Em documento, Brasil, África do Sul, Áustria, Irlanda, México e Nigéria defendem um mundo livre de arsenais de destruição em massa
O Estado de S.Paulo
21 Setembro 2017 | 05h00
Em julho, a comunidade internacional chegou a um acordo histórico para proibir as armas nucleares. Nossos seis países têm orgulho de terem participado desse esforço desde o primeiro momento.
Armas de destruição em massa são cruéis e indiscriminadas. Elas provocam devastação em massa e perdas inaceitáveis de vidas. Mais de 70 anos depois de Hiroshima e Nagasaki, as Nações Unidas decidiram adotar instrumento juridicamente vinculante que, de uma vez por todas, proíbe essas armas.
Após décadas de paralisia das negociações multilaterais para o desarmamento nuclear, o novo tratado, que foi aberto para assinaturas em 20 de setembro, representa grande mudança de paradigma na forma com que a comunidade internacional tem enfrentado uma ameaça verdadeiramente existencial contra a vida no planeta.
Ao proibir a única categoria de armas de destruição em massa ainda não sujeita a uma interdição global, o acordo busca estigmatizar a posse de armas nucleares. A existência de aproximadamente 15 mil ogivas nucleares com mais de 2,5 mil megatons de energia destrutiva – suficiente para destruir o planeta várias vezes – é um forte alerta de nossa vulnerabilidade coletiva e da necessidade urgente de proibir e eliminar essas armas atrozes como a única forma de assegurar que elas nunca serão usadas novamente.
O tratado reflete o crescente consenso por parte da comunidade internacional de que armas de destruição em massa não são capazes de aumentar a segurança nacional ou internacional nem devem ter lugar nas doutrinas militares do século 21.
O novo tratado se baseia na firme convicção de que qualquer uso de armas nucleares repugnaria aos princípios da humanidade e aos ditames da consciência pública. Constitui o resultado lógico das discussões sobre os impactos humanitários das armas nucleares, realizadas sob a égide da Iniciativa Humanitária. Sua principal conclusão foi a de que a guerra atômica e o direito internacional humanitário se excluem mutuamente.
Em poucas palavras, as consequências devastadoras de qualquer detonação nuclear – ainda mais de uma guerra nuclear – teriam implicações extremamente severas para o meio ambiente, a economia, o desenvolvimento socioeconômico, a segurança alimentar e a saúde globais, ameaçando a própria sobrevivência da humanidade.
O Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares é consistente e complementar ao Tratado sobre Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), que obriga todos seus Estados-partes a se engajarem de boa-fé e concluírem negociações com vistas ao desarmamento nuclear em todos os seus aspectos, sob controle internacional estrito e efetivo.
Ao estabelecer uma proibição universal das atividades centrais relacionadas às armas nucleares, o novo instrumento contribui para a implementação do TNP e fortalecimento do regime internacional de desarmamento e não proliferação nuclear existente. Abre um caminho para que Estados que possuem ou abrigam armas nucleares possam aderir ao tratado quando estiverem prontos por meio de um processo de desarmamento nuclear verificável, irreversível e com prazo determinado.
A fim de levar em consideração as posições desses países, o tratado não especifica os detalhes desse processo, mas prevê que arranjos adicionais deverão ser acordados no contexto da futura acessão de Estados possuidores de armas nucleares.
Com a adoção desse texto, em julho, as Nações Unidas enviaram mensagem robusta de que os Estados precisam reconsiderar o papel das armas nucleares nas doutrinas de segurança e trabalhar com vistas ao objetivo de um mundo mais seguro para todas as nações. A única forma de garantir que as armas nucleares não sejam jamais usadas em nenhuma circunstância é por meio de sua total eliminação e da garantia juridicamente vinculante de que nunca serão produzidas novamente.
Impulsionados por um forte sentido de responsabilidade e urgência, África do Sul, Áustria, Brasil, Irlanda, México e Nigéria, como integrantes de um grupo de mais de 120 países, estão convencidos de que, no presente contexto de segurança, não existe espaço para procrastinação. A humanidade não pode se dar o luxo de esperar o “momento certo” para acabar com as armas nucleares.
Gostaríamos também de reconhecer a contribuição essencial da sociedade civil para o processo. Permanecemos empenhados em fazer o nosso melhor para alcançar o objetivo mais elevado de um mundo livre de armas nucleares. Nossos seis países conclamam toda a comunidade internacional a se juntar a nós nesse esforço crucial para a sobrevivência da humanidade.
ARTIGO SUBSCRITO PELOS CHANCELERES DE ÁFRICA DO SUL, ÁUSTRIA, BRASIL, IRLANDA, MÉXICO E NIGÉRIA