Meio Ambiente
Os impactos causados pela agropecuária são responsáveis por
69% das emissões de gases de efeito estufa do Brasil.
3 de novembro de 2016 • Atualizado às 09 : 26
Para especialistas, churrasco de domingo é vilão do
aquecimento global. A picanha, a fraldinha e a maminha, bem salgadas, feitas na
brasa, símbolos de um bom churrasco, estão se tornando inimigas do clima.
A
justificativa é de que a carne, desde a criação do gado até a mesa do
brasileiro, é responsável pela liberação de grande quantidade de gases que
causam o aquecimento global, segundo o Observatório do Clima (OC) – rede que
reúne 40 organizações da sociedade civil. A recomendação é que o consumo de
carne de boi seja menor e a produção mais eficiente.
Os impactos causados pela agropecuária são responsáveis por
69% das emissões de gases de efeito estufa do Brasil. Estão incluídos na conta
poluentes decorrentes do processo digestivo e dejetos de rebanhos, o uso de
fertilizantes e o desmatamento (43% das emissões nacionais).
Os números são do Sistema de Estimativa de Emissão de Gases
de Efeito Estufa (Seeg), do Observatório do Clima, divulgados no Rio de
Janeiro.
De acordo com a coordenadora de Clima e Agropecuária do
Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora),
Marian Piatto, que integra a rede do observatório na agropecuária, somente o
gado de corte é responsável por 65% das emissões de gases de efeito estufa na
agropecuária.
Ela explica que um dos problemas está no sistema digestivo
dos animais com dificuldades de processar o capim. “O gado bovino, quando se
alimenta do capim, explicando de uma maneira bem simples, elimina metano por
meio do arroto e do pum. Não é como nos carros, que vemos uma fumaça cinza, mas
são poluentes”.
Marina lembra que o país tem um dos maiores rebanhos do
mundo, cerca de 200 milhões de animais, o que agrava o problema. “É quase um
por pessoa”, comparou.
Para chegar aos 69% das emissões nacionais do setor agropecuário,
o coordenador do Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa,
Tasso Azevedo, acrescenta que, além dos problemas com o gado, entram na conta o
transporte da carga, que, na maioria das vezes, usa diesel, o mais poluente dos
combustíveis e o desmatamento para criação de pasto. Na Amazônia, onde avança o
uso de terras para a atividade, é comum a ocupação de áreas derrubadas com o
gado, denunciou Eron Martins, do Instituto Imazon.
“A relação entre a pecuária e o desmatamento é muito estreita
porque a pecuária tem uma fluidez econômica muito rápida, o que facilita
colocar a pecuária nos locais de expansão (desmatadas) para ter o direito
daquela área mais tarde”, disse Martins. Ele contou que é comum a extração de
madeira deixar áreas degradadas que, em seguida, acabam revertidas em pasto.
Soluções visam reduzir emissões
Segundo os especialistas, às vésperas de o acordo de Paris
entrar em vigor em 2017, com metas para limitar o aumento da temperatura no
planeta, há espaço na agropecuária para redução das emissões, como melhor
manejo de pastagens e menor uso de fertilizantes. O governo, por sua vez, deve
atrelar a concessão de subsídios, como o Plano Safra, às contrapartidas
ambientais. Os ambientalistas, porém, são unânimes em recomendar menor consumo
de carne.
“Cada bife que a gente come é responsável por impacto
ambiental. Não comemos camarão e lagosta todo o dia, por que temos a
necessidade de comer uma quantidade diária de carne bovina?”, questionou
Marina. Uma meta internacional para tornar a carne brasileira mais sustentável
foi descartada porque o destino de 80% do gado do país é a mesa do brasileiro,
de acordo com a especialista.
Para quem pensar em adiar uma mudança de hábitos à mesa,
Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, alerta que o
aquecimento global é responsável por ondas de calor, com sensação térmica de
50º, como no verão do Rio de Janeiro, falta de chuvas, como em São Paulo, e
desastres ambientais. “A gente está falando de qualidade de vida e de economia,
mudanças climáticas são um risco para um país que depende da agricultura e da
pecuária”, afirmou.
O outro lado da moeda
A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) questionou os
dados e disse que a conta do Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de
Efeito Estufa é uma “visão parcial” da produção.
“Se a gente for levar em conta que o Brasil emite menos de
4% das emissões globais, que o sistema leva em conta as emissões e não o
balanço, se a gente considerar os esforços empreendidos para redução das
emissões no Brasil – que vêm diminuindo – e o comprometimento da propriedade
rural na conservação da biodiversidade, no estoque de carbono e na recuperação
de áreas degradas, [poderá constatar] que a agropecuária é uma atividade muito
menos impactante do que se pintou no relatório”, afirmou o coordenador de
Sustentabilidade, Nelson Ananias Filho.
“Precisamos promover políticas de recuperação de pastagens
em degradação para aumentar produtividade e emitir menos gases, produzindo
comida e o nosso churrasco de fim de semana”. Nelson confirma que uma pastagem
bem manejada sequestra até 90% de toda emissão da pecuária.
Para incentivar o setor, o Ministério da Fazenda, por meio
do Plano Safra, apresenta aos produtores técnicas da Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (Embrapa) de produção sustentável.
“Para o governo, é inviável financiar toda mudança
tecnológica do setor. O que fazemos é mostrar as coisas que estão na prateleira
e que são viáveis”, disse o coordenador-geral de Meio Ambiente e Mudanças
Climáticas, Aloisio Lopes Pereira de Melo.