sexta-feira, 14 de outubro de 2016
Mudanças no uso da terra afetam a biodiversidade e o solo, afirma estudo
Pesquisa realizada no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da
Universidade de São Paulo, em Piracicaba, acaba de mensurar o impacto
da transformação de áreas de floresta em pastagens e de pastagens em
canaviais sobre a biodiversidade do solo.
A conclusão é que esse impacto é devastador sobre a macrofauna original
do solo: 90% dela – formada por cupins, formigas, minhocas, besouros,
aranhas e escorpiões – desapareceu por completo.
A pesquisa foi realizada por André Luiz Custodio Franco, durante o seu
doutorado e estágio de pesquisa no exterior realizados com bolsas da
FAPESP, com orientação do professor Carlos Clemente Cerri.
Os resultados do trabalho foram publicados no periódico Science of the Total Environment .
“Nossa intenção foi verificar como a mudança no uso da terra interfere
na emissão de gases e no armazenamento de carbono no solo e, em
consequência, na composição da matéria orgânica, ” diz Franco.
Invertebrados, microrganismos e fungos desenvolvem um grande papel na
reciclagem do solo, graças à sua ação na decomposição da matéria
orgânica. Eles compõem a microfauna do solo. Formigas e cupins – que
integram a macrofauna do solo – são os principais agentes
estabilizadores, evitando a erosão graças à construção de seus ninhos.
Para verificar o que acontece com a biodiversidade com a mudança no uso
da terra, os pesquisadores retiraram blocos de solo na forma de cubos
com 30 centímetros de profundidade. Essas amostras foram coletadas em
três canaviais localizados em Jataí, Goiás, Ipaussu e Valparaíso, São
Paulo. Nessas áreas uma parte do pasto foi convertida em cana. A equipe
também coletou blocos de áreas nativa, de mata, para demonstrar a
biodiversidade do solo em um sistema estável, antes do desmatamento para
pastagem.
“Quando a mata nativa é convertida em pasto, todos os predadores de topo
do solo, como as aranhas e os escorpiões, desaparecem”, diz Franco. “Na
ausência de predadores, as populações de cupins e minhocas explodem. A
quantidade de cupins no solo aumenta nove vezes. Já a de minhocas cresce
14 vezes.”
Por outro lado, quando o pasto é convertido em canavial, as populações
de cupim e minhocas também são eliminadas, em decorrência da correção
química do solo.
O solo nativo é ligeiramente ácido e os invertebrados e microrganismos
estão adaptados para viver num ambiente de leve acidez. Como a cana
precisa de um solo mais alcalino, a agroindústria introduz quantidades
maciças de calcário – além de fertilizantes, herbicidas e pesticidas.
“Isto torna o solo tóxico, especialmente para as minhocas”, diz Franco.
O resultado da correção química do solo e, posteriormente, da adubação
química é a eliminação quase completa de toda a sua biodiversidade. Os
poucos animais e microrganismos que poderiam se adaptar a um solo
levemente alcalino são eliminados pelos agrotóxicos.
“Cerca de 90% da macrofauna do solo desapareceu. Em termos de grupos
animais, perdeu-se 40%”, diz Franco. Ou seja, o solo dos canaviais é um
solo extirpado de biodiversidade – e, em consequência, instável.
Cupins e formigas são os “engenheiros do solo”, observa Franco. Eles são
importantes para manter sua estabilidade. Onde há mais animais a
estabilidade do solo é maior. Decorre daí que menos animais significa
menor estabilidade e, por conseguinte, maior risco de erosão.
Outra questão a ser contabilizada é a perda de carbono do solo. A ação
de cupins e formigas faz com que partículas de carbono sejam
encapsuladas em microagregados de argila ou areia e permaneçam
protegidas da decomposição por microrganismos. Já as minhocas
estabilizam as partículas de carbono que passam pelo seu trato digestivo
e que ficam igualmente encapsuladas, fora do alcance dos
microrganismos.
A perda da macrofauna coloca em risco a estabilidade do solo e a sua
capacidade de armazenar carbono, além de contribuir para a liberação de
carbono na atmosfera.
O artigo de André L.C. Franco, Marie L.C. Bartz, Maurício R. Cherubin,
Dilmar Baretta, Carlos E.P. Cerri, Brigitte J. Feigl, Diana H. Wall,
Christian A. Davies Carlos C. Cerri, Loss of soil (macro)fauna due to
the expansion of Brazilian sugarcane acreage, publicado em Science of
the Total Environment , pode ser lido em
www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969716308117.
Fonte: Fapesp