Adote 1 Parque: apoio privado para conservação é bom, mas não resolve falta de gestão pública
09 fevereiro 2021
Por WWF-Brasil
O anúncio do acordo que lança na prática o programa Adote 1 Parque, em 9 de fevereiro de 2021, confirma que grandes empresas estão dispostas a contribuir com a conservação do meio ambiente na Amazônia. Para nós, do WWF-Brasil, esse é um ponto fundamental: sem a participação de todos - governos, empresas, consumidores, povos indígenas, comunidades locais - não conseguiremos vencer os grandes desafios ambientais do século 21, tais como a perda de biodiversidade e a crise climática. Portanto, qualquer iniciativa do setor privado que vá no sentido de fortalecer a gestão das unidades de conservação, que cobrem pouco mais de 18% da área terrestre do país e 26% da área marinha, é bem vinda.
No entanto, a falta de transparência quanto aos detalhes operacionais do programa e, sobretudo, a situação dramática pela qual passa o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBio, nos impedem de comemorar o lançamento de tal programa.
Nos últimos dois anos o Brasil viu o desmatamento voltar a crescer não só na Amazônia, mas também na Mata Atlântica e em outras partes do país. Mesmo as unidades de conservação públicas, que por lei deveriam estar imunes à expansão agrícola e mineral, viram nesse período um crescimento exponencial no desmatamento ilegal (83% maior do que a média dos 10 anos anteriores). Isso ocorre porque o Governo Federal reduziu drasticamente o orçamento do ICMBio e asfixiou a capacidade de fiscalização e punição do IBAMA. O projeto orçamentário enviado ao Congresso Nacional pelo Presidente Bolsonaro prevê o menor orçamento em 21 anos para a área ambiental, com um corte de 35% (em relação a 2019) nos recursos destinados à fiscalização ambiental. Some-se a isso o crescente aparelhamento do ICMBio com pessoas sem experiência na gestão de áreas protegidas e temos uma situação realmente desalentadora.
É nesse contexto que devemos avaliar o programa ora lançado. Por mais importante que seja o apoio de empresas à gestão de UCs, isso só terá efeitos positivos se houver gestão pública de qualidade, algo que estamos perdendo rapidamente sob a atual gestão federal.
Por fim, a falta de transparência do Ministério do Meio Ambiente impede que se possa avaliar a própria adequação do programa ao fim a que se pretende. Não se sabe quais foram os critérios utilizados para priorizar determinadas UCs, assim como não há informações sobre condições existentes ou recursos humanos disponíveis para sua execução. Ainda, não fica claro qual é de fato o papel das empresas - elas são doadoras de recursos ou serão também responsáveis por sua execução? Há sérias e justificadas dúvidas, portanto, quanto a sua eficiência e sustentabilidade no médio prazo.
Não há como fazer gestão pública séria sem planejamento, transparência, debate público e orçamento. Recursos privados podem ajudar, mas apenas se o restante estiver endereçado. Infelizmente não é essa a situação atual no país, o que indica que nossas áreas protegidas continuarão sob uma ameaça sem precedentes.
O PAT Cerrado Tocantins concluiu a etapa de elaboração e nos próximos 5 anos irá implementar o Plano que cobre 22 municípios em todo o Estado de Tocantins e que corresponde a mais de 37 mil km2 do bioma Cerrado. O Plano visa a conservação de 9 espécies Criticamente em Perigo (CR) e 3 espécies Em Perigo (EN) de extinção e que não constavam em Unidades de Conservação (UCs) ou não possuíam algum instrumento de conservação.
Oscar Vitorino Junior, biólogo do Naturatins e coordenador do Núcleo Operacional do PAT Cerrado Tocantins destaca:
“O plano estabelece atividades para conservação de espécies que demandam uma atenção especial, que são considerados ameaçados de extinção, nas listas nacionais do Ministério do Meio Ambiente e no Livro Vermelho da Flora Brasil. O Sumário Executivo apresenta uma lista com a indicação da família, espécie, nome comum e estado de conservação desses táxons e em seguida trazinformações sobre a ecologia de cada espécie”.
Entre as espécies-alvo da flora e fauna do PAT Cerrado Tocantins estão:
Angelonia aternifolia: uma erva de até 60 cm de altura com flores de pétalas roxas e que foi encontrada apenas uma única vez em 1978 no município de Almas, TO.
Bomelia braunni: é uma bromélia que cresce no solo e pode atingir 40 cm de altura e tem flores agrupadas que vão desde a cor lilás até a rouxa. Ela possui frutos que quando estão maduros tem o formato de uma bananinha.
Mylesinus paucisquamamtus: conhecido como pacú dente-seco, é um peixe de porte médio que chega a atingir aproximadamente 30 cm, sua ocorrência é limitada à bacia do rio Tocantins e se alimenta de plantas aquáticas.
Paratrygon aiereba: é conhecida como arraia maçã e também é a maior espécie de arraia com ocorrência na bacia dos rios Araguaia-Tocantins. Esta espécie se alimenta de moluscos e peixes.
Além das espécies alvo, serão beneficiadas indiretamente 49 espécies de fauna e 16 de flora, entre os destaques estão o gavião real (Harpia harpyja) , o lobo guará (Chrysocyon brachyurus), a onça pintada (Panthera onca), a abelha Uruçu-Amarela (Melipona rufiventris) e 16 tipos de plantas do grupo Angioespermas que em muitas vezes podem facilitar o processo de polinização.
O Naturatins publicou no dia 07 de julho a Portaria n° 80 no Diário Oficial do Estado (DOE), que estabelece a criação do Plano de Ação para Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção do Território Cerrado Tocantins (PAT Cerrado Tocantins).
Durante a elaboração do PAT Cerrado Tocantins foi realizada uma expedição de campo para o levantamento de informações e situação de conservação e ocorrência das quatro espécies prioritárias de flora na qual participaram pesquisadores do Centro Nacional de Conservação da Flora e Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (CNCFlora/JBRJ), da Universidade Estadual do Tocantins (Unitins), do Naturatins, da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e da Universidade de Brasília (UnB). A oficina de elaboração reuniu representantes de 15 órgãos, instituições federais e organizações.
A participação e engajamento de atores locais é essencial para a implementação de todas as ações planejadas. O PAT Cerrado Tocantins conta com o assessoramento técnico da Universidade Federal de Tocantins (UFT), Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Instituto de Desenvolvimento Rural do Tocantins (RURALTINS).
Coalizão Pró-UC divulga posicionamento sobre fusão entre ICMBio e Ibama
10 fevereiro 2021
Formada por nove instituições ambientais, organização defende a atuação individual dos institutos e avalia os potenciais riscos da união
Por Coalizão Pró-UC
Diante da possível fusão entre o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), a Coalizão Pró-Unidades de Conservação divulgou uma nota de posicionamento para enfatizar a importância de manter os dois institutos separados e esclarecer as implicações dessa fusão. A Coalizão Pró-UC é formada pelas principais instituições de conservação ambiental no Brasil: WWF-Brasil, SOS Mata Atlântica, Imaflora, Imazon, Fundação Grupo Boticário, The Nature Conservancy, Conservação Internacional, Semeia e Rede Pró-UCs.
De acordo com a nota, o ICMBio, responsável pela gestão e conservação das UCs (Unidades de Conservação) federais, garantiu importantes conquistas desde sua criação, em 2007. Em 11 anos, o número de unidades com planos de manejo aumentou em 250%, passando de 78 em 2007 para 195 em 2018. A avaliação sobre a conservação da fauna, cuja metodologia foi reconhecida internacionalmente, também aumentou de mil para 12 mil espécies. O ICMBio estimula também as UCs de uso sustentável, onde o número de famílias cadastradas nas Reservas Extrativistas e categorias similares aumentou mais de 1200%, passando de 3 mil para pelo menos 52 mil em 10 anos. Além disso, a visitação pública nas UCs teve um incremento significativo de 3,6 milhões de pessoas em 2008 para 15,3 milhões em 2019, um crescimento de mais de 400% em uma década.
O ICMBio atua também na gestão das Florestas Nacionais. As seis Florestas Nacionais atualmente, com parte concedida para manejo florestal empresarial, geraram arrecadação aos cofres públicos de mais de R$69 milhões entre 2010 e 2019. Segundo a nota, "o governo tem como meta triplicar a área concedida, aumentando de pouco mais de 1 milhão para 3 milhões, o que ampliará significativamente o valor arrecadado que é distribuído para União, estado e municípios, além dos empregos e renda gerados ao longo de toda a cadeia de valor da madeira. Portanto, a ampliação das concessões florestais como declarado pelo Governo Federal depende da continuidade das atividades desenvolvidas pelo ICMBio".
Já o Ibama possui as atribuições de licenciamento ambiental, controle da qualidade ambiental, autorização de uso de recursos naturais e a fiscalização e poder de polícia ambiental. Todas atividades de suma importância, especialmente em um momento no qual o país enfrenta severas altas no desmatamento. Ainda assim, o número de autos de infração ambientais realizados pelo Ibama em 2020 foi o menor em quinze anos, o que também denota a necessidade de foco, independência e fortalecimento do órgão.
Segundo Roberto Palmieri, secretário executivo do Imaflora, esses dados reforçam que ter uma instituição especializada na gestão de UCs nesses últimos 13 anos e outra dedicada a fiscalização ambiental propiciou avanços significativos na quantidade de instrumentos de gestão e na qualidade dos serviços prestados à sociedade, mesmo com condições muito limitadas de pessoal, cargos e orçamento. “Fundir os dois órgãos geraria conflitos de interesse nos processos de licenciamento, pois implicaria no Ibama licenciar as atividades econômicas em Unidades de Conservação geradoras de recursos para o ICMBio, que passariam para sua gestão. É importante manter a independência do órgão licenciador e do órgão gestor da UCs”, explica Roberto.
Riscos da fusão A Coalizão Pró-UC avalia que a fusão pode causar o efeito contrário ao ganho de eficiência esperado pelo governo, devido ao cenário de fragilização da política ambiental. Uma série de implicações estão envolvidas, como a desmobilização da equipe qualificada ao longo de mais uma década de existência do ICMBio e do Ibama, a desorganização dos processos, das normativas, dos instrumentos e de todo o sistema de gestão das UCs federais, além das consequentes perda de foco, eficiência, qualidade e eficácia nos processos de gestão.
Segundo Angela Kuczach, diretora-executiva da Rede Pró-UCs, a atuação individual dos institutos gerou um potencial de inovação no serviço público e na gestão das UCs e ampliou o diálogo com a sociedade. "São conquistas que não podem retroceder. Há uma enorme preocupação de que essa fusão possa comprometer a garantia do número de servidores dedicados a atividades essenciais, como o combate ao desmatamento e aos incêndios, que em 2020 chamaram a atenção da imprensa mundial pelos elevados índices de ambos", finaliza.
Para ler o posicionamento na íntegra, clique aqui.
Sobre a Coalizão Pró-UC A Coalizão Pró-UC (Pró Unidades de Conservação da Natureza) é uma rede de instituições da sociedade civil, que tem como objetivo promover, junto à sociedade, o que consideramos as melhores e mais eficientes formas de proteger e conservar o patrimônio natural brasileiro, para essa e as futuras gerações. Para tanto, promove a articulação entre os setores, o debate junto à sociedade e desenvolve estratégias para o fortalecimento das UCs (Unidades de Conservação) em todo o território nacional. Integram a Coalizão, o WWF-Brasil, a Fundação SOS Mata Atlântica, a TNC (The Nature Conservancy), a CI-Brasil (Conservação Internacional), Fundação Grupo Boticário para a Conservação da Natureza, o Instituto Semeia, Rede Nacional Pró Unidades de Conservação, o Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola), o IPE (Instituto de Pesquisas Ecológicas) e a UICN-Brasil (União Internacional para a Conservação da Natureza).
O Ministério das Relações Exteriores do Brasil afirmou nesta terça-feira (12), em nota, ter recebido “com grande satisfação”, as determinações da OMC – Organização Mundial do Comércio que examinou o veto brasileiro à importação de pneus recauchutados provenientes da UE – União Européia.
Mesmo aceitando alguns argumentos brasileiros para a proibição, os árbitros da OMC decidiram impedir o Brasil de importar o produto de qualquer outro país.
“O Brasil recebeu, com grande satisfação, as determinações do Painel, que são amplamente favoráveis às teses ambientais e de saúde pública defendidas pelo Brasil”, diz o documento.
Além disso, o Itamaraty diz que após uma análise das implicações jurídicas do relatório, “o governo brasileiro decidiu que não recorrerá ao Órgão de Apelação”.
O Brasil proibiu a importação de pneus usados da UE, mesmo recauchutados, com o argumento de que o material é um resíduo que põe em risco o ambiente e serve como criadouro para insetos nocivos à saúde humana, como o mosquito da dengue.
A União Européia apresentou um processo contra a proibição por considerá-la uma barreira não tarifária que tem como objetivo garantir o mercado para os recauchutados no Brasil.
Embora proíba a importação da UE, o Brasil compra pneus nos países do Mercosul, e, por decisões judiciais, também importa usados para serem recauchutados pela indústria nacional e vendidos no mercado interno.
O grupo, segundo o Itamaraty, considerou a proibição necessária para proteger a saúde pública e o meio ambiente. “Os pneus recauchutados têm uma vida útil menor que os novos” e a importação “acelera a acumulação de resíduos no país importador”, diz o texto.
Segundo interpretação brasileira, o relatório também concluiu que a exceção que permite ao Brasil importar pneus dos vizinhos do Mercosul “não constitui discriminação arbitrária ou injustificável contra produtos de outras origens, nem é uma restrição disfarçada ao comércio internacional”.
De acordo com o Itamaraty, a exceção foi determinada por uma decisão arbitral do Mercosul e o volume de pneus importados não é expressivo.
Apesar disso, “o grupo considerou que as importações de pneus usados como matéria-prima para a indústria que recauchuta no Brasil, permitidas por autorizações judiciais, ocorrem em volumes tais que acabam por comprometer o objetivo de reduzir a acumulação de resíduos de pneus no país.”
“O grupo entendeu também que a receita gerada por essa matéria-prima no Brasil beneficia produtores nacionais de pneus em detrimento de seus concorrentes estrangeiros”, acrescenta o documento.
Em conseqüência, “o Brasil poderá manter a proibição de importação de pneus reformados, desde que concomitantemente assegure com eficácia a implementação da proibição de importação de pneus usados”, diz a nota.
Ainda segundo a nota, as recomendações do grupo terão que ser adotadas pelo Órgão de Resolução de Controvérsias da OMC entre 20 e 60 dias a partir de hoje caso nenhuma outra parte apresente recurso.
“Uma vez adotado o relatório do Painel pelo Órgão de Solução de Controvérsias, caberá ao Brasil indicar como e em que prazo pretende colocar suas medidas em conformidade com as disciplinas multilaterais de comércio”, conclui em nota o Itamaraty. (Folha Online)
Trilhões de pedaços de plástico quase invisíveis estão flutuando nos oceanos do mundo, das águas superficiais aos mares profundos. Essas partículas, conhecidas como microplásticos, normalmente se formam quando objetos de plástico maiores, como sacolas de compras e recipientes de comida, se rompem.
Os pesquisadores estão preocupados com os microplásticos porque eles são minúsculos, amplamente distribuídos e fáceis de serem consumidos pela vida selvagem, acidentalmente ou intencionalmente. Estudamos a ciência marinha e o comportamento animal, e queríamos entender a escala desse problema. Em um estudo publicado recentemente que conduzimos com o ecologista Elliott Hazen, examinamos como os peixes marinhos – incluindo espécies consumidas por humanos – estão ingerindo partículas sintéticas de todos os tamanhos.
Na mais ampla revisão sobre o tema realizada até os dias atuais, descobrimos que, até o momento, 386 espécies de peixes marinhos ingeriram detritos plásticos, incluindo 210 espécies comercialmente importantes. Mas as descobertas sobre o consumo de plástico por peixes estão aumentando. Especulamos que isso poderia estar acontecendo porque os métodos de detecção de microplásticos estão melhorando e porque a poluição por plástico no oceano continua a aumentar.
Resolvendo o quebra-cabeça de plásticos
Não é novidade que criaturas selvagens ingerem plástico. A primeira observação científica desse problema veio do estômago de uma ave marinha em 1969. Três anos depois, os cientistas relataram que os peixes da costa do sul da Nova Inglaterra consumiam minúsculas partículas de plástico.
Desde então, mais de 100 artigos científicos descreveram a ingestão de plástico em várias espécies de peixes. Mas cada estudo contribuiu apenas com uma pequena peça de um quebra-cabeça muito importante. Para ver o problema com mais clareza, tivemos que juntar essas peças.
Fizemos isso criando o maior banco de dados existente sobre a ingestão de plástico por peixes marinhos, com base em todos os estudos científicos do problema publicados de 1972 a 2019. Coletamos uma série de informações de cada estudo, incluindo quais espécies de peixes ele examinou, o número de peixes que comeram plástico e quando esses peixes foram pescados. Como algumas regiões do oceano têm mais poluição por plástico do que outras, também examinamos onde os peixes foram encontrados.
Para cada espécie em nosso banco de dados, identificamos sua dieta, habitat e comportamentos alimentares – por exemplo, se ela se alimentava de outros peixes ou se alimentava de algas. Ao analisar esses dados como um todo, queríamos entender não apenas quantos peixes estavam comendo plástico, mas também quais fatores poderiam levar com que o fizessem. As tendências que encontramos foram surpreendentes e preocupantes.
Um problema global
Nossa pesquisa revelou que os peixes marinhos estão ingerindo plástico em todo o mundo. De acordo com 129 artigos científicos em nosso banco de dados, pesquisadores estudaram esse problema em 555 espécies de peixes. Ficamos alarmados ao descobrir que mais de dois terços dessas espécies haviam ingerido plástico.
Uma advertência importante é que nem todos esses estudos procuraram microplásticos. Isso provavelmente ocorre porque a localização de microplásticos requer equipamentos especializados, como microscópios, ou o uso de técnicas mais complexas. Mas quando os pesquisadores procuraram microplásticos, encontraram cinco vezes mais plástico por peixe individual do que quando procuraram apenas pedaços maiores. Estudos que foram capazes de detectar essa ameaça anteriormente invisível revelaram que a ingestão de plástico foi maior do que havíamos previsto originalmente.
Nossa revisão de quatro décadas de pesquisa indica que o consumo de plástico por peixes está aumentando. Desde uma avaliação internacional realizada para as Nações Unidas em 2016, o número de espécies de peixes marinhos encontrados com plástico quadruplicou.
Da mesma forma, apenas na última década, a proporção de peixes que consomem plástico dobrou em todas as espécies. Estudos publicados de 2010-2013 descobriram que uma média de 15% dos peixes amostrados continham plástico; nos estudos publicados de 2017-2019, essa participação subiu para 33%.
Acreditamos que existam duas razões para essa tendência. Primeiro, as técnicas científicas de detecção de microplásticos melhoraram substancialmente nos últimos cinco anos. Muitos dos estudos anteriores que examinamos podem não ter encontrado microplásticos porque os pesquisadores não podiam vê-los.
Em segundo lugar, também é provável que os peixes estejam realmente consumindo mais plástico com o tempo, à medida que a poluição por plástico no oceano aumenta globalmente. Se isso for verdade, a expectativa é de que a situação piore. Vários estudos que procuraram quantificar os resíduos de plástico projetam que a quantidade de poluição por plástico no oceano continuará a aumentar nas próximas décadas.
A maior parte do lixo plástico global é descartada
O mundo produz cerca de 380 milhões de toneladas métricas (418 milhões de toneladas curtas) de plástico anualmente, das quais mais da metade, é jogada fora.
Fatores de risco
Embora nossas descobertas possam fazer parecer que os peixes do oceano estão cheios de plástico até as guelras, a situação é mais complexa. Em nossa revisão, quase um terço das espécies estudadas não consumiram plástico. E mesmo em estudos que relataram ingestão de plástico, os pesquisadores não encontraram plástico em todos os peixes individualmente. Entre estudos e espécies, cerca de um em cada quatro peixes continha plásticos – uma fração que parece estar crescendo com o tempo. Os peixes que consumiam plástico normalmente tinham apenas um ou dois pedaços no estômago.
Em nossa opinião, isso indica que a ingestão de plástico por peixes pode ser generalizada, mas não parece ser universal. Nem parece aleatório. Pelo contrário, fomos capazes de prever quais espécies eram mais propensas a comer plástico com base em seu ambiente, habitat e comportamento alimentar.
Por exemplo, peixes como tubarões, garoupa e atum que caçam outros peixes ou organismos marinhos como alimento, eram mais propensos a ingerir plástico. Consequentemente, as espécies mais altas na cadeia alimentar correm maior risco.
Não ficamos surpresos que a quantidade de plástico que os peixes consumiam também parecia depender de quanto plástico havia em seu ambiente. Espécies que vivem em regiões oceânicas conhecidas por terem muita poluição por plástico, como o Mar Mediterrâneo e as costas do Leste Asiático, foram as que tiveram mais plástico em seus estômagos.
Efeitos de uma dieta de plástico
Esta não é apenas uma questão de conservação da vida selvagem. Os pesquisadores não sabem muito sobre os efeitos da ingestão de plástico em peixes ou humanos. No entanto, há evidências de que os microplásticos e até mesmo as partículas menores chamadas nanoplásticos podem se mover do estômago de um peixe para seu tecido muscular, que é a parte que os humanos normalmente comem. Nossas descobertas destacam a necessidade de estudos que analisem a frequência com que os plásticos são transferidos dos peixes para as pessoas e seus efeitos potenciais no corpo humano.
Nossa revisão é um passo para a compreensão do problema global da poluição do plástico nos oceanos. Das mais de 20.000 espécies de peixes marinhos, apenas cerca de 2% foram testadas para consumo de plástico. E muitas extensões do oceano ainda precisam ser examinadas. No entanto, o que agora está claro para nós é que “longe da vista, longe da mente” não é uma resposta eficaz à poluição do oceano – especialmente quando pode acabar em nossos pratos.