Com o aumento das temperaturas e a redução das chuvas em muitos lugares do planeta, uma parcela maior de terra está se tornando cada vez mais seca e árida. O alerta foi emitido nesta segunda-feira (09/12) pela Organização das Nações Unidas (ONU), através da divulgação de um relatório sombrio. Segundo o levantamento, em 2020, 30,9% da população global vivia em terras áridas, comparado a 22,5%, em 1990. Na imagem acima, o registro de quem enfrenta essa realidade: uma criança caminha com dois botijões de água, em meio à rodovia Transacreana, no Acre.
Ainda de acordo com o estudo, aproximadamente 77,6% das terras do planeta sofreram com condições mais secas durante as três décadas que antecederam 2020 e as zonas áridas expandiram-se em cerca de 4,3 milhões de km2 – uma área quase um terço maior que a Índia, o sétimo maior país do mundo – e agora cobrem 40,6% de todas as terras da Terra (excluindo a Antártida).
O impacto dessa transição de terras que antes eram consideradas úmidas para áridas é devastador em diversos sentidos: para o meio ambiente, a vida selvagem, as pessoas que habitam essas regiões e sem dúvida nenhuma, para a agricultura.
“Esta análise finalmente dissipa uma incerteza que há muito tempo cerca as tendências globais de seca. Pela primeira vez, a crise de aridez foi documentada com clareza científica, revelando uma ameaça existencial que afeta bilhões ao redor do globo", diz Ibrahim Thiaw, secretário executivo da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (UNCCD, na sigla em inglês).
Ele explica que, ao contrário das secas - períodos temporários de baixa precipitação -, a aridez representa uma transformação permanente e implacável”. “As secas terminam. Quando o clima de uma área se torna mais seco, no entanto, a capacidade de retornar às condições anteriores é perdida. Os climas mais secos que agora afetam vastas terras ao redor do globo não retornarão a como eram e essa mudança está redefinindo a vida na Terra.”
Brasil entre países impactados pela seca
O novo relatório aponta que nas últimas décadas, quase 8% das terras globais, uma área maior que o Canadá, foram levadas para além dos limites de aridez (ou seja, de terras não áridas para terras áridas, ou de classes de terras áridas menos áridas para classes mais áridas).
O estudo indica também que, se o ritmo atual das emissões de gases de efeito estufa continuar como está, provavelmente ocorrerá a expansão de terras áridas no centro-oeste dos Estados Unidos, no centro do México, no norte da Venezuela, no sudeste da Argentina, em toda a região do Mediterrâneo, na costa do Mar Negro, em grandes partes do sul da África e da Austrália, assim como a região nordeste do Brasil.
Nosso país, inclusive, é citado entre as áreas do planeta onde foi registrada uma tendência significativa de seca, com escassez de água e incêndios florestais se tornando riscos perenes. É o que se tem visto, por exemplo, ano a ano
Todavia, países da África são os mais afetados. O Sudão do Sul e a Tanzânia são as nações com a maior porcentagem de terras em transição para terras áridas, colocando em risco a sobrevivência não apenas de seus habitantes, mas de uma série de espécies da fauna (em agosto, o governo da Namíbia anunciou que iria abater centenas animais, incluindo elefantes e zebras, e distribuir sua carne para aplacar a fome da população).
“Por décadas, os cientistas do mundo têm sinalizado que nossas crescentes emissões de gases de efeito estufa estão por trás do aquecimento global. Agora, pela primeira vez, um órgão científico da ONU está alertando que a queima de combustíveis fósseis está causando a seca permanente em grande parte do mundo também - com impactos potencialmente catastróficos afetando o acesso à água, o que pode levar as pessoas e a natureza ainda mais perto de pontos de inflexão desastrosos. À medida que grandes extensões de terra do mundo se tornam mais áridas, as consequências da inação se tornam cada vez mais terríveis e a adaptação não é mais opcional - é imperativa", afirma Barron Orr, cientista-chefe da UNCCD.
O rio Tarumã Açu, no Amazonas, completamente seco, em setembro de 2024
Foto: Clóvis Miranda/Fotos Públicas
Principais tendências e projeções globais
- 77,6% de terras do planeta experimentaram climas mais secos de 1990 a 2020, em comparação aos 30 anos anteriores;
- 40,6% da massa de terra global (excluindo a Antártida) é agora classificada como "terras áridas", acima dos 37,5% nos últimos 30 anos;
- 4,3 milhões de km² é a extensão de terras úmidas transformadas em áridas nos últimos 30 anos, uma área um terço maior que a Índia;
- 40% das terras aráveis globais foram afetadas pela aridez, o principal fator de degradação agrícola;
- 2,3 bilhões de pessoas viviam em zonas áridas em 2020, o dobro de 1990, com projeção de esse número mais que dobre até 2100. Atualmente mais da metade dessa população está localizada na Ásia;
- Pouco mais de 9% das terras do mundo são classificadas como "hiperáridas", incluindo os desertos de Atacama (Chile), Saara (África), Namíbia (África) e Gobi (China/Mongólia).
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Foto de abertura: Alexandre Cruz Noronha / Amazônia Real / Fotos Públicas