduzir muito o desmatamento, mas esse não é o caso do Cerrado. Nesse sentido é necessário pensar em como implementar aspectos, os quais já estão inclusive em lei, em que, por exemplo, é feito o pedido de estudo de viabilidade ou de se demonstrar a necessidade de desmatar uma nova área. Há possibilidade de ser criado um imposto de autorização de desmatamento legalque possa, depois, ser revertido para o uso sustentável de outras áreas.


Hoje, infelizmente, é muito mais barato para o produtor desmatar uma nova área, por exemplo, para poder expandir o pasto, do que recuperar uma área já degradada. Existe um incentivo econômico muito grande para que se continue desmatando sempre novas áreas em vez de manter e utilizar, de maneira sustentável, as áreas já abertas e utilizadas. É um pacote que precisa ser pensado em conjunto.


IHU On-Line — O estudo fez algum cálculo para medir em que percentual o desmatamento foi reduzido a partir da política de desmatamento, em contraposição a que percentual de áreas foram desmatadas por causa das barganhas concedidas pelo governo?
Raoni Rajão – É difícil atribuir valores percentuais de maneira direta. O que houve foi uma série de estudos que tentam compreender o papel dessas diferentes políticas para explicar como o desmatamento saiu de 20 mil quilômetros quadrados em 2005 para 4 mil quilômetros quadrados em 2012. Esses estudos mostraram um aumento substancial dos atos de infração emitidos pelo Ibama nos municípios.


O meu estudo, particularmente, mostra a revolução tecnológica que aconteceu dentro dos órgãos ambientais, porque antes os técnicos iam para campo sem saber onde procurar o desmatamento, mas hoje eles fazem monitoramentos por satélite. A própria criação de Unidades de Conservação foi muito importante e, além disso, houve mudanças legislativas importantes, como, por exemplo, a criação da lista negra dos municípios desmatadores. Aqueles municípios que estão nessa lista têm dificuldades de conseguir créditos com bancos e isso gerou uma reação importante para o setor produtivo na região Amazônica. Ou seja, esses são dados de uma série de estudos que apontam como o desmatamento chegou a esses valores, mas não existe um estudo integrado.


Como o elemento político estava presente no período de 2005 a 2012, fica difícil separar a influência dele desses outros elementos. Entretanto, o que mostramos é que se a partir de 2012 as políticas que levaram ao desmatamento foram mantidas, então o que mudou foi de fato a reversão de algumas políticas, como a redução das Unidades de Conservação. Então, apesar de não atribuirmos um percentual a cada uma dessas políticas, fica claro que tem que ter havido uma influência importante da dimensão política para poder explicar essa reversão, porque, do contrário, ela não se explica e estaríamos com os mesmos índices de desmatamento que foram registrados em 2012.


IHU On-Line — Dado o índice de desmatamento no país, o Brasil não conseguirá cumprir suas metas internas propostas para o acordo de Paris?
Raoni Rajão – Se a tendência se confirmar, não. Tanto é que consideramos que o cenário intermediário é o cenário tendencial. Ou seja, se as questões do desmatamento e doorçamento de carbono não entrarem para a agenda política de 2018, chegaremos a 2030 longe da meta do acordo de Paris. A situação é preocupante porque, com exceção de uma candidata, ninguém toca nesse assunto. Pelo contrário, candidatos à esquerda e à direita estão querendo se aproximar do agronegócio porque ele é uma grande potência, gera PIB, mas não fazem uma aproximação qualificada no sentido de afirmarem que querem apoiar o agronegócio que busca crescer, que quer gerar uma agricultura de baixo carbono, e não aquele agronegócio que quer roubar terra. Mas, infelizmente, essa mensagem fica muito misturada na discussão política e a tendência é a de ter uma eleição que não trate do assunto.


IHU On-Line — Que questões são urgentes e precisam constar no debate eleitoral acerca da questão ambiental?
Raoni Rajão — É importante começar a discutir a agenda do orçamento de carbono, porque o carbono é um recurso finito: nós emitimos dia a dia, toda vez que ligamos o carro estamos emitindo gás carbônico, porém é importante fazer essa emissão de maneira inteligente. É a mesma coisa com o orçamento da União, que precisa ser pensado de maneira mais efetiva.


Não é simplesmente cortar gastos, aumentar impostos ou aumentar investimentos, mas fazer gastos de maneira mais efetiva. Infelizmente, isso está fora do debate e é curioso que esteja fora do debate em um contexto em que, por exemplo, mesmo dando sinalizações pró-desmatamento, tanto Kátia Abreu, que foi ministra de Dilma, quanto Blairo Maggi, que é ministro de Temer, já falaram publicamente que a agricultura não precisa desmatar para crescer. Este foi o cenário: de 2005 para 2012 houve um aumento espetacular das exportações brasileiras de soja e de carne, e a produção agrícola do Brasil aumentou substancialmente, isso em um cenário em que o desmatamento caiu.



De fato, há pessoas ligadas ao agronegócio falando que não precisa desmatar para poder crescer, então, por que isso não vira uma linha comum de propostas? O que aconteceu nesses últimos tempos é que o setor do agronegócio que quer desmatar não está sendo repreendido pelo agronegócio que está querendo produzir. Parte dos candidatos não quer atacar essa questão do desmatamento e da diminuição das emissões de gás carbônico, a meu ver, porque não querem ofender parte importante do eleitorado deles. Entretanto é essencial conseguir separar estes dois públicos: a agricultura que está querendo produzir e aquela que está querendo só desmatar.


IHU On-Line — Deseja acrescentar algo?
Raoni Rajão — Um ponto a ser colocado é que esse estudo é resultado de um trabalho de duas equipes de ponta de duas universidades brasileiras e que utilizou modelos desenvolvidos no Brasil. Normalmente, quando se trata de grandes estudos sobre mudanças climáticas, há uma tendência muito grande de copiar e colar modelos desenvolvidos fora do país, o que faz com que não tenhamos uma capacidade de entender as nossas particularidades nacionais. Nesse sentido, esse estudo foi representativo e também, de certa forma, foi importante para o desenvolvimento científico do país. É relevante enfatizar isso e a importância de continuar a se fazer investimentos nessa área, pois esse estudo que fizemos só foi possível porque, anteriormente, essa mesma equipe fez parte de um grande projeto do Ministério da Ciência e Tecnologia, onde fizemos as projeções de emissões do Brasil até 2050.


É importante haver investimento para a Ciência e Tecnologia, porque se não existir investimento em Ciência e Tecnologia nas universidades, não teremos inteligência governamental no país. Infelizmente estamos num cenário onde isso não é visto, onde acredita-se que as universidades públicas são espaços privilegiados ou que são politizados, mas esses são espaços em que se gera inteligência e se faz pesquisa.

(EcoDebate, 23/07/2018) publicado pela IHU On-line, parceira editorial da revista eletrônica EcoDebate na socialização da informação.


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