Elton Alisson, de Campo Grande (MS) | Agência FAPESP – Alvo
de recente questionamento, o aumento no desmatamento na Amazônia nos
últimos meses, em comparação com 2018, é incontestável. O aumento foi
apontado pelo sistema de monitoramento por satélites Deter, do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e deverá ser confirmado antes
de dezembro com o lançamento dos dados obtidos durante um ano completo
por outro sistema de monitoramento da instituição, o Prodes.
Nos próximos dias deverão ser divulgados os dados do Deter para o
período de agosto de 2018 a julho de 2019. Entre outubro e novembro,
sairão os dados do Prodes para o mesmo período, que são utilizados para
verificação do Deter. O Prodes usa dados do satélite Landsat – sistema
que existe desde 1989 – e apresenta os dados consolidados sobre o
desmatamento total apenas uma vez por ano.
A afirmação foi feita por
Carlos Nobre, pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP), durante palestra na
71ª Reunião Anual
da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada
de 21 a 27 de julho na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS), em Campo Grande.
“Os números da série anual do Prodes, que compreende o período de
agosto de 2018 a julho de 2019, devem confirmar o que os dados dos
últimos meses mostraram: que o desmatamento da Amazônia nos últimos 12
meses foi muito maior do que no período anterior”, disse Nobre, que é
pesquisador aposentado do Inpe.
“Temos que partir do princípio de que está realmente ocorrendo um
aumento do desmatamento na Amazônia”, disse. Segundo ele, o
questionamento dos dados sobre o desmatamento da Floresta Amazônica nos
últimos três meses indicados pelo Deter é infundado. Isso porque a
margem de incerteza do sistema varia de 10% a 12%.
O sistema apontou que o desmatamento na Amazônia em quilômetros
quadrados (km²) aumentou nos meses de maio, junho e nos primeiros 20
dias de julho, respectivamente, 34%, 91% e 125% em relação aos mesmos
meses em 2018.
“Esses percentuais de aumento estão muito além da margem de
incerteza. A probabilidade de que o desmatamento da Amazônia está
aumentando está acima de 99%”, disse Nobre.
Os dados do Deter são disponibilizados desde o lançamento do sistema,
em 2004, pelo Inpe. Já os do Prodes – que foi o primeiro sistema de
monitoramento de desmatamento na Amazônia criado pelo órgão em 1989 –
ficaram embargados no início e só passaram a ser disponibilizados em
2002.
“Esses dados públicos permitiram um enorme entendimento das causas do
desmatamento e municiaram as políticas de combate que tiveram grande
sucesso durante vários anos”, disse Nobre.
O eventual embargo dos números de desmatamento obtidos pelo Deter e o
Prodes ou a descontinuação desses dois sistemas causariam enormes
prejuízos para o país e fariam o Inpe perder o protagonismo mundial no
desenvolvimento de sistemas de monitoramento florestal, afirmou.
“Não divulgar os dados do desmatamento do Inpe não faria o problema
desaparecer, porque hoje há muitos grupos em todo o mundo que fazem esse
tipo de mapeamento. Mas o Inpe, que desenvolveu o melhor sistema de
monitoramento de florestas tropicais do mundo ao longo dos últimos 30
anos, perderia sua liderança”, disse Nobre.
De acordo com o pesquisador, o Brasil, por intermédio do Inpe, foi o
primeiro país do mundo a fazer esse tipo de monitoramento florestal por
satélite. Os sistemas desenvolvidos pelo instituto ajudaram a capacitar
pesquisadores de 60 países e muitos países tropicais usam os algoritmos
criados na instituição.
Enquanto os sistemas de monitoramento desenvolvidos por outras
instituições no mundo, baseados em big data e algoritmos automáticos de
inteligência artificial, apresentam hoje uma margem de erro acima de
20%, a do Prodes é de 5 a 6%, comparou Nobre. “Isso representa um enorme
aperfeiçoamento desse sistema de monitoramento, que é resultado de 30
anos de avanço científico”, disse.
Confiança nos dados
Em coletiva de imprensa no dia 26 de julho, na reunião da SBPC, o
ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos
Pontes, disse que “não tem dúvidas de que os dados produzidos pelo Deter
estão corretos e são confiáveis, mas foram usados com o objetivo
incorreto”.
“Os dados do Deter não são para medição do desmatamento, mas para
alerta de desmatamento, para auxiliar o Ibama nas ações de fiscalização.
Seria errado utilizá-los para indicar desmatamento”, disse Pontes à
Agência FAPESP. “Os dados do Prodes é que têm a finalidade de medir desmatamento, mas demoram um certo tempo para ser compilados.”
O ministro destacou que o Inpe é uma instituição conceituada, cujo
trabalho é reconhecido internacionalmente, e que continuará a
desempenhar suas funções como sempre fez. “O fato de perguntarmos sobre a
variação de um dado é normal é já aconteceu anteriormente”, disse.
O portal TerraBrasilis é uma plataforma web desenvolvida pelo Inpe
para acesso, consulta, análise e disseminação de dados geográficos
gerados pelos projetos de monitoramento da vegetação nativa do
instituto, como o Prodes e o Deter:
http://terrabrasilis.dpi.inpe.br/.
Este texto foi originalmente publicado por
Agência FAPESP de acordo com a
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EcoDebate, ISSN 2446-9394, 01/08/2019