"74% dos eleitores brasileiros querem mudanças profundas", constatou o DataFolha.
Está aumentando! Na última rodada eram 70%. Esse é o "candidato"
que mais cresce nas pesquisas mas nenhum dos competidores com número
nas nossas urnas eletrônicas conseguiu associar-se a ele. O número
desses "não representados" cresce, aliás, exatamente porque nenhum dos candidatos da oposição propõe mudanças no sistema. Só propõem mudar quem vai operar o mesmo sistema nos próximos quatro anos.
Aécio
chega, até, a ancorar o seu discurso na introdução da meritocracia na
equação de governo mas justifica-se, para tanto, com os mesmíssimos
argumentos que Lula e cia. invocam para recusa-la: a sua augusta; a sua
magnânima vontade.
Não serve!
Isso
não pode mais ser uma escolha do governante de plantão. Ha que se
tornar impossível recusa-la; viver fora dela; manter um emprego público
sem ela. A meritocracia já é o maior dever de todo brasileiro que se
esfalfa de trabalhar aqui fora por um lugarzinho ao sol. Está na hora
dela se tornar também o seu mais sagrado direito.
Assim
como mais que o salário ou mesmo o prêmio da remuneração variável é a
perspectiva de perder o emprego que faz todo mundo trabalhar duro no Brasil Real
tentando fazer mais que o vizinho; assim como a perspectiva do castigo é
a única coisa que de fato detém o crime e, vice-versa, a impunidade o
fator que mais o incentiva, o recall é a
semente da meritocracia na política e no serviço público. E meritocracia
não é outra coisa senão sinônimo de fim da impunidade.
Com que mudança mais profunda poderiam sonhar os 74% de brasileiros desanimados de seu país e "não representados"
pelos candidatos que estão aí, do que a de planta-la definitivamente
nos universos da política e do serviço público brasileiros?
Mas o que é esse tal de recall?
Porque o voto distrital puro é o pré-requisito para que ele possa ser
implantado? Porque qualquer eleitor, do menos ao mais escolarizado, é
capaz de entender a lógica dessa ferramenta e o poder fulminante que ela
tem?
Essas são as respostas que eu ofereço na série de artigos cujos links
volto a indicar aos leitores e sugerir aos candidatos no final desta
introdução: porque armar a mão de cada eleitor com o pode de retomar a
qualquer hora o mandato concedido a quem não corresponder às suas
expectativas inverte a relação de forças entre o Estado e o cidadão que
hoje impera no Brasil; são eles que passarão a depender de nós e não
mais o contrário. Passa a ser nossa a iniciativa de propor reformas e
deles a obrigação de executa-las, sob pena de perder o mandato.
Porque, então, a imprensa nunca falou nisso?
Apenas
e tão somente porque a nenhum político interessa falar nisso pela razão
óbvia de que ele prefere continuar para todo o sempre refestelado na
impunidade e sem nenhum "patrão" cobrando o seu trabalho, e a imprensa brasileira de hoje limita-se a aderir ou a se colocar "contra" o que os seus "políticos de referência"
propõem ou deixam de propor. Deixa a eles a iniciativa da pauta
política nacional em vez de confronta-los com as alternativas que o
mundo testou e aprovou e obriga-los a se posicionar diante delas.
A
imprensa que, em outros tempos, comandou ou, pelo menos, foi o arauto
das grandes guinadas da nossa trajetória política, transformou-se, hoje,
em mera caixa de ressonância do que dizem as suas fontes viciadas e
abriu mão do papel propositivo que está legitimada para ter, elemento
constitutivo que é de toda e qualquer democracia. É isso que justifica o
apelido de "Quarto Poder" -- mais independente que os outros
três por estar livre das injunções das eleições e das nomeações -- que
ela tem nas democracias.
Enquanto
a referência do debate político brasileiro nesta era da globalização
não sair das fronteiras do Brasil não haverá avanço nenhum. Seguiremos
oscilando entre o despotismo puro e simples e o despotismo esclarecido
em que temos vivido desde sempre.
É
impossível aprender democracia em português, simplesmente porque
nenhuma das sociedades que falam essa língua jamais experimentou uma. E
não é só de exercício da democracia que se trata. Até o ato de pensar,
de estudar e de pesquisar "inquisitivamente" nos é negado pelo vício do modo jesuíta de raciocinar "defensivamente"
a que estamos todos sujeitos desde antes de nascer. Nós não
interrogamos os fatos em busca da verdade, preferimos lutar contra eles
para enquadrá-los às nossas mentiras.
A
função, por excelência, do jornalismo brasileiro nestes tempos de
progressiva exclusão do país da competição global deveria ser, portanto,
contribuir para inserir o Brasil no mundo moderno que é aquele que está
lá fora. Oferecer-lhe parâmetros.
O
divisor de águas da modernidade está no grau de inserção da
representação política das sociedades no sistema meritocrático a que
elas já estão inexoravelmente submetidas pela globalização da economia.
Quanto maior a dissintonia entre esses dois universos mais lenta será a
capacidade de se reformar para reagir a um mundo em permanente mudança e
mais alto será o imposto burocrático a ser pago por essa sociedade na
forma de exclusão dos mercados globais por falta de condições de
competir com os mais ágeis.
O voto distrital com recall
põe esses dois lados dançando para a mesma música, submetidos ao mesmo
tipo de pressão. Com o mandato dos políticos passando a depender a cada
momento da renovação do voto de confiança do seu eleitor, assim como o
emprego desse eleitor depende a cada momento da renovação do seu
contrato com o seu empregador, tudo se afina: todos passam a correr na
mesma direção e na mesma velocidade, uns jogando a favor dos outros.
O
que eu volto a oferecer a seguir são as razões da minha profunda
convicção no poder fulminante desse instrumento. Siga a série pelos
links abaixo e, se concordar comigo, ajude a espalhar essa idéia:
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