sexta-feira, 2 de outubro de 2020

A importância dos manguezais, que ficam desprotegidos com decisão do governo Bolsonaro

 ENVOLVERDE

Duas resoluções que protegiam áreas de preservação permanente como restingas e manguezais e restringiam o desmatamento e a ocupação nesses biomas foram derrubadas na manhã da segunda-feira (28/09) em reunião do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), convocada pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. As resoluções estavam em vigor desde 2002.

Salles, que foi gravado neste ano dizendo que era preciso aproveitar a pandemia para “passar a boiada” de aprovação de flexibilização de leis ambientais, já havia reduzido o número de entidades da sociedade que fazem parte do Conama em 2019. O conselho é o principal órgão consultivo do ministério e tinha participação de 96 entidades — hoje, tem 23 membros.

Além das resoluções 302 e 303, que protegem os manguezais, a reunião derrubou a resolução 284/2001, que estabelecia critérios de eficiência de consumo de água e energia necessários para aprovação de projetos de irrigação.

O ministério também liberou a queima de lixo tóxico em fornos usados para produção de cimento — a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que essa queima seja feita em ambiente controlado.

O governo diz que as questões tratadas nas resoluções foram incorporadas por leis aprovadas depois, como o Código Florestal.

Mas especialistas em ambiente afirmam que essas resoluções eram as únicas normas que de fato protegiam esses biomas, essenciais para manutenção do equilíbrio ambiental no país e no mundo.

Restingas são áreas de vegetação encontradas em regiões arenosas de praias e em dunas.

Manguezais são ecossistemas costeiros, de transição entre a terra e o mar, que ficam em regiões tropicais e subtropicais do planeta. É ali onde ficam aquelas plantas retorcidas por cima da lama escura que, de acordo com a maré, ora ficam cobertas pela água salgada do mar, ora ficam expostas com as raízes fincadas na água que se mistura à dos rios.

Manguezais no nordeste foram atingidos por petróleo no ano passado (Foto: CLEMENTE COELHO JÚNIOR )

O Brasil tem quase 14 mil quilômetros quadrados de áreas de manguezais, segundo o Atlas dos Manguezais do Brasil, um documento produzido pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) publicado em 2018.

Além disso, o país tem a maior extensão contínua de manguezais do mundo, e fica em segundo ou terceiro lugar entre os países com maior área de manguezal — a classificação muda de acordo com a metodologia aplicada.

E por que os manguezais são tão importantes?

Eles prestam uma série de “serviços”, de acordo com a professora do Instituto Oceanográfico da USP, Yara Schaeffer Novelli, e o biólogo e oceanógrafo Clemente Coelho Júnior, professor da Universidade de Pernambuco que está participando do trabalho de retirada de petróleo das praias.

Ambos são fundadores do BiomaBrasil, instituto que dá capacitações formal e informal sobre conservação da biodiversidade.

Eles citam algumas dessas funções dos manguezais:

1. Berçário natural: de 70% a 80% das espécies de importância econômica passam pelo menos uma fase da vida nos sistemas de manguezal, o que faz com que os mangues sejam conhecidos como os “berçários naturais” da vida marinha.

Ali, os filhotes ficam em seus primeiros estágios de desenvolvimento, aproveitando o ambiente mais calmo, onde as raízes das árvores dão proteção e eles. Como é um ambiente cheio de nutrientes, os filhotes também têm alimentação ali. Depois, migram para o mar aberto.

Manguezal em Pernambuco atingido por óleo no ano passado
 ( Foto: CLEMENTE COELHO JÚNIOR )

2. Protege de processo natural de erosão: o mangue atenua o processo de erosão costeiro, protegendo todo litoral. A pressão e energia do mar que atingiriam a costa são dissipadas no mangue.

“O manguezal protege as costas das ações de ressacas, de tsunamis. Isso foi bem provado no tsunami de 2004, no dia 26 de dezembro em Sumatra [Indonésia]. Onde ainda havia manguezal, as comunidades que estavam por trás dessa barreira natural foram menos prejudicadas que aquelas comunidades que já haviam substituído os manguezais por resorts, plantações de arroz e outros”, lembra Schaeffer Novelli.

3. Filtro biológico: a floresta tem capacidade de “digerir” matéria orgânica e absorver muitos nutrientes. Se esgoto é lançado no rio, por exemplo, os mangues filtram isso, retendo as substâncias, absorvendo nutrientes e acumulando em sua biomassa.

4. Retenção de sedimentos: os rios correm arrastando solo e sedimentos, e quando chegam no estuário as partículas se acumulam nas raízes do mangue. Isso significa que o mangue cuida do leito do rio, assoreando, retendo os sedimentos antes de chegarem ao mar, garantindo uma água mais limpa na zona costeira.

5. Combate ao aquecimento global: dentro dos ecossistemas, as florestas de mangue são as que mais sequestram carbono da atmosfera. Isso significa que o mangue ajuda a combater o aquecimento global. “O manguezal tem importância nesse contexto moderno das mudanças climáticas por ser muito eficiente fixador e acumulador de carbono”, diz Schaeffer Novelli.

6. Importância cultural e cênica: em muitas regiões as áreas de manguezal são tidas como sagradas. Além disso, sua beleza cênica é importante para o turismo.uas resoluções que protegiam áreas de preservação permanente como restingas e manguezais e restringiam o desmatamento e a ocupação nesses biomas foram derrubadas na manhã da segunda-feira (28/09) em reunião do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), convocada pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. As resoluções estavam em vigor desde 2002.

#Envolverde

Incêndios podem contribuir para morte lenta das onças-pintadas no Pantanal

 Agência Envolverde

  • Há aproximadamente 2 mil onças-pintadas vivendo no Corredor das Onças no Pantanal, e conservacionistas estimam que os incêndios impactaram o habitat de cerca de 600 delas, além de deixarem algumas mortas ou feridas.
  • As onças têm dificuldade de fugir porque os incêndios queimam também debaixo da terra, o que impede sua identificação visual.
  • O Pantanal, maior região alagada do mundo, sofre uma onda de incêndios desde o final de 2019. Estima-se que as chamas tenham destruído aproximadamente 3,3 milhões de hectares, ou 22% da região.
  • Embora não esteja totalmente claro de que forma os incêndios afetarão as populações de onças-pintadas no futuro, eles podem levar à insegurança alimentar e à instabilidade genética, de acordo com os specialistas.

Fernando Tortato costuma passar seu tempo analisando imagens de armadilhas fotográficas para monitorar as onças no Pantanal. Mas, nos últimos 45 dias, ele assumiu um novo papel, o de bombeiro, às vezes trabalhando em turnos exaustivos de 24 horas ininterruptas para ajudar a extinguir as chamas que vêm arrasando o Pantanal desde o final de 2019. Segundo Tortato, os incêndios parecem uma “onda que queima tudo”.

“No Pantanal, que é uma área alagada, normalmente temos alguns rios, riachos, lagoas e brejos que são barreiras naturais contra o fogo”, diz Tortato, pesquisador do programa de conservação de onças-pintadas da ONG Panthera. “Mas este ano, com esta condição – totalmente seca – as barreiras não funcionaram. E, com isso, o incêndio atingiu uma escala que nunca vimos antes.”

Fernando Tortato ajudando a apagar as chamas no Pantanal. 
Foto: Fernando Tortato/Panthera.

Somente em 2020, estima-se que os incêndios queimaram aproximadamente 3,3 milhões de hectares do Pantanal, o equivalente a 22% de toda a região, de acordo com dados compilados pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Acredita-se que muitos incêndios foram causados deliberadamente por pessoas abrindo terreno para a agricultura, mas a seca generalizada que aflige o Pantanal está ajudando a alimentar as chamas.

Muitas espécies foram afetadas pelo fogo, especialmente pequenos vertebrados como répteis e anfíbios, que não conseguem fugir com facilidade. Os conservacionistas também estão preocupados com as onças-pintadas (Panthera onca), animais que atraem um grande número de turistas para a região a cada ano. Por se tratar de uma espécie quase ameaçada, o número de onças já estava em tendência decrescente devido à perda e à fragmentação de habitat, bem como aos conflitos entre humanos e a fauna selvagem; e os incêndios podem exercer ainda mais pressão sobre esses felinos. Em meados de setembro, o Parque Estadual Encontro das Águas, em Porto Jofre (MT), onde está uma das maiores concentrações de onças-pintadas do mundo, teve 85% de sua área afetados pelo fogo.

Embora a população total de onças-pintadas nas Américas Central e do Sul seja estimada entre 65 mil e 170 mil indivíduos, o Corredor das Onças do Pantanal abriga uma população pequena, porém vital, de cerca de 2 mil indivíduos, de acordo com Howard Quigley, diretor-executivo de ciência da conservação da Panthera e integrante do grupo especializado em felinos da UICN (União Internacional pela Conservação da Natureza).

Considerando a quantidade de terras queimadas no Pantanal, acredita-se que aproximadamente 600 onças-pintadas tiveram seu habitat impactado pelo fogo, o que pode levar a problemas de insegurança alimentar para a espécie, diz Quigley. Também é provável que muitas onças tenham morrido ou ficado feridas pelos incêndios. Até agora, a equipe da Panthera e seus parceiros encontraram uma onça morta e quatro com queimaduras.

Onça-pintada fêmea resgatada com queimaduras nas patas. Foto: Abigail Martin.

“No panorama mais amplo da viabilidade das onças-pintadas, isso pode ser visto como apenas mais um sinal no radar de sobrevivência da espécie, tendo pouco impacto geral”, diz Quigley. “Por outro lado, as onças podem estar vivendo uma morte lenta, e isso é grave.”

“A sobrevivência das onças está fortemente ligada a duas coisas: a segurança dos núcleos populacionais e o movimento dos animais pelas terras entre esses núcleos, os corredores, cuja combinação forma o Corredor das Onças”, acrescenta Quigley. “Olhando apenas para o Pantanal, esses incêndios certamente não ajudam na segurança da população local de onças-pintadas.”

As maiores populações de onças do Pantanal estão localizadas perto do Gran Chaco, no Paraguai, e do Parque Nacional Noel Kempff Mercado, na Bolívia, segundo Quigley. Se os incêndios afetarem severamente essas populações, a espécie pode passar por uma instabilidade genética no futuro, afirma.

“Com os incêndios na Bolívia no ano passado, este pode ser um golpe duplo para a população regional de onças, embora não seja um nocaute, até onde sabemos”, explica Quigley.

Para as onças, fugir das chamas não é um processo simples. Muitos dos incêndios queimam também sob o solo e não são detectáveis visualmente, o que torna difícil evitá-los, explica Tortato.

“Elas podem queimar as patas porque não conseguem ver o fogo”, diz ele. “Identificar esses lugares [onde o fogo está queimando] é tão difícil para os animais quanto para nós.”

A equipe da Panthera vem trabalhando com o governo, comunidades locais e outras organizações para tentar salvar o maior número possível de animais selvagens. Até agora, eles ajudaram uma tartaruga, duas serpentes, vários iguanas e duas onças, entre elas uma fêmea de quatro anos chamada Glória, resgatada por membros da comunidade com queimaduras severas nas patas.

Equipe da ONG Panthera combatendo um incêndio no Pantanal. 
Foto: Fernando Tortato/Panthera.

“Quando as pessoas perceberam que ela estava procurando refúgio em torno da comunidade, agiram imediatamente para salvá-la”, contou Rafael Hoogesteijn, diretor do programa de conflitos do projeto de conservação das onças da Panthera, num blog. “Em outras partes da América Latina, ela teria sido morta na hora. Mas, nessa região do Pantanal, a relação entre as pessoas e a vida selvagem é tão profunda que a comunidade fez tudo o que podia para salvá-la. Eles mantiveram o grande felino de quatro anos vivo até que pudesse ser levado para um centro de resgate e receber tratamento médico. Glória está se recuperando bem, e os veterinários continuam monitorando-a na esperança de soltá-la no futuro.”

A equipe também trabalha para ajudar os moradores locais, muitos dos quais já estão sofrendo por causa da pandemia de covid-19 que afetou bastante os lucros do turismo este ano.

Esta semana começou a chover no Pantanal. Embora a região sul tenha recebido bastante água, a parte norte só teve chuvas leves até agora. “Não é suficiente para apagar os incêndios”, constata Tortato. Ainda assim, ele e seus colegas têm esperança de que a região se recupere ecologicamente, pelo menos em certa medida, depois que as chuvas finalmente chegarem.

Imagem aérea dos incêndios na região do Pantanal. Foto: Fernando Tortato/Panthera.

“Talvez o Pantanal não seja mais o mesmo, mas deve criar uma nova composição da vida selvagem”, diz Tortato. “Não sabemos. Normalmente as pesquisas mostram mais perguntas do que respostas. Este é o problema.”

Embora ainda não esteja claro como os incêndios influenciarão as populações de onça-pintada no futuro, há um fator positivo para a espécie. No Pantanal, as onças predam jacarés e capivaras e, nesta época do ano, essas espécies tendem a viver na água, o que provavelmente as salvou do fogo. A abundância desses animais será uma fonte fácil de alimento para as onças-pintadas sobreviventes.

“As onças devem ter comida suficiente nos próximos meses se tomarem ou mantiverem territórios que se sobrepõem a esses corpos d’água”, diz Quigley. “O problema então passa a ser como elas sobreviverão na estação chuvosa, quando as principais presas se dispersam pela imensa extensão de água que é o Pantanal de janeiro a maio.”

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Nasa lança plataforma que pode revolucionar a análise de incêndios na Amazônia

 

Nasa lança plataforma que pode revolucionar a análise de incêndios na Amazônia

Por Shanna Hanbury / Tradução de Carol de Marchi*

A nova ferramenta de monitoramento de incêndios Amazon Dashboard, lançada em 19 de agosto pela Nasa, apresenta grandes avanços sobre a forma como o fogo na Amazônia é monitorado. A plataforma utiliza coleta automatizada de dados e análise computadorizada para identificar, quase em tempo real, quais são os incêndios que estão devastando a floresta neste momento.

Até recentemente, as queimadas na Amazônia eram rastreadas pela contagem de focos de incêndio, prática que não detalhava o número nem o tamanho dos incêndios reais, além de não informar com precisão as áreas impactadas, as emissões de carbono ou o tipo de incêndio. Tudo isso a nova feramenta da agência espacial norte-americana já consegue detectar.

“Por mais valiosa que seja a informação sobre o fogo ativo, usada para rastrear índices mensais ou anuais, ainda é um cenário incompleto do que está acontecendo”, afirma Douglas Morton, responsável pela nova ferramenta, uma criação do Laboratório de Ciências Biosféricas do Centro de Voos Espaciais Goddard.

“Nossa equipe queria fornecer mais contexto sobre os tipos, o tamanho e o crescimento dos incêndios ao longo do tempo. São elementos cruciais para potencialmente combatê-los em locais remotos”, explica Morton.

O novo sistema da agência espacial norte-americana consegue identificar os incêndios em áreas desmatadas, aqueles que ocorrem no sub-bosque da floresta, as queimadas em pastagens e aquelas causadas anualmente por agricultores de subsistência para limpar campos já existentes.

Os incêndios florestais de sub-bosque um dos tipos mais destrutivos na Amazônia — passaram quase totalmente despercebidos nos anos anteriores, pois os satélites eram incapazes de registrá-los. Com chamas muitas vezes menores que 1 metro de altura, os incêndios florestais de sub-bosque penetram na folhagem densa, deixando um rastro de queimadas impossível de ser visto a distância, oculto sob as copas das árvores amazônicas, algumas de até 50 metros de altura.

A partir de agora, utilizando dados infravermelhos mais sensíveis durante as passagens noturnas dos satélites Suomi NPP e NOAA-20, a Nasa pode detectar esses incêndios devastadores quase em tempo real.

Incêndios na Amazônia em 1 de agosto de 2020 na divisa entre os estados do Amazonas, Pará e Mato Grosso (inferior), captados pela nova ferramenta da Nasa. A linha vertical à direita é a rodovia BR-163, que facilita
o acesso dos grileiros à floresta. A fumaça à esquerda da BR-163 é uma queimada ilegal na
Floresta Nacional de Jamanxim. A grande área desmatada à direita com fumaça é a Bacia do Xingu.
A fumaça na extrema esquerda se eleva sobre a Bacia do Tapajós. Na Amazônia, os grandes incêndios quase sempre bordejam áreas desmatadas, indicando provável desmatamento ilegal para criação de gado.

Precisos e acessíveis, os dados da Nasa podem ajudar administradores de terras a identificar e a extinguir incêndios florestais em locais remotos antes que eles se tornem grandes demais, além de contribuir para a exposição dos criminosos causadores das queimadas. A detecção mais apurada dos incêndios realizados em pequenas fazendas familiares e em comunidades tradicionais permite que as operações de fiscalização se concentrem exclusivamente no que realmente importa: o combate a redes criminosas de desmatamento em larga escala e a prevenção e contenção de incêndios em áreas de alto risco.

“É pioneiro. Uma revolução em nosso campo. Nós poderíamos reagir rapidamente e deter estes incêndios florestais”, diz Erika Berenguer, bióloga e especialista em Amazônia da Universidade de Oxford. “Podemos separar os incêndios provenientes do desmatamento e da agricultura dos incêndios florestais, que são muito mais difíceis de identificar. Na verdade, não sabemos quanto fogo se alastra para a floresta, mas é uma proporção considerável.”

A nova ferramenta de análise de incêndios da Nasa chega em um momento crítico. Encontrar soluções nunca foi tão urgente, pois a Floresta Amazônica caminha em direção a um ponto de inflexão que pode transformá-la em savana — sucumbindo à seca induzida pela mudança climática, ao desmatamento desenfreado e ao recorde de incêndios anuais ocorridos sob a liderança do presidente Jair Bolsonaro, um entusiasta dos interesses do agronegócio e da mineração industrial na região amazônica.

Dados podem ajudar a conter futuros incêndios florestais

Os incêndios florestais em sub-bosques podem começar em fazendas ou em pastagens e eventualmente
atingem a floresta. As árvores danificadas pelo fogo morrem, transformando-se em combustível e
tornando a floresta mais vulnerável a futuros incêndios. Foto: Sérgio Vale/Amazônia Real

Para os pesquisadores, o novo sistema da agência espacial norte-americana não poderia ter vindo em melhor hora. “Este ano, a Amazônia teve mais incêndios do que no ano passado, mas você não saberia disso olhando para o número total de pixels vermelhos na tela”, diz Morton. “Nem todas as detecções de incêndio são de igual importância”.

O fogo em áreas recentemente desmatadas e os incêndios florestais de sub-bosque são os mais preocupantes para os cientistas, pois são eles que emitem mais carbono, ocasionando os maiores danos à floresta tropical e à biodiversidade.

Liana Anderson, pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), trabalha com sua equipe na quantificação dos impactos do fogo na Amazônia. Uma melhor compreensão do custo real dos incêndios na Amazônia, diz ela, poderia ajudar a planejar o orçamento anual para o combate e prevenção de queimadas. “Neste momento de crise, precisamos de incentivos para que a ciência seja considerada na tomada de decisões e em problemas que afetam a sociedade”, diz ela.

Estimativas baseadas em dados de 2008 a 2012 no Acre sugerem que os danos causados pelos incêndios podem totalizar 7% do PIB da Amazônia. “Eles danificam a infra-estrutura, como cercas entre fazendas, linhas de transmissão elétrica e estradas. A fumaça prejudica a saúde [humana], o que gera um custo. Há também perdas para a produção agrícola e, em casos mais raros, [o fogo] pode até interromper o tráfego aéreo”, diz Liana Anderson. Segunda ela, a nova ferramenta poderia ajudar a quantificar os danos financeiros, justificando um melhor controle de incêndios para os governos federal e estaduais.

Separando criminosos de pequenos proprietários 

Em agosto, no município de Canaã dos Carajás, um incêndio isolado ocorreu em uma área que provavelmente era um pequeno pasto, de acordo com a nova ferramenta da Nasa. As chamas não duraram muito e não afetaram a floresta. Eram características do fogo utilizado por pequenos proprietários de terras para renovar o solo em fazendas familiares, garantindo o abastecimento alimentar local.

No entanto, em 15 de julho, Jair Bolsonaro decretou uma proibição de queimadas por 120 dias, tornando ilegais todos os incêndios intencionais na Amazônia até outubro, com uma exceção feita apenas para as comunidades indígenas e tradicionais.

“Essa proibição criminalizou os pequenos proprietários de terra e estimulou o uso desordenado de fogo entre as comunidades rurais pobres, ao mesmo tempo em que distraiu as autoridades de grandes grileiros”, diz Sonaira Silva, agrônoma da Universidade Federal do Acre. “Eles têm receio de serem multados e sentem que podem alegar que o incêndio não foi intencional se o fogo não parecer organizado.”

Segundo ela e outros pesquisadores, a ferramenta da Nasa poderia ajudar a acabar com esse problema, uma vez que é capaz de fazer a distinção entre queimadas de desmatamento e pequenos incêndios agrícolas. Isso permite que as autoridades filtrem os fogos de baixo impacto e foquem nos agentes criminosos de maior escala na Amazônia.

“Não podemos ter fogo zero na Amazônia. Essas proibições que vêm de cima para baixo não são efetivas, porque precisamos ser capazes de separar quem é quem: pessoas que causam a destruição criminosa da floresta tropical e pequenos proprietários que usam o fogo como seu único meio de garantir a alimentação”, conclui Sonaira Silva.

Dados de um grande incêndio florestal próximo à Terra Indígena Baú (PA), comparado ao que
pode ser um pequeno incêndio de pastagem no município de Canaã dos Carajás, ambos no Pará.
A diferença no tamanho e impacto do fogo demonstra que os incêndios podem ser priorizados.
Dados do Banco de Dados de Emissões de Incêndios da Nasa na Amazônia.

Foto (destaque): Sérgio Vale/Amazônia Real

*Este texto foi publicado originalmente no site Mongabay Brasil em 23/9/2020

Agência de notícias sem fins lucrativos que visa aumentar o interesse e a valorização de terras e animais selvagens, ao examinar o impacto das tendências emergentes no clima, na tecnologia, na economia e nas finanças em conservação e desenvolvimento. Seu objetivo é inspirar, educar e informar

Ministra do STF dá 48 horas para Salles explicar decisão do Conama de revogar normas que protegem restinga e manguezais

 

Ministra do STF dá 48 horas para Salles explicar decisão do Conama de revogar normas que protegem restinga e manguezais

Hoje, 1/1, a tentativa de Ricardo Salles, ministro do meio ambiente, de colocar em risco áreas de preservação ambiental como restinga e mangue sofreu mais um revés. Desta vez, foi a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), quem se manifestou.

Weber determinou que o ministro explique, em 48 horas, a decisão do Conama – Conselho Nacional do Meio Ambiente de revogar três resoluções do órgão (como contamos aqui) que tratam de projetos de irrigação e da proteção de Áreas de Preservação Permanente (APPs) como restinga, manguezais e mananciais urbanos.

“Diante da urgência qualificadora da tutela provisória requerida e da relevância do problema jurídico-constitucional posto, requisitem-se informações prévias ao Ministro de Estado do Meio Ambiente , a serem prestadas no prazo de 48 horas. Dê-se ainda vista ao Advogado-Geral da União e ao Procurador-Geral da República, no mesmo prazo”, ordenou a ministra.

Pressa e nova norma

A decisão do conselho que alarmou e revoltou ambientalistas, organizações e a sociedade civil foi tomada em reunião marcada por Salles, às pressas, na segunda-feira passada, 28/9, que durou pouco mais de três horas.

No encontro, a maioria dos integrantes do conselho ainda aprovou uma nova resolução, que autoriza a incineração de embalagens e resíduos de agrotóxico em fornos para produção de cimento, o que segundo especialistas, traz riscos de contaminação a todos que estiverem na área.

Justiça Federal suspende revogação e PT ajuiza ação no STF

No dia seguinte, em 29/1, a Justiça Federal do Rio de Janeiro acolheu ação popular contra a medida do Conama – focada nas normas que regem as áreas de vegetação citadas acima – e suspendeu a decisão do Conama, por meio de uma liminar. Agora, o assunto deve ser analisado pela Advocacia Geral da União (como contamos aqui).

No mesmo dia, o Partido dos Trabalhadores (PT) ajuizou, no Supremo Tribunal Federal (STF), uma ação contra a decisão do Conama: a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 747 contra a Resolução 500/2020 do Conama, que foi atribuída à ministra Rosa Weber. Ou seja, ela é sua relatora.

Aliás, por que Rosa Weber não aprovou a oportunidade para analisar a ação movida no ano passado contra o Decreto 9.806/2019, com o qual Salles desmantelou o Conama, em maio? A entao Procuradora Geral da República, Rachel Dodge tentou anular o decreto, mas o governo reagiu. O processo foi parar no STF e, em setembro, Weber tornou-se sua relatora e o engavetou.

Foto: Rosinei Coutinho/STF

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Deputados pedem ao Ministério Público de Minas Gerais investigação sobre repasses de taxa de fiscalização da mineração

 

Deputados pedem ao Ministério Público de Minas Gerais investigação sobre repasses de taxa de fiscalização da mineração

Ano passado, apenas 38% desta taxa foi repassada ao Sistema Estadual de Meio Ambiente. Por lei, o repasse deveria ser integral.

Área atingida pelo rompimento da barragem um ano após a tragédia da Vale, em Brumadinho — Foto: Raquel Freitas/G1

O deputado federal Rogério Correia (PT) e a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT) entraram com uma representação no Ministério Público de Minas Gerais para pedir que sejam investigadas possíveis irregularidades nos repasses da Taxa de Fiscalização de Mineração (TFRM) ao Sistema Estadual do Meio Ambiente.

Na representação, os deputados citam reportagem do G1 do dia 23 de setembro, que revelou que, no ano do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, que resultou na morte de 270 pessoas, o governo de Minas arrecadou R$ 319 milhões da TFRM. O valor deveria ser repassado integralmente para as atividades de fiscalização. Mas, conforme relatório do Ministério Público de Contas, apenas 38% deste valor foi destinado à pasta.

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A destinação deste recurso está prevista na Lei 22.796/17, criada pela Comissão Extraordinária das Barragens logo após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, em 2015. O deputado Rogério Correia era o relator da comissão.

A maior tragédia ambiental do país matou 19 pessoas, devastou distritos e percorreu o Rio Doce até a foz, no Espírito Santo.

No documento, os deputados afirmam que a lei não tem brechas para diferentes interpretações e que, comprovado o descumprimento por parte do governo, o gestor deve responder por crime de responsabilidade. E finalizam pedindo que sejam aplicadas, aos responsáveis, “as penalidades previstas nas esferas administrativa, cível e penal”.

G1 entrou em contato com o Ministério Público para saber sobre o andamento das apurações, mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem.

O governo de Minas também foi procurado para falar sobre a representação, mas ainda não se posicionou. Quando a reportagem do G1 foi publicada em 23 de setembro, foi emitida a nota abaixo:

“A Secretaria de Fazenda informa que ainda que os valores empenhados pelos órgãos e entidades do SISEMA estejam menores do que os valores efetivamente arrecadados e vinculados, os recursos não utilizados dentro do exercício financeiro em que são arrecadados permanecem legalmente atrelados a essas unidades, não tendo sido utilizados em nenhum outro órgão. Seguindo estritamente o que é determinado pela Lei 4.320/64, os recursos permanecem vinculados a essas entidades e serão utilizados em exercício futuros, mediante suplementação por superávit financeiro”.

Fonte: G1


Passando a boiada: 5 momentos nos quais Ricardo Salles afrouxou regras ambientais

 

Passando a boiada: 5 momentos nos quais Ricardo Salles afrouxou regras ambientais

Desde o começo da gestão, Ricardo Salles criou regras mais favoráveis para infratores ambientais – REUTERS

“Precisa ter um esforço nosso aqui, enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só se fala de covid, e ir passando a boiada, e mudando todo o regramento (ambiental), e simplificando normas”.

A frase é famosa: foi dita pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na reunião ministerial do dia 22 de abril, e tornada pública por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

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Apesar disso, segundo ambientalistas e procuradores ouvidos pela BBC News Brasil, Ricardo Salles já está trabalhando para “passar a boiada” desde o começo de sua gestão, em janeiro de 2019, muito antes da pandemia do novo coronavírus.

Desde que assumiu a pasta, o ministro criou regras que dificultaram a aplicação de multas; transferiu poderes do Ministério do Meio Ambiente para outras pastas; e tentou mudar o entendimento sobre normas como a Lei da Mata Atlântica.

A última tentativa de Salles de remover regulamentações ambientais aconteceu nesta segunda-feira (28). Em reunião convocada dias antes pelo ministro, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) revogou quatro resoluções que tratavam de diferentes áreas da política ambiental do país.

Duas das resoluções eliminadas restringiam o desmatamento e a ocupação em áreas de restinga, manguezais e dunas. Na prática, o fim das resoluções, que estavam em vigor desde 2002, criou a possibilidade de ocupação em áreas de restinga numa faixa de 300 metros a partir da praia. Antes, essas áreas eram consideradas como sendo de proteção ambiental.

Na mesma reunião, o Conama também permitiu a queima de lixo tóxico — como embalagens de defensivos agrícolas, por exemplo — em fornos usados originalmente para a produção de cimento. Além disso, o conselho também derrubou uma resolução que criava normas para projetos de irrigação.

A decisão do Conselho é controversa.

Segundo o advogado especializado em direito ambiental Rodrigo Moraes, a decisão foi juridicamente correta, pois as resoluções que foram revogadas seriam ilegais.

As normas foram criadas para regulamentar uma versão anterior do Código Florestal, de 1965, que foi revogado com a edição do novo código, em 2012. Assim, estas também teriam perdido a eficácia, argumenta Moraes. Além disso, diz ele, a exigência de preservar a faixa de 300 metros depois do mar não estava presente na lei original — assim, o Conselho de meio ambiente teria “legislado” de forma indevida ao criar a norma, em 2002.

Já ambientalistas argumentam que a decisão do Conselho foi feita sob medida para atender a setores econômicos.

“Mesmo com a revogação das resoluções, a proteção dos mangues, dunas e restingas continuarão a existir pelas regras do Novo Código Florestal, pela Lei da mata Atlântica e ainda pelas regras constitucionais”, argumenta o advogado.

Segundo o deputado federal Rodrigo Agostinho (PSB-SP), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso, o “revogaço” agrada ao mercado imobiliário, que deseja erguer prédios em áreas protegidas à beira-mar; a criadores de camarão que querem construir seus tanques dentro de manguezais; e ao agronegócio, que deseja menos regulamentações nas suas operações com irrigação e agrotóxicos.

Agostinho também rebate o argumento de que as resoluções seriam ilegais. “Tivemos algumas decisões do Judiciário confirmando que as resoluções tinham sido recepcionadas (pelo novo Código Florestal) e estavam em vigor. Agora, ficou uma lacuna. A regulamentação que tinha para manguezais e restingas deixou de existir”, disse ele à BBC News Brasil.

Incêndios na Amazônia se intensificaram nos últimos dois anos – REUTERS

No começo da noite desta terça-feira (29/09), a decisão do Conama que revogou as resoluções foi anulada pela Justiça Federal. É uma decisão liminar (provisória) da juíza Maria Amélia Almeida Senos de Carvalho, da 23ª Vara Federal do Rio de Janeiro. Ela atendeu a uma ação popular formulada por um grupo de advogados. Cabe recurso.

Em entrevista ao canal de TV CNN Brasil, nesta quarta-feira (30/09), Salles disse que a pasta vai recorrer da decisão. Ele também lembrou que já existiam estudos para revogar as resoluções desde a gestão da ex-ministra Izabella Teixeira (2010-2016), ainda nos governos do PT.

Improbidade administrativa

Por conta das constantes ‘boiadas’, um grupo de procuradores do Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação de improbidade administrativa contra Ricardo Salles, pedindo que a Justiça Federal o afaste do cargo. O caso está atualmente nas mãos do desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Brasília).

“O que se percebe é que existe uma desestruturação das políticas (ambientais), o que repercute nas violações (de direitos) e nas ilegalidades que são discutidas na ação judicial (de improbidade)”, diz o procurador Júlio Araújo, um dos autores da ação.

“Quando se desestrutura a política, não se trata de um mero rearranjo, uma mera reorganização. Você cria condições para que não haja a efetiva proteção daquele bem jurídico, daquela pauta a que está destinada a pasta. É por isso que nós colocamos essa questão no campo da improbidade administrativa. Ela está fora do quadrante da possibilidade de escolha do gestor”, explica Araújo, que integra a Força-Tarefa Amazônia do MPF.

“É uma atuação (a de Salles) em sentido contrário ao que se deveria minimamente organizar. Não significa que deve (a atuação do ministro) ser de um jeito ou de outro. Ao longo dos últimos 30 anos, isso foi… cada gestor procurou dar uma orientação. Agora, desestruturar, esvaziar a política ambiental, isso não é permitido. Por isso a ação de improbidade”, diz ele à BBC News Brasil.

A reportagem da BBC News Brasil procurou o Ministério do Meio Ambiente para comentar o assunto, mas não houve resposta até o fechamento desta reportagem.

Mas quais foram as outras tentativas de afrouxar a proteção ambiental no país? A BBC News Brasil cita algumas decisões que vão nesse sentido.

1. Abrir mão do poder de conceder florestas públicas

Em meados de maio, o presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido) e Ricardo Salles assinaram um decreto transferindo do Ministério do Meio Ambiente para o Ministério da Agricultura o poder de conceder as florestas nacionais.

A concessão ocorre quando o governo dá a uma empresa privada o direito de explorar uma área de floresta, por meio da prática conhecida como manejo florestal, em troca de algum tipo de contrapartida. O concessionário pode usar a área para cortar madeira de forma sustentável ou para turismo, por exemplo.

Pouco depois, a Justiça Federal interveio no assunto e suspendeu os efeitos do decreto. Para o juiz federal Henrique Jorge Dantas da Cruz, que analisou o caso, a mudança não poderia ter sido feita por decreto, pois seria necessária a aprovação do Congresso Nacional.

Da mesma forma como as atribuições de cada ministério são definidas em lei, também é preciso uma lei aprovada pelo Congresso para mudá-las, e não um simples decreto do Executivo, entendeu o magistrado.

2. Tentar afrouxar a proteção à Mata Atlântica

No dia 6 de abril, Salles publicou um despacho aprovando um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a Lei da Mata Atlântica.

Na prática, o despacho de Salles obrigou os órgãos ambientais do governo federal, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a adotar o entendimento presente no Código Florestal, mais brando, ao invés daquele da Lei da Mata Atlântica, mais restritivo.

A mudança possibilitava, entre outras coisas, a regularização de desmatamentos ilegais em áreas de preservação permanente (APPs) na Mata Atlântica, que é considerado o bioma mais ameaçado do país.

Mais uma vez, a tentativa de afrouxar normas foi frustrada: no começo de junho, o próprio Salles revogou a despacho, que estava sendo contestado na Justiça pelo Ministério Público Federal e por órgãos da área ambiental.

Ao desistir do despacho, o governo decidiu ingressar com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal, de modo a evitar futuros questionamentos jurídicos.

O presidente Jair Bolsonaro assinou decreto transferindo do Ministério do Meio Ambiente para o Ministério da Agricultura o poder de conceder as florestas nacionais. – REUTERS

3. A ‘audiência de conciliação’ para multas ambientais

Em abril de 2019, Ricardo Salles e Jair Bolsonaro assinaram decreto criando a necessidade de uma “audiência de conciliação” entre fiscais e infratores, sempre que houver a aplicação de uma multa ambiental.

As tais audiências nunca “pegaram”: dados obtidos pela ONG Observatório do Clima mostram que, de outubro de 2019 até agosto deste ano, foram realizadas apenas cinco audiências deste tipo pelo Ibama, e nenhuma pelo ICMBio. O número é muito menor que a quantidade de multas aplicadas pelos dois órgãos no período.

Na prática, o decreto das “audiências de conciliação” criou mais um gargalo para a aplicação de multas ambientais, contribuindo para a diminuição da atividade da fiscalização, de acordo com servidores e ex-dirigentes do Ibama.

“O número de autuações lavradas é um dado importante que pode traduzir o esforço do governo em punir realmente aqueles que cometem crimes ambientais. Quanto menor a presença da fiscalização em campo, fazendo o seu trabalho de responsabilizar os infratores, maior a sensação de impunidade”, disse um servidor do Ibama à BBC News Brasil em meados de setembro deste ano, sob condição de anonimato.

4. Mudanças no Conselho Nacional do Meio Ambiente

Conselheiros revogaram duas resoluções, em vigor desde 2002, que protegiam áreas de preservação permanente como restingas e manguezais – CLEMENTE COELHO JÚNIOR/DIVULGAÇÃO

A revogação das normas ambientais desta segunda-feira não seria possível sem um passo anterior: a mudança na composição do Conselho Nacional do Meio Ambiente, o Conama.

A mudança foi feita por decreto, em maio de 2019, e envolveu uma mudança drástica na composição do colegiado.

O número de integrantes caiu de 96 para 23, e a proporção de representantes do governo federal aumentou em relação aos indicados por governos estaduais e ONGs ambientalistas.

Além disso, também foram suprimidos os representantes sem direito a voto, indicados pelo Ministério Público Federal, pelos Ministérios Públicos dos Estados e pela Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados.

5. Exoneração de fiscais logo depois de ação em terras indígenas

No fim de abril deste ano, Ricardo Salles decidiu exonerar o então coordenador-geral da fiscalização ambiental do Ibama, Renê Luiz de Oliveira, e o coordenador de operações de fiscalização, Hugo Ferreira Netto Loss. Pouco antes, tinha sido demitido o diretor de Proteção Ambiental do órgão, Olivaldi Azevedo.

O que poderia ser um ato administrativo normal — a remoção de servidores de cargos de chefia — passou a ser criticado por ambientalistas por causa do momento em que aconteceu: as demissões foram feitas logo depois que o Ibama realizou operações bem sucedidas contra garimpeiros ilegais em terras indígenas no Pará.

Entre janeiro e abril de 2020, foram várias as operações em quatro terras indígenas naquele Estado: Ituna-Itatá, Apyterewa, Cachoeira Seca e Trincheira Bacajá. Os resultados foram expressivos. Em uma única etapa de operações nas terras indígenas, em abril de 2020, foram destruídos pouco mais de 100 equipamentos usados por garimpeiros, como serras, tratores e veículos.

Pouco antes das demissões serem efetivadas, um grupo de 16 fiscais do Ibama enviou carta à presidência do Instituto pedindo a manutenção de Renê Oliveira e Hugo Ferreira em seus cargos, o que não aconteceu.

Fonte: BBC

Pecuária polui mais do que soma de carros e vans na União Europeia

 

Pecuária polui mais do que soma de carros e vans na União Europeia

Greenpeace afirma que as políticas ambientais têm que incluir a pecuária em suas prioridades para combater a crise climática

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Foto: Pixabay
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Gado, porcos e outras criações de animais na Europa estão emitindo mais gases responsáveis pelo efeito estufa do que o total anual emitido por todos os carros e vans do continente. Esta análise do Greenpeace leva em consideração o impacto que a alimentação destes animais tem para as mudanças climáticas.

O aumento da produção de carne, leite e derivados na última década transformou a pecuária em uma grande fonte de emissões e, enquanto as políticas ambientais focaram no transporte e energias renováveis como solução para conter o aquecimento global, esta atividade foi deixada de lado.

Em 2018, ultimo ano com dados disponíveis na UN Food and Agriculture Organization, a pecuária nas fazendas europeias, incluindo o Reino Unido, foi responsável pela emissão 502 milhões de toneladas de dióxido de carbono por ano. Número comparável às 656 milhões de toneladas emitidas por todos os carros e vans da Europa no mesmo ano.

Alimentação animal

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Mas, quando a emissão indireta de gases é calculada, por meio de métodos que consideram as áreas desmatadas para a produção de ração ou pastagens, o total de emissão gerado pela pecuária europeia chega a 704 milhões de toneladas de dióxido de carbono.  

Estes cálculos estão disponíveis em um relatório publicado pelo Greenpeace, chamado de Farming for Failure – algo como “cultivando para o fracasso”.

A produção de carne e leite da União Europeia cresceu 9,5% entre 2007 e 2018. De acordo com o Greenpeace isso significa um aumento de 6% nas emissões anuais, cerca de 39 milhões de toneladas, ou o equivalente a colocar 8,4 milhões de veículos a mais nas ruas.

Se esta tendência se mantiver, a União Europeia terá poucas chances de atingir as suas metas de redução nas emissões estabelecidas pelo Acordo de Paris.

Marco Contiero, diretor de políticas agrícolas do Greenpeace, afirma que as políticas ambientais têm que incluir a pecuária em suas prioridades, ou as metas de redução de carbono não serão atingidas.

“A ciência é clara, assim como os numeros: não Podemos evitar o pior da crise climática se as políticas continuarem a favorecer a produção de carne e leite.”

Redução radical

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Cortar 50% da produção animal na Europa vai eliminar a emissão de cerca de 250 milhões de toneladas de gases do efeito estufa por ano, um número que é quase igual às emissões de 11 dos países menos poluidores do continente.

Um porta-voz dos pecuaristas do reino Unido disse que os Produtores estão fazendo a sua parte e tem como meta neutralizar suas emissões de carbono até 2040. A pecuária é responsável por 10% das emissões do Reino Unido, sem considerar a produção de alimentos para os animais.

“Se quisermos atingir a neutralidade em carbono, precisamos cortar todas as nossas fontes de emissão”, declarou o porta-voz. “O foco em aumentar a produtividade é chave, além de manter e aumentar nosso sequestro de carbono em áreas verdes e o uso de energias renováveis”.

O Greenpeace sugere o fim de subsídios governamentais para pecuária nas políticas ambientais europeias, como parte de uma retomada verde.

É difícil que esta ideia vença os poderosos interesses que a atividade tem nos diversos países europeus, mas os opositores do fim de subsídio aos pecuaristas vão precisar apresentar outras maneiras de se atingir as metas para redução na emissão de carbono sem mudanças de larga-escala no setor agropecuário.


 

Governo de São Paulo é processado por financiar aquecimento global

Movimento de Famílias pelo Clima questiona na justiça investimento bilionário na indústria automotiva sem contrapartida climática