Salles, que foi gravado neste ano
dizendo que era preciso aproveitar a pandemia para “passar a boiada” de
aprovação de flexibilização de leis ambientais, já havia reduzido o
número de entidades da sociedade que fazem parte do Conama em 2019. O
conselho é o principal órgão consultivo do ministério e tinha
participação de 96 entidades — hoje, tem 23 membros.
Além das resoluções 302 e 303, que
protegem os manguezais, a reunião derrubou a resolução 284/2001, que
estabelecia critérios de eficiência de consumo de água e energia
necessários para aprovação de projetos de irrigação.
O ministério também liberou a
queima de lixo tóxico em fornos usados para produção de cimento — a
Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que essa queima seja feita
em ambiente controlado.
O governo diz que as questões tratadas nas resoluções foram incorporadas por leis aprovadas depois, como o Código Florestal.
Mas especialistas em ambiente
afirmam que essas resoluções eram as únicas normas que de fato protegiam
esses biomas, essenciais para manutenção do equilíbrio ambiental no
país e no mundo.
Restingas são áreas de vegetação encontradas em regiões arenosas de praias e em dunas.
Manguezais são ecossistemas
costeiros, de transição entre a terra e o mar, que ficam em regiões
tropicais e subtropicais do planeta. É ali onde ficam aquelas plantas
retorcidas por cima da lama escura que, de acordo com a maré, ora ficam
cobertas pela água salgada do mar, ora ficam expostas com as raízes
fincadas na água que se mistura à dos rios.
O Brasil tem quase 14 mil
quilômetros quadrados de áreas de manguezais, segundo o Atlas dos
Manguezais do Brasil, um documento produzido pelo ICMBio (Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) publicado em 2018.
Além disso, o país tem a maior
extensão contínua de manguezais do mundo, e fica em segundo ou terceiro
lugar entre os países com maior área de manguezal — a classificação muda
de acordo com a metodologia aplicada.
E por que os manguezais são tão importantes?
Eles prestam uma série de
“serviços”, de acordo com a professora do Instituto Oceanográfico da
USP, Yara Schaeffer Novelli, e o biólogo e oceanógrafo Clemente Coelho
Júnior, professor da Universidade de Pernambuco que está participando do
trabalho de retirada de petróleo das praias.
Ambos são fundadores do BiomaBrasil, instituto que dá capacitações formal e informal sobre conservação da biodiversidade.
Eles citam algumas dessas funções dos manguezais:
1. Berçário natural: de 70% a 80%
das espécies de importância econômica passam pelo menos uma fase da vida
nos sistemas de manguezal, o que faz com que os mangues sejam
conhecidos como os “berçários naturais” da vida marinha.
Ali, os filhotes ficam em seus
primeiros estágios de desenvolvimento, aproveitando o ambiente mais
calmo, onde as raízes das árvores dão proteção e eles. Como é um
ambiente cheio de nutrientes, os filhotes também têm alimentação ali.
Depois, migram para o mar aberto.
2. Protege de processo natural de
erosão: o mangue atenua o processo de erosão costeiro, protegendo todo
litoral. A pressão e energia do mar que atingiriam a costa são
dissipadas no mangue.
“O manguezal protege as costas das
ações de ressacas, de tsunamis. Isso foi bem provado no tsunami de 2004,
no dia 26 de dezembro em Sumatra [Indonésia]. Onde ainda havia
manguezal, as comunidades que estavam por trás dessa barreira natural
foram menos prejudicadas que aquelas comunidades que já haviam
substituído os manguezais por resorts, plantações de arroz e outros”,
lembra Schaeffer Novelli.
3. Filtro biológico: a floresta tem
capacidade de “digerir” matéria orgânica e absorver muitos nutrientes.
Se esgoto é lançado no rio, por exemplo, os mangues filtram isso,
retendo as substâncias, absorvendo nutrientes e acumulando em sua
biomassa.
4. Retenção de sedimentos: os rios
correm arrastando solo e sedimentos, e quando chegam no estuário as
partículas se acumulam nas raízes do mangue. Isso significa que o mangue
cuida do leito do rio, assoreando, retendo os sedimentos antes de
chegarem ao mar, garantindo uma água mais limpa na zona costeira.
5. Combate ao aquecimento global:
dentro dos ecossistemas, as florestas de mangue são as que mais
sequestram carbono da atmosfera. Isso significa que o mangue ajuda a
combater o aquecimento global. “O manguezal tem importância nesse
contexto moderno das mudanças climáticas por ser muito eficiente fixador
e acumulador de carbono”, diz Schaeffer Novelli.
6. Importância cultural e cênica:
em muitas regiões as áreas de manguezal são tidas como sagradas. Além
disso, sua beleza cênica é importante para o turismo.uas resoluções que protegiam
áreas de preservação permanente como restingas e manguezais e
restringiam o desmatamento e a ocupação nesses biomas foram derrubadas
na manhã da segunda-feira (28/09) em reunião do Conselho Nacional do
Meio Ambiente (Conama), convocada pelo ministro do Meio Ambiente,
Ricardo Salles. As resoluções estavam em vigor desde 2002.
Incêndios podem contribuir para morte lenta das onças-pintadas no Pantanal
Paolla Yoshie 29/09/2020por Elizabeth Alberts, Mongabay –
Há aproximadamente 2 mil onças-pintadas vivendo no Corredor das
Onças no Pantanal, e conservacionistas estimam que os incêndios
impactaram o habitat de cerca de 600 delas, além de deixarem algumas
mortas ou feridas.
As onças têm dificuldade de fugir porque os incêndios queimam também debaixo da terra, o que impede sua identificação visual.
O Pantanal, maior região alagada do mundo, sofre uma onda de
incêndios desde o final de 2019. Estima-se que as chamas tenham
destruído aproximadamente 3,3 milhões de hectares, ou 22% da região.
Embora não esteja totalmente claro de que forma os incêndios
afetarão as populações de onças-pintadas no futuro, eles podem levar à
insegurança alimentar e à instabilidade genética, de acordo com os
specialistas.
Fernando Tortato costuma passar seu tempo analisando imagens de
armadilhas fotográficas para monitorar as onças no Pantanal. Mas, nos
últimos 45 dias, ele assumiu um novo papel, o de bombeiro, às vezes
trabalhando em turnos exaustivos de 24 horas ininterruptas para ajudar a
extinguir as chamas que vêm arrasando o Pantanal desde o final de 2019. Segundo Tortato, os incêndios parecem uma “onda que queima tudo”.
“No Pantanal, que é uma área alagada, normalmente temos alguns rios,
riachos, lagoas e brejos que são barreiras naturais contra o fogo”, diz
Tortato, pesquisador do programa de conservação de onças-pintadas da
ONG Panthera.
“Mas este ano, com esta condição – totalmente seca – as barreiras não
funcionaram. E, com isso, o incêndio atingiu uma escala que nunca vimos
antes.”
Somente em 2020, estima-se que os incêndios queimaram aproximadamente
3,3 milhões de hectares do Pantanal, o equivalente a 22% de toda a
região, de acordo com dados compilados pelo Laboratório de Aplicações de
Satélites Ambientais (Lasa), da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ). Acredita-se que muitos incêndios foram causados deliberadamente
por pessoas abrindo terreno para a agricultura, mas a seca generalizada
que aflige o Pantanal está ajudando a alimentar as chamas.
Muitas espécies foram afetadas pelo fogo, especialmente pequenos
vertebrados como répteis e anfíbios, que não conseguem fugir com
facilidade. Os conservacionistas também estão preocupados com as
onças-pintadas (Panthera onca), animais que atraem um grande número de turistas para a região a cada ano. Por se tratar de uma espécie quase ameaçada,
o número de onças já estava em tendência decrescente devido à perda e à
fragmentação de habitat, bem como aos conflitos entre humanos e a fauna
selvagem; e os incêndios podem exercer ainda mais pressão sobre esses
felinos. Em meados de setembro, o Parque Estadual Encontro das Águas, em
Porto Jofre (MT), onde está uma das maiores concentrações de
onças-pintadas do mundo, teve 85% de sua área afetados pelo fogo.
Embora a população total de onças-pintadas nas Américas Central e do Sul seja estimada entre 65 mil e 170 mil indivíduos, o Corredor das Onças do
Pantanal abriga uma população pequena, porém vital, de cerca de 2 mil
indivíduos, de acordo com Howard Quigley, diretor-executivo de ciência
da conservação da Panthera e integrante do grupo especializado em
felinos da UICN (União Internacional pela Conservação da Natureza).
Considerando a quantidade de terras queimadas no Pantanal,
acredita-se que aproximadamente 600 onças-pintadas tiveram seu habitat
impactado pelo fogo, o que pode levar a problemas de insegurança
alimentar para a espécie, diz Quigley. Também é provável que muitas
onças tenham morrido ou ficado feridas pelos incêndios. Até agora, a
equipe da Panthera e seus parceiros encontraram uma onça morta e quatro
com queimaduras.
“No panorama mais amplo da viabilidade das onças-pintadas, isso pode
ser visto como apenas mais um sinal no radar de sobrevivência da
espécie, tendo pouco impacto geral”, diz Quigley. “Por outro lado, as
onças podem estar vivendo uma morte lenta, e isso é grave.”
“A sobrevivência das onças está fortemente ligada a duas coisas: a
segurança dos núcleos populacionais e o movimento dos animais pelas
terras entre esses núcleos, os corredores, cuja combinação forma o
Corredor das Onças”, acrescenta Quigley. “Olhando apenas para o
Pantanal, esses incêndios certamente não ajudam na segurança da
população local de onças-pintadas.”
As maiores populações de onças do Pantanal estão localizadas perto do
Gran Chaco, no Paraguai, e do Parque Nacional Noel Kempff Mercado, na
Bolívia, segundo Quigley. Se os incêndios afetarem severamente essas
populações, a espécie pode passar por uma instabilidade genética no
futuro, afirma.
“Com os incêndios na Bolívia no ano passado, este pode ser um golpe
duplo para a população regional de onças, embora não seja um nocaute,
até onde sabemos”, explica Quigley.
Para as onças, fugir das chamas não é um processo simples. Muitos dos
incêndios queimam também sob o solo e não são detectáveis visualmente, o
que torna difícil evitá-los, explica Tortato.
“Elas podem queimar as patas porque não conseguem ver o fogo”, diz
ele. “Identificar esses lugares [onde o fogo está queimando] é tão
difícil para os animais quanto para nós.”
A equipe da Panthera vem trabalhando com o governo, comunidades
locais e outras organizações para tentar salvar o maior número possível
de animais selvagens. Até agora, eles ajudaram uma tartaruga, duas
serpentes, vários iguanas e duas onças, entre elas uma fêmea de quatro
anos chamada Glória, resgatada por membros da comunidade com queimaduras
severas nas patas.
“Quando as pessoas perceberam que ela estava procurando refúgio em
torno da comunidade, agiram imediatamente para salvá-la”, contou Rafael
Hoogesteijn, diretor do programa de conflitos do projeto de conservação
das onças da Panthera, num blog.
“Em outras partes da América Latina, ela teria sido morta na hora. Mas,
nessa região do Pantanal, a relação entre as pessoas e a vida selvagem é
tão profunda que a comunidade fez tudo o que podia para salvá-la. Eles
mantiveram o grande felino de quatro anos vivo até que pudesse ser
levado para um centro de resgate e receber tratamento médico. Glória
está se recuperando bem, e os veterinários continuam monitorando-a na
esperança de soltá-la no futuro.”
A equipe também trabalha para ajudar os moradores locais, muitos dos
quais já estão sofrendo por causa da pandemia de covid-19 que afetou
bastante os lucros do turismo este ano.
Esta semana começou a chover no Pantanal. Embora a região sul tenha
recebido bastante água, a parte norte só teve chuvas leves até agora.
“Não é suficiente para apagar os incêndios”, constata Tortato. Ainda
assim, ele e seus colegas têm esperança de que a região se recupere
ecologicamente, pelo menos em certa medida, depois que as chuvas
finalmente chegarem.
“Talvez o Pantanal não seja mais o mesmo, mas deve criar uma nova
composição da vida selvagem”, diz Tortato. “Não sabemos. Normalmente as
pesquisas mostram mais perguntas do que respostas. Este é o problema.”
Embora ainda não esteja claro como os incêndios influenciarão as
populações de onça-pintada no futuro, há um fator positivo para a
espécie. No Pantanal, as onças predam jacarés e capivaras e, nesta época
do ano, essas espécies tendem a viver na água, o que provavelmente as
salvou do fogo. A abundância desses animais será uma fonte fácil de
alimento para as onças-pintadas sobreviventes.
“As onças devem ter comida suficiente nos próximos meses se tomarem
ou mantiverem territórios que se sobrepõem a esses corpos d’água”, diz
Quigley. “O problema então passa a ser como elas sobreviverão na estação
chuvosa, quando as principais presas se dispersam pela imensa extensão
de água que é o Pantanal de janeiro a maio.”
A nova ferramenta de monitoramento de incêndios Amazon Dashboard, lançada em 19 de agosto pela Nasa, apresenta grandes avanços sobre a forma como o fogo na Amazônia é monitorado. A plataforma utiliza coleta automatizada de dados e análise computadorizada para identificar, quase em tempo real, quais são os incêndios que estão devastando a floresta neste momento.
Até recentemente, as queimadas na Amazônia eram rastreadas pela contagem de focos de incêndio,
prática que não detalhava o número nem o tamanho dos incêndios reais,
além de não informar com precisão as áreas impactadas, as emissões de
carbono ou o tipo de incêndio. Tudo isso a nova feramenta da agência
espacial norte-americana já consegue detectar.
“Por mais valiosa que seja a informação sobre o fogo ativo, usada
para rastrear índices mensais ou anuais, ainda é um cenário incompleto
do que está acontecendo”, afirma Douglas Morton, responsável pela nova
ferramenta, uma criação do Laboratório de Ciências Biosféricas do Centro de Voos Espaciais Goddard.
“Nossa equipe queria fornecer mais contexto sobre os tipos, o tamanho
e o crescimento dos incêndios ao longo do tempo. São elementos cruciais
para potencialmente combatê-los em locais remotos”, explica Morton.
O novo sistema da agência espacial norte-americana consegue identificar os incêndios em áreas desmatadas, aqueles que ocorrem no sub-bosque da floresta, as queimadas em pastagens e aquelas causadas anualmente por agricultores de subsistência para limpar campos já existentes.
Os incêndios florestais de sub-bosque — um dos tipos mais destrutivos na Amazônia
— passaram quase totalmente despercebidos nos anos anteriores, pois os
satélites eram incapazes de registrá-los. Com chamas muitas vezes
menores que 1 metro de altura, os incêndios florestais de sub-bosque
penetram na folhagem densa, deixando um rastro de
queimadas impossível de ser visto a distância, oculto sob as copas das
árvores amazônicas, algumas de até 50 metros de altura.
A partir de agora, utilizando dados infravermelhos mais sensíveis
durante as passagens noturnas dos satélites Suomi NPP e NOAA-20, a Nasa
pode detectar esses incêndios devastadores quase em tempo real.
Precisos e acessíveis, os dados da Nasa podem ajudar administradores
de terras a identificar e a extinguir incêndios florestais em locais
remotos antes que eles se tornem grandes demais, além de contribuir para
a exposição dos criminosos causadores das queimadas. A detecção mais
apurada dos incêndios realizados em pequenas fazendas familiares e em
comunidades tradicionais permite que as operações de fiscalização se
concentrem exclusivamente no que realmente importa: o combate a redes
criminosas de desmatamento em larga escala e a prevenção e contenção de
incêndios em áreas de alto risco.
“É pioneiro. Uma revolução em nosso campo. Nós poderíamos reagir
rapidamente e deter estes incêndios florestais”, diz Erika Berenguer,
bióloga e especialista em Amazônia da Universidade de Oxford. “Podemos
separar os incêndios provenientes do desmatamento e da agricultura dos
incêndios florestais, que são muito mais difíceis de identificar. Na
verdade, não sabemos quanto fogo se alastra para a floresta, mas é uma
proporção considerável.”
A nova ferramenta de análise de incêndios da Nasa chega em um momento
crítico. Encontrar soluções nunca foi tão urgente, pois a Floresta
Amazônica caminha em direção a um ponto de inflexão que
pode transformá-la em savana — sucumbindo à seca induzida pela mudança
climática, ao desmatamento desenfreado e ao recorde de incêndios anuais
ocorridos sob a liderança do presidente Jair Bolsonaro, um entusiasta
dos interesses do agronegócio e da mineração industrial na região amazônica.
Dados podem ajudar a conter futuros incêndios florestais
Para os pesquisadores, o novo sistema da agência espacial
norte-americana não poderia ter vindo em melhor hora. “Este ano, a
Amazônia teve mais incêndios do que no ano passado, mas você não saberia
disso olhando para o número total de pixels vermelhos na tela”, diz
Morton. “Nem todas as detecções de incêndio são de igual importância”.
O fogo em áreas recentemente desmatadas e os incêndios florestais de
sub-bosque são os mais preocupantes para os cientistas, pois são eles
que emitem mais carbono, ocasionando os maiores danos à floresta
tropical e à biodiversidade.
Liana Anderson, pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e
Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), trabalha com sua equipe na
quantificação dos impactos do fogo na Amazônia. Uma melhor compreensão
do custo real dos incêndios na Amazônia, diz ela, poderia ajudar a
planejar o orçamento anual para o combate e prevenção de queimadas.
“Neste momento de crise, precisamos de incentivos para que a ciência
seja considerada na tomada de decisões e em problemas que afetam a
sociedade”, diz ela.
Estimativas baseadas em dados de 2008 a 2012 no Acre sugerem que os
danos causados pelos incêndios podem totalizar 7% do PIB da Amazônia.
“Eles danificam a infra-estrutura, como cercas entre fazendas, linhas de
transmissão elétrica e estradas. A fumaça prejudica a saúde [humana], o
que gera um custo. Há também perdas para a produção agrícola e, em
casos mais raros, [o fogo] pode até interromper o tráfego aéreo”, diz
Liana Anderson. Segunda ela, a nova ferramenta poderia ajudar a
quantificar os danos financeiros, justificando um melhor controle de
incêndios para os governos federal e estaduais.
Separando criminosos de pequenos proprietários
Em agosto, no município de Canaã dos Carajás, um incêndio isolado
ocorreu em uma área que provavelmente era um pequeno pasto, de acordo
com a nova ferramenta da Nasa. As chamas não duraram muito e não
afetaram a floresta. Eram características do fogo utilizado por pequenos
proprietários de terras para renovar o solo em fazendas familiares,
garantindo o abastecimento alimentar local.
No entanto, em 15 de julho, Jair Bolsonaro decretou uma proibição de queimadas por 120 dias, tornando ilegais todos os incêndios intencionais na Amazônia até outubro, com uma exceção feita apenas para as comunidades indígenas e tradicionais.
“Essa proibição criminalizou os pequenos proprietários de terra e
estimulou o uso desordenado de fogo entre as comunidades rurais pobres,
ao mesmo tempo em que distraiu as autoridades de grandes grileiros”, diz
Sonaira Silva, agrônoma da Universidade Federal do Acre. “Eles têm
receio de serem multados e sentem que podem alegar que o incêndio não
foi intencional se o fogo não parecer organizado.”
Segundo ela e outros pesquisadores, a ferramenta da Nasa poderia
ajudar a acabar com esse problema, uma vez que é capaz de fazer a
distinção entre queimadas de desmatamento e pequenos incêndios
agrícolas. Isso permite que as autoridades filtrem os fogos de baixo
impacto e foquem nos agentes criminosos de maior escala na Amazônia.
“Não podemos ter fogo zero na Amazônia. Essas proibições que vêm de
cima para baixo não são efetivas, porque precisamos ser capazes de
separar quem é quem: pessoas que causam a destruição criminosa da
floresta tropical e pequenos proprietários que usam o fogo como seu
único meio de garantir a alimentação”, conclui Sonaira Silva.
Agência
de notícias sem fins lucrativos que visa aumentar o interesse e a
valorização de terras e animais selvagens, ao examinar o impacto das
tendências emergentes no clima, na tecnologia, na economia e nas
finanças em conservação e desenvolvimento. Seu objetivo é inspirar,
educar e informar
Hoje, 1/1, a tentativa de Ricardo Salles, ministro do meio ambiente,
de colocar em risco áreas de preservação ambiental como restinga e
mangue sofreu mais um revés. Desta vez, foi a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), quem se manifestou.
Weber determinou que o ministro explique, em 48 horas, a decisão do Conama– Conselho Nacional do Meio Ambiente de revogar três resoluções do órgão (como contamos aqui) que tratam de projetos de irrigação e da proteção de Áreas de Preservação Permanente (APPs) como restinga, manguezais e mananciais urbanos.
“Diante da urgência qualificadora da tutela provisória requerida e da relevância do problema jurídico-constitucional
posto, requisitem-se informações prévias ao Ministro de Estado do Meio
Ambiente , a serem prestadas no prazo de 48 horas. Dê-se ainda vista ao
Advogado-Geral da União e ao Procurador-Geral da República, no mesmo
prazo”, ordenou a ministra.
Pressa e nova norma
A decisão do conselho que alarmou e revoltou ambientalistas,
organizações e a sociedade civil foi tomada em reunião marcada por
Salles, às pressas, na segunda-feira passada, 28/9, que durou pouco mais
de três horas.
No encontro, a maioria dos integrantes do conselho ainda aprovou uma nova resolução, que autoriza a incineração de embalagens e resíduos de agrotóxico em fornos para produção de cimento, o que segundo especialistas, traz riscos de contaminação a todos que estiverem na área.
Justiça Federal suspende revogação e PT ajuiza ação no STF
No dia seguinte, em 29/1, a Justiça Federal do Rio de Janeiro acolheu ação popular contra a medida do Conama
– focada nas normas que regem as áreas de vegetação citadas acima – e
suspendeu a decisão do Conama, por meio de uma liminar. Agora, o assunto
deve ser analisado pela Advocacia Geral da União (como contamos aqui).
No mesmo dia, o Partido dos Trabalhadores (PT) ajuizou, no Supremo Tribunal Federal (STF), uma ação contra a decisão do Conama: a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 747 contra a Resolução 500/2020 do Conama, que foi atribuída à ministra Rosa Weber. Ou seja, ela é sua relatora.
Aliás, por que Rosa Weber não aprovou a oportunidade para analisar a ação movida no ano passado contra o Decreto 9.806/2019,
com o qual Salles desmantelou o Conama, em maio? A entao Procuradora
Geral da República, Rachel Dodge tentou anular o decreto, mas o governo
reagiu. O processo foi parar no STF e, em setembro, Weber tornou-se sua
relatora e o engavetou.
Jornalista
com experiência em revistas e internet, escreveu sobre moda, luxo,
saúde, educação financeira e sustentabilidade. Trabalhou durante 14 anos
na Editora Abril. Foi editora na revista Claudia, no site feminino
Paralela, e colaborou com Você S.A. e Capricho. Por oito anos, dirigiu o
premiado site Planeta Sustentável, da mesma editora, considerado pela
United Nations Foundation como o maior portal no tema. Integrou a Rede
de Mulheres Líderes em Sustentabilidade e, em 2015, participou da
conferência TEDxSãoPaulo.
O deputado federal Rogério Correia (PT) e a deputada estadual Beatriz
Cerqueira (PT) entraram com uma representação no Ministério Público de
Minas Gerais para pedir que sejam investigadas possíveis irregularidades
nos repasses da Taxa de Fiscalização de Mineração (TFRM) ao Sistema
Estadual do Meio Ambiente.
Na representação, os deputados citam reportagem do G1 do dia 23 de setembro, que
revelou que, no ano do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho,
que resultou na morte de 270 pessoas, o governo de Minas arrecadou R$
319 milhões da TFRM. O valor deveria ser repassado integralmente para as
atividades de fiscalização. Mas, conforme relatório do Ministério
Público de Contas, apenas 38% deste valor foi destinado à pasta.
A destinação deste recurso está prevista na Lei 22.796/17, criada pela Comissão Extraordinária das Barragens logo após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, em 2015. O deputado Rogério Correia era o relator da comissão.
A maior tragédia ambiental do país matou 19 pessoas, devastou distritos e percorreu o Rio Doce até a foz, no Espírito Santo.
No documento, os deputados afirmam que a lei não tem brechas para
diferentes interpretações e que, comprovado o descumprimento por parte
do governo, o gestor deve responder por crime de responsabilidade. E
finalizam pedindo que sejam aplicadas, aos responsáveis, “as penalidades
previstas nas esferas administrativa, cível e penal”.
O G1 entrou em contato com o Ministério Público para
saber sobre o andamento das apurações, mas não teve retorno até a
última atualização desta reportagem.
O governo de Minas também foi procurado para falar sobre a representação, mas ainda não se posicionou. Quando a reportagem do G1 foi publicada em 23 de setembro, foi emitida a nota abaixo:
“A Secretaria de Fazenda informa que ainda que os valores
empenhados pelos órgãos e entidades do SISEMA estejam menores do que os
valores efetivamente arrecadados e vinculados, os recursos não
utilizados dentro do exercício financeiro em que são arrecadados
permanecem legalmente atrelados a essas unidades, não tendo sido
utilizados em nenhum outro órgão. Seguindo estritamente o que é
determinado pela Lei 4.320/64, os recursos permanecem vinculados a essas
entidades e serão utilizados em exercício futuros, mediante
suplementação por superávit financeiro”.
“Precisa ter um esforço nosso aqui, enquanto estamos nesse
momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só
se fala de covid, e ir passando a boiada, e mudando todo o regramento
(ambiental), e simplificando normas”.
A frase é famosa: foi dita pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na reunião ministerial do dia 22 de abril, e tornada pública por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
Apesar disso, segundo ambientalistas e procuradores ouvidos pela BBC
News Brasil, Ricardo Salles já está trabalhando para “passar a boiada”
desde o começo de sua gestão, em janeiro de 2019, muito antes da pandemia do novo coronavírus.
Desde que assumiu a pasta, o ministro criou regras que dificultaram a
aplicação de multas; transferiu poderes do Ministério do Meio Ambiente
para outras pastas; e tentou mudar o entendimento sobre normas como a
Lei da Mata Atlântica.
A última tentativa de Salles de remover regulamentações ambientais
aconteceu nesta segunda-feira (28). Em reunião convocada dias antes pelo
ministro, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) revogou quatro resoluções que tratavam de diferentes áreas da política ambiental do país.
Duas das resoluções eliminadas restringiam o desmatamento e a
ocupação em áreas de restinga, manguezais e dunas. Na prática, o fim das
resoluções, que estavam em vigor desde 2002, criou a possibilidade de
ocupação em áreas de restinga numa faixa de 300 metros a partir da
praia. Antes, essas áreas eram consideradas como sendo de proteção
ambiental.
Na mesma reunião, o Conama também permitiu a queima de lixo tóxico —
como embalagens de defensivos agrícolas, por exemplo — em fornos usados
originalmente para a produção de cimento. Além disso, o conselho também
derrubou uma resolução que criava normas para projetos de irrigação.
A decisão do Conselho é controversa.
Segundo o advogado especializado em direito ambiental Rodrigo Moraes,
a decisão foi juridicamente correta, pois as resoluções que foram
revogadas seriam ilegais.
As normas foram criadas para regulamentar uma versão anterior do
Código Florestal, de 1965, que foi revogado com a edição do novo código,
em 2012. Assim, estas também teriam perdido a eficácia, argumenta
Moraes. Além disso, diz ele, a exigência de preservar a faixa de 300
metros depois do mar não estava presente na lei original — assim, o
Conselho de meio ambiente teria “legislado” de forma indevida ao criar a
norma, em 2002.
Já ambientalistas argumentam que a decisão do Conselho foi feita sob medida para atender a setores econômicos.
“Mesmo com a revogação das resoluções, a proteção dos mangues, dunas e
restingas continuarão a existir pelas regras do Novo Código Florestal,
pela Lei da mata Atlântica e ainda pelas regras constitucionais”,
argumenta o advogado.
Segundo o deputado federal Rodrigo Agostinho (PSB-SP), coordenador da
Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso, o “revogaço” agrada ao
mercado imobiliário, que deseja erguer prédios em áreas protegidas à
beira-mar; a criadores de camarão que querem construir seus tanques
dentro de manguezais; e ao agronegócio, que deseja menos regulamentações
nas suas operações com irrigação e agrotóxicos.
Agostinho também rebate o argumento de que as resoluções seriam
ilegais. “Tivemos algumas decisões do Judiciário confirmando que as
resoluções tinham sido recepcionadas (pelo novo Código Florestal) e
estavam em vigor. Agora, ficou uma lacuna. A regulamentação que tinha
para manguezais e restingas deixou de existir”, disse ele à BBC News
Brasil.
No começo da noite desta terça-feira (29/09), a decisão do Conama que
revogou as resoluções foi anulada pela Justiça Federal. É uma decisão
liminar (provisória) da juíza Maria Amélia Almeida Senos de Carvalho, da
23ª Vara Federal do Rio de Janeiro. Ela atendeu a uma ação popular
formulada por um grupo de advogados. Cabe recurso.
Em entrevista ao canal de TV CNN Brasil, nesta quarta-feira (30/09),
Salles disse que a pasta vai recorrer da decisão. Ele também lembrou que
já existiam estudos para revogar as resoluções desde a gestão da
ex-ministra Izabella Teixeira (2010-2016), ainda nos governos do PT.
Improbidade administrativa
Por conta das constantes ‘boiadas’, um grupo de procuradores do
Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação de improbidade
administrativa contra Ricardo Salles, pedindo que a Justiça Federal o
afaste do cargo. O caso está atualmente nas mãos do desembargador Ney
Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Brasília).
“O que se percebe é que existe uma desestruturação das políticas
(ambientais), o que repercute nas violações (de direitos) e nas
ilegalidades que são discutidas na ação judicial (de improbidade)”, diz o
procurador Júlio Araújo, um dos autores da ação.
“Quando se desestrutura a política, não se trata de um mero
rearranjo, uma mera reorganização. Você cria condições para que não haja
a efetiva proteção daquele bem jurídico, daquela pauta a que está
destinada a pasta. É por isso que nós colocamos essa questão no campo da
improbidade administrativa. Ela está fora do quadrante da possibilidade
de escolha do gestor”, explica Araújo, que integra a Força-Tarefa
Amazônia do MPF.
“É uma atuação (a de Salles) em sentido contrário ao que se deveria
minimamente organizar. Não significa que deve (a atuação do ministro)
ser de um jeito ou de outro. Ao longo dos últimos 30 anos, isso foi…
cada gestor procurou dar uma orientação. Agora, desestruturar, esvaziar a
política ambiental, isso não é permitido. Por isso a ação de
improbidade”, diz ele à BBC News Brasil.
A reportagem da BBC News Brasil procurou o Ministério do Meio
Ambiente para comentar o assunto, mas não houve resposta até o
fechamento desta reportagem.
Mas quais foram as outras tentativas de afrouxar a proteção ambiental
no país? A BBC News Brasil cita algumas decisões que vão nesse sentido.
1. Abrir mão do poder de conceder florestas públicas
Em meados de maio, o presidente da República Jair Bolsonaro (sem
partido) e Ricardo Salles assinaram um decreto transferindo do
Ministério do Meio Ambiente para o Ministério da Agricultura o poder de
conceder as florestas nacionais.
A concessão ocorre quando o governo dá a uma empresa privada o
direito de explorar uma área de floresta, por meio da prática conhecida
como manejo florestal, em troca de algum tipo de contrapartida. O
concessionário pode usar a área para cortar madeira de forma sustentável
ou para turismo, por exemplo.
Pouco depois, a Justiça Federal interveio no assunto e suspendeu os
efeitos do decreto. Para o juiz federal Henrique Jorge Dantas da Cruz,
que analisou o caso, a mudança não poderia ter sido feita por decreto,
pois seria necessária a aprovação do Congresso Nacional.
Da mesma forma como as atribuições de cada ministério são definidas
em lei, também é preciso uma lei aprovada pelo Congresso para mudá-las, e
não um simples decreto do Executivo, entendeu o magistrado.
2. Tentar afrouxar a proteção à Mata Atlântica
No dia 6 de abril, Salles publicou um despacho aprovando um parecer
da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a Lei da Mata Atlântica.
Na prática, o despacho de Salles obrigou os órgãos ambientais do
governo federal, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a adotar o entendimento presente
no Código Florestal, mais brando, ao invés daquele da Lei da Mata
Atlântica, mais restritivo.
A mudança possibilitava, entre outras coisas, a regularização de
desmatamentos ilegais em áreas de preservação permanente (APPs) na Mata
Atlântica, que é considerado o bioma mais ameaçado do país.
Mais uma vez, a tentativa de afrouxar normas foi frustrada: no começo
de junho, o próprio Salles revogou a despacho, que estava sendo
contestado na Justiça pelo Ministério Público Federal e por órgãos da
área ambiental.
Ao desistir do despacho, o governo decidiu ingressar com uma ação
direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal, de
modo a evitar futuros questionamentos jurídicos.
3. A ‘audiência de conciliação’ para multas ambientais
Em abril de 2019, Ricardo Salles e Jair Bolsonaro assinaram decreto
criando a necessidade de uma “audiência de conciliação” entre fiscais e
infratores, sempre que houver a aplicação de uma multa ambiental.
As tais audiências nunca “pegaram”: dados obtidos pela ONG
Observatório do Clima mostram que, de outubro de 2019 até agosto deste
ano, foram realizadas apenas cinco audiências deste tipo pelo Ibama, e
nenhuma pelo ICMBio. O número é muito menor que a quantidade de multas
aplicadas pelos dois órgãos no período.
Na prática, o decreto das “audiências de conciliação” criou mais um
gargalo para a aplicação de multas ambientais, contribuindo para
a diminuição da atividade da fiscalização, de acordo com servidores e
ex-dirigentes do Ibama.
“O número de autuações lavradas é um dado importante que pode
traduzir o esforço do governo em punir realmente aqueles que cometem
crimes ambientais. Quanto menor a presença da fiscalização em campo,
fazendo o seu trabalho de responsabilizar os infratores, maior a
sensação de impunidade”, disse um servidor do Ibama à BBC News Brasil em
meados de setembro deste ano, sob condição de anonimato.
4. Mudanças no Conselho Nacional do Meio Ambiente
A revogação das normas ambientais desta segunda-feira não seria
possível sem um passo anterior: a mudança na composição do Conselho
Nacional do Meio Ambiente, o Conama.
A mudança foi feita por decreto, em maio de 2019, e envolveu uma mudança drástica na composição do colegiado.
O número de integrantes caiu de 96 para 23, e a proporção de
representantes do governo federal aumentou em relação aos indicados por
governos estaduais e ONGs ambientalistas.
Além disso, também foram suprimidos os representantes sem direito a
voto, indicados pelo Ministério Público Federal, pelos Ministérios
Públicos dos Estados e pela Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos
Deputados.
5. Exoneração de fiscais logo depois de ação em terras indígenas
No fim de abril deste ano, Ricardo Salles decidiu exonerar o então
coordenador-geral da fiscalização ambiental do Ibama, Renê Luiz de
Oliveira, e o coordenador de operações de fiscalização, Hugo Ferreira
Netto Loss. Pouco antes, tinha sido demitido o diretor de Proteção
Ambiental do órgão, Olivaldi Azevedo.
O que poderia ser um ato administrativo normal — a remoção de
servidores de cargos de chefia — passou a ser criticado por
ambientalistas por causa do momento em que aconteceu: as demissões foram
feitas logo depois que o Ibama realizou operações bem sucedidas contra
garimpeiros ilegais em terras indígenas no Pará.
Entre janeiro e abril de 2020, foram várias as operações em quatro
terras indígenas naquele Estado: Ituna-Itatá, Apyterewa, Cachoeira Seca e
Trincheira Bacajá. Os resultados foram expressivos. Em uma única etapa
de operações nas terras indígenas, em abril de 2020, foram destruídos
pouco mais de 100 equipamentos usados por garimpeiros, como serras,
tratores e veículos.
Pouco antes das demissões serem efetivadas, um grupo de 16 fiscais do
Ibama enviou carta à presidência do Instituto pedindo a manutenção de
Renê Oliveira e Hugo Ferreira em seus cargos, o que não aconteceu.
Gado, porcos e outras criações de animais na Europa estão emitindo
mais gases responsáveis pelo efeito estufa do que o total anual emitido
por todos os carros e vans do continente. Esta análise do Greenpeace
leva em consideração o impacto que a alimentação destes animais tem para
as mudanças climáticas.
O aumento da produção de carne, leite e derivados na última década
transformou a pecuária em uma grande fonte de emissões e, enquanto as
políticas ambientais focaram no transporte e energias renováveis como
solução para conter o aquecimento global, esta atividade foi deixada de
lado.
Em 2018, ultimo ano com dados disponíveis na UN Food and Agriculture Organization,
a pecuária nas fazendas europeias, incluindo o Reino Unido, foi
responsável pela emissão 502 milhões de toneladas de dióxido de carbono
por ano. Número comparável às 656 milhões de toneladas emitidas por
todos os carros e vans da Europa no mesmo ano.
Alimentação animal
Mas, quando a emissão indireta de gases é calculada, por meio de
métodos que consideram as áreas desmatadas para a produção de ração ou
pastagens, o total de emissão gerado pela pecuária europeia chega a 704
milhões de toneladas de dióxido de carbono.
Estes cálculos estão disponíveis em um relatório publicado pelo Greenpeace, chamado de Farming for Failure – algo como “cultivando para o fracasso”.
A produção de carne e leite da União Europeia cresceu 9,5% entre 2007 e 2018. De acordo com o Greenpeace isso
significa um aumento de 6% nas emissões anuais, cerca de 39 milhões de
toneladas, ou o equivalente a colocar 8,4 milhões de veículos a mais nas
ruas.
Se esta tendência se mantiver, a União Europeia terá poucas chances
de atingir as suas metas de redução nas emissões estabelecidas pelo
Acordo de Paris.
Marco Contiero, diretor de políticas agrícolas do Greenpeace, afirma
que as políticas ambientais têm que incluir a pecuária em suas
prioridades, ou as metas de redução de carbono não serão atingidas.
“A ciência é clara, assim como os numeros: não Podemos evitar o pior
da crise climática se as políticas continuarem a favorecer a produção de
carne e leite.”
Redução radical
Cortar 50% da produção animal na Europa vai eliminar a emissão de
cerca de 250 milhões de toneladas de gases do efeito estufa por ano, um
número que é quase igual às emissões de 11 dos países menos poluidores
do continente.
Um porta-voz dos pecuaristas do reino Unido disse que os Produtores
estão fazendo a sua parte e tem como meta neutralizar suas emissões de
carbono até 2040. A pecuária é responsável por 10% das emissões do Reino
Unido, sem considerar a produção de alimentos para os animais.
“Se quisermos atingir a neutralidade em carbono, precisamos cortar
todas as nossas fontes de emissão”, declarou o porta-voz. “O foco em
aumentar a produtividade é chave, além de manter e aumentar nosso
sequestro de carbono em áreas verdes e o uso de energias renováveis”.
O Greenpeace sugere o fim de subsídios governamentais para pecuária
nas políticas ambientais europeias, como parte de uma retomada verde.
É difícil que esta ideia vença os poderosos interesses que a
atividade tem nos diversos países europeus, mas os opositores do fim de
subsídio aos pecuaristas vão precisar apresentar outras maneiras de se
atingir as metas para redução na emissão de carbono sem mudanças de
larga-escala no setor agropecuário.
Governo de São Paulo é processado por financiar aquecimento global
Movimento de Famílias pelo Clima questiona
na justiça investimento bilionário na indústria automotiva sem
contrapartida climática
O Movimento Famílias pelo Clima entrou com uma ação contra o Governo do Estado de São Paulo por descumprimento da Política Estadual de Mudanças Climáticas, promulgada em 2009.
O grupo alega que o Programa IncentivAuto, criado no final de 2019,
oferece subsídios ao setor automotivo sem qualquer contrapartida para
redução das emissões de gases do efeito estufa do setor.
O IncentivAuto prevê a concessão de financiamento de no mínimo R$ 1
bilhão para expansão de fábricas de veículos automotivos no estado, com
desconto de 25% para pagamento antecipado quando o empréstimo for
superior a R$ 10 bilhões.
publicidade
Em contrapartida aos recursos públicos utilizados, as empresas devem
criar apenas 400 empregos, um montante irrisório em um Estado que fechou
340 mil vagas de emprego no primeiro semestre deste ano devido à
pandemia.
Cumprimento de política climática
A ação, protocolada na sexta-feira (25/9) na 6a Vara da Fazenda
Pública do Foro Central, pede que o Governo de São Paulo apresente
provas de que os projetos financiados pelo Programa IncentivAuto incluem
medidas de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE), de
adaptação aos impactos das mudanças climáticas e de implementação de
tecnologias menos poluentes, como prevê a política climática do Estado.
“Minha filha de 11 anos tem me questionado por que os adultos não
estão fazendo nada para impedir a crise climática, que já está gerando
consequências diretas na vida dela. O que eu respondo pra ela?”,
questiona Clara Ramos, que representa o movimento na ação judicial e é
mãe de duas meninas.
“Não posso mais ficar de braços cruzados esperando que as nossas
lideranças façam alguma coisa, pois já percebemos que elas não vão
fazer, pelo menos não na urgência necessária.”
Movimento Famílias pelo Clima
A fala de Ramos explicita o sentimento que motivou a criação do
Movimento Famílias pelo Clima, que integra o movimento global Parents
for Future, – um coletivo de pais, mães e familiares que atuam em nome
de seus filhos para buscar com urgência a contenção e adaptação às
mudanças do clima.magem: Pixabay
Grupos como este, que defendem os direitos humanos das futuras
gerações, estão surgindo em todo o mundo. Eles estão partindo do
ativismo em rede e da organização de protestos para o enfrentamento nos
tribunais de governos omissos à crise climática.
“A ação faz parte de um movimento global de litígio que busca
provocar o Judiciário a dar as soluções que governos não estão dando
para combater o aquecimento global e mitigar os impactos das mudanças
climáticas”, afirma Flavio Siqueira, advogado da ação.
“Em um contexto de ondas de calor e recordes de temperatura alta,
ações como essa são necessárias e urgentes para que a questão climática
esteja inserida em políticas públicas como o Programa IncentivAuto.”
Na Austrália, grupos de adolescentes com menos de 18 anos estão
enfrentando o governo contra a indústria do carvão mineral, uma das
maiores do mundo e grande responsável por emissões de gases do efeito
estufa. Em Portugal, seis jovens denunciaram 33 países na Corte Europeia
de Direitos Humanos com a alegação de descumprimento de acordos de
combate à mudança do clima.
Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores
A indústria automobilística é responsável por parte significativa das
emissões de gases e poluentes na atmosfera, tanto na etapa de produção
quanto na circulação de veículos nas ruas. O Brasil está atrasado em
relação ao resto do mundo na transição para tecnologias e fontes
energéticas mais limpas no transporte.
O Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores,
Proconve, instituído no âmbito federal, prevê a substituição da frota de
ônibus e caminhões à diesel até 2022, com a adoção da tecnologia
equivalente ao Euro-6, muito menos poluente – na Europa, isso foi
implantado em 2015.
“O mundo desenvolvido está indo na direção de uma sociedade de baixo
carbono. Enquanto isso, São Paulo, o estado mais rico e tecnologicamente
avançado do Brasil, pode estar usando dinheiro público para financiar
uma indústria automobilística do passado”, diz Mariana Menezes, do
Famílias pelo Clima, mãe de três crianças.
“Os formuladores de políticas públicas precisam urgentemente se
sintonizar com os desafios e as oportunidades que a crise climática traz
para o país”, completa Daniela Vianna, mãe de um menino e integrante do
grupo.
Poluição mata
Por ano, nove milhões de mortes são atribuídas à poluição do ar em todo o mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde.
A médica patologista Dra. Evangelina Vormittag, diretora do Instituto Saúde e Sustentabilidade, aponta que,
mesmo em um cenário de redução da poluição atmosférica de 5% entre 2012
e 2030, haverá no Estado de São Paulo um número de aproximadamente 250
mil óbitos e 1 milhão de internações no SUS por problemas relacionados à
poluição, como câncer, acidente cardiovascular e problemas
respiratórios em adultos e crianças.
Tratamentos de saúde e as altas taxas de mortalidade decorrentes da
poluição atmosférica pela queima de combustíveis fósseis custaram o
equivalente a 11% do PIB da China e a quase 1% do PIB do Brasil no ano
de 2010, de acordo com o estudo “Better Growth, Better Climate”,
publicado em 2014.
“O custo da poluição do ar é muito maior do que os valores que
precisam ser investidos para uma transição para a sociedade de baixo
carbono, com foco em energias renováveis e deixando os combustíveis
fósseis no solo e no passado”, afirma Pedro Hartung, do Instituto Alana.