Com informações da BBC -
19/12/2016
Hoje a Rússia é líder na exploração espacial, mas a China está acelerando rápido. [Imagem: Roscomos]
Há décadas existe a promessa de uma base na Lua. Colocamos um pé lá, e parou por aí - nossa presença no satélite natural da Terra se resume a pegadas.
No entanto, estão surgindo cada vez mais iniciativas públicas e privadas que não só anunciam um retorno à Lua, mas planos ambiciosos de colonização lunar.
A China já revelou que pretende pousar no lado oculto da Lua (que não pode ser visto da Terra) em 2018, enquanto a Rússia prepara o pouso de sua primeira nave tripulada para 2031.
Os Estados Unidos não se manifestaram como governo, mas em julho deste ano deram permissão para a empresa privada Moon Express ir à Lua. E a NASA convocou recentemente companhias do setor privado a enviarem sugestões de experimentos que possam ser feitos por lá.
A que se deve tanto interesse na Lua?
Segunda corrida espacial
Para Leon Vanstone, da Universidade do Texas, o principal motivo é o mesmo da Guerra Fria: poder. "Devemos lembrar que foram os russos (então União Soviética) os primeiros a enviar um homem ao espaço - eles queriam militarizar o espaço - e os Estados Unidos se apressaram então em colocar um homem na Lua", disse ele.
Essa demonstração de poder custou bilhões de dólares e, segundo Vanstone, as potências perceberam que o melhor para todos era realizar iniciativas conjuntas em que os gastos e responsabilidades são compartilhados.
Mas o tabuleiro do xadrez geopolítico mudou.
A China está crescendo como uma potência espacial, e os Estados Unidos já não têm o mesmo status, dependendo dos russos até mesmo para mandar astronautas para a Estação Espacial Internacional. E, conforme lembra a especialista em Direito Espacial Jill Stuart, da Escola de Economia de Londres, "há muita tensão entre os Estados Unidos e a Rússia. Então, há sempre uma política complicada por trás."
Além disso, diferentemente da maioria das agências espaciais do mundo - como a NASA (EUA), ESA (Europa) ou Roscosmos (Rússia) -, o programa espacial chinês é dirigido por militares. "Os Estados Unidos não querem dizer que o seu programa é estatal. Na sua política capitalista, preferem dizer 'vamos deixar nossas empresas privadas à frente do programa espacial'," afirma Stuart. Ocorre que essas empresas não são de todo privadas, uma vez que são financiadas com dinheiro do estado e devem operar sob a tutela da NASA.
Depois de meio século longe da Lua, agora há pelo menos seis projetos que prometem animar a exploração espacial. [Imagem: NASA]
Para Naveen Jain, um dos fundadores da Moon Express, as possibilidades de negócios na Lua são ilimitadas. Uma licença de uso e exploração permitiria a ele dar início a atividades de mineração, oferecer pacotes turísticos ou vender pedaços de rochas lunares como pedras preciosas.
"Parafraseando JFK (ex-presidente norte-americano John Fitzgerald Kennedy) 'escolhemos ir à Lua não porque era fácil, mas porque era um bom negócio', e é disso que se trata, de fazer um bom negócio", disse o fundador da Moon Express, que vê a comercialização da Lua como um negócio "grandiosamente genial".
E a tecnologia agora barateou em relação à corrida espacial dos anos 1960. "A primeira vez que o homem foi à Lua precisou de foguetes gigantes que custaram centenas de milhões de dólares," disse Jain. "Estamos usando um foguete menor, impresso em 3D, que custa menos de US$ 5 milhões."
E a sonda não-tripulada que ele planeja enviar à Lua no ano que vem custará outros meros US$ 5 milhões, algo que a NASA costuma gastar apenas nos estudos iniciais - sempre pagos a empresas privadas.
"A Lua é extremamente rica em recursos. Tudo pelo que brigamos na Terra está em abundância no espaço", afirma o empresário. "Cada vez mais pessoas estão interessadas em metais raros, e esse é o interesse de fazer a mineração na Lua."
A questão é que seria muito mais caro trazer esses minerais para a Terra do que continuar a explorar o que temos aqui, ou mesmo encontrar novas minas. Assim, parece haver outros elementos na equação do negócio que não estão totalmente claros.
Minerais extraídos na Lua ficariam muito mais caros do que os explorados na Terra. [Imagem: BBC/Divulgação]
Com o avanço da tecnologia e com a capacidade de chegar cada vez mais longe, a Lua se torna apenas um pequeno passo para a exploração do espaço.
Assim que a meta não for mais o nosso satélite, será Marte. E, se um dia chegarmos lá, então o desafio vai além.
Mas, para que isso aconteça, é preciso resolver um problema antes: combustível para viajar. Afinal, a maior parte do peso das naves lançadas ao espaço é de combustível.
Por isso, a Lua poderia ser uma parada estratégica para abastecimento. E não apenas os Estados Unidos acreditam nisso. A China também está de olho em Marte e anunciou recentemente que, em 2020, pretende visitar o Planeta Vermelho.
Direito espacial
Segundo o tratado sobre a exploração e utilização do espaço, assinado por 103 países em 1967, "o espaço, incluindo a Lua e outros corpos celestes, não deve ser objeto de apropriação nacional por reivindicação de soberania, uso, ocupação ou de qualquer outra forma".
Como os governos poderiam então planejar operações na Lua e conceder concessões a empresas privadas se, a princípio, ninguém tem o poder de fazê-lo?
Embora o acordo internacional afirme que o espaço é um território neutro e ninguém pode se apropriar dos corpos celestes, há diversas interpretações, e as empresas estão de olho em brechas na legislação de quase 50 anos para abocanhar uma fatia do negócio no espaço: "Primeiramente, o tratado especifica que nenhuma nação deve se apropriar de qualquer corpo celeste," diz a especialista Jill Stuart. "Mas há dúvidas se as entidades não-estatais poderiam fazer essas reivindicações."
Em segundo lugar, o fato de que você não pode reclamar a propriedade, não significa que não possa ocupar o espaço. "É como a Antártida", diz a especialista. "Você pode ter uma base lá, contanto que diga que o que está sob seus pés não é seu."
As bases na Lua são um sonho antigo. Mas a pergunta que permanece é: Para quê? [Imagem: BBC]
Mas os Estados Unidos parecem estar indo além, a começar pela autorização dada à Moon Express, um direito que o país não teria e, portanto, não poderia conceder. E, em novembro de 2015, aquele país aprovou uma lei que permite aos cidadãos norte-americanos explorar comercialmente e reivindicar a posse de recursos obtidos no espaço.
"Isso me perturba um pouco", admite Stuart. "Essa lei tem o potencial de minar o acordo internacional que já está em vigor para o espaço."
Said Mosteshar, do Instituto de Direito e Política Espacial de Londres, concorda que essa lei norte-americana atropela os tratados internacionais. "Parece que os Estados Unidos estão concedendo a seus cidadãos um direito que o próprio país não tem. Você não pode dar um direito nacional que não pode exercer".
Em 1979, antecipando uma futura exploração lunar, a ONU redigiu o Tratado da Lua, estipulando as condições para essa atividade. A questão é que apenas 13 países assinaram o acordo - e nenhum deles tem recursos para participar de uma corrida espacial.
Talvez a exploração da Lua seja inevitável. E a possibilidade de haver bases de diferentes países, como ocorre na Antártida, não está tão distante de acontecer. Mas, para Jill Stuart, a pergunta que devemos fazer é: quem nós queremos que nos represente no espaço?