Em
artigo, o secretário-executivo do ISA, André Villas-Bôas, avalia e
critica as medidas tomadas pelo governo Bolsonaro até aqui na pauta
socioambiental. Texto publicado originalmente na versão digital da Folha de S.Paulo, de 10/4/2019
Nunca
foram vistos tantos equívocos, desgaste e confusão em apenas 100 dias
de governo. O presidente da República, seus filhos e alguns ministros
encarregam-se de promover conflitos simultâneos, inclusive fomentando de
forma gratuita acusações entre facções que, supostamente, apoiam-no.
Com viés ideológico bizarro, ministérios e políticas inteiros não apenas
são desmontados, mas reduzidos ao ridículo.
O
ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, até agora, só mostrou vontade
para criminalizar servidores e ambientalistas - ele próprio condenado
por improbidade administrativa por fraudar o plano de manejo de uma
Unidade de Conservação. Já bastante desmoralizado nos foros ambientais
mundiais, Salles pretende chantagear a comunidade internacional,
defendendo que o Brasil só tomará medidas para reduzir emissões de gases
de efeito estufa e o desmatamento se for pago para isso, trocando o
protagonismo do país pelo oportunismo na agenda de mudanças climáticas (leia mais).
De forma patética, o ministro tentou aproveitar-se do maior desastre
humanitário ambiental de nossa história, em Brumadinho (MG), para propor
a flexibilização da legislação do licenciamento ambiental (saiba mais).
Nunca é demais lembrar que a catástrofe teve entre uma de suas causas o
enfraquecimento dos controles previstos no licenciamento de uma
barragem de rejeitos de mineração.
Nos primeiros 100 dias de governo não se realizou nenhuma operação significativa contra o desmatamento e o número de multas aplicadas pelo Ibama foi o menor desde 1995.
Enquanto isso, multiplicam-se os dados sobre aumento do ritmo da
destruição da floresta e as denúncias de invasões de áreas protegidas e
violência contra ambientalistas, quilombolas, índios e assentados.
Na
mesma frente, ao promover o ceticismo climático, o desmantelamento das
políticas ambientais e o sectarismo diplomático, Bolsonaro dá um tiro no
pé de seu próprio projeto de poder, assentado na exportação de
commodities agrícolas e no fortalecimento da bancada ruralista. Neste
ano, prevê-se uma queda significativa da safra agrícola justamente por
causa de extremos climáticos, além de outros impactos negativos ao setor
a longo prazo, previstos pela comunidade científica e a Embrapa.
Por
outro lado, o mercado internacional cobra cada vez mais rigor ambiental
dos produtores rurais.
Enquanto a economia segue patinando e a
bandeira eleitoral do combate à corrupção é relegada ao segundo plano, o
percentual de brasileiros que considera o governo ótimo ou bom caiu
15%, de 49% para 34%, entre janeiro e março, segundo o IBOPE. Mas a
erosão precoce da sua popularidade não deve ser festejada: porque pode
ensejar mais medidas alopradas, com potencial de danos perenes à
sociedade, ao meio ambiente e à imagem do país.
Vale registrar que
posições defendidas por Bolsonaro, como a de vender e arrendar Terras
Indígenas e de renegar os esforços para proteção da biodiversidade e o
enfrentamento da crise ambiental e climática, são regressivas mesmo em
relação àquelas defendidas pelo regime militar que ele não cansa de
elogiar. Foi ainda durante a ditadura que se reconheceu como
constitucional que as Terras Indígenas são bens da União e que o nosso
patrimônio natural deve ser preservado. Se as posições de Bolsonaro
traduzirem-se em medidas concretas, representarão retrocesso secular
para as políticas socioambientais.
Apenas três meses após assumir o Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o presidente Adalberto
Eberhard pediu exoneração nesta segunda-feira, 15, acentuando o clima tenso e
conflagrado no Ministério do Meio Ambiente. Ele vinha sendo cobrado pelos
servidores do órgão a dar uma resposta às declarações feitas pelo ministro
Ricardo Salles durante uma cerimônia pública no fim de semana.
Assim como a crise interna no Ministério da Educação
derrubou o ex-ministro Ricardo Vélez Rodríguez e as desavenças na Agência
Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) já causaram a
demissão de dois presidentes, o Meio Ambiente também vive um momento
tumultuado.
Além do embate no ICMBio, há outros focos de conflito no
ministério de Salles. A então presidente do Ibama, Suely Araújo, pediu demissão
depois que o ministro fez insinuações sobre o valor da contratação de carros
oficiais no órgão. O governo também já criou polêmica no setor ao exonerar um
funcionário do Ibama que havia multado o então deputado Jair Bolsonaro por
pesca ilegal em área protegida.
Também no fim de semana, o pivô foi o próprio presidente
Jair Bolsonaro. Em vídeo divulgado pelo senador Marcos Rogério (DEM-RO), ele
desautorizou os fiscais do Ibama que queimaram caminhões e tratores apreendidos
numa operação contra o desmatamento ilegal em Rondônia. Essa ação dos fiscais,
porém, é prevista em lei.
Adalberto Eberhard enviou carta a Salles alegando
"motivos pessoais" para sua demissão do ICMBio - órgão responsável
pela gestão de 335 unidades de conservação federais no País. A decisão, no
entanto, foi tomada depois que o ministro, numa reunião conturbada com
produtores rurais do Rio Grande do Sul, no sábado, se irritou com a ausência de
servidores do instituto e ameaçou uma punição por "desrespeito à figura do
ministro, do presidente do ICMBio e do povo gaúcho".
Salles e Eberhard visitavam a região do Parque Nacional
Lagoa do Peixe. Após ouvir queixas de pescadores e produtores locais sobre o
ICMBio, o ministro pediu para que os funcionários do órgão se juntassem a ele
na mesa. "Não tem nenhum funcionário?", perguntou na sequência.
"Vocês vejam a diferença de atitude: está aqui o presidente do ICMBio que,
embora seja um ambientalista histórico, uma pessoa respeitada no setor, veio
aqui ouvir a opinião de todos vocês. E na presença do ministro do Meio Ambiente
e do presidente do ICMBio, não há nenhum funcionário aqui."
Salles, então, anunciou a abertura de processo
administrativo disciplinar contra todos os funcionários. A plateia aplaudiu com
entusiasmo. Eberhard manteve-se em silêncio. A resposta veio nesta segunda,
quando ele foi até seu gabinete em Brasília, limpou as gavetas, despediu-se dos
funcionários e entregou a carta de demissão ao ministro.
Funcionários relataram ao jornal O Estado de S. Paulo que
não foram ao evento com o ministro e o presidente do ICMBio simplesmente porque
não haviam sido convocados para a cerimônia, que foi acompanhada por políticos
gaúchos, além de representantes do agronegócio. Alguns servidores chegaram a ir
ao evento, mas apenas cerca de 20 minutos depois do início e só ao saberem que
o ministro havia ameaçado puni-los pela ausência. O chefe do parque, Fernando
Weber, se juntou à mesa, ao lado do ministro, mas não teve a chance de
responder às críticas.
Fusão
A exoneração pode acelerar a proposta de Salles de fundir o
ICMBio ao Ibama, que cuida do licenciamento ambiental e do controle do
desmatamento, entre outras ações. Questionado, o ministro não negou a intenção,
mas não citou datas. "Por enquanto, ainda não faremos isso", disse ao
Estado. A mudança depende de projeto de lei. À reportagem, Salles afirmou que
agradecia ao "grande trabalho que o Adalberto fez à frente do ICMBio num
momento muito difícil e de reestruturação" e admitiu que ainda não tem um
nome substituto.
Salles, agora, terá de enfrentar as reações à condenação de
Bolsonaro à queima de caminhões e tratores em crimes ambientais, além de
críticas recorrentes à sua atuação - como por ter determinado ao Ibama que
liberasse a exploração de petróleo na área do santuário de Abrolhos (BA),
contrariando pareceres técnicos do próprio órgão. As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.
O WWF-Brasil vê com profunda preocupação a decisão do governo
federal, por meio da Agência Nacional de Petróleo e do Ibama (Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), em
incluir blocos das bacias de Jacuípe (3 blocos) e Camamu-Almada (4
blocos) na 16ª Rodada de Licitações para Concessões de Petróleo e Gás,
anunciada esta semana. As áreas se localizam nas proximidades da Bacia
de Abrolhos, reconhecido patrimônio da biodiversidade marinha
brasileira.
O primeiro ponto de atenção se deve ao fato de que as análises
técnicas do Ibama, contrárias à exploração, foram ignoradas pela direção
do órgão cuja missão é “proteger o meio ambiente, garantir a qualidade
ambiental e assegurar a sustentabilidade no uso dos recursos naturais,
executando as ações de competência federal”.
Parecer técnico do Ibama, de março de 2019 (Informação Técnica nº 7/2019-COPROD/CGMAC/DILIC),
propõe a exclusão da totalidade das áreas a serem ofertadas nas bacias
de Jacuípe (3 blocos) e Camamu-Almada (4 blocos) por riscos à
biodiversidade da Bacia de Abrolhos.
“Colocar em risco a Bacia de Abrolhos em nome de uma possível
exploração de petróleo é uma decisão equivocada. Ao sobrepor o interesse
econômico à proteção da biodiversidade se expõe uma visão de curto
prazo sobre as riquezas que a natureza pode nos oferecer, sobretudo nos
oceanos de onde retiramos alimentos e proteção. Além disso, ela traz a
insistência em um modelo energético que privilegia os combustíveis
fósseis, um caminho do qual deveríamos nos desviar”, afirma Mauricio
Voivodic, diretor-executivo do WWF-Brasil.
Com base em informações disponíveis no Relatório de Impacto
Ambiental de Perfuração disponibilizado pela empresa, traz grande
preocupação a possível emissão de uma licença para as atividades de
perfuração, segundo manifestação de um conjunto de organizações ainda em
2013 (Conservação Internacional, Gambá, Instituto Amigos da Reserva da
Biosfera da Mata Atlântica, Instituto Baleia Jubarte, PANGEA, Projeto
Coral Vivo, Fundação SOS Mata Atlântica). Ainda segundo esta
manifestação, “as simulações de vazamento de pior caso indicam grande
risco de impacto aos ambientes costeiros próximos - especialmente
manguezais que possuem alta sensibilidade ao óleo e em toda a Região dos
Abrolhos“.
Em segundo lugar, é preciso manter a proteção garantida por lei do
Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. Criado por Decreto Federal
88218/1983, o Parque resguarda uma área de 87.943 ha no Banco de
Abrolho, região reconhecida como o maior e mais complexo ambiente
coralíneo do Atlântico Sul, abrigando a maior “bidoversidade marinha, o
principal berçário das baleias jubartes, além de abrigar importantes
áreas de reprodução e alimentação de aves e tartarugas marinhas”,
segundo o próprio Ministério do Meio Ambiente.
Por último, mas não menos importante, é preciso dar o devido valor e
lugar das informações técnico-científicas e fortalecer os órgãos que têm
como trabalho e missão fornecer informações objetivas para nos guiar
para uma economia de baixo carbono, ambientalmente correta e socialmente
justa.
por Ana Aranha, Luana Rocha, Agência Pública/Repórter Brasil –
Um coquetel que mistura diferentes agrotóxicos foi encontrado na água
de 1 em cada 4 cidades do Brasil entre 2014 e 2017. Nesse período, as
empresas de abastecimento de 1.396 municípios detectaram todos os 27
pesticidas que são obrigados por lei a testar. Desses, 16 são
classificados pela Anvisa como extremamente ou altamente tóxicos e 11
estão associados ao desenvolvimento de doenças crônicas como câncer,
malformação fetal, disfunções hormonais e reprodutivas. Entre os locais
com contaminação múltipla estão as capitais São Paulo, Rio de Janeiro,
Fortaleza, Manaus, Curitiba, Porto Alegre, Campo Grande, Cuiabá,
Florianópolis e Palmas.
Os dados são do Ministério da Saúde e foram obtidos e tratados em
investigação conjunta da Repórter Brasil, Agência Pública e a
organização suíça Public Eye. As informações são parte do Sistema de
Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano
(Sisagua), que reúne os resultados de testes feitos pelas empresas de
abastecimento.
Os números revelam que a contaminação da água está aumentando a
passos largos e constantes. Em 2014, 75% dos testes detectaram
agrotóxicos. Subiu para 84% em 2015 e foi para 88% em 2016, chegando a
92% em 2017. Nesse ritmo, em alguns anos, pode ficar difícil encontrar
água sem agrotóxico nas torneiras do país.
Embora se trate de informação pública, os testes não são divulgados
de forma compreensível para a população, deixando os brasileiros no
escuro sobre os riscos que correm ao beber um copo d’água. Em um esforço
conjunto, a Repórter Brasil, a Agência Pública e a organização suíça
Public Eye fizeram um mapa interativo com os agrotóxicos encontrados em
cada cidade. O mapa revela ainda quais estão acima do limite de
segurança de acordo com a lei do Brasil e pela regulação europeia, onde
fica a Public Eye.
Saiba o nível de contaminação da sua cidade clicando na imagem abaixo.
O retrato nacional da contaminação da água gerou alarde entre
profissionais da saúde. “A situação é extremamente preocupante e
certamente configura riscos e impactos à saúde da população”, afirma a
toxicologista e médica do trabalho Virginia Dapper. O tom foi o mesmo na
reação da pesquisadora em saúde pública da Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz) no Ceará, Aline Gurgel: “dados alarmantes, representam sério
risco para a saúde humana”. En
Entre
os agrotóxicos encontrados em mais de 80% dos testes, há cinco
classificados como “prováveis cancerígenos” pela Agência de Proteção
Ambiental dos Estados Unidos e seis apontados pela União Europeia como
causadores de disfunções endócrinas, o que gera diversos problemas à
saúde, como a puberdade precoce. Do total de 27 pesticidas na água dos
brasileiros, 21 estão proibidos na União Europeia devido aos riscos que
oferecem à saúde e ao meio ambiente.
A falta de monitoramento também é um problema grave. Dos 5.570
municípios brasileiros, 2.931 não realizaram testes na sua água entre
2014 e 2017.
Coquetel tóxico
A mistura entre os diversas químicos foi um dos pontos que mais gerou
preocupação entre os especialistas ouvidos. O perigo é que a combinação
de substâncias multiplique ou até mesmo gere novos efeitos. Essas
reações já foram demonstradas em testes, afirma a química Cassiana
Montagner. “Mesmo que um agrotóxico não tenha efeito sobre a saúde
humana, ele pode ter quando mistura com outra substância”, explica
Montagner, que pesquisa a contaminação da água no Instituto de Química
da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), de São Paulo. “A mistura
é uma das nossas principais preocupações com os agrotóxicos na água”.
Os paulistas foram os que mais beberam esse coquetel nos últimos
anos. O estado foi recordista em número de municípios onde todos os 27
agrotóxicos estavam na água. São mais de 500 cidades, incluindo a grande
São Paulo – Guarulhos, São Bernardo do Campo, Santo André e Osasco –
além da própria capital. E algumas das mais populosas, como Campinas,
São José dos Campos, Ribeirão Preto e Sorocaba. O Paraná foi o segundo
colocado, com coquetel presente em 326 cidades, seguido por Santa
Catarina e Tocantins.
Os especialistas falam muito sobre a “invisibilidade” do efeito
coquetel. As políticas públicas não monitoram a interação entre as
substâncias porque os estudos que embasam essas políticas não apontam os
riscos desse fenômeno. “Os agentes químicos são avaliados isoladamente,
em laboratório, e ignoram os efeitos das misturas que ocorrem na vida
real”, diz a médica e toxicologista Dapper.
Por isso, ela lamenta, as pessoas que já estão desenvolvendo doenças
em decorrência dessa múltipla contaminação provavelmente nunca saberão a
origem da sua enfermidade. Nem os seus médicos.
Questionado sobre quais medidas estão sendo tomadas, o Ministério da
Saúde enviou respostas por email reforçando que “a exposição aos
agrotóxicos é considerada grave problema de saúde pública” e listando
efeitos nocivos que podem gerar “puberdade precoce, aleitamento
alterado, diminuição da fertilidade feminina e na qualidade do sêmen;
além de alergias, distúrbios gastrintestinais, respiratórios,
endócrinos, neurológicos e neoplasias” (Leia a íntegra das respostas do
Ministério da Saúde).
A resposta, porém, ressalta que ações de controle e prevenção só
podem ser tomadas quando o resultado do teste ultrapassa o máximo
permitido em lei. E aí está o problema: o Brasil não tem um limite
fixado para regular a mistura de substâncias.
Essa é uma das reivindicações dos grupos que pedem uma regulação mais
rígida para os agrotóxicos. “É um absurdo esse problema ficar invisível
no monitoramento da água e não haver ações para controlá-lo”, afirma
Leonardo Melgarejo, engenheiro de produção e membro da Campanha Nacional
Contra os Agrotóxicos e Pela Vida “Se detectar diversos agrotóxicos,
mas cada um abaixo do seu limite individual, a água será considerada
potável no Brasil. Mas a mesma água seria proibida na França”.
Ele se refere à regra da União Europeia que busca restringir a
mistura de substâncias: o máximo permitido é de 0,5 microgramas em cada
litro de água – somando todos os agrotóxicos encontrados. No Brasil, há
apenas limites individuais. Assim, somando todos os limites permitidos
para cada um dos agrotóxicos monitorados, a mistura de substâncias na
nossa água pode chegar a 1.353 microgramas por litro sem soar nenhum
alarme. O valor equivale a 2.706 vezes o limite europeu.
O risco das pequenas quantidades
Mesmo quando se olha a contaminação de cada agrotóxico isoladamente, o
quadro preocupa. Dos 27 agrotóxicos monitorados, 20 são listados como
altamente perigosos pela Pesticide Action Network, grupo que reúne
centenas de organizações não governamentais que trabalham para monitorar
os efeitos dos agrotóxicos.
Mas, aos olhos da lei brasileira, o problema é pequeno. Apenas 0,3%
de todos os casos detectados de 2014 a 2017 ultrapassaram o nível
considerado seguro para cada substância. Mesmo considerando os casos em
que se monitora dez agrotóxicos proibidos no Brasil, são poucas as
situações em que a presença deles na água soa o alarme.
E esse é o segundo alerta feito por parte dos pesquisadores: os
limites individuais seriam permissivos. “Essa legislação está há mais de
10 anos sem revisão, é muito atraso do ponto de vista científico”
afirma a química Montagner. “É como usar uma TV antiga, pequena e preto e
branco, quando você pode ter acesso a uma HD de alta definição”.
Ela se refere a pesquisas mais recentes sobre os riscos do consumo
frequente e em quantidades menores, um tipo de contaminação que não gera
reações imediatas. “Talvez certo agrotóxico na água não leve 15% da
cidade para o hospital no mesmo dia. Mas o consumo contínuo gera efeitos
crônicos ainda mais graves, como câncer, problemas na tireoide,
hormonal ou neurológico”, alerta Montagner. “Já temos evidências
científicas, mas a água contaminada continua sendo considerada como
potável porque não se olha as quantidades menores”, afirma.
Em resposta a essa crítica, um grupo de trabalho foi criado pelo
Ministério da Saúde para rever os limites da contaminação. “Estamos
fazendo um trabalho criterioso”, afirma Ellen Pritsch, engenheira
química e representante da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária
e Ambiental no grupo. Segundo ela, pesquisas internacionais e
regulações de outros países estão sendo levados em conta. Criado em
2014, a previsão é que os trabalhos sejam concluídos em setembro.
Pelo menos 144 cidades detectaram o mesmo pesticida de modo contínuo
durante os quatro anos de medições seguidos, segundo os dados. Mais uma
vez, São Paulo é o recordista desse fenômeno de intoxicação.
Especialistas ouvidos pela reportagem apontam o uso de pesticidas na
produção de cana de açúcar como a provável origem para a larga
contaminação do estado. “A cultura da cana é a que tem mais herbicidas
registrados. Como São Paulo é um dos maiores produtores de cana, isso
justifica sua presença elevada [de pesticidas na água]”, afirma Kassio
Mendes, coordenador do comitê de qualidade ambiental da Sociedade
Brasileira da Ciência das Plantas Daninhas.
O diuron, um dos principais herbicidas usados pelo setor, foi
detectado em todos os testes feitos na água dos mananciais das regiões
onde mais se cultiva cana no estado, segundo dados de 2017 da Companhia
Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). A substância é uma das
apontadas como provável cancerígena pela Agência de Proteção Ambiental
dos Estados Unidos.
De quem é a responsabilidade?
Depois de contaminada, são poucos os tratamentos disponíveis para
tirar o agrotóxico da água. “Alguns filtros são capazes de tirar alguns
tipos de agrotóxicos, mas não há um que dê conta de todos esses”, afirma
Melgarejo. “A água mineral vem de outras fontes, mas que são
alimentadas pela água que corre na superfície, então eventualmente
também serão contaminadas”.
O trabalho preventivo, ou seja, evitar que os agrotóxicos cheguem aos
mananciais, deveria ser primordial, afirma Rubia Kuno, gerente da
divisão de toxicologia humana e saúde ambiental da Cetesb. “O esforço
deve ser na prevenção porque o sistema de tratamento convencional não é
capaz de remover os agrotóxicos da água”, afirma.
É grande o debate sobre a complexidade em se enfrentar o problema,
mas é difícil encontrar quem está assumindo a responsabilidade.
A reportagem procurou as secretarias do Meio Ambiente, Agricultura e
Saúde e Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp)
para entender quais ações são tomadas no estado com o maior índice de
contaminação. As respostas foram dadas pela Sabesp e pela assessoria do
meio ambiente com informações técnicas sobre o monitoramento. Nem as
secretarias nem a empresa esclareceram o que está sendo feito para
controlar ou prevenir o problema. (Leia a íntegra das respostas da
Sabesp e da Secretaria do Meio Ambiente)
O Ministério da Saúde diz que a vigilância sanitária dos municípios e
dos estados deve dar o alerta aos prestadores de serviços de
abastecimento de água para que tomem as providências de melhoria no
tratamento da água. “Caso os dados demonstrem que o problema ocorre de
forma sistemática, é preciso buscar soluções a partir da articulação com
os demais setores envolvidos, como órgãos de meio ambiente, prestadores
de serviço e produtores rurais”, diz a nota enviada pelo órgão.
Questionado sobre quais ações estão sendo tomadas, o Sindicato
Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), que
representa os produtores de agrotóxicos, fez uma defesa sobre a
segurança dos pesticidas. Em nota, o grupo afirma que a avaliação feita
pela Anvisa, Ibama e Ministério da Agricultura garante que eles são
seguros ao trabalhador, população rural e ao meio ambiente “sempre que
utilizados de acordo com as recomendações técnicas aprovadas e indicadas
em suas embalagens”.
O sindicato afirma que a aplicação correta dos produtos no campo é um
desafio e atribui a responsabilidade aos trabalhadores que aplicam os
pesticidas. “O setor de defensivos agrícolas realiza iniciativas para
garantir a aplicação correta de seus produtos, uma vez que alguns
problemas estruturais da agricultura como a falta do hábito da leitura
de rótulo e bula e analfabetismo no campo trazem um desafio adicional de
cumprimento às recomendações de uso”.
Ao contrário do que ocorre em outros países, no Brasil as empresas
que produzem agrotóxicos não se envolvem com o monitoramento da água,
que é custeado pelos cofres públicos e pelas empresas de abastecimento.
Em Santa Catarina, que está entre os três estados com maior
contaminação, o Ministério Público Estadual chamou a responsabilidade de
prefeituras, secretarias estaduais, concessionárias de água, agências
reguladoras e sindicatos de produtores e trabalhadores rurais. A
iniciativa partiu dos resultados de um estudo inédito que encontrou
agrotóxicos na água de 22 municípios. “Alertamos todos os órgãos
públicos e privados envolvidos para buscar soluções, é preciso aplicar
medidas corretivas para diminuir os riscos dos cidadãos”, diz a
promotora Greicia Malheiros, responsável pela investigação. A iniciativa
teve início em março desse ano e ainda não tem resultados.
Mais do que remediar a contaminação da água, a coordenadora técnica
do estudo, a engenheira química Sonia Corina Hess, defende a proibição
do uso dos pesticidas que oferecem maior risco. Das substâncias
encontradas em seu estudo no estado catarinense, sete estão proibidas na
União Europeia por oferecer risco à saúde humana. “Tem que proibir o
que é proibido lá fora, tem que proibir o que é perigoso. Se faz mal
para eles porque no Brasil é permitido?”, questiona.
Perigoso na Europa, permitido no Brasil
O controle da água feito pelo Brasil também está distante dos parâmetros
da União Europeia. Com o objetivo de eliminar a contaminação, o
continente fixou a concentração máxima na água em 0,1 micrograma por
litro – valor que era o mínimo detectável quando a regulação foi criada.
Para descobrir como a água do Brasil seria avaliada pelo padrão
europeu, a organização Public Eye classificou os dados fornecidos pelo
Ministério da Saúde segundo o critério daquele continente. Alguns dos
agrotóxicos mais perigosos ultrapassaram os limites europeus em mais de
20% dos testes. Entre eles, o glifosato e o mancozebe, ambos associados a
doenças crônicas, e o aldicarbe, proibido no Brasil e classificado pela
Anvisa como “o agrotóxico mais tóxico registrado no país, entre todos
os ingredientes ativos utilizados na agricultura”.
O glifosato é o caso mais revelador sobre as peculiaridades do Brasil
na regulação sobre agrotóxicos. Classificado como “provável
carcinogênico” pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, órgão
da Organização Mundial da Saúde, o pesticida está sendo discutido em
todo o mundo. Há milhares de pacientes com câncer processando os
fabricantes nos Estados Unidos – e vencendo nos tribunais – além de
protestos e petições pedindo a sua proibição na Europa. Não há consenso,
entre as agências reguladoras, sobre sua classificação. No Brasil, que
oficialmente colocou a substância em revisão desde 2008, o Ministério da
Agricultura liberou novos registros para a venda de glifosato no início
deste ano. O pesticida passou a ser vendido em novas formas,
quantidades e por número maior de fabricantes.
Nos testes com a água do país, a controversa substância foi a que
mais ultrapassou a margem de segurança segundo o critério da União
Europeia: 23% dos casos acima do limite. Pela lei brasileira, o
glifosato foi um dos que menos soou o alarme: apenas 0,02% dos testes
ultrapassaram o nosso limite.
“Isso é um escândalo de saúde pública. Nós colocamos o limite alto,
lá na estratosfera, e aí comemoramos que temos uma água segura”,
questiona a pesquisadora Larissa Bombardi, professora de geografia na
Universidade de São Paulo e autora de um atlas que compara a lei
brasileira e europeia no controle dos agrotóxicos. Seu estudo revela
como nossos limites chegam a ser 5 mil vezes mais altos que os europeus.
O caso mais grave é o do glifosato: enquanto na Europa é permitido
apenas 0,1 miligramas por litro na água, aqui no Brasil a legislação
permite até 500 miligramas por litro.
Como o glifosato é o agrotóxico mais vendido no país, e também o que
tem o limite mais generoso para presença na água, Bombardi lança
suspeitas sobre os critérios usados: “no caso do glifosato é realmente
difícil encontrar justificativa científica, parece ser mais uma decisão
política e econômica”. O pesticida foi o mais consumido em 2017 no
Brasil com 173 mil toneladas vendidas, segundo o Ibama. O volume
corresponde a 22% das estimativas de vendas para esse químico em todo o
mundo no mesmo ano – o que faz do Brasil um importante mercado para as
fabricantes, entre elas as gigantes Syngenta e a Monsanto – comprada
pela Bayer no ano passado.
Limites generosos
A larga diferença entre os limites fixados pela União Europeia e pelo
Brasil é um dos principais argumentos dos críticos do uso da substância
no Brasil. “Essa diferença só pode se dar por dois motivos. Ou porque
nossa sociedade é mais forte, somos seres mais resistentes aos
agrotóxicos. Ou mais tola, porque estamos sendo ingênuos quanto aos
riscos que corremos”, provoca Melgarejo, da
Campanha Contra os
Agrotóxicos.
A engenheira química Ellen Pritsch, representante da Associação
Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental no grupo de trabalho que
reavalia os limites dos pesticidas na água, discorda. Para ela, os
atuais limites são seguros e foram fixados com embasamento científico.
“O critério brasileiro é dez vezes menor do que o efeito que geraria
problema. Então, mesmo que seja encontrado um percentual acima esse
valor, ainda assim seria menor [estaria abaixo do risco]”, afirma.
Antes de aprovar os registros dos agrotóxicos, as empresas
fabricantes entregam estudos com testes feitos com animais em
laboratórios. O Sindiveg, sindicato da indústria de fabricantes de
pesticidas, defende que esses estudos são o suficiente para avaliar os
riscos das substâncias. “São estudos de bioconcentração em peixes e
micro-organismo, algas e organismos do solo, abelhas, microcrustáceos,
peixes e aves”, afirma nota enviada pelo Sindiveg em resposta às
perguntas da reportagem.
A principal reivindicação dos grupos que fazem campanha pelo controle
dos agrotóxicos é por mais restrição e até pela proibição de alguns dos
pesticidas hoje aprovados no país, como a atrazina, o acefato e o
paraquate, que são campeões de venda no Brasil, mas proibidos na União
Europeia.
Mas o governo aponta na direção oposta. A responsável pela pasta da
agricultura, ex-líder da bancada ruralista Tereza Cristina, foi
presidente da comissão especial na Câmara que aprovou, em junho passado,
o Projeto de Lei que propõe agilizar a aprovação de novos agrotóxicos
no país. Apelidado pelos críticos como o “PL do veneno”, já gerou grande
polêmica, sendo criticado em uma carta assinada por mais de 20 grupos
da comunidade científica.
Sem previsão de conseguir maioria no Congresso para aprovar o PL, a
estratégia parece ter mudado. Desde o início do ano, o Ministério da
Agricultura publicou novos registros para 152 agrotóxicos, uma
velocidade recorde de 1,5 aprovações por dia. Chamada para esclarecer as
liberações em audiência na Câmara na última terça-feira (9), a ministra
disse que “não existe liberação geral” e que longos processos de
aprovação só atrasam o agronegócio brasileiro.
Ela chamou de
“desinformação” os estudos que apontam os riscos dessas substâncias e,
usando o mesmo argumento do sindicato dos produtores de agrotóxicos,
declarou que as intoxicações ocorrem devido ao modo como os
trabalhadores aplicam as substâncias. Um dia depois da audiência, o
governo aprovou a comercialização de mais 31 agrotóxicos no Brasil.
Esta reportagem faz parte do projeto Por Trás do
Alimento, uma parceria da Agência Pública e Repórter Brasil para
investigar o uso de Agrotóxicos no Brasil. A cobertura completa está no site do projeto.
O agito dos grandes centros urbanos prejudica a saúde física e
mental. As poluições sonora, visual e atmosférica somadas ao
enclausuramento do dia a dia contribuem com o desencadeamento de
problemas pulmonares, cardíacos e emocionais. Diante deste contexto, a
ciência vem mostrando que praticar atividades ao ar livre, em contato
com a natureza, é o que precisa ser incorporado na rotina das pessoas
como forma de tratamento preventivo.
Pesquisadores da Universidade de Chiba, no Japão, reuniram 168
voluntários e colocaram metade para passear em florestas e o grupo
restante para andar nos centros urbanos. As pessoas que tiveram contato
com a natureza mostraram em geral uma diminuição de 16% no cortisol
(hormônio do estresse), 4% na frequência cardíaca e 2% na pressão
arterial.
Para o neurologista e psicoterapeuta cognitivo Mário Negrão, é
possível notar uma melhora significativa no aparelho digestivo, nas
alergias e na resistência à bactérias e infecções, mas o mais importante
é a sensação de bem-estar. “Quando você coloca um indivíduo em uma
cidade sem muita natureza, você está colocando-o em um ecossistema
hostil, onde tudo que o rodeia é artificial. É comprovado que isso gera
um impacto imenso na saúde”, relata.
Na Austrália, um estudo produzido na Universidade Deakin mostra que a
natureza oferece às pessoas momentos de liberdade e relaxamento,
impactando positivamente o estado mental dos indivíduos e reduzindo
sintomas de ansiedade e depressão. Na Holanda, pesquisadores do Centro
Médico Universitário de Amsterdã constataram que pessoas que vivem
próximas da natureza reduzem em 21% as chances de desenvolverem
depressão. Os benefícios também envolvem uma melhora na qualidade do
sono, no desenvolvimento cognitivo, na imunidade, nos problemas
cardíacos e pulmonares, além de uma redução na ansiedade, na tensão
muscular e na possibilidade de desenvolver doenças como obesidade e
diabetes.
Para a doutora em Ciências Florestais e membro da Rede de
Especialistas em Conservação da Natureza, Teresa Magro, a sensação de
bem-estar está relacionada também ao que fazemos no ambiente natural.
“Só o fato de olhar uma paisagem, fazer um passeio em um parque ou em
uma área com menos barulho, já nos dá uma sensação de relaxamento”,
afirma.
No país com a mais rica biodiversidade do mundo, o contato com a
natureza pode ocorrer em diferentes espaços, como parques, praças,
cachoeiras e ambientes costeiros e marinhos. “Os benefícios fornecidos
pela natureza – como ar puro, água, regulação microclimática, redução de
partículas poluentes, relaxamento mental e físico, entre outros – e sua
conexão com a saúde das pessoas devem ser vistos pela sociedade e pelo
poder público como uma prioridade. Ter espaços verdes acessíveis e bem
cuidados próximos da população estimula a visitação e a prática de
atividades, o que resulta em indivíduos mais relaxados e produtivos”,
completa a gerente de Conservação da Biodiversidade da Fundação Grupo
Boticário de Proteção à Natureza, Leide Takahashi.
Sobre a Rede de Especialistas
A Rede de Especialistas de Conservação da Natureza é uma reunião de
profissionais, de referência nacional e internacional, que atuam em
áreas relacionadas à proteção da biodiversidade e assuntos correlatos,
com o objetivo de estimular a divulgação de posicionamentos em defesa da
conservação da natureza brasileira. A Rede foi constituída em 2014, por
iniciativa da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
O projeto tem capacidade de produção de 116, 86MW de potência.
Em alta no mundo pelo baixo potencial poluidor, a energia
solar tem se tornado uma das melhores alternativas para geração de energia
elétrica renovável. A cidade de Barreiras, que fica no oeste baiano, não ficou
de fora e ganhará em breve um dos maiores parques de energia solar do Brasil.
O Sertão Solar Barreiras já está em fase de implantação nas
proximidades do Aeroporto da cidade, em uma área de cerca de 300 hectares. A
expectativa é gerar 500 empregos diretos e em torno de 2.000 indiretos. A
Prefeitura de Barreiras, por meio do Projeto Desenvolve Barreiras, tem
oferecido o apoio necessário para agilizar os procedimentos de emissão de
alvarás e licenças, para que a cidade seja beneficiada o mais breve possível
com o funcionamento do parque.
“Estamos em uma região de produção agrícola em expansão na
área de irrigação e industrialização, esse investimento chega aqui em boa hora
para reforçar a oferta de energia em nossa região. Além de alavancar o
comércio, a geração de emprego e renda, a arrecadação municipal também ganhará
com o funcionamento do parque por meio de impostos como o ICMS e royalties”,
comentou o prefeito de Barreiras Zito Barbosa.
“Queremos aproveitar ao máximo a mão de obra local, e nesse sentido
necessitaremos do apoio da Prefeitura. Nosso projeto em Barreiras tem
capacidade de produção de 116, 86MW de potência, para se ter uma ideia a
estrutura corresponde a 352.442 painéis de energia”, explicou o diretor
de desenvolvimento da Atlas Renewable Energy, empresa responsável pelo
empreendimento.
“Esse é um projeto de impacto ambiental muito pequeno, diferente das
PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas) e Termoelétricas que nós temos na
região”, concluiu o prefeito.
Com informações da prefeitura de Barreiras.
Por Camila Maciel – Agência Brasil
Os efeitos da poluição do ar à saúde humana já são conhecidos. Uma
pesquisa do Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo
(USP) identificou agora que as árvores também sofrem esses efeitos, o
que interfere nos benefícios ambientais prestados por elas. Os
pesquisadores utilizaram como modelo a tipuana (Tipuana tipu) –
uma das espécies de árvores mais comuns em São Paulo – e mostraram que
os poluentes atmosféricos restringem o desenvolvimento desse tipo de
planta.
Diminuir temperatura, produzir vapor de água, mitigar o escoamento da
água da chuva e, inclusive, filtrar a poluição são alguns dos
benefícios das árvores no ambiente urbano que estão prejudicados. “Vamos
precisar muito desses serviços ambientais para a gente se adaptar aos
impactos das mudanças climáticas. É muito importante ter árvores na
cidade. Quanto mais saudáveis elas forem, mais rapidamente a gente vai
ganhar esse serviço [ambiental]. As árvores que estão crescendo neste
momento estão, provavelmente, sofrendo com o efeito da poluição”, disse
Marcos Buckeridge, professor do IB-USP e responsável pelo projeto.
Foram analisadas 41 tipuanas localizadas em diferentes distâncias do
Polo Industrial de Capuava, em Mauá, uma das áreas mais industrializadas
da região metropolitana de São Paulo. De acordo com os pesquisadores, o
bairro é composto por áreas residenciais e comerciais e um polo
industrial, formado por refinarias de petróleo e fábricas de cimento e
fertilizantes, por onde circula grande quantidade de caminhões e carros.
Estudo
Com um instrumento semelhante a uma broca de furadeira, mas com o
interior oco, chamado de sonda Pressler, os pesquisadores retiraram
amostras das cascas e dos anéis de crescimento. Eles analisaram a
composição química e o tamanho dos anéis e conseguiram medir a variação
dos níveis de poluição do ar por diversos elementos químicos a que as
plantas foram expostas durante o desenvolvimento e como esse fator
influenciou o crescimento delas.
“Nós pegamos árvores que estão em posição onde há uma poluição muito
forte e comparamos com árvores onde a poluição não é tão forte”, afirmou
Buckeridge. Quando os anéis são muito grandes ou largos, isso indica
anos de bom crescimento, ou seja, foram anos de menores níveis de
poluição. Os anéis de crescimento menores ou mais estreitos, por sua
vez, representam anos de crescimento ruim, quando os níveis de poluição
foram maiores.
“As árvores mais próximas às vias de tráfego e expostas a
concentrações mais altas de alumínio, bário e zinco, gerados pelo
desgaste de peças de automóveis, tiveram menor crescimento ao longo dos
anos”, mostra o estudo, que teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado de São Paulo (Fapesp).
De acordo com a pesquisa, o material particulado (partículas muito
finas de sólidos ou líquidos suspensos no ar) com tamanho de até 10
micrômetros (PM10), emitido pelo polo industrial, reduziu em até 37% a
taxa de crescimento do diâmetro das árvores mais próximas à área.
Os resultados das análises da composição química das amostras das
cascas foram confirmadas com dados obtidos por meio de séries temporais
de emissões de material particulado na região de Capuava por cerca de 20
anos, elaboradas pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo
(Cetesb).
O estudo revela que os metais pesados e o material particulado
influenciam o desenvolvimento das árvores ao mudar as propriedades
ópticas da superfície das folhas. “Dessa forma, aumentam a temperatura e
reduzem a disponibilidade de luz para a fotossíntese da planta. Além
disso, podem reduzir as trocas gasosas das árvores ao acumular nos
estômatos foliares – um conjunto de células nas folhas da planta que
permitem a troca de gases com o ambiente e a transpiração do vegetal”.
Buckeridge destaca que a pesquisa mostrou o impacto da poluição no
desenvolvimento das tipuanas e, agora, em novas etapas do trabalho, será
possível calcular os impactos para a cidade como um todo. “Agora vamos
ter que integrar, fazer a modelagem da arborização em São Paulo e ver,
no caso da tipuana tipu, quais são esses efeitos no nível macro, mas nós
não temos esse número ainda”, explicou.