“As tecnologias de emissões negativas são muito
interessantes, mas não são uma alternativa para redução rápida de emissões de
CO2”. A frase foi dita pelo professor John Shepherd, da Universidade
de Southampton, no Reino Unido, um dos autores do estudo divulgado nesta
quinta-feira (1º) pelo Conselho Consultivo de Ciências das Academias
Europeias (Easac, na sigla em inglês), mostrando que as tecnologias não são uma
bala de prata contra os efeitos do aquecimento no planeta, como muitos esperam.
O Easac assessora a União Europeia e é formado pelas academias científicas
nacionais dos 28 estados membros.
Não vai funcionar, é simples assim. E, o que é pior: as
tecnologias sugeridas pelos cientistas do Painel Intergovernamental das Nações
Unidas sobre Mudanças Climáticas (IPCC na sigla em inglês) podem causar
ainda mais aquecimento.O IPCC calcula
que cerca de 12 bilhões de toneladas precisarão ser capturadas, anualmente, e
armazenadas após 2050 - o equivalente a cerca de um terço de todas as emissões
globais hoje.
Para se ter uma ideia, o relatório avalia uma variedade de
tecnologias possíveis, incluindo a "bioenergia com captura e armazenamento
de carbono" (BECCS), na qual os cientistas do IPCC apostam quase todas as
fichas. Trata-se de uma técnica que consiste em plantar árvores que absorvem
CO2 da atmosfera e depois queimá-las para produzir eletricidade, enquanto os
gases são capturados e enterrados. Parece um processo complexo, e é. O diretor
do programa do Easac, e outro autor do relatório, Michael Norton, disse ao
jornal “The Guardian” que a técnica tem problemas:
“Tem que ter territórios muito extensos e poderia haver uma
extinção em massa de animais selvagens”, avisa ele. Faz sentido, já que a ideia
é criar florestas e mais florestas com um único tipo de árvore. E a
monocultura, comodizem os
ambientalistas e estudiosos sobre o assunto, não é amiga da biodiversidade.
No relatório do Conselho, os cientistas atestam algo que há
algum tempo preocupava apenas os ecossocioeconomistas. São estudiosos que
enxergam nas tecnologias de captura de carbono um outro viés, como práticas
muito caras, que não podem ser adotadas por países pobres. Tais práticas poderiam
aumentar ainda mais o fosso já profundo entre os pobres e os ricos. O Acordo de
Paris prevê que os países desenvolvidos invistam 100 bilhões de dólares por ano
em medidas de combate à mudança do clima e em adaptação nos países pobres. Mas
ainda é grande a distância entre o que é exigência oficial, não obrigatória,
eo que, de fato, será feito.
Busquei algum exemplo bem-sucedido de técnicas de emissões
negativas no mundo e encontrei o caso de uma usina de energia em Hellisheiði, na Islândia. A planta produz
apenas cerca de um terço do carbono que uma planta de carvão tradicional seria
– mas mais do que o que ele emite é capturado e armazenado no subsolo.Para isso, ela tem uma parede de ventiladores
que filtra o CO2 e o injeta na água que é, então,bombeada para o chão, onde se torna pedra.
É um processo até simples, esclarecem os pesquisadores. Mas
tem um problema de difícil solução: é caro.Já que é assim, por que não respeitar, portanto, práticas e técnicas que
não envolvem custos astronômicos e que exercem a mesma função?
Pesquisei algo nesse sentido e encontrei um estudo realizado
por pesquisadores da Universidade da Guiana, na França, em parceria com órgãos
brasileiros e peruanos como o Instituto de Investigações da Amazônia Peruana e
a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).A pesquisa avaliou, durante dez anos (entre
2002 e 2012), as mudanças em áreas de florestas não desmatadas e áreas que
sofreram corte seletivo. Os pesquisadores analisaram mais de 113 áreas de
floresta permanente e 13 áreas afetadas experimentalmente, em diferentes
regiões da Amazônia. Após a análise dos dados, observou-se que, ao longo da primeira
década após o corte, as árvores mais velhas que sobrevivem à motosserra absorvem
mais CO2 do que as mais novas.
Segundo a pesquisa, de 1999 a 2002 a extensão da
exploração madeireira seletiva na Amazônia brasileira foi equivalente
ao desmatamento no mesmo período. A situação resultou em emissões de
mais de 90 milhões de toneladas de carbono por ano, que aumentaram as emissões
antropogênicas de carbono em 25% em relação ao desmatamento sozinho.
Chama-se a esta prática de manejo florestal, muito usada
também pelos indígenas, povos tradicionais que poderiam dar sugestões bem possíveis
para os cientistas que tentam achar soluções mirabolantes para o aquecimento
global. A prática de manejo das capoeiras, retirando árvores mais velhas ou
mesmo algumas novas,mas crescidas,
respeitando seu tempo de dispersar as sementes na terra, é barata. Dá mais
trabalho, exige maior contato com o meio ambiente.
Os indígenas têm muito a compartilhar sobre esta e outras
práticas. Basta incluí-los, assim como a todos os outros povos que precisam da
floresta, nas mesas de negociações e debates. Isto não é feito porque há um
descrédito arraigado. WolfgangSachs,
ambientalista alemão que organizou o livro “The Development Dictionary” (Ed. Z,
ainda sem tradução no Brasil) , chama de ecocracia o discurso daqueles que
acreditam no casamento entre meio ambiente e desenvolvimento sem se preocupar
em reconsiderar a lógica do produtivismo “que está na raiz das dificuldades
ecológicas que o planeta está atravessando”.
“Esta crença reduz a ecologia a um conjunto de estratégias
gerenciais de eficiência de recursos e gerenciamento de riscos. Trata como se
fosse um problema de tecnologia o que, de fato, não passa de um impasse
civilizatório”, escreve ele.
Neste cenário, as sociedades que não escolheram investir
toda a sua energia em produção acabam se tornando inaceitáveis para o Ocidente.
A percepção ecocrática torna-se cega à diversidade fora da economia do
Ocidente.
O MPDFT recomenda, a sociedade cobra, o GDF ignora. E a Justiça?
Por Tânia Battella
O Governador do Distrito Federal, pela segunda vez, publicou Decreto que declara “situação deEmergência e determina restrições para o uso de água no Distrito Federal”, por
180 ( cento e oitenta) dias e, atribui à Agência Reguladora de Água e
Saneamento do Distrito Federal – ADASA, competências para definir
restrições para o uso de água da rede pública e outras medidas.
Durante o atual Governo, o Ministério Público do Distrito Federal e
Territórios – MPDFT encaminhou 29 Representações, ao GDF e um
Procedimento Administrativo com 64 (sessenta e quatro) Recomendações,
todas relativas a gestão dos Recursos Hídrico do Distrito Federal.
Muitas delas, especificamente direcionadas à ADASA, que pelo Decreto
passou a ser responsável por definir restrições ao uso da água, outras à
CAESB e demais órgãos com atribuições diretas ou indiretamente
relacionadas a questão.
A sociedade, diante dessa circunstância, e sofrendo as consequências e
o ônus da falta de gestão dos recursos hídricos, apesar der todas as
Recomendações do MPDFT, no mínimo, merece uma prestação de contas deste Governo, que tenta atribuir à falta de chuva, portanto, a São Pedro, essa responsabilidade da crise que se impõe no DF.
Só no ano de 2017, foram encaminhadas 16 (dezesseis) Recomendações da
Promotoria de Defesa do Meio Ambiente – PRODEMA ao GDF, todas relativas
ao meio ambiente, das quais 5 (cinco) em parceria com outras
Promotorias.
Já o Procedimento Administrativo PA nª. 08190.046097/16-87, de 31 de
março deste exercício, assinado pelo Procurador Geral de Justiça, Dr.
Leonardo Roscoe Bessa, pela Procuradora Distrital dos Direitos do
Cidadão, Dra. Maria Rosynete de Oliveira Lima e pelas Promotoras Dra.
Marta Eliana de Oliveira, Dr. Paulo José Leite Farias, Dr. Roberto
Carlos Batista, Dra. Cristina Rasia Montenegro e Dra. Luciana Medeiros
Costa, todos da PRODEMA, pelo Promotor Dr. Trajano Sousa de Melo, da
PRODECON ( Promotoria de Defesa do Consumidor) e Dr. Dênio Augusto de
Oliveira Moura, da PROUB (Promotoria de Defesa da Ordem Urbanística) ,
sob o título de “Contribuições do MPDFT para Enfrentamento da Crise Hídrica no Distrito Federal”, mediante
oito Considerações, apresenta 64 ( sessenta e quatro) Recomendações
específicas a diversos órgãos do GDF sobre a gestão dos recursos
hídricos.
À ADASA, especificamente, são direcionadas 19 (dezenove), das 64 (
sessenta e quatro ) Recomendações. À CAESB, 7 (sete); à SEMA e IBRAM, 13
(treze) das 64 Recomendações; à TERRACAP, (5) e as demais aos diversos
órgãos responsáveis pela gestão dos recursos hídricos direta e
indiretamente.
Vale destacar, destas Recomendações, algumas por estarem relacionadas
a reivindicações permanentes da sociedade do Distrito Federal, como
aquelas que incidem em disponibilizar informações sobre a capacidade dos
Sistemas de Abastecimento de Água Potável, sobre a qualidade das águas
dos córregos formadores dos Reservatórios para Abastecimento, a
elaboração do Plano de Saneamento Ambiental do Distrito Federal, revisão
dos procedimentos de nos termos de outorga ( autorização pela ADASA
para uso de água dos mananciais do DF), integração entre emissão de
outorga pela ADASA e de licença ambiental pelo IBRAM, publicação de
todos os dados hidrológicos pela ADASA, agilização na elaboração do
PLANO DE Saneamento ambiental do DF etc.
Outra Recomendação expressa nesse PA é a do item 39, que diz respeito
à aprovação do Zoneamento Ecológico e Econômico do Distrito Federal com
precedência aos demais documentos em elaboração pelo GDF, como a
revisão do PDOT-DF, a Lei de Uso do Solo – LUOS e o Plano de Preservação
do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB. À revelia dessa
Recomendação do MPDFT, o GDF tem acelerado o procedimento de aprovação
da LUOS, inclusive sem dar satisfação às Entidades que apresentaram
sugestões sobre o Projeto de Lei, a pedido do próprio Governador.
Há de se destacar, também o item 30 do PA, que Recomenda a “Adoção
de medidas de gestão que visem um maior equilíbrio das contas da CAESB,
visto que, atualmente, segundo informações do Ministério Público de
Contas, 70% de seus gastos são destinados a sua folha de pagamento”. Recentemente
foi alvo de divulgação os altos valores pagos a Diretores e servidores
daquela Companhia, provocando indignação a toda sociedade.
Também são objeto de reivindicação de várias entidades da Sociedade
Civil, como o FÓRUM das ONGs Ambientalistas do DF e Entorno e da Frente
Comunitária do Sítio Histórico de Brasília e DF, tendo o FORUM das ONGs
também publicado Carta Aberta, divulgada nas redes sociais, enumerando
inúmeros problemas que persistem no projeto de lei do Zoneamento
Ecológico e Econômico do DF, já encaminhado para a Casa Civil ,como se pronto estivesse…
Finalmente, e não menos importante, vale destacar que a LUOS NÃO ESTÁ
COMPATÍVEL com a capacidade dos sistemas de abastecimento de água do
DF, nem o ZEE-DF está compatível nem reflete a situação grave em que se
encontra o DF, frente a grave Crise de Gestão Hídrica.
Esforços do MPDFT têm sido evidentes na defesa da qualidade de vida
dos habitantes do DF e na recuperação de um equilíbrio mínimo do meio
ambiente, tão gravemente agredido que causou essa Crise de Gestão
Hídrica, merecendo iniciativas de toda ordem ao governo do Distrito
Federal para seu enfrentamento.
A sociedade civil organizada tem, persistentemente, tentado
interferir na gestão do território, conquistada legalmente pela
Constituição de 1988 e solenemente ignorada pelo Governo. Infelizmente,
sem resultados.
E agora, caberá á Justiça do Distrito Federal fazer sua parte, já que
estão esgotados os recursos administrativos na defesa de todos os
direitos da sociedade, em participar da gestão da cidade, do MPDFT na
defesa desses direitos, do Meio Ambiente e da Ordem Urbanística.
A expansão de Brasília para habitação segundo Lúcio Costa: Brasília revisitada
Por Tânia Battella
Um dos graves problemas de Brasília decorre da inexistência de um
planejamento Regional, de responsabilidade da União e das Unidades da
Federação envolvidas, em especial do Distrito Federal, Goiás e Minas
Gerais, que constituem a RIDE – Região Integrada de Desenvolvimento,
tendo por decorrência a pressão sobre o DF em busca de solução para os
problemas da Região, como emprego, habitação, saúde, educação, entre
outros, em total desvirtuamento da função de Brasília como Capital
Federal e promotora do desenvolvimento Regional.
Em 1987, quando foi publicado o Decreto Distrital nº 10.829, em
regulamentação ao Artigo 38 da Lei Federal nº 3.751, de 13 de abril de
1960, no que se refere à preservação da concepção urbanística de Brasília, foi também publicado como seu Anexo, portanto parte integrante dele, o documento denominado Brasília Revisitada, de autoria de Lúcio Costa, dividido basicamente em três blocos: o primeiro sobre AS CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS DO PLANO PILOTO, um segundo sobre COMPLEMENTAÇÃO E PRESERVAÇÃO e o último sobre ADENSAMENTO E EXPANSÃO URBANA DO PLANO PILOTO.
Sobre AS CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS DO PLANO PILOTO, o
autor discorre sobre a importância das quatro escalas – monumental,
residencial, gregária e bucólica, destacando a importância e
caraterísticas de cada uma; sobre a estrutura viária; sobre a questão
residencial; sobre a orla do lago e a importância do paisagismo.
Este trecho do texto, sucinto e conciso, de Lúcio Costa, merece ser
descrito para esclarecer o significado das quatro escalas, objeto da
verdadeira preservação, que resume o conceito do projeto urbanístico da
cidade, muitas vezes interpretado com subjetividade para desvirtuamento
de sua essência:
A concepção urbana de Brasília se traduz em quatro escalas distintas:
a monumental, a residencial, a gregária e a bucólica.
A presença da escala monumental – “não no sentido da ostentação, mas no
sentido da expressão palpável, por assim dizer, consciente daquilo que
vale e significa” – conferiu à cidade nascente, desde seus primórdios, a
marca inelutável
de efetiva capital do país.
A escala residencial, com a proposta inovadora da Superquadra, a
serenidade urbana assegurada pelo gabarito uniforme de seis pavimentos, o
chão livre e acessível a todos através do uso generalizado dos pilotis e o franco
predomínio do verde, trouxe consigo o embrião de uma nova maneira de
viver, própria de Brasília e inteiramente diversa da das demais cidades brasileiras.
A escala gregária, prevista para o centro da cidade – até hoje ainda em
grande parte desocupado – teve a intenção de criar um espaço urbano mais
densamente utilizado e propício ao encontro.
As extensas áreas livres, a serem densamente arborizadas ou guardando a cobertura vegetal nativa, diretamente contígua a áreas edificadas,marcam a presença da escala bucólica.
A escala monumental comanda o eixo retilíneo – Eixo Monumental – e foi
introduzida através da aplicação da “técnica milenar dos terraplenos”
(Praça dos Três Poderes, Esplanada dos Ministérios), da disposição disciplinada
porém rica das massas edificadas, das referências verticais do
Congresso Nacional e da Torre de Televisão e do canteiro central gramado e livre de ocupação que atravessa a cidade do nascente ao poente.
As Superquadras residenciais, intercaladas pelas Entrequadras (comércio
local, recreio, equipamentos de uso comum) se sucedem, regular e
linearmente dispostas ao longo dos 6 Km de cada ramo do eixo arqueado –
Eixo Rodoviário-Residencial. A escala definida por esta seqüência
entrosa-se com a escala monumental não apenas pelo gabarito das
edificações como pela definição geométrica do território de cada quadra
através da arborização densa da faixa verde que a delimita e lhe confere
cunha de “pátio interno” urbano.
A escala gregária surge, logicamente, em torno da interseção dos dois eixos,a Plataforma Rodoviária, elemento de vital importância na concepção da cidade e que se tornou, além do mais, o ponto de ligação de Brasília com as
cidades satélites. No centro urbano, a densidade de ocupação se previu
maior e os gabaritos mais altos, à exceção dos dois Setores de Diversões.
E a intervenção da escala bucólica no ritmo e na harmonia dos espaços urbanos se faz sentir na passagem, sem transição, do ocupado para o não-ocupado –
em lugar de muralhas, a cidade se propôs delimitada por áreas livres
arborizadas.
Sobre a questão viária, o autor menciona, comparando, a situação
caótica do trânsito do Rio de Janeiro e a facilidade pretendida com a
estrutura viária proposta para Brasília, permitindo atravessar a cidade de ponta a ponta livre de engarrafamentos. Acrescenta, entretanto, observação já da época, sobre a má qualidade do transporte coletivo da cidade: O
que permanece incompreensível é até hoje não existir – pelo menos na
área urbana – um serviço de ônibus municipal impecável, que se beneficie
das facilidades existentes (apenas a título de exemplo: as pistas
laterais do Eixo Rodoviário-Residencial – destinadas prioritariamente ao
transporte coletivo – tem mão nos dois sentidos; no entanto sua
utilização pelos ônibus só se faz numa direção em cada uma delas). Bem
como não se ter ainda introduzido o sistema de “transferência” que se
impõe para que o passageiro não seja onerado indevidamente.
Ao tratar da questão residencial, é absolutamente claro quando
estabelece a proposta de um concentrar as moradias em superquadras, ao
longo do Eixo Rodoviário-Residencial, através da criação de áreas de vizinhança.
Sobre a Orla do Lago, Lúcio Costa é, também, absolutamente claro, quando afirma: O
Plano-piloto refuga a imagem tradicional no Brasil da barreira
edificada ao longo da água; a orla do lago se pretendeu de livre acesso a
todos, apenas privatizada no caso dos clubes. E onde prevalece a escala
bucólica.
Em apenas dois parágrafos, Lúcio Costa resume a essência e a importância do paisagismo na cidade de Brasília:
“De uma parte, técnica rodoviária; de outra técnica paisagística de parques
e jardins.” (memória descritiva do plano-piloto)
A memória descritiva do plano deixou clara a importância da volumetria
paisagística na interação das quatro escalas urbanas da cidade; o
canteiro central da Esplanada gramado, as cercaduras verdes das
Superquadras, a massa densamente arborizada prevista para os Setores
Culturais (ainda até hoje desprovidos de vegetação).
Aqui cabe acrescentar que governos locais NÃO SOUBERAM FAZER ESSA
LEITURA e introduziram arborização onde o autor fez previsão e reafirmou
através desse documento, em 1987, de que no canteiro central da
Esplanada dos Ministérios, apenas caberia grama…
Ainda é tempo de se corrigir.
Por último, neste bloco, acrescenta o projeto de quadras econômicas,
para habitação coletiva, já apresentado ao governador José Aparecido de
Oliveira, posteriormente edificadas onde hoje se conhece como Quadras
Lúcio Costa.
No segundo bloco, o autor apresenta 7 (sete) itens selecionados para destacar como importantes na complementação à preservação do projeto de Brasília, dos quais destaco os itens 1, 2, 3 e 5.
O item 1. Restrito a um único parágrafo, contém o indicativo do
primeiro procedimento a ser adotado no sentido da complementação e
preservação de Brasília:
Proceder ao tombamento do conjunto urbanístico-arquitetônico da
Praça dos Três Poderes, incluindo-se os Palácios do Itamarati e da
Justiça, de vez que constituem sua vinculação arquitetônica com a
Esplanada dos Ministérios, cuja perspectiva ficará valorizada com a transferência das palmeiras imperiais ( grifo meu).
Dessa recomendação, a que se refere a transferência das palmeiras imperiais jamais foi levada a sério e cumprida pelos diversos governos locais desde 1987 até os dias de hoje.
Quem sabe na elaboração do Plano de Preservação do Conjunto de
Brasília – PPCUB, previsto na Lei Orgânica do DF, essa recomendação que
aparece em inúmeros documentos do autor de Brasília seja finalmente
respeitada e cumprida.
No item 2., Lúcio Costa recomenda a manutenção dos gabaritos (
alturas dos prédios) nos Eixos Rodoviário e Monumental, tal como eram
“vigentes” à época, em 1987, até os Setores de Grandes Áreas, inclusive,
permanecendo não edificáveis as áreas livres diretamente contíguas,
e baixas a densidade, com gabaritos igualmente baixos nas áreas onde já
é prevista ocupação entre a cidade e a orla do lago. E acrescenta: Isto é fundamental. ( grifo meu). E justifica:
Brasília, a capital, deverá manter-se “diferente” de todas as demais cidades do país: não terá apartamentos de moradia em edifícios altos; o gabarito
residencial não deverá ultrapassar os seis pavimentos iniciais, sempre
soltos do chão.
Este será o traço diferenciador – gabarito alto no centro comercial, mas deliberadamente contido nas áreas residenciais, a fim de restabelecer, em ambiente moderno, escala humana mais próxima da nossa vida doméstica e familiar tradicional.
No item 3. Lúcio Costa destaca a necessidade de garantir a estrutura
das unidades de vizinhança do Eixo Rodoviário-Residencial, com uma única
entrada às superquadras, a interrupção das vias que lhes dão acesso
(vias L1 e W1) e a ocupação das entrequadras com equipamentos públicos de esporte e recreio e demais equipamentos de interesse comunitário, sobretudo escolas públicas destinadas ao ensino médio.
O item 5. Se resume em um único parágrafo:
Providenciar as articulações viárias necessárias para fazer
prevalecer na cidade de hoje a mesma clareza e fluência viárias contidas
no risco original e, paralelamente, “arrematar” a cidade como um todo (recomendo neste sentido consulta ao trabalho “Brasília 57-85”). (grifo meu).
Deste item há de se destacar a referência ao documento “Brasília 57-85”,
elaborado sob a coordenação de Lúcio Costa e sob minha supervisão e de
Luiz Alberto Cordeiro, à época responsáveis pelo então Departamento de
Arquitetura e Urbanismo da Secretaria de Viação e Obras e da Diretoria
Técnica da TERRACAP, respectivamente. Tal documento compõe os poucos de
autoria e coordenação de Lúcio Costa onde são registrados pontos
essenciais, sob o ponto de vista do autor do projeto do Conjunto
Urbanístico de Brasília, que devem ser considerados no processo de sua preservação e recuperação como Patrimônio Histórico Nacional e Cultural da Humanidade.
O último bloco de recomendações de Brasília Revisitada refere-se ao Adensamento e expansão urbana do “Plano Piloto”.
Assim foi expresso e conceituado por Lúcio Costa:
Uma vez assegurada a proteção do que se pretende preservar, trata-se agora
de verificar onde pode convir ocupação – predominantemente residencial –
em áreas próximas ao “Plano Piloto”, ou seja, na bacia do Paranoá, e de
que forma tal ocupação deve ser conduzida para integrar-se ao que já
existe, na forma e no espírito, ratificando a caracterização de cidade parque –
“derramada e concisa” – sugerida como traço urbano diferenciador da
capital.
Na sequência, lembra do projeto das quadras econômicas, projeto executado próximo ao Guará.
Em Brasília, propriamente, propôs seis áreas, que denominou de A a F, sendo as áreas A e B na
parte oeste da cidade, resultam da distância excessiva entre a Praça
Municipal e a Estrada Parque Indústria e Abastecimento decorrente do
deslocamento do conjunto urbano em direção ao lago
recomendado por Sir William Holford no julgamento do concurso.
A área C seria próxima à Vila Planalto, já objeto de proposição sua quando se levantou sobre a fixação da Vila Planalto.
A área D é sugerida pela existência de centros comerciais
consolidados na área fronteira e as últimas áreas, E e F, visam o
atendimento de demanda habitacional futura, em habitação multifamiliar,
que poderiam ser chamadas de novas Asas Sul e Norte.
As áreas A e B, situadas a oeste da cidade, que correspondem aos
Setores Sudoeste e Noroeste, a proposto de Lúcio Costa consistia em :
Na implantação dos dois novos bairros a oeste – Oeste Sul e Oeste
Norte – foram previstas Quadras Econômicas (pilotis e três pavimentos)
para responder à demanda habitacional popular e Superquadras (pilotis e
seis pavimentos) para classe média, articuladas entre si por pequenos
centros de bairro, com ocupação mais densa, gabaritos mais baixos (dois
pavimentos sem pilotis) e uso misto.
Para a ocupação da área D, a recomendação e condições estabelecida pelo autor foram as seguintes:
A ocupação residencial da quarta área (D) só é admissível na
forma de renque singelo de pequenas quadras (como as Quadras Planalto,
com pilotis e quatro pavimentos) ou de Quadras Econômicas (pilotis e
três pavimentos). Em razão da localização desta área, a fim de evitar interferência negativa com o
Eixo Rodoviário sul, além do gabarito ser mais baixo, toda a extensão de
terreno compreendida entre as novas quadras e o Eixo deve permanecer
não edificada ou destinada a usos que impliquem em baixa densidade de ocupação, e
sempre cobertas de verde para diluir no arvoredo as construções.
Fica absolutamente expressa a preocupação em relação ao Eixo
Rodoviário, que teria de ser preservado com cobertura de vegetação e as
edificações teriam de ser de 4 pavimentos, mantendo o perfil da cidade.
Para as Novas Asas Sul e Norte, a recomendação foi a de edificações com 4 (quatro) pavimentos, sobre pilotis e cercadura arborizada, permitindo, na Asa Nova Norte, a ocupação indicada foi:
prever Quadras Econômicas ou conjuntos geminados para atender à população
de menor renda, e considerar a eventual possibilidade de fixação, em
termos adequados, da atual Vila Paranoá. Os demais núcleos de edifícios
residenciais devem ser soltos do chão, tendo, no máximo, 4 pavimentos e
com gabarito de preferência uniforme para que se mantenha, apesar da ocupação, a
serenidade da linha do horizonte, sendo cada conjunto, – desta vez de
fato e de saída – emoldurado por farta arborização. Os centros de
bairro, mais densamente ocupados, devem sempre ter gabaritos mais
baixos.
Sendo estas basicamente as recomendações do próprio autor tanto do
projeto do conjunto urbanístico de Brasília quanto de sua expansão
urbana, asseguradas pela legislação de Tombamento, os governos locais e
as Instituições responsáveis pela preservação desse Patrimônio têm o
DEVER de cumprir.
Da conclusão do documento Brasília Revisitada MERECEM DESTAQUES
ALGUNS PONTOS TOTALMENTE IGNORADOS PELOS GOVERNANTES E RESPONSÁVEIS PELA
SUA IMPLEMENTAÇÃO:
O “quantum” populacional atingido pela abertura à ocupação dessas
novas áreas, pelos adensamentos previstos, pela ocupação residencial
multifamiliar nas margens das vias de ligação entre Brasília e as
satélites, pelo adensamento controlado destes núcleos e pela implantação
da Samambaia, deve ser considerado a população limite para a capital federal, a fim de não desvirtuar a
função primeira – político-administrativa – que lhe deu origem. A
Brasília não interessa ser grandemetrópole.
Como nossa estrutura econômico-social induz à migração de
populações carentes para os grandes centros urbanos, é essencial
pensar-se desde já no desenvolvimento, em áreas próximas à capital de
núcleos industriais capazes de absorver, na medida do possível, essas migrações com efetiva oferta de trabalho. Brasília é, no caso, uma simples miragem. Cidade
fundamentalmente político-administrativa e de prestação de serviços, a
demanda de mão de obra, sobretudo não qualificada, é necessariamente
menor embora a proximidade
do poder central crie a ilusão de facilidades que, de fato, não existem.
Quanto ao escalonamento, no tempo, das implantações aqui sugeridas cabe
ao Departamento de Urbanismo da Secretaria de Viação e Obras coordenar
os estudos a serem feitos conjuntamente com as demais Secretarias
e concessionárias de serviços públicos a fim de definir com segurança o
melhor procedimento, bem como as tecnologias a serem utilizadas, tendo
em vista
o abastecimento de água e energia, o transporte, o saneamento e a preservação
do meio ambiente, o controle da poluição do lago Paranoá e a proteção da área
a ser ocupada pela futura represa do São Bartolomeu – integrando, enfim,
como um todo, as novas proposições e o planejamento do território do
Distrito Federal. ( grifo meu)
O plano-piloto de Brasília não se propôs visões prospectivas de
esperanto tecnológico, nem tampouco resultou de promiscuidade
urbanística,ou de elaborada o falsa “espontaneidade”.
Brasília é a expressão de um determinado conceito urbanístico, tem
filiação certa, não é uma cidade bastarda. O seu “facies” urbano é o de
uma cidade inventada que se assumiu na sua singularidade e adquiriu
personalidade própria graças à arquitetura de Oscar Niemeyer e à sua
gente.
Diante das conclusões do próprio autor da proposta, faço aqui minhas conclusões:
1º) Lúcio Costa, ao propor a o Adensamento e Expansão urbana do
“Plano Piloto”, assim expresso por ele mesmo, no documento anexo ao
Decreto Distrital nº 10.829/87, que subsidiou a inscrição de Brasília
como Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO, além de fazê-lo sob o
aspecto da preservação dos princípios fundamentais do projeto
urbanístico da cidade, delegou ao governo e autoridades locais a
responsabilidade de estudos de viabilidade quanto a capacidade dos
sistemas de infraestrutura e demais estudos técnicos, conforme se lê em
sua Conclusão;
2º) Os órgãos do Governo local, durante anos, não elaboraram nenhum
diagnóstico sobre as condições dos sistemas de infraestrutura urbana no
DF, nem mesmo na Bacia do Lago Paranoá, onde se situa Brasília, conforme
recomendação de Lúcio Costa e da boa técnica de planejamento urbano
onde a natureza, o meio ambiente e os cidadãos são minimamente
respeitados;
3º) Os governos locais sucessivos, desde as décadas de 80 e 90 até os dias de hoje, sequer se preocuparam em levantar o quantum de
população já havia sido instalada na Bacia do Lago Paranoá, e até nos
dias de hoje insistem em continuar ocupando e impermeabilizando esse
terreno, alegando propostas de Lúcio Costa, contida em Brasília
Revisitada. É preciso responsabilidade das Instituições governamentais
em fazerem tais afirmações e justificarem a viabilidade, conforme o
próprio autor da proposta recomendou, já descrito acima, além de ser
prática indispensável de qualquer Entidade com a menor responsabilidade
sobre a ocupação equilibrada do território;
4º) Inusitadamente, os Governos locais utilizaram a planta
esquemática de localização das áreas propostas para expansão urbana (
anexo 1), como sendo a verdadeira, inclusive na extensão da ocupação, em
total desacordo com o próprio texto do documento, à revelia de estudos
técnicos necessários e recomendados e contraditório à planta oficial em
escala 1:25.000 ( anexo 2), anexo ao documento e de autoria de Lúcio
Costa. Acrescente-se que esta planta, original, por mim solicitada ao
órgão responsável do GDF, não foi encontrada, senão cópia digitalizada. O documento original, histórico, está desaparecido, o que demonstra total descaso do Governo local com o assunto de Preservação de Brasília e sua memória.
5º) Lamentavelmente, o que se tem notícias é de que a própria TERRACAP, Entidade que deveria agir em
defesa do interesse do Distrito Federal, portanto, do interesse
público, insiste na implementação da área conhecida como Taquari, apesar
de todos os estudos do próprio GDF apontarem o Lago Paranoá
completamente comprometido, como corpo receptor, e agora utilizado para
abastecimento da população;
6º) Este governo insiste também em proposições de impermeabilização
do solo, em todo o DF, como projetos de lei de regularização de
ocupações de áreas públicas, adensamentos nas Áreas de Tutela de
Brasília, propostas pela Lei de Uso do Solo – LUOS, pelos projetos e
execuções de impermeabilização nas Áreas da Orla do Lago Paranoá, na
contra mão de recomendações do próprio Ministério Público para a
recuperação de nossa capacidade hídrica;
7º) É inadiável a suspensão de todo e qualquer empreendimento no DF,
quer de novos quanto de “regularização” e de “adensamentos”, para um
levantamento sério e responsável e o estabelecimento criterioso de
formas, localidades, condições, situações e definições temporais em que
novas ocupações, “regularizações” e “adensamentos”, sejam aprovados, sob
pena de agravamento ainda maior das péssimas condições de atendimento à
população quanto a infraestrutura urbana, agravamento da crise de
gestão hídrica no DF, agravamento das agressões aos princípios
fundamentais do projeto do Plano Piloto de Brasília, insustentabilidade e
risco de irrecuperação das condições do lago Paranoá até mesmo para o
cumprimento de sua função original: recreativa.
Aqui vai um alerta aos governantes atuais e pretendentes ao GDF:
estamos atentos no que proporão em suas campanhas pois a população do
Distrito Federal está cada dia mais alerta à veracidade e viabilidade
das proposições. Não se faz mais eleitores como antigamente. Hoje
sabemos escolher melhor e cobrar o prometido.
O
Arco do Desmatamento da Amazônia tem 500 mil km2 de terras que vão do
leste e sul do Pará em direção oeste, passando por Mato Grosso, Rondônia
e Acre. É o local onde a fronteira agrícola avança em direção à
floresta, em que se dão os piores confrontos entre quem protege o verde e
quem quer desmatar para garantir sua sobrevivência. Não por acaso, foi
chamado de “zona de guerra”, pelo fiscal do ICMBio e chefe da Floresta
Nacional de Jamari, em Rondônia, Áquilas Mascarenhas, em reportagem recente publicada no jornal “Valor Econômico”.
Folheando o site do jornal britânico “The Guardian”, eis
que me deparo com outro apelido para a região: fronteira sem lei. A
reportagem recente, feita pelo editor de meio ambiente do jornal,
Jonathan Watts, conta a história do violento assassinato de Sairá Kaápor
em abril do ano passado. Embora o caso ainda não tenha sido resolvido
pela Justiça, o que se acredita é que o indígena teria enfrentado
madeireiros da região, por isso morreu. A reportagem, muito sensata e
com informações precisas, vai trazendo o fio do novelo e apontando para
uma realidade que passa distante de brasileiros do Sul/Sudeste.
“Armados com arcos, flechas,
rastreadores de GPS e armas pesadas, Sairá e outros membros de sua
tribo, a Ka´apor, expulsam, às vezes atacam, os madeireiros que tentam
entrar em seu território, a Terra Indígena Alto Turiaçu de 530.000
hectares, no Maranhão”.
Parece cena de filme, mas não é. Trata-se, segundo Watts, de um “mundo frágil,perigoso, equilibrado precariamente em valores de conservação e consumo, tradição e modernidade”.Essa
relação tão intensa e frágil é definida de forma extremamente sensível
pelo jornalista britânico. E vai deixando no leitor brasileiro uma
sensação de impotência diante do quadro absolutamente negligenciado
pelos governantes, que Watts lembra serem, muitos deles, “coronéis que
possuem uma autoridade quase feudal”.
“Nada
é preto e branco. Os madeireiros também eram vizinhos. Muitos eram
pobres. Houve intercâmbio. As pessoas iriam lutar contra os madeireiros
um ano, fazer amizade com eles no próximo e depois voltar a lutar. Mesmo
o Sairá já vendeu árvores em sua terra em troca de cachaça e dinheiro,
mas mais tarde desistiu de álcool e liderou a campanha para impedir que
outros na sua aldeia bebessem e negociassem madeira”, conta o
jornalista.
O
assassinato de Sairá ocorreu na estrada de Betel, pequena aldeia
madeireira que tem apenas algumas centenas de casas, uma igreja e um
bar. Ele estava sendo ameaçado de morte e, por isso, todas as suspeitas
recaem sobre os madeireiros, embora um indígena esteja sendo apontado
como possível culpado por conta de uma briga.
Em 2014, o indígena se envolveu numa ação contra madeireiros ilegais
que foi noticiada mundo afora. Na ocasião, alguns madeireiros foram
espancados e amarrados, deixados nus para serem entregues a agentes
policiais. A violência, portanto, muitas vezes é de parte a parte.
Sairá
e sua história ilustram os dados divulgados na reportagem de Joe Leahy e
Andres Schipani, do também britânico “Financial Times”, reproduzida
pelo “Valor”:
“Até 95%
do desmatamento na região é ilegal, impulsionado por garimpeiros,
pecuaristas e pequenas propriedades rurais irregulares, bem como pelas
novas áreas de incursão abertas por projetos de infraestrutura como
estradas e represas. Cerca de 80% das áreas desmatadas tornam-se pastos,
de acordo com as autoridades ambientais. Embora o desmatamento no
Brasil continue muito menor do que no pico registrado em 2004, quando
uma área maior do que a Macedônia foi dizimada, a área atingida vem
aumentando de 2012 para cá”, diz o texto.
Também
nesta reportagem escrita por estrangeiros é descrita uma cena de
violência na “fronteira sem lei”. Garimpeiros ilegais queimaram, em
outubro do ano passado, o escritório local do Ibama em retaliação à
destruição dos botes que usavam para dragar os rios da região em busca
de ouro. A floresta Amazônica, que tem tudo para ser um dos maiores
orgulhos do território brasileiro, torna-se às vezes frágil, às vezes
perigosa, diante do olhar certeiro de quem acompanha as notícias sobre o
meio ambiente.
“
Agora, por causa das incertezas políticas depois do impeachment da
ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016, e com o Brasil diante de suas
eleições mais imprevisíveis em décadas, a floresta amazônica se torna
ainda mais vulnerável. Críticos sustentam que as incertezas fortaleceram
elementos conservadores no Congresso, em particular os ruralistas -
políticos que representam os interesses dos produtores rurais em tempos
nos quais o desejo insaciável da China por comida torna o Brasil uma
potência agrícola cada vez mais forte. Isso quer dizer que a eleição
geral de outubro não é importante apenas para o futuro do Brasil, mas
também para o da maior floresta tropical do mundo, um dos principais
baluartes contra as mudanças climáticas na Terra, de acordo com os
ativistas”, escrevem os repórteres.
A
sensação é de que os atores responsáveis pelo cenário de terra
desprotegida e sem normas estão se aproveitando do momento também
sensível pelo qual o país está passando. Carlos Nobre, cientista
especializado em mudanças climáticas, foi ouvido pelos repórteres do FT,
e diz, claramente, que não há motivo para crer que em três anos o
Brasil vai conseguir reduzir o desflorestamento de algo entre mais de 6
mil e 8 mil quilômetros quadrados para 3,9 mil quilômetros quadrados.
“Odesafio
vai ser ainda maior para 2030, a menos que haja uma clara mudança na
política ambiental, e isso só vai ficar claro quando soubermos quem vai
ser eleito em 2018”, acrescenta ele.
Os desmandos na Amazônia estão, de fato, preocupando os estrangeiros. Em outro site jornalístico, “The Globe and Mail Inc”, repórteres
contam a história da BR-163, que liga Cuiabá a Santarém e que, segundo o
texto, “corta um caminho pelo próprio país e através
das ambições conflitantes do Brasil: transformar-se em uma economia do
primeiro mundo, por um lado, e por outro, para proteger e preservar o
que resta de um ecossistema que recicla um quinto da precipitação
mundial, detém 150 milhões de toneladas de carbono armazenado e abriga
15 por cento de todas as espécies na Terra”.
Vale
a pena conferir o que pensam os profissionais estrangeiros sobre a
atual situação da Amazônia e o que eles conseguem apurar, com recursos
que lhes permitem viajar pela região. E não custa lembrar que esta luta,
entre os preservadores e os dilapidadores da Amazônia brasileira, não é
de hoje que está ocupando também os nossos temores mais profundos.
Acabo de receber, por mensagem, um simpático convite para a missa em
ação de graças a Dom Pedro Casaldáliga, que fará 90 anos este ano. Nomeado
bispo prelado de São Felix do Araguaia, Dom Pedro teve que se exilar em
2012 por conta das ameaças de morte que sofreu por defender o povo
Xavante das agressões feitas por pessoas que queriam suas terras.
E vida que segue, num país considerado, em pesquisa realizadapela instituição Global Witness, como o mais perigoso do mundo para defensores ambientais.
Esta terça-feira (27) foi um dia de muitas notícias sobre o
clima. Na minha pesquisa diária pela internet, estava pensando em buscar mais
informações sobre o “Dia Zero”, quando as torneiras de água vão se secar na
Cidade do Cabo. Já há várias datas estimadas para que isso aconteça, sendo que
a mais distante é em junho deste ano e a mais assustadora é daqui a dez semanas. Trata-se de um dos tantos eventos extremos
causados pelas mudanças climáticas e a Cidade do Cabo, na África do Sul, vai
ser a primeira cidade a enfrentar o problema. Virão outras e, segundo estudos,
São Paulo está entre elas.
Fiquei imaginando como seria viver com um racionamento de
água que chegará ao limite de proibir banhos diários. Lavar roupa em máquina,
nem pensar. Dar descarga será também uma atividade que precisará ser reduzida.
E mais tantas outras coisas que se faz com água no dia a dia.
Há um Centro de Operações de Desastre na cidade, e o chefe
local, Greg Pillay, entrevistado pela equipe do jornal britânico “The
Guardian”, disse que já identificou quatro graves riscos que poderão ocorrer
quando as torneiras se secarem de vez, entre eles surtos de doenças e anarquia
nas ruas, com o povo em busca de água. Alguém consegue imaginar uma situação
como essa?
A estratégia é: no lugar da água canalizada, a cidade vai
ter 200 pontos de coleta, para garantir o mínimo de 25 litros por pessoa,
máximo que será possível. Esses pontos estarão a cerca de 200 metros da casa de
cada cidadão. A pergunta é: as pessoas poderiam ter evitado chegar a esse
ponto, se tivessem poupado mais água?
Segundo o vice-prefeito Ian Neilson, houve uma campanha de
informação pública que ajudou a reduzir o consumo diário de água da cidade, de 1.200
milhões de litros para 540 milhões de litros. Se as pessoas continuarem a
colaborar e conseguirem diminuir em mais 25%, é possível que as torneiras
possam continuar abertas.
Mas um comentário que chama a atenção na fala de Christine
Colvin, gerente de água doce da WWF e membro do conselho consultivo da
Prefeitura, para a reportagem do jornal, é de que o cenário atual foi previsto
e que há outra previsão, esta sistematicamente esquecida, que põe a cidade no
meio de uma alarmante zona de calor intenso no futuro.
“O que nós não sabíamos era quando esse futuro chegaria. As
empresas e os investidores ouviram as projeções de longo prazo, mas não ouviram
quando foi puxado o gatilho da arma. Se esta seca pode ajudar a esta
conscientização, então isso poderia ser uma coisa boa. Se isso for visto
como um teste de pressão para o novo normal, isso nos ajudará a nos adaptar”,
disse ela.
O “novo normal” é aquele que muitos dirigentes, pessoas que
poderiam ajudar a traçar novos caminhos para as rotinas dos cidadãos, entre
eles o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, preferem fazer de conta que
nunca terá que existir. O “novo normal” terá que ser construído passo a passo,
com ações diferentes, com mais cuidado, com mais respeito às mensagens que o
meio ambiente está emitindo.
Estamos a 20 dias do 8º Fórum Mundial da Água,
que este ano vai acontecer no Brasil, em Brasília, e o “Dia Zero” é tema
obrigatório para que o encontro não seja repleto de retóricas inúteis.
Pensando sobre as tais mensagens que não estamos conseguindo
ouvir com atenção necessária, minha atenção foi desviada para outra notícia,
publicada como manchete no site do “The Guardian” de ontem,dando conta de que
os cientistas estão, verdadeiramente, alarmados com o aquecimento do Ártico. As
tempestades de neve que estamos observando acontecer na Europa, se para os
turistas são bons momentos de lazer, na verdade estão preocupando quem sabe
“ler” as mensagens do clima.É que o frio deveria estar acontecendo mais ao
Norte, onde está ocorrendo uma onda de calor alarmante, que vem obrigando os
cientistas a reconsiderarem até mesmo suas previsões mais pessimistas de
mudanças climáticas.
“O Polo Norte não tem luz solar até março, mas um fluxo de
ar quente tem pressionado as temperaturas na Sibéria por até 35C acima das
médias históricas deste mês. A Groenlândia já experimentou 61 horas de
temperaturasacima do congelamento em
2018 - mais de três vezes mais horas do que em qualquer ano anterior”, descreve
a reportagem no jornal.
É um clima “louco”, “estranho”, “chocante”, dizem os
cientistas.Ruth Mottram, do Instituto Meteorológico Dinamarquês, disse que
desde o final da década de 50, pelo menos, as temperaturas no Ártico não
estavam tão elevadas.
Para não dizer que não falei de flores, vamos registrar que,
pelo menos na intenção, alguns humanos que detém o poder estão começando a se
preocupar e tomar atitudes para conviver com este clima louco, estranho,
chocante. É o caso da Alemanha, que surpreendeu muita gente quando decidiu
autorizar algumas cidades a proibirem carros a diesel por causa da poluição. O foco, aqui, não é exatamente a
mudança do clima que também é afetada pela poluição, mas a saúde das pessoas.
De qualquer maneira, é bom imaginar que estamos assistindo a uma mudança de
rumo, também quando lemos a notícia de que os legisladores da Bélgica, em
Bruxelas, aprovaram medida semelhante para proteger os cidadãos dos efeitos
nefastos da poluição do ar da cidade. Lá, segundo reportagem do jornal
português “O Público”, de cada vez que as medições da qualidade do ar
apontarem níveis nocivos, a utilização da rede de transportes públicos passará
a ser gratuita. Não é má ideia.
Não muito longe dali, também com intuito de proteger a saúde
humana, mas quem sabe já focando implementar a necessária mudança em rotinas, a
prefeita de Paris Anne Hidalgo está num embate com o Tribunal Administrativo da
cidade por ter fechado para carros um trecho à beira do Sena em 2016. A
população adorou, pedestres e ciclistas passaram a frequentar o espaço que
antes era apenas para os carros. O lugar, que era barulhento e poluído, hoje é
especialmente convidativo a caminhadas e ao lazer. Mas a decisão desagradou aos
que preferem o “conforto” de andar de carro. Parece que a briga vai continuar,
e a prefeita, assim como a Câmara Municipal, terão os parisienses a seu lado.
É o “novo normal” sendo costurado de maneira ainda
desorganizada.
Relíquia: Manuscrito de Lúcio Costa sobre o Plano Piloto
Por Tânia Battella
Ao contrário do que muitos dizem, Lúcio Costa sempre esteve presente
na implantação de seu projeto do plano piloto de Brasília. Entre 1980 e
1985, quando respondi pelo Departamento de Arquitetura e Urbanismo da
Secretaria de Viação e Obras – DAU/SVO, hoje da Secretaria de Gestão do
Território e Habitação – SEGETH, formalizamos a consultoria de Lúcio
Costa para assuntos relacionados a implantação e implementação de seu
projeto de Brasília.
Assim, vários foram os Pareceres sobre determinadas questões, sobre
as quais o autor de Brasília opinou, quer por consulta nossa, direta, do
DAU/SVO, ou por outras instituições governamentais e não
governamentais, cujas posições sempre nos encaminhava, ciente de que a
responsabilidade da preservação de seu projeto era do Departamento de
Arquitetura e Urbanismo da SVO.
Guardei, com orgulho e muito carinho cópia dessas Cartas/Pareceres
manuscritas que abordam temas até hoje debatidos, como o Touring Club,
a Plataforma Rodoviária, a Praça dos Três Poderes, interligação das
vias L1 e W1, Setor de Hotéis de Turismo, Setor Hoteleiro, Praça do
Buriti entre outros.
Considerando a oportunidade da elaboração do Plano de Preservação do
Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB, previsto pela Lei Orgânica do
DF, em andamento pelo GDF e considerando também que a SEGETH,
responsável pela coordenação desse Plano não disponibilizou tais
informações, e ainda pela atualidade dos temas abordados nesses
Pareceres, vou relatá-los, em série, sempre disponibilizando cópia da
Carta manuscrita elaborada pelo autor do projeto de Brasília.
Nesse sentido, inicio com o parecer sobre consulta formulada em maio de 1983, pela Administração da Rodoviária, sobre a utilização de paramentos e platibandas da Estação para propaganda comercial. Vale
lembrar que a Estação rodoviária é projeto de arquitetura de autoria de
Lúcio Costa, merecendo duplamente ser considerada sua opinião a
respeito,
Sua resposta à consulta foi a seguinte:
1º. A propaganda comercial na Estação Rodoviária deve limitar-se aos numerosos boxes de negócios – cerca de 40 – existentes; 2º. É inconcebível que, na capital da República, a boa
conservação da estação fique na dependência de tais artifícios; as
verbas consideradas necessárias a essa manutenção devem ser incluídas no
orçamento normal do DF. 3º. A Plataforma Rodoviária é parte integrante do Eixo Monumental da cidade e, como tal, está a exigir compostura urbana compatível com essa circunstância. Sou, pois, radicalmente contrário à proposta.
Lúcio Costa
18/v/83
Desse Parecer, claro e objetivo, além do conteúdo propriamente dito,
contrário à utilização de espaços da edificação da Estação Rodoviária
para propaganda comercial, vale destacar o conceito inserido sobre a
própria Estação Rodoviária, como parte integrante do Eixo Monumental da cidade, assinalado por ele mesmo, na Carta/Parecer.
Assim deve, portanto, ser tratada e considerada a Estação Rodoviária: parte integrante do Eixo Monumental da cidade e, como tal, está a exigir compostura urbana compatível com essa circunstância. (este grifo é meu).