A constatação de que a busca pelo bem-estar humano – quando envidada
pelo bom uso dos fundamentos macroeconômicos – é antagônica e ameaçadora
à própria ideia de sustentabilidade, pode ser claramente percebida pela
“tensão” provocada pela atividade econômica sobre o mundo natural,
principalmente a partir das condições impostas para se alcançar mais
crescimento econômico.
Por sua vez, isso
reafirma e expõe, a olhos nus, a fragilidade da relação existente entre a
ecologia e a economia, clamando por um novo tipo de atividade econômica
voltada ao equilíbrio do meio ambiente, e não somente aos “caprichos”
mercadológicos.
De igual modo, percebe-se essa fragilidade quando
nos damos conta de que qualquer ação humana ocorre no âmbito dos
limites do Planeta. Daí a importância conferida a um novo tipo de
economia – urgente e necessária – que seja capaz de combinar moderada
produção com rigoroso respeito aos limites biofísicos.
A
utilidade – termo caro aos economistas – do mundo não pode estar acima
da preocupação maior que é salvaguardar as condições de equilíbrio da
Terra. Por isso um dos mais importantes princípios elementares do
Movimento Ecologia Profunda é justamente o de que o bem-estar e o
florescimento da vida humana e não-humana na Terra têm valor em si
mesmos (valor intrínseco, valor inerente), sendo que esses valores são
independentes da utilidade do mundo não-humano aos propósitos humanos.
Todavia,
não há como escapar de determinadas assertivas: o modo de crescimento
das economias, principalmente na era do industrialismo, tem sido a causa
mais relevante de distúrbios ao meio ambiente.
Assim, o ônus
ambiental ora presenciado em diversas frentes é sintomaticamente gerado
pelo crescimento econômico. Acrescido a isso, duas outras constatações
contribuem, sobremaneira, para o acirramento das atuais condições
doentias do Planeta: a dimensão quantitativa populacional, com
estimativas de que, em 2050, 9,5 bilhões de pessoas estarão habitando um
único Planeta e o não menos doentio modo consumista da humanidade, em
que os 20% mais ricos “abocanham” quase 80% de toda a produção material
do planeta.
Tomando o modo american way of life como paradigma,
outra assertiva, dentro dessa perspectiva, não pode ser desconsiderada:
se toda a humanidade, excetuando obviamente os 4,5% da população de
norte-americanos, tivesse o mesmo padrão de vida e consumo médio desse
contingente populacional, a existência de três outros planetas Terras
ainda não seria suficiente para o atendimento do consumo humano.
Logo,
para se chegar à fórmula ideal que combine bem-estar, associando isso à
qualidade de vida, com equilíbrio das condições climáticas, notadamente
a partir da prática da sustentabilidade, é preciso que todos, sem
exceção, aprendamos a lidar com desafios inerentes ao processo que sejam
capazes de enfrentar dilemas como:
A contradição entre expansionismo produtivista e sustentabilidade;
Atenuação dos conflitos e emergências sociais legitimamente reclamada
pelos menos favorecidos com os imperativos da conservação/preservação
ambiental;
Conscientização de que todos estamos e participamos da
mesma espaçonave Terra, numa alusão direta à ideia metafórica defendida
por Kenneth Boulding.
O pano de fundo disso tudo, ademais, está
na imprescindível necessidade de troca do “crescimento” (quantidade)
por“ desenvolvimento” (qualidade), deixando bem clara a noção existente
de incompatibilidade entre a expansão física das economias com a
preservação ambiental.
Junto a isso, também se faz necessário
resgatar a noção de que o bem-estar está amparado no âmbito do
desenvolvimento econômico, e não no do crescimento, assim como a própria
sustentabilidade, analogamente, não combina com o expansionismo
econômico, com a aceleração do ciclo de negócios ou ainda com a
capacidade de produção industrial sem limites que, conjuntamente, levam à
apropriação desmesurada dos recursos da natureza, acarretando menos, e
não mais bem-estar às populações.
Concernente a isso, é oportuno
não perder de vista que a ocorrência de qualquer tipo de crescimento –
especialmente da economia, da população, do consumo – tende mais a
retirar qualidade de vida dos povos, exatamente porque, nesse caso,
limites serão inexoravelmente transpostos.
O outro nome adequado
para explicar a condição de “limites transpostos” é “destruição de
recursos”. Para ilustrar isso, cabe mencionar o discurso do presidente
Roosevelt feito em 1909 no Senado dos EUA: “com o crescimento constante
da população e o aumento ainda mais rápido do consumo, nosso povo teria
necessidade de maiores quantidades de recursos naturais […]. Se nós,
desta geração, destruirmos os recursos que são necessários a nossos
filhos, se nós reduzimos a capacidade de nossa terra de manter uma
população, nós diminuiremos o nível de vida e nós retiraremos até o
direito à vida das gerações futuras neste continente”.
Por essas e
outras, não há como negar a evidência de que o modelo de crescimento
econômico praticado pelas nações após a Segunda Guerra Mundial se
converteu numa espécie de agente de quebra do equilíbrio ecológico,
acarretando, em termos econômicos, péssima distribuição dos recursos, e,
em termos sociais, esfacelamento do bem-estar aos menos favorecidos.
Marcus Eduardo de Oliveira, Articulista do EcoDebate, é economista e ativista ambiental
prof.marcuseduardo@bol.com.br
Fonte: EcoDebate