Segundo as entidades, cerca de dez indígenas em isolamento, incluindo mulheres e crianças, foram assassinados
Jamil Chade, correspondente, O Estado de S.Paulo
GENEBRA – Órgãos da ONU e da OEA denunciaram nesta quinta-feira, 21, um “possível massacre” dos indígenas em isolamento no território Vale do Javari (Amazonas). Num comunicado, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e o Escritório Regional para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) se dizem "preocupados" e pedem que o governo adote "medidas imediatas" para frear os ataques contra povos indígenas.
Segundo as entidades, cerca de dez indígenas em isolamento, incluindo mulheres e crianças, foram assassinadas. De acordo com os órgãos, a região está enfrentando “um aumento das incursões e de atos de violência contra as comunidades indígenas em isolamento voluntário e contato inicial na região do Vale do Javari”.
O comunicado público das organizações internacionais vem num momento em que o governo de Michel Temer está sendo questionado por governos e ongs estrangeiras sobre a política de proteção aos povos indígenas. Agora, a cobrança pública das entidades promete incrementar a pressão sobre a Funai.
Para os órgãos internacionais, o “suposto massacre seria uma das numerosas denúncias de parte das comunidades indígenas em relação a incursões e ataques contra povos indígenas em isolamento voluntário e contato inicial na área, perpetrados por garimpeiros, produtores e extrativistas de madeira ilegais”.
“Ambas instituições receberam também informação sobre o possível massacre de integrantes da comunidade indígena em contato inicial Warikama Djapar”, declarou.
Os órgãos reconhecem o fato de que Ministério Público Federal (MPF) tenha iniciado investigações e apontam que o governo tem se demonstrado interessado em fazer avançar o processo. Mas as entidades pedem que os resultados de tais investigações sejam publicados e que os responsáveis sejam julgados e sancionados.
A Comissão e o Escritório da ONU também pedem que o governo adote “medidas imediatas” para evitar as incursões aos territórios dos indígenas em isolamento na Terra Indígena do Vale do Javari.
“Os contatos não desejados e as incursões por parte de terceiros nos territórios dos povos em isolamento voluntário e contato inicial constituem um sério risco para sua sobrevivência física”, alertam. Tais contatos resultariam em agressões diretas, problemas sérios de saúde devido à falta de defesas imunológicas e escassez de alimentos. “Todos estes problemas têm um impacto irreversível na capacidade do povo afetado de sobreviver e podem resultar em seu desaparecimento”, completam.
Entre as medidas exigidas pelas entidades estão o controle de entrada no território, vigilância permanente e monitoramento dos movimentos territoriais dos povos em isolamento. Além disso, as organizações querem medidas para prevenir atividades ilegais de mineração, cultivo, caça, pesca e extrativismo ilegal de madeira nos territórios indígenas.
Ataque. A crítica pública foi feita no mesmo dia em que, em Genebra, o Brasil passava por uma sabatina de sua política de direitos humanos. Apesar de o governo se comprometer oficialmente a dar uma resposta à situação indígena, o País foi duramente criticado por representantes de povos indígenas que acusaram o estado brasileiro de “omissão” e de “sucatear” a Funai.
“Como resultado dos cortes de orçamento do órgão indigenista oficial, estamos prestes a confirmar um massacre de indígenas isolados na Amazônia brasileira”, disse o Conselho Indigenista Missionário. “Estas mortes não são resultados de uma política inocente, mas um ato criminoso, previsível, de um Estado que se mostra incapaz de proteger sua população mais vulnerável”, disse.
Para o grupo é “vexatório o Brasil continuar a defender em seus discursos uma realidade ilusória, diante da latente falta de vontade política, revelando assim, sua mais perversa face”.
Ao responder às críticas, a embaixador do Brasil na ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo, garantiu que o governo tem um “compromisso” em defender os direitos dos povos indígenas e que cerca de US$ 700 milhões foram investidos para tal fim, principalmente em educação e saúde. Ela, porém, admite que o assunto é “um desafio”.