Publicado em agosto 7, 2015 por
Redação
“Hoje eu vi uma coisa no jardim que me chocou. Uma flor”
(Ian Mc Ewan. “Jardim de Cimento”. Trad. Luiza Lobo. Rio de janeiro: Rocco)
[
EcoDebate]
Área contaminada, de acordo com a CETESB – Companhia Ambiental do
Estado de São Paulo -, pode ser definida como “uma área, local ou
terreno onde há comprovadamente poluição ou contaminação causada pela
introdução de quaisquer substâncias ou resíduos que nela tenham sido
depositados, acumulados, armazenados, enterrados ou infiltrados de forma
planejada, acidental ou até mesmo natural…”
Neste contexto, o
causador do dano ambiental (pessoa física ou jurídica), conforme
determina o artigo 225, § 3º da Constituição Federal, poderá ser
responsabilizado, por um mesmo ato, alternativa ou cumulativamente nas
esferas civil, penal e administrativa.
No tocante à responsabilidade civil mencione-se primeiramente que o
Código Civil Brasileiro adota dois sistemas de responsabilidades, quais
sejam: a responsabilidade civil subjetiva (art. 927) e a
responsabilidade civil objetiva (art. 927, parágrafo único).
No regime
de responsabilidade subjetiva impõe-se a obrigação de reparar o dano
àquele que, “por ação ou omissão voluntária, negligência, ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito”, ficando “obrigado a
repara-lo” (art. 186 do Código Civil).
O sistema de responsabilidade
subjetiva tem, portanto, seu fundamento basilar na culpa. Por essa
teoria não se responsabiliza a pessoa que agiu de maneira
irrepreensível, mesmo que tenha causado algum dano.
Por outro lado, a responsabilidade civil objetiva independe da
existência de dolo (intenção de causar o dano) ou culpa (negligência,
imprudência ou imperícia). Trata-se da teoria do risco pela qual aquele
que, através de sua atividade, gera um risco de dano para terceiros deve
ser obrigado a repara-lo, ainda que a sua atividade e o seu
comportamento estejam isentos de culpa.
O Código Civil estabelece, ainda, que “haverá obrigação de reparar o
dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano,
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem” (Parágrafo
único, do artigo 927 do Código Civil). Assim, a responsabilidade
ambiental civil pela reparação do dano ambiental é objetiva e isto
porque está prevista na Lei nº 6.938/81 que dispõe no artigo 14, § 1º
que o poluidor é obrigado, independentemente da existência de culpa, a
indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros.
A Lei 6.938/81 ao deste modo determinar substituiu o princípio da
responsabilidade subjetiva fundamentada na “culpa”, pela
responsabilidade objetiva cuja base é o “risco da atividade”. Isto quer
dizer que aquele que exerce atividades suscetíveis de causarem danos ao
meio ambiente se sujeita à reparação do prejuízo, independentemente de
ter agido ou não com culpa.
Contudo, para que seja possível o pleito da reparação do dano, é
necessária a identificação do responsável, a demonstração do “evento
danoso” (dano ambiental) e do “nexo de causalidade”, ou seja, é
necessária a comprovação da relação causal entre a fonte poluidora e o
dano.
No que tange à responsabilidade penal ambiental, vale dizer que a
mesma está calcada na culpabilidade, conforme prescreve o artigo 2º da
Lei de Crimes ambiental nº 9.605/98: “Art. 2º. Quem, de qualquer forma,
concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas
a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade…”.
Isto significa que
nos crimes ambientais o elemento moral vem estereotipado tanto no dolo
como na culpa. O crime doloso ocorre quando o agente quer o resultado ou
assume o risco de produzi-lo (art. 18, I Código Penal – redação dada
pela Lei n.º 7.209, de 11.07.1984). O crime culposo se configura na
hipótese de o agente provocar o resultado por imprudência, negligência
ou imperícia.
Em outras palavras: diferentemente da responsabilidade civil objetiva
que para ser configurada independe do poluidor ter agido ou não com
culpa, no que diz respeito à responsabilidade penal há de se averiguar
se o agente agiu com dolo ou culpa.
Saliente-se, ainda, que poderão ser
responsabilizadas por eventual prática de crime ambiental a pessoa
física, a pessoa jurídica, “bem como o diretor, o administrador, o
membro do conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto
ou mandatário da pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de
outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para
evita-la” (art. 2º, lei 9.605/98).
No tocante à pessoa jurídica, a mesma somente poderá vir a ser
responsabilizada “(…) nos casos em que a infração seja cometida por
decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão
colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade” (art. 3º, Lei
9.605/98).
Portanto, a teor desse artigo, a responsabilidade da pessoa
jurídica fica condicionada a que a infração tenha sido cometida em seu
interesse ou benefício e por decisão de seu representante legal ou
contratual, ou de seu órgão colegiado. A responsabilidade da pessoa
jurídica não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou
partícipes do mesmo fato, na medida em que a empresa por si mesma não
comete crimes.
No que tange à responsabilidade administrativa ambiental, cumpre
mencionar que ela surge no momento em que as normas ambientais
administrativas são ofendidas. Isso significa que as infrações
administrativas se concretizam pela violação ao ordenamento
jurídico-ambiental. Os pressupostos da responsabilidade administrativa
ambiental são: conduta: a conduta pode ser imputada à pessoa física ou
jurídica que tenha concorrido por ação ou omissão para a prática da
infração, e ilicitude, ou seja, o dano ambiental que enseja
responsabilidade administrativa é aquele enquadrável como o resultado
descrito em um tipo infracional ou o provocado por uma conduta omissiva
ou comissiva violadora de regras jurídicas.
Importante destacar que na esfera administrativa a infração é
caracterizada não necessariamente pela ocorrência do dano, mas pela
inobservância de regras jurídicas, de que podem ou não resultar
conseqüências prejudiciais ao ambiente. Em outras palavras: a
responsabilidade administrativa existe mesmo que o dano ambiental não
tenha ocorrido, ou seja, o ato de contrariar normas administrativas gera
a responsabilidade para o infrator. Exemplo disso é a tipificação como
crime e como infração administrativa da conduta de operar atividade sem a
licença ambiental exigível.
Enfim, uma constatação de contaminação de área pode deflagrar a
imposição de sanções civis (cumprimento de obrigações de fazer,
consistente na remediação do solo, para a integral reparação do dano,
ou, se irreversível a contaminação, pagamento de indenização em pecúnia;
e de não fazer, impondo-se a cessação da atividade poluidora), sanções
criminais (por exemplo, crime de causar poluição: condenação da pessoa
física à pena de reclusão, de um a quatro anos e multa, com base no
artigo 54, da lei 9.605/98), e de sanções administrativas com pagamento
de multas que podem chegar a R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de
reais) de acordo com o previsto no Decreto n.º 6.514 de 22 de julho de
2008.
Entretanto, muito mais importante do que a reparação de um dano
ambiental, é a prevenção de sua ocorrência. Aliás, é a prevenção que
orienta todo o Direito Ambiental. Não podem a humanidade e o próprio
Direito contentar-se em reparar e reprimir o dano ambiental.
A
degradação ambiental, como regra, é irreparável. Como reparar o
desaparecimento de uma espécie? Como trazer de volta uma floresta
totalmente degradada por desmatamento ilegal? Como purificar um lençol
freático contaminado com agrotóxico, esgoto e agentes poluentes?
Na reparação existe um remédio ressarcitório, na prevenção, ocorre a
ação de inibição.
Daí, portanto, a necessidade de que a sociedade
brasileira esteja atenta no sentido de que os potenciais poluidores
estejam efetivamente tomando medidas concretas de prevenção quanto à
ocorrência de possíveis danos ambientais, provenientes de suas
atividades produtivas.
E, isso, para que os brasileiros possam
efetivamente usufruir ao direito estabelecido na Constituição Federal do
Brasil, de viver em um meio ambiente ecologicamente equilibrado, e,
jamais se chocar com a presença de uma flor em um jardim.
Referência
1. http://areascontaminadas.cetesb.sp.gov.br/
Bibliografia
MARCONDES, S. “Brasil, amor à primeira vista! Viagem ambiental no Brasil
do século XVI ao XXI”. São Paulo: Editora Fundação Peirópolis, 2005.
Sandra Marcondes é Advogada, com mestrado em Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente.
in
EcoDebate, 07/08/2015
[
O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído,
desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate e, se for o caso, à
fonte primária da informação ]
Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário da revista eletrônica EcoDebate
Caso queira ser incluído(a) na lista de distribuição de nosso boletim
diário, basta enviar um email para
newsletter_ecodebate+subscribe@googlegroups.com . O seu e-mail será
incluído e você receberá uma mensagem solicitando que confirme a
inscrição.
O EcoDebate não pratica SPAM e a exigência de confirmação do e-mail
de origem visa evitar que seu e-mail seja incluído indevidamente por
terceiros.