quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Países ricos emitem mais CO2, mas as emissões crescem mais nos países emergentes, artigo de José Eustáquio Diniz Alves Notícia


Países ricos emitem mais CO2, mas as emissões crescem mais nos países emergentes, artigo de José Eustáquio Diniz Alves


emissões globais e nacionais de CO2

[EcoDebate] As emissões globais de dióxido de carbono (CO2) procedentes, principalmente, da queima de combustíveis fósseis aumentaram de 9,4 bilhões de toneladas em 1960 para 36,2 bilhões de toneladas em 2016. Foi um aumento de 3,8 vezes em 56 anos. Neste mesmo período a população mundial aumentou de 3 bilhões de habitantes para 7,5 bilhões, um aumento de 2,5 vezes. Portanto, houve aumento das emissões per capita, pois a poluição cresceu mais rápido do que a população.


Mas as emissões são muito desiguais em termos regionais e possuem ritmos diferentes de crescimento entre os países e os grupos de países. Os países ricos que fazem parte do G7 (EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá) emitiram 5,1 bilhões de toneladas de CO2 em 1960, representando 54% das emissões globais e passaram a emitir 10,3 bilhões de toneladas de CO2, em 2007. Porém, a partir da crise de 2008, as emissões no G7 diminuíram e chegaram a 8,97 bilhões de toneladas em 2016, representando 24,8% das emissões globais. Ou seja, o peso das emissões do G7 caiu mais da metade em termos relativos nos 56 anos em consideração.


Por outro lado, a China que emitia 780 milhões de toneladas de CO2 em 1960, deu um grande salto em 2016, quando emitiu 10,1 bilhões de toneladas de CO2. Isto quer dizer que a China emitia 8,3% das emissões globais em 1960 e passou a emitir 28,1% em 2016 (mais do que todos os países do G7 agrupados).

A Índia que emitia 120 milhões de toneladas de CO2 em 1960 (representando apenas 1,3% do total global) passou a emitir 2,4 bilhões de toneladas (representado 6,7% das emissões globais), em 2016. Os três países mais populosos do mundo, também são os que mais emitem CO2. Em 2016, os três gigantes demográficos juntos emitiram 17,9 bilhões de toneladas, representando 49,5% das emissões globais de CO2.

O gráfico abaixo mostra as emissões dos países do G7 (EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá) e da China, Índia e Rússia. Nota-se que nos últimos 10 a 12 anos, as emissões de CO2 diminuíram em todos os países do G7 e na Rússia e só aumentaram na China e na Índia, sendo que na China as emissões ficaram estagnadas entre 2013 e 2016. Entre os grandes emissores do mundo, somente a Índia continua aumentando consistentemente suas emissões de CO2. Como é um país em desenvolvimento com um nível muito elevado de pobreza, o crescimento econômico da Índia pode contribuir para reduzir a pobreza, mas vai elevar ainda mais as emissões de CO2. A Índia dobrou suas emissões entre 2005 e 2016 e neste ritmo pode ultrapassar a União Europeia antes de 2025 e os EUA antes de 2030.

emissões de CO2 do grupo do G7 mais China, Índia e Rússia

O gráfico abaixo mostra as emissões de CO2 de alguns países em desenvolvimento selecionados. Embora as emissões destes 10 países representem um volume muito menor do que dos 10 países do gráfico anterior, a diferença é que todos eles apresentam crescimento significativo das emissões nos 56 anos em questão. Em 1960, estes 10 países emitiam 46,2 milhões de toneladas de CO2 (representando apenas 0,5% do total) e, em 2016, passaram a emitir 2,3 bilhões de toneladas (representando 6,3% das emissões totais). Os países que mais aumentaram as emissões entre 1960 e 2016 foram Qatar (699 vezes) Arábia Saudita (237 vezes), Tailândia (88 vezes) e Angola (65 vezes).

emissões de CO2 de países em desenvolvimento selecionados

O Brasil emitia 46,9 milhões de toneladas em 1960 (representando 0,5% do total) e passou a emitir 487,4 milhões de toneladas de CO2 em 2016 (representando 1,3% do total). O aumento foi de 10,4 vezes em 56 anos. As emissões per capitas do Brasil estão aumentando.

A generalização do modelo “Extrai-Produz-Descarta” (modelo metabólico entrópico) faz com que os países em desenvolvimento sejam aqueles que, no século XXI, mais aumentam as suas emissões de gases de efeito estufa. Mais da metade das emissões globais já são provenientes dos países em desenvolvimento, sendo que a China e a Índia respondem por 35% das emissões totais em 2016.
Segundo o Global Carbon Project (GCP) as emissões de CO2 aumentaram de 36,2 bilhões de toneladas em 2016 para 36,8 bilhões de toneladas em 2017, com aumento, tanto na China quanto na Índia. A Índia se aproxima muito do nível da União Europeia e mantém o ritmo de crescimento acelerado das emissões.

Nota-se que as emissões da China são maiores do que a soma das emissões dos EUA e da União Europeia (EU), em conjunto. Segundo análise do site Unearthed (30/05/2018) as emissões de CO2 da China subiram cerca de 4% nos primeiros três meses de 2018 e podem subir 5% em 2018, interrompendo o período de estagnação das emissões e acendendo um sinal de alerta para o mundo e para o agravamento da liberação de gases de efeito estufa.

emissões de CO2 da China, EUA, União Europeia e Índia

O quadro acima é preocupante, pois a redução das emissões dos países desenvolvidos está se dando em um ritmo lento e os países emergentes ou em desenvolvimento estão aumentando as emissões de CO2 em ritmo rápido, o que só agrava o efeito estufa e torna distante o sonho de atingir as metas do Acordo de Paris. Os países ricos precisam reduzir drasticamente suas emissões (ou de preferência zerar as emissões) num prazo curto e os países pobres não podem aumentar as suas emissões. Caso contrário, as consequências podem ser catastróficas.

Pesquisa publicada na revista European Geosciences Union Earth System Dynamics, mostra que nos níveis atuais de emissões de CO2, o prazo para limitar o aquecimento até 1,5° C já foi ultrapassado e resta muito pouco tempo antes que as metas de Paris, de limitar o aquecimento global a 2°C, se tornem inviáveis, mesmo com estratégias drásticas de redução global de emissões. O prazo é curto para reverter o quadro de degradação ambiental global.

O estudo considera que se não forem tomadas ações decisivas até 2035 para combater a mudança climática, a humanidade poderá cruzar um ponto de não retorno, e a liberação de CO2 e metano aprisionado no permafrost, nas geleiras e outros sítios ecológicos elevaria a temperatura do Planeta e levaria o mundo a um colapso ambiental, que, também, poderá significar um colapso civilizacional.
Referências:

Zach Boren, Harri Lammi. Dramatic surge in China carbon emissions signals climate danger, Unearthed, 30.05.2018
https://unearthed.greenpeace.org/2018/05/30/china-co2-carbon-climate-emissions-rise-in-2018/
Corinne Le Quéré et al. Global Carbon Budget 2017, Earth Syst. Sci. Data, 10, 405–448, 2018
https://www.earth-syst-sci-data.net/10/405/2018/essd-10-405-2018.pdf
Global Carbon Project: http://www.globalcarbonproject.org/index.htm

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/09/2018

"Países ricos emitem mais CO2, mas as emissões crescem mais nos países emergentes, artigo de José Eustáquio Diniz Alves," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/09/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/09/26/paises-ricos-emitem-mais-co2-mas-as-emissoes-crescem-mais-nos-paises-emergentes-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/.

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Sem um ‘choque de gestão’ e ‘uma ação conjunta entre entes públicos e privados’ será impossível eliminar o desmatamento ilegal


Sem um ‘choque de gestão’ e ‘uma ação conjunta entre entes públicos e privados’ será impossível eliminar o desmatamento ilegal


Sem choque de gestão é impossível eliminar o desmatamento ilegal. Entrevista especial com Ana Paula Valdiones

IHU
Sem um “choque de gestão” e “uma ação conjunta entre entes públicos e privados” será impossível eliminar o desmatamento ilegal em Mato Grosso, meta que deveria ser cumprida até 2020 segundo o acordo firmado na COP-21, adverte Ana Paula Valdiones, analista de Gestão Ambiental do Instituto Centro de Vida, na entrevista a seguir, concedida por e-mail à IHU On-Line.
Segundo ela, o aumento do desmatamento no estado entre 2014 e 2017 evidencia que “as ações que estão sendo realizadas até o momento para conter o desmatamento não estão sendo suficientes”. Ela informa que, do total de vegetação derrubada em 2017, “98% não detinha autorização do órgão ambiental estadual para desmatar” e que “46% da área do Cerrado desmatada estava coberta por pastagem, 44% por agricultura e 10% é um mosaico de agricultura e pastagem”.

Para reforçar o quadro de desmatamento, afirma, “o governo do estado sancionou uma lei (Lei Estadual nº 10.713/2018) que permite novos desmatamentos na Área de Proteção Ambiental das Cabeceiras do Rio Cuiabá”. Embora a legislação esteja suspensa pelo Ministério Público, essa é mais uma medida que dificulta o alcance das metas assumidas na COP-21 e é uma sinalização positiva para aqueles que desmataram ilegalmente. “Essa medida também diminui o grau de proteção de uma das poucas Unidades de Conservação – UC de Mato Grosso no Cerrado. As UCs no estado protegem apenas 6% da área original do bioma Cerrado. Excetuando-se as Áreas de Proteção Ambiental – APA, categoria que conta com menor proteção e permite na maioria das unidades a exploração agropecuária, Mato Grosso possui menos de 2% do Cerrado protegido por Unidades de Conservação”, pontua.

Na avaliação de Ana Paula, o desmatamento ilegal em Mato Grosso é facilitado pela não implementação de acordos como a moratória da soja e os TACs da pecuária no estado. “Os acordos de cadeias para combater o desmatamento como a moratória da soja e os TACs da pecuária ainda não abrangem o bioma Cerrado, e se mantêm olhando exclusivamente para Amazônia. (…) É necessário que outras bases de dados chaves, como a Guia de Trânsito Animal, que registra a movimentação comercial do gado entre fazendas, também sejam disponibilizadas na íntegra para possibilitar o monitoramento de toda a cadeia, por meio do cruzamento entre diferentes bases de dados”.

Ana Paula Valdiones é graduada em Gestão Ambiental pela Universidade de São Paulo – USP e mestra em Ciências pelo Programa de Pós-Graduação em Mudança Social e Participação Política da USP. Atualmente, é analista de Gestão Ambiental do Instituto Centro de Vida.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Segundo monitoramento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – Inpe, entre agosto de 2016 e julho de 2017, o desmatamento no Cerrado foi de 7,4 mil km². E entre 2014 e 2017, o desmatamento subiu 24% somente em Mato Grosso. Qual é o significado do aumento do desmatamento na região, considerando a atual situação do Cerrado?
Ana Paula Valdiones – Nossa análise foi apenas de Mato Grosso e a comparação com o bioma Cerrado como um todo, que envolve 11 estados e o DF. Mas não analisamos a dinâmica de desmate nos outros estados individualmente. Assim, sabemos que em Mato Grosso o desmatamento aumentou entre 2014 e 2017, enquanto o desmatamento total no bioma diminuiu nesse mesmo período. O aumento no estado demonstra que as ações que estão sendo realizadas até o momento para conter o desmatamento não estão sendo suficientes. Os órgãos ambientais responsáveis pelo combate ao desmatamento não estão conseguindo ser efetivos na dissuasão da derrubada ilegal da vegetaçãonatural, bem como os mercados ainda não estão cumprindo seus compromissos de eliminar o desmatamento de sua cadeia de fornecimento (notadamente soja e pecuária) evitando compras de produtos oriundos do desmatamento ilegal que ameaça esse bioma.


IHU On-Line – Como você avalia, de outro lado, a contestação desses dados do desmatamento pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso – Sema-MT, segundo a qual o desmatamento foi de 7,9% entre 2014 e 2017?
Ana Paula Valdiones – Estamos nos referindo a duas informações que são “medidas” de formas diferentes. O Inpe, que é o órgão federal responsável, dentre outras atribuições, pelo monitoramento do desmatamento nos diferentes biomas, tem uma metodologia diferente daquela empregada pela Sema. Seria interessante que o próprio órgão ambiental estadual, que é o responsável pela metodologia e pela produção da informação, explicitasse as divergências metodológicas ao contestar os dados federais, deixando mais claras as limitações e pontos fortes de cada metodologia.


IHU On-Line – Em que regiões de Mato Grosso o desmatamento do Cerrado é maior?
Ana Paula Valdiones – Assim como na Amazônia mato-grossense, o desmatamento no Cerrado também está bastante concentrado. 53% de todo o desmatamento de 2017 se concentrou em 10 municípios, dentre eles Nova NazaréRibeirão Cascalheira e Cocalinho.


IHU On-Line – Quais são as implicações do desmatamento para o Cerrado como um todo?
Ana Paula Valdiones – O Cerrado é o segundo maior bioma do país e o mais rico em biodiversidade. O bioma presta serviços diversos à sociedade, como a manutenção da quantidade e qualidade de água, regulação do clima, conservação da biodiversidade e oferta de alimentos. Além disso, dele dependem diversas populações tradicionais, que compõem o patrimônio histórico e cultural brasileiro. Contudo esse desmatamento ameaça a continuidade da prestação desses serviços ecossistêmicos, inclusive aqueles essenciais ao agronegócio, que reduzem as possibilidades de quebras de safras, como a provisão de água e regulação climática, e coloca em risco a subsistência dos povos e comunidades tradicionais e tem impactos irreversíveis sobre a biodiversidade.


IHU On-Line – O levantamento do Instituto Centro de Vida – ICV também aponta que 46% do Cerrado foi convertido em outros usos. Quais são eles?
Ana Paula Valdiones – Segundo os dados do Mapbiomas, em 2017, 46% da área do Cerrado desmatada estava coberta por pastagem, 44% por agricultura e 10% é um mosaico de agricultura e pastagem.


IHU On-Line – Que fatores têm contribuído para o desmatamento do Cerrado e para a conversão do bioma em outros usos? Há um incentivo para a expansão do agronegócio no estado? Isso tem um impacto no Cerrado?
Ana Paula Valdiones – As ações de desincentivo (dissuasão) do desmatamento ilegal ainda são insuficientes. Do total de vegetação derrubada em 2017, 98% não detinha autorização do órgão ambiental estadual para desmatar. A capacidade de fiscalização do estado ainda é limitada perante o desafio de combater o desmatamento ilegal. É necessário implementar ferramentas mais eficientes e ampliar a transparência de informações fundamentais para o controle ambiental, possibilitando que toda a sociedade possa contribuir para o monitoramento e combate ao desmatamento. Um passo importante foi dado nesse sentido semana passada (19/09), com o lançamento do Portal da Transparência da Sema.
área de distribuição original do CerradoBioma Cerrado (Foto: Todo Estudo)
Além disso, incentivos econômicos para se conservar a floresta em pé ainda não foram implementados. Aqueles produtores com áreas de vegetação superior ao exigido pela lei não têm hoje mecanismos financeiros que tornem atrativa a manutenção dessas áreas com vegetação excedente.


IHU On-Line – O estado de Mato Grosso se comprometeu em eliminar o desmatamento ilegal até 2020 para atender as metas da COP-21. Qual é a possibilidade de essa meta se concretizar?
Ana Paula Valdiones – A não ser que ocorra um choque de gestão e uma ação conjunta entre entes públicos e privados, infelizmente será muito difícil atingir essa meta no prazo. A ilegalidade na abertura de novas áreas é muito alta. Em 2017, 98% de tudo que foi aberto no Cerrado e 89% do total desmatado na Amazônia foi ilegal.


IHU On-Line – Recentemente você mencionou que dois decretos não favoreceram a proteção das Áreas de Proteção Ambiental – APA do Rio Cuiabá e das planícies do Guaporé e do Araguaia. Pode nos dar algumas informações sobre que decretos são esses e quais suas finalidades?
Ana Paula Valdiones – Recentemente o governo do estado sancionou uma lei (Lei Estadual nº 10.713/2018) que permite novos desmatamentos na Área de Proteção Ambiental das Cabeceiras do Rio Cuiabá. A medida, que está suspensa pelo Ministério Público, significa um retrocesso em relação aos compromissos firmados na COP-21. Além de ser uma sinalização positiva para novos desmatamentos e um afrouxamento para aqueles que já desmataram ilegalmente, essa medida também diminui o grau de proteção de uma das poucas Unidades de Conservação – UC de Mato Grosso no Cerrado. As UCs no estado protegem apenas 6% da área original do bioma Cerrado. Excetuando-se as Áreas de Proteção Ambiental – APA, categoria que conta com menor proteção e permite na maioria das unidades a exploração agropecuária, Mato Grosso possui menos de 2% do Cerrado protegido por Unidades de Conservação.
Outro decreto publicado há poucos dias (Decreto Estadual 1.647/2018) retira o uso restrito em regiões do Vale do Araguaia e do Guaporé, que até então tinham restrições semelhantes às áreas do Pantanal. Essa é novamente uma redução na proteção de ecossistemas frágeis.


IHU On-Line – Qual é a situação ambiental das Áreas de Proteção Ambiental do Rio Cuiabá e das planícies do Guaporé e do Araguaia?
Ana Paula Valdiones – APA Cabeceiras do Rio Cuiabá foi criada em 1999 e cobre uma área de aproximadamente 462 mil hectares. Localiza-se numa região de extremamente alta prioridade para conservação por estar no divisor das bacias do Rio CuiabáArinosTeles Pires e Manso. 40% da APA Cabeceiras do Rio Cuiabá já foi desmatada; 1/3 disso ocorreu após a criação da Unidade de Conservação, ilegalmente; 90% desse desmatamento recente se concentrou majoritariamente em grandes e médios imóveis rurais cadastrados no CAR [Cadastro Ambiental Rural]. A área destinada à produção agropecuária no entorno está crescendo e significa uma pressão à manutenção da vegetação remanescente nesta UC. A Lei que permite novos desmatamentos autorizados pode afetar quase 100 mil hectares de Cerrado inseridos na APA e que, até então, estavam sob proteção legal.
Já as áreas úmidas do Guaporé e do Araguaia, assim como outros ecossistemas de interface entre ambientes terrestres e aquáticos, têm um papel importante para o provimento de água e conservação da biodiversidade. Assim, quando o decreto determina “Não se aplicam às planícies alagáveis do Guaporé e do Araguaia as restrições impostas por lei específica ao Pantanal mato-grossense e planície pantaneira do Rio Paraguai”, significa mais uma redução na proteção de ecossistemas frágeis.


IHU On-Line – Por que, na sua avaliação, o Cadastro Ambiental Rural não tem sido suficiente ou efetivo para evitar a compra de produtos oriundos de regiões em que ocorre o desmatamento ilegal?
Ana Paula Valdiones – Os acordos de cadeias para combater o desmatamentocomo a moratória da soja e os TACs [termos de ajustamento de conduta] da pecuária ainda não abrangem o bioma Cerrado, e se mantêm olhando exclusivamente para Amazônia. Recentemente, aumentou significativamente o nível de transparência que temos do CAR no estado de Mato Grosso. É necessário que outras bases de dados chaves, como a Guia de Trânsito Animal, que registra a movimentação comercial do gado entre fazendas, também sejam disponibilizadas na íntegra para possibilitar o monitoramento de toda a cadeia, por meio do cruzamento entre diferentes bases de dados.


(EcoDebate, 26/09/2018) publicado pela IHU On-line, parceira editorial da revista eletrônica EcoDebate na socialização da informação.


[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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A florada do ipê e a rede social secreta da natureza, artigo de Marcia C. M. Marques



A florada do ipê e a rede social secreta da natureza, artigo de Marcia C. M. Marques




ipê-roxo
Ipê-roxo. Foto: EBC

[EcoDebate] Em setembro, em várias regiões do Brasil, floresce o ipê, uma árvore de flores grandes e vistosas que embelezam as matas e cerrados, praças e ruas das cidades. Os galhos sem folhas contrastam com as inflorescências densas, nas quais milhares de flores se espremem para expor a beleza de seus estames e estigmas e, assim, atrair aves, abelhas, borboletas e outros insetos polinizadores que auxiliarão a produzir as sementes que serão dispersas pelo vento em alguns meses. É impossível não notar essa florada que desperta interesse e curiosidade em muita gente.
O botânico americano Alwyn Gentry foi um dos primeiros cientistas a estudar as plantas tropicais da família das bignoniáceas e suas interessantes estratégias para sinalizar aos animais a presença de néctar e pólen. Ele observou que uma florada colorida, massiva e curta atrai uma gama grande de animais que aprenderam, ao longo da evolução, que a visita a uma árvore chamativa como esta é a certeza de encontrar alimento.

Nas mais de 20 espécies de ipê que ocorrem no Brasil, as flores são amarelas, brancas, roxas e rosadas e, cada uma ao seu tempo, disputam a atenção dos polinizadores. O zum-zum dos animais é especialmente evidente nas plantas que estão nas suas áreas naturais – ou seja, nas matas dos parques e demais áreas protegidas –, mas pode ainda ser ouvido nas árvores usadas na arborização de inúmeras cidades brasileiras.

Por ser bem marcada temporalmente, é comum que a florada do ipê estimule nas pessoas um espírito observador, o mesmo que moveu o botânico Gentry a começar a associar os períodos de florada com suas próprias atividades do dia a dia. Lembrar “o que eu estava fazendo na florada do ano passado?” ou “será que a florada está acontecendo sempre na mesma época?” são indagações comuns de um bom observador da natureza e do mundo que o cerca.

Uma associação recorrente envolve a observação de que o clima tem se tornado cada vez mais quente, as chuvas seguindo ritmos imprevisíveis – de tempestades torrenciais a secas severas – e a natureza supostamente se adaptando a essas mudanças. A ciência tem mostrado milhares de evidências de alterações nos ritmos de plantas e animais devido às anomalias climáticas. E por que não pensar que, seguindo este ritmo alucinante de emissões de carbono na atmosfera e de elevações de temperaturas que a Terra está sofrendo, o próprio ipê poderá modificar sua florada, adiantando, atrasando ou mesmo dessincronizando seu relógio biológico… será, então, que no futuro teremos uma florada descompassada?

É triste pensar que o homem seja capaz de descaracterizar um ritmo que a história evolutiva das plantas moldou ao longo de milhões de anos. No entanto, essa pegada gigante que o homem moderno está deixando no planeta, especialmente nos últimos 100 anos, leva a crer que perderemos ainda muito mais das espécies e das suas relações ecológicas.

Enquanto a florada do ipê não muda de forma mais perceptível, temos a chance de observá-la e admirá-la. Somos milhões de pessoas que, ao mesmo tempo, observamos, fotografamos e publicamos as flores da estação. Os mecanismos evolutivos que levaram as plantas a florescerem massivamente foram determinados pelos polinizadores e o clima, não pelo homem. No entanto, a conexão entre indivíduos da espécie humana devido a um bem oferecido pela natureza – no caso, a beleza das flores – é algo recente e real e que nos faz refletir sobre o passado e o futuro de nossa espécie.

A natureza é – e sempre foi – capaz de criar laços estreitos entre nós, pois dependemos dela para sobreviver. Seja na produção de água para o nosso consumo, na renovação do ar atmosférico, na reciclagem do solo que utilizamos na agricultura, na polinização de espécies alimentícias ou no bem-estar promovido pela contemplação da natureza, não é possível o homem existir sem as áreas naturais. A natureza promove uma “rede social secreta” de pessoas que se sentem humanas e pertencentes a um mesmo planeta. Se dermos maior valor a essas conexões únicas, seremos capazes em pensar num futuro sustentável e possível.

* Marcia C. M. Marques é ecóloga, professora da UFPR e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/09/2018
"A florada do ipê e a rede social secreta da natureza, artigo de Marcia C. M. Marques," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/09/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/09/26/a-florada-do-ipe-e-a-rede-social-secreta-da-natureza-artigo-de-marcia-c-m-marques/.

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Pesquisadores investigam técnicas tradicionais de cultivo para viver com escassez de água





Pesquisadores investigam técnicas tradicionais de cultivo para viver com escassez de água


Incêndios florestais, falta de água e quebra de safra – esses foram os efeitos do verão de 2018 em grande parte da Europa. Os cientistas do clima pedem novas políticas agrícolas, dizendo que os agricultores precisam se preparar para maiores extremos de temperatura e clima.

Universitaet Tübingen*





Sistemas de coleta de águas pluviais com terraços para a agricultura em Vilaflor, na ilha canária de Teneriffe. Foto: Laura Dierksmeier
Sistemas de coleta de águas pluviais com terraços para a agricultura em 
Vilaflor, na ilha canária de Teneriffe. Foto: Laura Dierksmeier

Pesquisadores do Centro de Pesquisas Colaborativas de Tübingen (SFB) ResourceCultures estão investigando como sociedades agrárias no passado aprenderam a lidar com calor e aridez enquanto ainda produziam alimentos.


“A falta de água é um problema e há muitos exemplos históricos dela”, diz a Dra. Laura Dierksmeier, que está pesquisando economias insulares no início da era moderna como parte de um projeto da ResourceCultures. “Mas, como mostra a história, existem tantas soluções. Podemos encontrar abordagens viáveis para o futuro, olhando para o passado. ”A água como um recurso é um fator importante, aponta Dirksmeier. Sua disponibilidade e distribuição podem, em última instância, sustentar a estabilidade e a cooperação social.


As paisagens Dehesa do sul da Península Ibérica são um excelente exemplo: há milhares de anos, os agricultores de lá tiveram que sobreviver aos longos e secos verões. Em um projeto interdisciplinar, o porta-voz do SFB, professor Martin Bartelheim, e uma equipe de arqueólogos estão trabalhando com antropólogos culturais liderados pelo professor Roland Hardenberg, da Universidade de Frankfurt, para examinar a formação e o uso do Dehesa. Os bosques característicos de carvalhos e oliveiras foram plantados entre 2.800 e 4.000 anos atrás – e sobreviveram a todas as mudanças climáticas desde então. Os animais domesticados nativos – porcos Ibéricos, ovelhas Merino e ovelhas Retinta e caprinos – têm pastado o Dehesa desde a Idade do Bronze. Tanto os animais como a paisagem são ideais para as condições climáticas.


Soluções antigas para o problema do abastecimento de água são o foco dos arqueólogos Dr. Frerich Schön e Hanni Töpfer, liderados pelo professor Thomas Schäfer, em outro projeto que trata de mais de cem cisternas nas ilhas italianas de Linosa e Pantelleria. As cisternas continham entre cinco e 100 metros cúbicos de água. Eles foram cortados na rocha por colonos púnicos do século VIII aC e depois expandidos pelos romanos. Alguns desses poços de armazenamento de água subterrânea ainda estão em uso hoje. Tais sistemas eram essenciais para evitar o transporte de mão-de-obra intensiva, particularmente em áreas com pouca água subterrânea. As cisternas subterrâneas são relativamente fáceis de manter e mantêm a água fresca e limpa. Eles também ajudam a evitar a erosão do solo, recolhendo o excesso de água na chuva pesada.


Os pesquisadores também estão analisando os efeitos da escassez de água a longo prazo nas respectivas sociedades. A historiadora Dra. Laura Dierksmeier, liderada pelos professores Renate Dürr e Jörn Stäcker, está investigando as ramificações econômicas e sociais da escassez de água nas sociedades insulares do final da Idade Média e da Idade Moderna. As ilhas muitas vezes não têm água potável e são, portanto, particularmente vulneráveis.


Dierksmeier encontrou uma conexão clara entre renda e acesso a água limpa. Nas Ilhas Canárias e nas Ilhas Baleares, isso levou a tensões sociais, conflitos e criminalidade. Doenças eclodiram porque não havia água suficiente para higiene pessoal e para manter os hospitais limpos. Crianças e idosos foram os mais afetados. Numa tentativa de melhorar a situação, a água foi alocada a indivíduos em um sistema de cotas. Isso foi feito para garantir que esse recurso escasso chegasse às pessoas que mais precisavam. Mas teve o efeito oposto: um recurso geral lentamente se tornou uma mercadoria a ser vendida pelo maior lance. A “polícia da água” foi introduzida para determinar quem era o dono da água, para verificar a qualidade da água e punir quem a poluísse.

* Tradução e edição de Henrique Cortez, EcoDebate.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/09/2018


"Pesquisadores investigam técnicas tradicionais de cultivo para viver com escassez de água," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/09/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/09/26/pesquisadores-investigam-tecnicas-tradicionais-de-cultivo-para-viver-com-escassez-de-agua/.

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Agromineração: Plantas acumulam metais em teores altíssimos

Agromineração: Plantas acumulam metais em teores altíssimos

Agromineração: Plantas acumulam minérios de altos teores metálicos
As plantas hiperacumuladoras parecem ter uma preferência especial pelo níquel. [Imagem: Antony van der Ent et al. - 10.1021/es506031u]
Plantas hiperacumuladoras
As plantas gostam muito de alguns elementos químicos, como nitrogênio, fósforo e potássio (NPK), mas tipicamente não se dão bem com metais como o níquel ou o tálio, principalmente em altas concentrações.

No entanto, em 1976, um grupo de quatro pesquisadores da Universidade de Queensland, na Austrália, descobriu que uma pequena árvore, a Sebertia acuminata, nativa da ilha de Nova Caledônia, era uma "hiperacumuladora" de metais, contendo uma altíssima concentração de níquel em sua resina.

Desde então, 65 plantas hiperacumuladoras foram documentadas na Nova Caledônia, 130 em Cuba, 59 na Turquia e números menores no Brasil, Malásia, Indonésia, Filipinas e vários outros países.
Agora, um grupo liderado por dois dos autores da descoberta original fez um resumo desse que se tornou um florescente campo de pesquisas. Eles contaram 2.829 artigos científicos com o termo "hiperacumulador" publicados desde então, mostrando que essas plantas amantes de metais se tornaram bem mais do que uma curiosidade científica.

Destacam-se dois fortes interesses práticos: a biorremediação - a extração de metais contaminantes do solo e de rejeitos industriais - e a biomineração - o uso das plantas e bactérias para coletar minerais e elementos químicos de interesse comercial. Para o caso específico das plantas, a maioria dos pesquisadores prefere usar os termos agromineração ou fitomineração.
Agromineração: Plantas acumulam minérios de altos teores metálicos
Já existem vários testes para uso das "plantas metálicas" na recuperação de solos ou no cultivo em áreas pobres para outras culturas, mas com solos ricos em metais. [Imagem: Antony van der Ent et al. - 10.1021/es506031u]

Biomineração
Cada planta hiperacumuladora de metais tem seu próprio metal de preferência, mas o níquel vem despontando nas preferências dos pesquisadores porque as plantas parecem gostar particularmente dele.

A concentração de níquel nos biominérios extraídos das hiperacumuladoras varia entre 10% e 25% em peso (metal contido), altíssima em comparação com os minérios explorados pela mineração tradicional, que não passam de 1,5%. Se a biomassa das plantas for queimada antes da extração, o conteúdo de níquel pode chegar a 30%.

Além disso, o biominério está livre de silicatos de ferro e manganês, que aumentam o custo de extração do metal.

Uma planta em particular, a Pycnandra acuminata, produz um látex de cor azul-esverdeada que apresenta uma concentração de até 25% de níquel. Isso potencialmente dá a esse látex um valor bem mais elevado do que o látex extraído para a produção de borracha, por exemplo.

Antony van der Ent e seus colegas acreditam que essa árvore de grande porte possa ser usada também para limpar solos contaminados ou permitir que terras pobres em nutrientes voltem a ser férteis.
Agromineração: Plantas acumulam minérios de altos teores metálicos
Microscopia de fluorescência de raios X das cápsulas de sementes da planta hiperacumuladora de níquel Alyssummurale. A cor vermelha mostra sua estrutura, a cor verde mostra cálcio e o azul mostra o níquel. [Imagem: Antony van der Ent]

Agromineração
Outros pesquisadores envolvidos com a agromineração também já identificaram plantas afeitas a outros metais, incluindo o cobalto, com algumas aplicações práticas já em estudos.

"Existem aplicações de fitoextração para uma variedade de outros elementos para os quais plantas hiperacumuladoras são conhecidas, incluindo selênio, tálio e manganês, ou para remediação de solos poluídos por arsênico-cádmio ou selênio," escrevem Tanguy Jaffré e seus colegas - Jaffré também participou da descoberta original das hiperacumuladoras, nos anos 1970.

Uma abordagem particularmente promissora para a agromineração, segundo a equipe, consistirá em selecionar as plantas mais adequadas para o clima de regiões onde já é feita a mineração tradicional de determinados metais.

As plantas seriam então cultivadas nos rejeitos da mineração - em lugar de deixá-los acumulados ou depositados em barragens - ou nas áreas no entorno das minas, onde a concentração de metal no minério não é alta o suficiente para justificar sua extração pelos métodos convencionais.


Bibliografia:

The discovery of nickel hyperaccumulation in the New Caledonian tree Pycnandra acuminata 40 years on: an introduction to a Virtual Issue
Tanguy Jaffré, Roger D. Reeves, Alan J. M. Baker, Henk Schat, Antony van der Ent
New Phytologist
Vol.: 218: 432-434
DOI: 10.1111/nph.15105

Agromining: Farming for Metals in the Future?
Antony van der Ent, Alan J. M. Baker, Roger D. Reeves, Rufus L. Chaney, Christopher W. N. Anderson, John A. Meech, Peter D. Erskine, Marie-Odile Simonnot, James Vaughan, Jean Louis Morel, Guillaume Echevarria, Bruno Fogliani, Qiu Rongliang, David R. Mulligan
Environmental Science & Technology
Vol.: 49(8):4773-4780
DOI: 10.1021/es506031u

Sebertia acuminata: A Hyperaccumulator of Nickel from New Caledonia
Tanguy Jaffré, R. R. Brooks, J. Lee, Roger D. Reeves
Science
Vol.: 193, Issue 4253, pp. 579-580
DOI: 10.1126/science.193.4253.579

O tocante momento em que elefantes lamentam morte de líder da manada Animal morto no Sri Lanka após briga com rival foi velado pelo bando.


Por BBC

26/09/2018 10h11  Atualizado há 47 minutos

Elefantes se despedem do líder da manada — Foto: BBC

Elefantes se despedem do líder da manada — Foto: BBC


Cenas extraordinárias de elefantes selvagens velando um elefante morto viralizaram no Sri Lanka. Assista ao vídeo.

Esses animais são conhecidos por manterem fortes vínculos entre familiares e "amigos" no bando.
No vídeo, é possível ver que alguns usam suas trombas para acariciar o elefante.

Apesar desse “carinho”, os animais também são conhecidos por travarem duras batalhas entre si. Elefantes machos brigam por causa de comida e acasalamento.

Autoridades do país dizem que o elefante foi morto após uma luta que durou dias.
Guardas florestais espantaram os elefantes que estavam "velando" o corpo para que pudessem enterrá-lo em uma reserva no Sri Lanka chamada Kalawewa.

 Elefantes se despedem do líder da manada — Foto: BBC

Por ano, 33 mil toneladas de alimentos das feiras livres de São Paulo vão para o lixo

Por ano, 33 mil toneladas de alimentos das feiras livres de São Paulo vão para o lixo


Pesquisa dimensiona desperdício e propõe, entre outras, uma finalidade social para esses alimentos: creches, asilos e escolas públicas

Por Ivanir Ferreira, Jornal da USP

https://www.ecodebate.com.br/2018/09/26/por-ano-33-mil-toneladas-de-alimentos-das-feiras-livres-de-sao-paulo-vao-para-o-lixo/ 

 
Os dados sobre desperdício de alimentos no mundo são alarmantes. Cerca de 1,3 bilhão de toneladas são jogadas fora por ano. O Brasil tem uma grande participação nesta conta porque está entre os dez países que mais desperdiçam alimentos. Em média, descartamos 50% do que produzimos. Nas feiras livres, é possível se ter uma ideia deste problema. Depois da chamada xepa, milhares de toneladas de frutas, legumes e verduras que poderiam ir para o prato do brasileiro, vão para o lixo. Em São Paulo, este número chega a 33 mil toneladas por ano.  É preciso desenvolver metodologias para mensurar as perdas e o desperdício de alimentos, visando a sensibilizar a sociedade para a problemática.
Uma pesquisa da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP nos traz informações sobre o montante deste desperdício e o quanto perdemos em nutrientes, em água, em energia e em área agricultável. E melhor, o estudo indica que grande parte destes alimentos poderia ser resgatada e ter, entre outras, uma finalidade social: suprir necessidades de asilos, creches e escolas públicas.

 https://youtu.be/WhTOXvofhsI

Do total de desperdício de frutas, verduras e legumes que acontece nas feiras livres de São Paulo, as maiores perdas estão relacionadas às folhas. Além dos alimentos, também há perdas de recursos naturais. A pesquisa de Sylmara Lopes, da EACH, avalia o impacto ambiental e apresenta informações sobre o quanto se perde em nutrientes, água, energia e área agricultável. Confira no segundo vídeo:


Das 33 mil toneladas de alimentos descartadas anualmente nas feiras livres de São Paulo, uma grande parcela, que tem ótima qualidade, poderia ser reaproveitada e ter uma finalidade social como o suprimento de alimentos em instituições que atendem pessoas em vulnerabilidade. Além do consumo humano, pesquisa da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP propõe outras rotas de reaproveitamento: ração animal, geração de energia e compostagem. Veja neste terceiro vídeo:



Do Jornal da USP, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/09/2018


"Por ano, 33 mil toneladas de alimentos das feiras livres de São Paulo vão para o lixo," in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/09/2018, https://www.ecodebate.com.br/2018/09/26/por-ano-33-mil-toneladas-de-alimentos-das-feiras-livres-de-sao-paulo-vao-para-o-lixo/.


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Florestas sob medida


Florestas sob medida

Projetos colocados em prática em São Paulo mostram que é possível dotar de cobertura florestal até mesmo espaços de 15 metros quadrados – uma ótima opção para metrópoles em que o cimento e o asfalto predominam 




Projeto de Cardim para Floresta de Bolso às margens do rio Pinheiros, em São Paulo (Foto: Divulgação)
A ideia é simples, mas inusitada: criar pequenos bolsões de Mata Atlântica em áreas desocupadas ou degradadas da metrópole. Em pouco tempo, locais abandonados são tomados por ipês, jacarandás, perobas, jatobás, pitangueiras e outras espécies nativas. Insetos e aves são atraídos pela vegetação, pelos frutos e flores, e todo o ecossistema original de uma pequena floresta é resgatado.
A Floresta de Bolso é uma técnica natural de restauração da Mata Atlântica criada e desenvolvida pelo botânico e paisagista Ricardo Cardim. O espaçamento e a composição buscam respeitar a dinâmica original das florestas nativas, o que propicia crescimento mais rápido, menor índice de perdas, baixo consumo de água e manutenção mais simples. Essa mata pode ser implantada em espaços a partir de 15m2 ou em grandes áreas em projetos de restauração florestal.
Segundo Cardim, a Floresta de Bolso, devido à grande diversidade e densidade vegetal, contribui para melhorar a qualidade de vida e saúde da população ao baixar a temperatura, aumentar a umidade do ar, reter água das chuvas, filtrar gases tóxicos e abrandar a poluição sonora, entre outros benefícios.

São Paulo é um bom exemplo de como a floresta nativa original foi devastada. O município ainda tem reservas de Mata Atlântica nos extremos norte e sul (serras da Cantareira e do Mar), mas quase nada no seu miolo, dominado por concreto e asfalto. Originariamente, apenas os parques Trianon e Volpi tinham Mata Atlântica. Daí a ideia de se fazerem minibolsões semelhantes e recuperar parte da floresta perdida.

Fascinado por árvores desde criança, Cardim viu que nas praças e parques de São Paulo predominavam espécies exóticas. Seu interesse foi aumentando a ponto de, em 1992, começar a estudar a fundo as capoeiras (florestas em crescimento em áreas desmatadas), avaliando quantidade de árvores por metro quadrado, quais espécies ocorriam ao lado de quais, taxa de crescimento e outras variáveis importantes.

Replicação

A partir das observações, o botânico concluiu que, devido à competição por espaço, luz e água, as árvores da mata tropical crescem muito rapidamente, cerca de seis metros em dois anos, e quase sem manutenção. E percebeu que isso poderia ser replicado em várias escalas, desde que se seguissem algumas regras de plantio e manejo.

Mata na escola Castanheiras: laboratório de ensino sobre a biodiversidade brasileira (Foto: Divulgação)
Após 15 anos de estudos e pesquisas, ele pôs suas ideias em prática e surgiu a Cardim Arquitetura Paisagística, que começou fazendo telhados verdes e, com o tempo, passou a criar Florestas de Bolso, inclusive no quintal da sede. A partir de 2013 a ideia foi vendida a grandes empresas, como o Citibank e a Basf.

Outras conquistas foram oito Florestas de Bolso em espaços públicos. A primeira foi desenvolvida no bairro da Vila Olímpia, na capital paulista, com o plantio de 83 mudas de 40 espécies diferentes em um canteiro público degradado. Depois vieram os parques Ibirapuera, Cândido Portinari e Villa-Lobos. Em maio e dezembro de 2017, duas áreas verdes usadas como depósito de lixo atrás da igreja de Pinheiros se transformaram em Mata Atlântica e numa nova praça com 60 mudas de araucárias (o pinheiro nativo brasileiro), em homenagem ao nome do bairro.

“As empresas, as ONGs e o governo já entenderam a importância do nosso trabalho e hoje contamos com grande incentivo, inclusive da população de São Paulo, que nos apoia trabalhando em mutirão e comprando mudas, oriundas de viveiros especializados”, afirma Cardim. Ele ressalta a importância de um projeto na escola Castanheiras, em Alphaville (bairro de Barueri, na Grande São Paulo), que recebeu uma Floresta de Bolso com 100 árvores de 60 espécies e um pomar indígena com 20 espécies frutíferas nativas raras.

A ideia é tornar essa iniciativa um laboratório de ensino sobre a biodiversidade brasileira e sua importância. “Com essas ações, queremos aumentar o número de Florestas de Bolso e resgatar a Mata Atlântica no cotidiano da população, mostrando que todos podem conviver em harmonia com a natureza ancestral e ganhar com isso”, diz Cardim.

Plantador missionário

O Parque Linear Tiquatira, na zona leste paulistana, é um corredor verde com 4km de extensão, formado por mais de 23 mil árvores de 150 espécies, na maior parte de Mata Atlântica. Desse total, a maioria foi plantada por um único homem ao longo de 15 anos: o empresário Hélio Silva.

Parque Tiquatira: mais de 23 mil árvores e público superior a 2 mil pessoas nos fins de semana (Foto: Divulgação)
Nascido no interior paulista, Silva, hoje com 67 anos, veio para São Paulo em 1958, época em que as áreas verdes ainda eram comuns na cidade. Numa manhã de 2003, ao caminhar pela Avenida Governador Carvalho Pinto, ao longo do córrego Tiquatira, ele viu o local tão abandonado e degradado que decidiu torná-lo uma área verde.

Não foi fácil. De cada dez mudas que plantava, oito eram arrancadas por vândalos e comerciantes, temerosos de que as árvores ocultassem seus estabelecimentos. Mas Silva persistiu e, aos poucos, o verde tomou conta da paisagem e ganhou a simpatia dos moradores.

Em 2008, quando o local já contava com 5 mil árvores, o poder público criou ali o parque Tiquatira, o primeiro da capital com o título de linear, ao longo de cursos d’água. Silva hoje é membro do Conselho Gestor de Arborização da Cidade de São Paulo, ligado à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente. Dá palestras sobre seu projeto em escolas e faculdades e prepara um livro sobre o tema.

Silva sempre pretendeu arborizar o local com espécies da Mata Atlântica. O parque conta com 90% de árvores nativas e outras plantadas para atrair pássaros, como a calabura, originária das Américas e com fruto muito doce. Uma de cada 12 árvores plantadas é de frutíferas silvestres, como pitangas, araçás, jatobás e acerolas. O mesmo procedimento foi adotado no Piscinão do Metrô Penha, também na zona leste, onde 3.200 árvores tornaram o terreno uma área agradável e frequentada pela população local.

“Hoje, as pessoas se maravilham com essas iniciativas e se oferecem para ajudar”, afirma Silva. “O Parque Tiquatira recebe mais de 2 mil visitantes por fim de semana. Há três anos conto com o auxílio de duas pessoas apaixonadas pelo tema. As crianças ficam motivadas; sempre as convido a plantar comigo e dou o nome de cada uma delas à muda que plantou. Elas se comprometem a cuidar e adotam a árvore para sempre, o que me dá muita alegria.”

Ele pretende plantar 50 mil árvores até seu último dia de vida. “Já estamos procurando novas áreas e ruas para arborização, com o auxílio das autoridades responsáveis”, ressalta. “Nossa prioridade sempre será a de recuperar áreas degradadas, trazendo o verde de volta para a população. A natureza é generosa e nos agracia com coisas belas que passam despercebidas no dia a dia”.

As cidades mais arborizadas do mundo


Parque em Singapura: cidade líder em arborização (Foto: Divulgação)
Uma árvore por habitante é a recomendação mínima da Organização Mundial da Saúde (OMS) para as cidades. A quantidade mínima indicada é de 12m2 de área verde por habitante, e a ideal é de 36m2, cerca de três árvores por morador. Em Estocolmo, capital da Suécia, são 86m2 de área verde por habitante. Já Nova York plantou 1 milhão de árvores em oito anos. Com mais de 8 milhões de habitantes, a cidade americana cumpriu a meta dois anos antes do previsto pelo projeto MillionTreeNYC, lançado pelo ex-prefeito Michael Bloomberg.

Goiânia é a cidade mais arborizada do Brasil, segundo um censo de 2010 do IBGE, com 89,5% de arborização. A capital goiana é repleta de árvores como ipês, flamboyants, palmeiras-imperiais e mongubas, espécie típica do Cerrado. Goiânia conta com o projeto voluntário Plante a Vida, que já plantou mais de 1 milhão de mudas de espécies nativas da região. Atrás de Goiânia no quesito arborização vêm Campinas, Belo Horizonte, Porto Alegre e Curitiba.

Um estudo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), divulgado este ano, apresentou um novo algoritmo que processa imagens do Google Street View. Intitulado Treepedia, o estudo gera mapas de vegetação que, combinados com outros dados, geram o Green View Index (GVI). Segundo o índice, a líder em arborização no mundo é Singapura, com GVI 29,3%. Confira na tabela quem ocupa as dez primeiras colocações.