terça-feira, 6 de outubro de 2020

Amazónia à beira da destruição "irreversível"

 

Amazónia à beira da destruição "irreversível"

Voltou a época das queimadas na Amazónia, depois de um ano de devastação recorde
Voltou a época das queimadas na Amazónia, depois de um ano de devastação recorde   -   Direitos de autor  Edmar Barros/AP
Tamanho do texto Aa Aa

A desflorestação e desmatamento a Amazónia terão atingido o valor máximo dos últimos 14 anos.

São dados oficiais, mas ainda preliminares que assinalam um ano devastador para o pulmão do mundo: mais 34 por cento de área ardida do que no ano anterior. A tradicional épocadas queimadas voltou e os especialistas dizem que estamos muito perto do ponto de não retorno.

Uma nuvem de fumo envolve a cidade de Novo Progresso
Euronews/APUma nuvem de fumo envolve a cidade de Novo Progresso

Carlos Nobre, investigador do INPA, o instituto governamental brasileiro que monitoriza a situação na Amazónia, não tem dúvidas que estamos à beita do ponto de não retorno. " Quando toda esta área começar a tornar-se numa savana, é irreversível. É um processo irreversível que demora 30 a 50 anos. Depois disso, 60% a 70% da floresta amazónica estará convertida numa savana," avisa.

Há uma nuvem de fumo que resiste à passagem dos dias nesta região do Pará. Terá sido aqui, em Novo Progresso, que começou o movimento que há um ano organizou o "Dia do Fogo". Mas há aqui quem viva para proteger a floresta. Nubia Machado, é professora e pede que "se um crime ambiental foi cometido por A, B ou C, essas pessoas não devem ser tomadas como o estereótipo dos habitantes de Novo Progesso".

Euronews/AP
Começou esta semana uma nova época de queimadasEuronews/AP

Joaquim da Silva, agricultor paranense, garante que ele e "todos os vizinhos querem tomar conta da terra de forma legal".

Nas contas oficiais, a Amazónia brasileira perdeu no último ano 9 mil 205 quilómetros quadrados de floresta - uma área equivalente ao território de Chipre. A maioria em queimadas iniciadas em Agosto e Setembro do ano passado.

Plano para proteção da Amazónia pode prejudicar a floresta


Plano para proteção da Amazónia pode prejudicar a floresta

Amazónia
Amazónia   -   Direitos de autor  AP Photo
Tamanho do texto Aa Aa

Em maio, depois de uma série de incêndios florestais na Amazónia, o presidente brasileiro colocou o exército na frente da proteção da floresta tropical.

Mas segundo uma investigação da Associated Press, a decisão teve o efeito contrário.

A agência de notícias diz que sob o controlo dos militares as acusações relacionadas com a devastação da floresta estão praticamente paradas e que o exército parece concentrar-se em dezenas de pequenos projetos de construção de estradas e pontes, alimentando ainda mais a exploração da Amazónia.

A Associeted Press descobriu que o número de multas emitidas por crimes ambientais foi reduzido para quase metade desde há quatro anos, especialmente com a presidência de Jair Bolsonaro. A agência cita ainda dois funcionários do Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis que, sob anonimato, revelaram que deixaram de utilizar mapas de satélite para localizar locais de risco e multar os proprietários.

Mas os agricultores também têm queixas e pedem mais respeito pelos produtores rurais.

Perigos para a Saúde Pública

Os especialistas lembram que a Amazónia perdeu cerca de 17% da área original e, ao ritmo atual, espera-se que atinja um ponto de viragem nos próximos 15 a 30 anos.

Ao decompor-se, irá libertar centenas de biliões de toneladas de dióxido de carbono para a atmosfera.

Segundo um estudo da Human Rights Watch, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazónia, e do Instituto de Estudos de Política de Saúde, os incêndios que resultam da desflorestação descontrolada estão a envenenar o ar que milhões de pessoas respiram.

O estudo revelou que mais de 2 mil pessoas foram ao hospital por causa de doenças respiratórias relacionadas com os incêndios do ano passado.

Para a Human Rights Watch Brasil, trata-se de um problema "crónico" de saúde pública que poderia ter sido evitado.

Crise de extinção: líderes mundiais dizem que é hora de agir

 

Crise de extinção: líderes mundiais dizem que é hora de agir

De acordo com a ONU, 75% da superfície terrestre da Terra foi significativamente alterada pela ação humana. Fonte: GETTY IMAGES.

Enquanto cerca de 150 líderes globais se alinhavam – virtualmente – para falar da cúpula da biodiversidade na quarta-feira, as apostas não poderiam ser maiores.

“A casa está pegando fogo e todos nós estamos trancados, por causa de uma doença que veio da nossa má gestão da natureza”.

Leia também:

Foi assim que Inger Anderson, chefe do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, destacou a questão em um briefing um dia antes do evento.

“Acho que há uma percepção de que se não cuidarmos da natureza, podemos acabar em apuros”, acrescentou ela.

Muitos primatas, incluindo o macaco dourado, ameaçado de extinção, estão em declínio devido à perda de habitat. Fonte: JOEL SARTORE, NATIONAL GEOGRAPHIC PHOTO ARK.

Com o mundo lutando com a saúde pública, a devastação social e econômica da pandemia Covid-19, os líderes estão sob pressão crescente para cumprir suas promessas de reverter o declínio no mundo natural.

Por que essa cúpula é importante?

Esta cúpula é principalmente um fórum de alto nível para líderes mundiais. Seu objetivo é “destacar a crise que a humanidade enfrenta com a degradação da biodiversidade, e a necessidade urgente de acelerar a ação sobre a biodiversidade para o desenvolvimento sustentável”.

Mas o ponto em que compromissos genuínos serão feitos – para tomar medidas para proteger a natureza – será na conferência sobre biodiversidade em 2021. Essa conferência, adiada por causa da pandemia, é onde todos os países membros devem adotar uma nova “estrutura de biodiversidade “- essencialmente um contrato global para colocar a natureza no caminho da recuperação até 2030.

Mas um relatório da ONU publicado apenas duas semanas atrás revelou que nenhuma das 20 metas de biodiversidade que os países assinaram em 2011 seria totalmente cumprida.

Os insetos contribuem com centenas de milhões de libras para a economia global, polinizando as plantações de alimentos. Fonte: VICTORIA GILL.

Essas metas eram ambiciosas, englobando todos os aspectos de como nossas vidas humanas se cruzam com o mundo natural.

Variam desde a redução da taxa de perda de habitats naturais como florestas e proteção das paisagens mais preciosas para a vida selvagem, até mudanças mais fundamentalmente econômicas, como a eliminação de subsídios para “atividades que são prejudiciais”, incluindo práticas intensivas e poluentes de agricultura e pesca.

Covid-19 não é a primeira pandemia causada por uma doença zoonótica – uma doença que “transbordou” dos animais. Fonte: GETTY IMAGES.

Xi Jinping, presidente da China, país anfitrião da conferência de 2021, usou seu discurso pré-gravado para enfatizar o compromisso de seu país de virar o jogo para a biodiversidade.

“Precisamos encontrar uma maneira da humanidade viver em harmonia com a natureza”, disse ele.

O Sr. Xi também enfatizou a necessidade de recuperação econômica, dizendo que o desenvolvimento verde “aumentaria o potencial de alta qualidade da recuperação econômica pela Covid-19”.

“Precisamos reconhecer que nossas soluções estão na natureza – para alcançar um ´ganha-ganha`”.

O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, usou um discurso pré-gravado para destacar a situação do pangolim, criticamente ameaçado de extinção:

“Eu não acredito que qualquer um de nós escolheria deixar um planeta no qual uma criaturinha tão maravilhosamente bizarra seja tão desconhecida para as gerações futuras quanto os dinossauros e dodôs são para nós hoje”.

“No entanto, é isso que nos espera se continuarmos neste caminho. E isso não é apenas uma má notícia para os pangolins – é uma má notícia para todos nós”.

O pangolim é um dos mamíferos mais ameaçados da Terra e também era uma suspeita “espécie de elo perdido” na pandemia de coronavírus. Fonte: GETTY IMAGES.

Mas, na esteira do recente anúncio do governo do Reino Unido de que protegeria mais terras para a natureza, o histórico do país na perda de biodiversidade está sendo examinado.

A professora Kate Jones, da University College London (UCL), que estuda a interação entre a natureza e a saúde humana, descreveu os “declínios históricos massivos” da biodiversidade no Reino Unido como “terríveis”.

O que é diferente desta vez?

Inger Anderson insistiu que os “trilhões de dólares investidos em pacotes de estímulo” por causa da pandemia, proporcionaram uma oportunidade ideal para investir no crescimento sustentável. “Certamente não queremos voltar aos nossos caminhos prejudiciais”, disse ela.

Elizabeth Maruma Mrema, secretária executiva da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, um tratado multilateral que visa conservar as espécies, acrescentou: “Empresas, bancos, a juventude – todos estão prontos para agir. Esta é nossa última chance e todos têm um papel a desempenhar”.

Ao destruir o mundo natural, explicou a professora Jones, “atualmente estamos degradando nosso patrimônio. Portanto, nossos sistemas financeiros precisam mudar”.

Ela acrescentou: “Com a mudança climática, nossa casa está em um penhasco e vai cair em breve. A perda de biodiversidade e as mudanças no uso da terra significam que ela também está pegando fogo – nossa trajetória atual não é sustentável, então temos que fazer algo.

“Há mais conversa e ação agora do que antes, e estou mais esperançosa agora do que nunca, mas as expectativas ainda são baixas”.

Fonte: BBC News / Victoria Gill
Tradução: Redação Ambientebrasil / Maria Beatriz Ayello Leite
Para ler a reportagem original em inglês acesse:
https://www.bbc.com/news/science-environment-54357479

A legislação ambiental brasileira cada vez mais frágil

 

A legislação ambiental brasileira cada vez mais frágil

A fragilidade da legislação ambiental brasileira

Esvaziamento de colegiados participativos resulta em decisões sem amparo técnico-científico, levando à judicialização das políticas ambientais

Oceana Brasil

Os desdobramentos das decisões da 135ª Reunião Ordinária da Plenária do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), realizada no dia 28 de setembro de 2020 após convocação de última hora, levaram à judicialização das decisões que suspendiam as resoluções 302 e 303/2002. Essas normas protegem manguezais e restingas, ecossistemas costeiros de enorme importância socioambiental.

As medidas foram aprovadas por um Conselho esvaziado, à luz de sua história de quatro décadas pautada pelo debate com ampla participação da sociedade civil, das três esferas de governo e do setor produtivo. A deliberação na Plenária, em geral, é precedida por discussões nas Câmaras Técnicas, formadas por conhecedores da matéria em pauta, o que não ocorreu nas deliberações que culminaram com a suspenção das duas resoluções, além da aprovação de medida que versa sobre o licenciamento da incineração de resíduos em fornos industriais.

Em 2019, a composição do Conselho foi reduzida de 96 para 23 membros, em que permaneceram somente quatro representantes da sociedade civil e dois do setor produtivo. Criado pela Lei nº 6.938/ 1981, o Conama escapou de ser enquadrado no Decreto nº 9.759/2019, que extinguiu colegiados formados no âmbito no governo federal. Entre eles, o ato presidencial suspendeu os Comitês Permanentes de Gestão da Pesca (CPGs), que eram os únicos espaços consultivos dos quais participam representantes do governo, do setor pesqueiro e da sociedade civil para discutir medidas de ordenamento da atividade pesqueira.

A extinção e o esvaziamento desses fóruns fragilizam o respaldo científico na tomada de decisão pelos gestores da área ambiental, além de minar a transparência na elaboração das políticas públicas, uma vez que os procedimentos são escusos. Em nossa experiência acompanhando os CPGs, pudemos observar que, ao dar voz aos envolvidos na execução das políticas ambientais propostas – como o setor produtivo – as chances de uma resposta bem sucedida são maiores.

A Resolução Conama nº 302/2002 estabelece para as Áreas de Preservação Permanente (APP) de reservatório artificial – definidas como acumulação não natural de água destinada a quaisquer de seus múltiplos usos – parâmetros, definições e limites de 30 metros em áreas urbanas e de 100 metros em áreas rurais. Dispõe também sobre os critérios para aumentar ou diminuir a área de APP desses reservatórios, dependendo do seu uso.

Com a revogação dessa resolução, permanece em vigor somente o disposto no Código Florestal, que não contempla o estabelecimento de “Área de Preservação Permanente no entorno de reservatórios artificiais de água que não decorram de barramento ou represamento de cursos d’água naturais.” Os limites de proteção ficam assim restritos somente para reservatórios de água com fins de abastecimento público ou de geração de energia. Os demais reservatórios passam a ser analisados no processo de licenciamento ambiental dos empreendimentos, o que efetivamente reduz a proteção das áreas de APP de reservatórios artificiais.

A Resolução Conama 303/2002 estabelece limites referentes às Áreas de Preservação Permanente em geral, incluindo as faixas de restinga e manguezais do litoral brasileiro. Se essa resolução for de fato revogada, os manguezais continuarão protegidos em toda a sua extensão pelo Código Florestal. No entanto, as áreas de restinga perderão a faixa de proteção de 300 metros estabelecida na Resolução 303, cujo novo limite, passará a ser regido pelo Código Florestal e será estabelecido pelo órgão ambiental licenciador.

Além disso, com a revogação da Resolução 303 diversas áreas de APP não presentes no Código Florestal deixarão de existir, a saber: dunas, locais de refúgio ou de reprodução de aves migratórias, locais de refúgio ou de reprodução de exemplares da fauna ameaçados de extinção que constem de lista elaborada pelo Poder Público Federal, Estadual ou Municipal e nas praias, em locais de nidificação e de reprodução da fauna silvestre, como áreas de desova de tartarugas.

As resoluções 302 e 303/2002 do Conama são referências basilares para os processos de licenciamento ambiental de empreendimentos como resorts ou carcinicultura em regiões litorâneas. A sua possível revogação eliminará a faixa mínima de 300 metros, em que não pode haver construções, fragilizando a proteção dos mangues e restingas e de todos os outros ecossistemas não incluídos no Código Florestal, o que tornará ainda mais vulneráveis as comunidades pesqueiras da região Norte e Nordeste, já severamente impactadas pelo derramamento de óleo em 2019 e pela pandemia da Covid-19.

Alertamos para outra medida aprovada sem embasamento técnico ou consulta pública na 135ª Plenária do Conama. Trata-se do licenciamento da queima de resíduos em fornos industriais para serem transformados em cimento. A incineração não deve ser tratada como solução para a redução do volume de resíduos, sobretudo dos resíduos plásticos que compõe cerca de 16% dos resíduos sólidos. A solução para a redução da geração de resíduos deve estar focada no início de sua cadeia produtiva, como na redução da produção de plásticos descartáveis.

A função da legislação ambiental é proteger o meio ambiente, respeitando a Constituição Federal e a Política Nacional do Meio Ambiente. O Brasil precisa avançar em suas políticas públicas tendo como princípios o desenvolvimento sustentável, a ciência, a transparência e a participação social.

Nota da Oceana Brasil

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/10/2020

 

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate com link e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

Mudanças Climáticas: evidências e impactos atuais

 

Mudanças Climáticas: evidências e impactos atuais
projeções do aquecimento global

O negacionismo militante abusa da anticiência, em uma bem-sucedida campanha de desinformação, ignorando qualquer estudo ou pesquisa contrária, com o objetivo ideológico de negar as mudanças climáticas e o aquecimento global antropogênico

Em geral, insistem em desrespeitar e desqualificar autores e comentaristas. Frequentemente ocultos pelo anonimato, abusam da lógica perversa de que é mais fácil desqualificar o outro do que qualificar a si mesmo.

Além disto, insistem na desinformação e na confusão de conceitos.

A desinformação deliberada apenas contribui para alimentar a confusão de conceitos e temas relacionados ao aquecimento global / mudanças climáticas. E desinformação, em qualquer tema, é algo inaceitável.

Em razão disso, preparamos uma amostra de estudos e pesquisas, de Universidades e Institutos internacionais, relacionados às mudanças climáticas, suas evidências, bem como impactos atuais e futuros.

Veja, abaixo, uma amostra das matérias exclusivas que publicamos, nos últimos meses, tratando de mudanças climáticas / aquecimento global, nas quais citamos e destacamos as pesquisas publicadas que deram origem às matérias.

Boa leitura,

Mudança Climática Aumenta O Risco De Incêndios Florestais

Aumento Das Ondas De Calor Marinhas É Resultado Da Influência Humana

Mudanças Climáticas: O Ártico Está Em Transição Para Um Novo Estado Climático

Aquecimento: Verões Cada Vez Mais Quentes Tornam O Ártico Mais Verde

Degelo Da Groenlândia E Da Antártica Pode Adicionar 38 Cm Ao Aumento Do Nível Do Mar Em 2100

As Consequências Da Crise Climática Já Chegaram

Pesquisa Global Mostra Crescimento Dramático Dos Lagos Glaciais

Aumento Do Degelo, Na Groenlândia E Na Antártica, Combina Com Os Piores Cenários De Aquecimento Climático

Calor Extremo, Incêndios E Tempestades Indicam Que Futuro Assustador Já Chegou

O Aquecimento Global Aumenta O Risco De Furacões Extremos No Caribe

O Gelo Marinho Do Ártico Está Derretendo Mais Rapidamente Do Que Se Imaginava

Mudanças Climáticas E O Uso Da Terra Estão Acelerando A Erosão Do Solo

Mudanças Climáticas – Os Trópicos Estão Se Expandindo Em Direção Aos Polos

Mais Da Metade Dos Oceanos Do Mundo Já São Afetados Pelas Mudanças Climáticas

Redução Da Camada De Gelo Da Groenlândia Passa Do Ponto Sem Volta

Novo Estudo Apoia As Previsões De Que O Ártico Poderá Ficar Livre Do Gelo Marinho Em 2035

As Mudanças Climáticas Estão Impulsionando Quantidades Crescentes De Água Doce No Oceano Ártico

Emergência Climática: Sibéria – Calor, Fogo E Derretimento Do Gelo

Eventos Climáticos Extremos E As Mudanças Climáticas – Entenda

Eventos Climáticos Extremos – Calor Prolongado Na Sibéria Seria ‘Quase Impossível Sem Mudanças Climáticas’

Mudanças Climáticas Estão Afetando A Disponibilidade De Água E Estão Exacerbando Os Danos Causados Pelas Inundações E Secas Em Todo O Mundo

Emergência Climática – Modelos Climáticos Mais Recentes Mostram Secas Mais Intensas No Futuro

Nível Do Mar Pode Subir Mais De 1 Metro Até 2100 Se As Metas De Emissão Não Forem Cumpridas, Revela Pesquisa Internacional

Se Emissões De Carbono Não Caírem, 1/3 Da Humanidade Poderá Viver Em Áreas De Calor Insuportável Em 50 Anos

Mudanças Climáticas Podem Causar Perdas Potencialmente Catastróficas De Biodiversidade Em Todo O Mundo

Mudanças Climáticas Podem Interferir Na Circulação Oceânica Do Atlântico

Eventos Climáticos Extremos – Como As Mudanças Climáticas Podem Impactar Tempestades Nos Oceanos Tropicais

Relatório Afirma Que Mudança Climática Provoca Aumento De Mortes, Doenças E Fome No Planeta

Relatório De Várias Agências Destaca Sinais E Impactos Crescentes Das Mudanças Climáticas Na Atmosfera, Terra E Oceanos

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/10/2020

 

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate com link e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

 ECODEBATE

Comportamento do Consumidor Sustentável

Artigo de José Austerliano Rodrigues

[EcoDebate] Comportamento do consumidor tornou-se uma das áreas mais estudadas no campo de marketing e, diante da crescente emissão de gás carbônico, consumo da água e outros problemas ecológicos, a produção e o consumo global estão se tornando, também, áreas cada vez mais urgentes de serem estudadas. Sabe-se que as inovações tecnológicas são exigidas para reduzir estes problemas ecológicos, mas a importância e papel do consumo estão recebendo muita atenção nos anos mais recentes (SMART, 2010; SPAARGAREN; OOSTERVEER, 2010; VAN TRIJP; FISCHER, 2011).

Solomon (2013), o comportamento do consumidor é o estudo sobre como indivíduos, grupos e organizações selecionam, compram, usam e descartam bens, serviços, ideias ou experiências para satisfazer suas necessidades e desejos.

O comportamento do consumidor é extremamente complexo e, com o desenvolvimento do marketing tradicional, o consumo tornou-se mais insustentável ao longo dos anos. Tukker e Jansen (2006), o consumo de alimentos, habitação e transporte privado, é responsável por mais de 70% dos impactos ambientais. Além disso, essas três áreas respondem por mais da metade das despesas de consumo.

Contudo, os bens duráveis são adquiridos com mais frequência hoje em dia, o que aumenta o uso de matérias-primas, impactos ambientais e resíduos (BELZ; PEATTIE, 2009; REUTLINGER, 2012). Assim sendo, é necessário um consumo mais sustentável, devido ao crescente esgotamento dos recursos naturiais e outros problemas ecológicos.

Todavia, o objetivo do marketing do sustentável é promover um comportamento do consumidor sustentável e oferecer produtos adequados, com o objetivo de uma sustentabilidade econômica, ecológica e social.

O consumo mais sustentável exige uma mudança no comportamento do consumidor, também nas atividades das empresas (CHARTER et al., 2002; REUTLINGER, 2012). Embora exista um grande interesse pela sustentabilidade hoje em dia, como na década de 1990, quando os consumidores estavam cada vez mais preocupados com o meio ambiente, há uma discrepância entre expressar preocupação com a sustentabilidade e traduzir essas preocupações em ações sustentáveis (BELZ; PEATTIE, 2009; EMERY, 2012).

A complexidade das necessidades dos consumidores é frequentemente explicada pela Teoria de Abraham Maslow de que as pessoas precisam satisfazer a necessidade, da mais urgente para menos urgente (MASLOW, 1987; KOTLER; KELLER, 2018).

A seguir, serão apresentadas uma descrição sucinta de cada uma das necessidades de Maslow:

  • Necessidades Fisiológicas: comida, são as necessidades de sobrevivência. Aqui as pessoas já reconheceram a necessidade de alternativas mais sustentáveis, como alimentos orgânicos.

  • Necessidades de segurança: habitação faz parte de segurança (construção civil), conforme mencionado acima, isso responde pela grande parte dos impactos ambientais. Soluções mais sustentáveis tornaram-se mais aceitáveis, como a utilização de equipamentos mais novos para consumir menos energia (energia solar/eólica, etc.).

  • Necessidades Sociais e Estima: as necessidades sensação de pertencimento e estima são as que impedem a maioria das pessoas consumir de forma sustentável. As pessoas querem pertencer e ser reconhecidas por outros ao seu redor. Se o comportamento de consumo sustentável e os produtos sustentáveis não são da norma social, as pessoas não consomem. As pessoas se expressam através de compras e formam sua identidade, mas tudo dentro do quadro da norma social (influências psicológicas do marketing tradicional). Eles querem ser valorizados e se um produto sustentável não lhes traz o status necessário, eles não o compram. (JACKSON 2005; BELZ; PEATTIE 2009; EMERY 2012; MARTIN; SCHOUTEN 2012; REUTLINGER, 2012; KOTLER; KELLER, 2018).

  • Necessidade de Autorrealização: desenvolvimento e realizações pessoais.

Essas necessidades desempenham um papel no processo de decisão de compra dos consumidores (reconhecimento do problema, busca de informações, avaliação de alternativas, decisão de compras e comportamento pós-compra) e podem levar a decisões de compra menos sustentáveis (REUTLINGER, 2012; KOTLER; KELLER, 2018).

A necessidade de reconhecimento em um processo de decisão sustentável do consumidor deve reconhecer a necessidade de soluções alternativas e sustentáveis, que podem ter diferentes gatilhos, como o endosso de celebridades, que produtos sustentáveis se tornam da norma social (influências dos fatores culturais, sociais e pessoais do marketing sustentável).

A sustentabilidade adiciona uma nova dimensão à pesquisa de busca de informações, além de critérios tradicionais, como preço e ponto. Na maioria das vezes, os consumidores estão sobrecarregados com a quantidade de informações sobre sustentabilidade. Além disso, os consumidores são frequentemente menos conhecedor da sustentabilidade e a pesquisa de informações se transforma em um processo de aprendizagem (mudanças no comportamento de um indivíduo decorrentes da experiência).

Ao avaliar alternativas, os consumidores analisam os benefícios e atributos que os diferentes produtos têm a oferecer. A sustentabilidade é apenas um desses atributos e não é vista como um benefício por todos os consumidores. Outros atributos e benefícios são preço, desempenho e status que podem superar a sustentabilidade. Além disso, podem ser consideradas alternativas para a compra de um produto, como alugar ou não comprar.

O mais importante é a decisão de compra sobre a compra do produto sustentável ou não. Embora durante a avaliação de alternativas o consumidor tenha encontrado o produto mais preferido, a intenção de compra ainda pode ser intervindo. Com produtos sustentáveis, um dos principais fatores que podem impedir a compra é a disponibilidade. Outro fator é que se o produto sustentável resultar constrangimento por não ser da norma social, provavelmente não será comprado. Por outro lado, se o consumidor acredita que o produto convencional representa uma ameaça à sua segurança ou saúde, as soluções sustentáveis podem ser preferidas.

O comportamento pós-compra inclui o uso e o descarte do produto. O uso sustentável do produto significa uso eficiente e manutenção, a fim de prolongar a vida útil do produto. O comportamento pós-uso sustentável trata-se da reciclagem, reutilização ou remanufatura de produtos (economia circular), a fim de reduzir o desperdício que vai para aterros sanitários. Outra possibilidade pós-uso é a revenda do produto para outra pessoa. (BELZ; PEATTIE 2009; MARTIN; SCHOUTEN 2012; REUTLINGER, 2012; KOTLER; KELLER 2018).

Contudo, os consumidores tendem a se concentrar em questões únicas de sustentabilidade e comprar produtos que respondam a essas questões, como produtos Fairtrade (comércio justo) ou produtos benevolentes.

Portanto, os principais desafios são incluir todas as gamas de produtos sustentáveis no consumo sustentável e que o mercado de massa consuma de forma sustentável. Para isso, o consumo sustentável deve se tornar da norma social em oposição à sociedade consumidora vigente (BELZ; PEATTIE, 2009).

José Austerliano Rodrigues. Especialista Sênior em Sustentabilidade de Marketing e Doutor em Marketing Sustentável pela UFRJ, com ênfase em Sustentabilidade e Marketing, com interesse em pesquisa em Marketing Sustentável, Sustentabilidade de Marketing, Responsabilidade Social e Comportamento do Consumidor. E-mail: austerlianorodrigues@bol.com.br.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/10/2020

 

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate com link e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

 ECODEBATE

futuro insustentável

Decrescimento econômico e sustentabilidade em um mundo lotado

Decrescimento econômico e sustentabilidade em um mundo lotado, por Herman E. Daly

A exploração de recursos naturais é tão intensa que não podemos mais fingir que vivemos em um ecossistema ilimitado. Desenvolver uma economia sustentável em uma biosfera finita exige novas maneiras de pensar.

Objetos criados pelo homem atulham o meio ambiente. Teorias econômicas que funcionavam bem em um mundo vazio já não se adequam a um planeta lotado

É generalizada a convicção de que o crescimento é uma panaceia para todos os grandes males econômicos do mundo moderno. Pobreza? Basta fazer a economia crescer (ou seja, incrementar a produção de bens e serviços e estimular os gastos dos consumidores), e a riqueza se propagará de cima para baixo na sociedade.

Não deveríamos redistribuir riqueza dos ricos para os pobres, porque isso tornaria o crescimento mais lento. Contra o desemprego é só intensificar a demanda por bens e serviços, baixando os juros e estimulando investimentos. Excesso de população? Basta fomentar o crescimento econômico e confiar em que a transição demográfica resultante reduza as taxas de nascimentos.

Degradação ambiental? Confiemos na curva de Kuznets, uma relação empírica com o propósito de mostrar que, com crescimento incessante do Produto Interno Bruto (PIB), a poluição inicialmente aumenta, mas depois atinge um máximo e declina.

Confiar dessa maneira no crescimento poderia não trazer problemas se a economia mundial existisse em um vácuo, mas as coisas não são assim. A economia é um subsistema da biosfera finita, que lhe dá suporte. Quando a expansão da economia afetar excessivamente o ecossistema circundante, começaremos a sacrificar o capital natural (como peixes, minerais e petróleo) que valem mais do que o capital criado pelo homem (estradas, fábricas e eletrodomésticos). Teremos, então, o que denomino crescimento deseconômico, produzindo “males” mais rapidamente do que bens – tornando-nos mais pobres, e não mais ricos.

Depois que ultrapassamos a escala ótima, o crescimento torna-se algo estúpido no curto prazo e impossível de ser mantido no longo. As evidências sugerem que os EUA talvez já tenham entrado numa fase assim.

Não é fácil reconhecer e evitar o crescimento deseconômico. Um dos problemas é que algumas pessoas beneficiam-se dele e não têm estímulo para mudar. Além disso, as contas nacionais não registram explicitamente os custos de crescimento, por isso não os vemos claramente. A humanidade precisa fazer a transição para uma economia sustentável – que respeite os limites físicos inerentes ao ecossistema mundial e garanta que continue funcionando no futuro. Se não fizermos essa transição, poderemos ser punidos não apenas com crescimento deseconômico, mas com uma catástrofe ecológica que reduziria sensivelmente nosso padrão de vida.

A maioria dos economistas contemporâneos discorda de que alguns países estejam rumando para a deseconomia. Muitos ignoram a questão da sustentabilidade e confiam que, como já fomos tão longe com crescimento, poderemos continuar assim para sempre. A preocupação com a sustentabilidade, porém, tem longa história, remontando a escritos de John Stuart Mill na década de 1840.

A abordagem contemporânea baseia-se em estudos realizados nas décadas de 1960 e 1970 por Kenneth Boulding, Ernst Schumacher e Nicholas Georgescu-Roegen. Essa tradição é levada adiante pelos denominados economistas ecológicos, como eu, e em certa medida por subdivisões da corrente econômica principal chamada economia de recursos e ambiental. De modo geral, porém, a corrente principal, os economistas neoclássicos, considera a sustentabilidade um modismo e se alia ao crescimento.

Mas há fatos evidentes e incontestáveis: a biosfera é finita, não cresce, é fechada (com exceção do constante afluxo de energia solar) e obrigada a funcionar de acordo com as leis da termodinâmica. Qualquer subsistema, como a economia, em algum momento deve necessariamente parar de crescer e adaptar-se a um equilíbrio dinâmico, algo semelhante a um estado estacionário. As taxas de nascimentos devem ser iguais às de mortalidade, e as de produção de commodities devem se igualar às de depreciação.

Durante minha vida (82 anos), a população humana triplicou, e o número de objetos fabricados cresceu muito mais. O total de energia e material necessário para manter e substituir os artefatos humanos na Terra também aumentou enormemente. À medida que o mundo torna-se repleto de humanos e de suas coisas, ele é esvaziado do que havia antes por aqui. Para lidar com esse novo padrão de escassez, os cientistas precisaram desenvolver uma economia de “mundo cheio” para substituir a tradicional, de “mundo vazio”.

Na microeconomia, as pessoas e as empresas se dão conta claramente de quando devem parar de expandir uma atividade. Quando se expande, chega o momento em que toma o lugar de algum outro empreendimento, e essa substituição é contabilizada como custo. As pessoas param no ponto em que o custo marginal iguala-se ao benefício marginal. Ou seja, não vale a pena gastar um dólar a mais em um sorvete quando esse dá menos satisfação do que o equivalente a um dólar de outra coisa. A macroeconomia, porém, não dispõe de uma regra análoga que avise “a hora de parar”.

Como manter uma economia sustentável depende de enorme mudança racional e emocional por parte de técnicos, políticos e eleitores, poderíamos ser tentados a declarar que tal projeto é impossível. Mas a alternativa a uma economia sustentável, que mantenha permanente crescimento, é biofisicamente impossível. Ao escolher entre enfrentar uma impossibilidade política e uma impossibilidade biofísica, eu escolheria a primeira opção.

Sustentar o quê? Até agora, descrevi a “economia sustentável” apenas em termos gerais, como aquela capaz de ser mantida indefinidamente, em face de limites biofísicos. Para implementar esse tipo de economia, precisamos especificar exatamente o que deve ser sustentado de um ano para o outro. Os economistas têm discutido cinco grandezas candidatas: PIB, “utilidade”, rendimento, capital natural e capital total (a soma de capital natural e capital produzido pelo homem).

Algumas pessoas julgam que uma economia sustentável deveria manter a taxa de crescimento do PIB. Segundo essa visão, a economia sustentável é equivalente à de crescimento, e isso nos coloca a questão sobre se o crescimento sustentado é biofisicamente possível.

Até mesmo tentar definir sustentabilidade em termos de PIB constante é problemático, porque o PIB confunde melhoria qualitativa (desenvolvimento) com incremento quantitativo (crescimento). A economia sustentável deve, em algum ponto, parar de crescer, embora isso não signifique, necessariamente, parar de se desenvolver. Não há razão para limitar a melhoria qualitativa no projeto de produtos, o que pode fazer crescer o PIB sem incrementar a quantidade de recursos usados. A principal idéia por trás da sustentabilidade é mudar a trajetória de progresso – de crescimento não sustentável para desenvolvimento, presumivelmente, sustentável.

A candidata seguinte a ser sustentada, “utilidade”, refere-se ao nível de “satisfação de necessidades”, ou nível de bem-estar da população. Teóricos neoclássicos defendem a definição de sustentabilidade como a manutenção (ou incremento) de utilidade no decurso de gerações. Na prática, porém, essa definição é inútil. Utilidade é uma experiência, não uma coisa. Não há unidade de medida para utilidade, e ela não pode ser legada de uma geração a outra.

Recursos naturais, em contraste, são coisas: podem ser medidos e transferidos. Em especial, pode-se medir seu rendimento, ou seja, a taxa na qual a economia as usa, levando-as de fontes de baixa entropia no ecossistema, transformando-as em produtos úteis e, por fim, descartando-as de volta ao ambiente como rejeitos de alta entropia.

Sustentabilidade pode ser definida em termos de rendimento pela capacidade do meio ambiente de suprir cada recurso natural e absorver os produtos finais descartados.

Para os economistas, recursos são uma forma de capital, ou riqueza, abrangendo de estoques de matérias-primas a produtos acabados e fábricas. Existem dois grandes tipos de capital: natural e artificial. A maioria dos economistas neoclássicos acredita que o capital criado pelo homem é um bom substituto do natural e, portanto, defendem a manutenção da soma dos dois, abordagem denominada sustentabilidade fraca.

A maioria dos economistas ecológicos, eu inclusive, acredita que capital natural e artificial são, frequentemente, mais complementos do que substitutos, e que o natural deveria ser mantido separado, porque tornou-se fator limitante. Essa abordagem é denominada sustentabilidade forte.

Por exemplo, a quantidade anual de peixe capturado é atualmente limitada pelo capital natural das populações do mar, e não mais pelo capital artificial representado pelos barcos pesqueiros. A sustentabilidade fraca sugeriria que a escassez de peixes poderia ser enfrentada com a construção de mais barcos. A sustentabilidade forte conclui pela inutilidade de mais pesqueiros, se há escassez de peixes, e insiste que a pesca deve ser limitada para garantir a manutenção de populações adequadas para as gerações futuras.

A política mais adequada à manutenção do capital natural é o sistema cap-and-trade (limitar-e-negociar): define-se um limite para o total de rendimento permitido, conforme a capacidade do meio ambiente de regenerar recursos ou absorver poluição. O direito de esgotar fontes como os oceanos ou de poluir “dissipadores”, como a atmosfera, deixa de ser um bem gratuito, passando a ser um ativo escasso que pode ser negociado – comprado e vendido em um mercado livre -, após decidir a quem pertencem inicialmente. Entre os sistemas cap-and-trade já implementados está o criado pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) que institui o comércio do direito de poluir com dióxido de enxofre (que causa chuva ácida). Outro, na Nova Zelândia, estabelece a redução da pesca excessiva mediante a definição de cotas transferíveis.

O sistema “limitar-e-negociar” é um exemplo dos papéis distintos de livres mercados e de políticas governamentais. Tradicionalmente, a teoria econômica lidou mais com alocação (a distribuição de recursos escassos entre usos concorrentes). Não lidou com a questão de escala (o tamanho físico da economia em relação ao ecossistema). Mercados que funcionam de forma adequada alocam recursos eficientemente, mas não podem determinar a escala sustentável; isso pode ser feito apenas mediante política governamental.

Ajustes Necessários

A transição para uma economia sustentável exigirá muitos ajustes na política econômica. Algumas dessas mudanças já são evidentes. O sistema de seguridade social americano, por exemplo, encontra dificuldades com a transição demográfica para uma média populacional mais idosa. O ajuste exige impostos mais altos, aumento na idade de aposentadoria ou pensões menores. O sistema não está propriamente em crise, mas um ou mais ajustes são necessários para que se sustente.

Vida útil de produtos. Uma economia sustentável requer uma “transição demográfica” não apenas de pessoas, mas também de bens – as taxas de produção deveriam ser iguais às taxas de depreciação, em níveis elevados ou baixos. Taxas mais baixas são melhores, tanto em termos de durabilidade dos bens quanto para ter sustentabilidade. Produtos de vida mais longa podem ser substituídos mais lentamente, com uso menor de recursos. A transição é análoga a um evento de sucessão ecológica.

Ecossistemas jovens, em crescimento, têm tendência a maximizar a manutenção da eficiência do crescimento, medida em produção por unidade de biomassa existente. Nos maduros, a ênfase desloca-se para a maximização da eficiência da manutenção, ou por quanto da biomassa existente é mantida por unidade de nova produção – o inverso de eficiência produtiva. Precisamos de um ajuste similar para viabilizar a sustentabilidade. Uma adaptação nessa direção são os contratos de serviços vinculados a bens alugados – de fotocopiadoras a tapetes; nesse cenário, o fabricante permanece como proprietário, presta manutenção, recolhe e recicla o produto no fim de sua vida útil.

Crescimento do PIB

Devido a melhoras qualitativas e ao aumento de eficiência, o PIB pode continuar crescendo, mesmo com rendimento constante. Os ambientalistas ficariam satisfeitos porque a quantidade processada não aumentaria; os economistas ficariam felizes porque o PIB aumentaria. Essa forma de “crescimento” – na realidade, desenvolvimento -, conforme definido anteriormente, deveria ser incrementada ao máximo, mas há vários limites.

Setores da economia de modo geral considerados mais qualitativos, como o de tecnologia da informação, quando examinados mais de perto, revelam uma substancial base física. Por outro lado, para ser proveitosa aos pobres, a expansão deve consistir em bens necessários a eles – roupas, teto, comida na mesa, e não 10 mil receitas na internet. Mesmo os ricos gastam a maior parte de sua renda em automóveis, casas e viagens, mais do que em bens intangíveis.

Setor financeiro

Em uma economia sustentável, a ausência de crescimento muito provavelmente faria os juros caírem. É possível que o setor financeiro encolhesse, porque juros e taxas de crescimento baixos não poderiam sustentar a enorme superestrutura de transações financeiras – baseada sobretudo em endividamento e expectativas de crescimento econômico futuro – apoiada precariamente sobre a economia física. Numa economia sustentável, investimentos seriam feitos principalmente para substituição e melhoria qualitativa (não para especulação sobre a expansão quantitativa) e ocorreriam com menos frequência.

Comércio

O livre comércio não seria viável em um mundo contendo simultaneamente economias sustentáveis e insustentáveis, porque as primeiras com certeza contabilizariam muitos custos relativos ao meio ambiente e ao futuro, que seriam ignorados nas economias de crescimento. Economias insustentáveis, nesse caso, poderiam praticar preços inferiores ao de suas rivais sustentáveis, não por serem mais eficientes, mas apenas por não pagarem o custo da sustentabilidade.

Poderia existir um comércio regulamentado para compensar essas diferenças, assim como um comércio livre entre países igualmente comprometidos com a sustentabilidade. Considera-se que tais restrições são onerosas ao comércio, mas na verdade ele já é bastante regulamentado de maneira prejudicial ao meio.

Impostos

Que tipo de sistema tributário seria o mais adequado? Um governo preocupado com o uso mais eficiente de recursos naturais mudaria o alvo de seus impostos. Em vez de taxar a renda auferida por trabalhadores e empresas (o valor adicionado), tributaria o fluxo produtivo (aquele ao qual é adicionado valor), de preferência no ponto em que os recursos são apropriados da biosfera, o ponto de “extração” da Natureza.

Muitos países aplicam impostos de “extração”. Esse tipo induz um uso mais eficiente dos recursos, tanto na produção como no consumo, e tem monitoração e cobrança relativamente fáceis. Parece razoável taxar o que queremos evitar (esgotamento de recursos e poluição) e deixar de taxar o que mais queremos (renda).

A regressividade desse imposto sobre o consumo (os pobres pagariam um percentual- maior de sua renda do que os ricos) poderia ser compensada como gasto progressivo do imposto recolhido (isto é, para ajudar os pobres), instituindo um imposto sobre artigos de luxo ou cobrando mais impostos sobre rendas elevadas.

Emprego

É possível manter o pleno emprego? Essa é uma pergunta difícil, e a resposta, provavelmente é não. Entretanto, por uma questão de justiça, também devemos questionar se o pleno emprego é possível em uma economia de crescimento movida a livre comércio, exportação de serviços, imigração facilitada de mão-de-obra barata e adoção de tecnologias que eliminam empregos. Em uma economia sustentável, manutenção e consertos tornam-se mais importantes. Como exigem trabalho mais intenso e são relativamente protegidos de terceirização estrangeira, esses serviços poderão gerar mais empregos.

Entretanto, será necessário repensar a maneira como as pessoas obtêm renda. Se a automação e a exportação de postos de trabalho resultar em uma maior parte do produto total agregado ao capital (ou seja, empresas e seus donos lucrando mais com o produto), e portanto menor para os trabalhadores, então o princípio da distribuição de renda através do emprego torna-se menos justificável. Uma alternativa prática poderia ser a participação mais ampla na propriedade das empresas, para que os indivíduos obtivessem renda através de participação proprietária nas empresas, em vez de obtê-la mediante emprego em tempo integral.

Felicidade

Uma das forças motrizes do crescimento insustentável tem sido o axioma da insaciabilidade: as pessoas serão sempre mais felizes consumindo mais.

Entretanto, pesquisas de economistas experimentais e psicólogos levam à rejeição desse axioma. Crescentes evidências, como o trabalho de 1990 de Richard A. Easterlin, da Universidade do Sul da Califórnia, sugerem que o crescimento nem sempre incrementa a felicidade (nem a utilidade ou o bem-estar). Em vez disso, a correlação entre a renda absoluta e a felicidade é válida apenas até um limiar de “suficiência”; além desse ponto, apenas o status relativo influencia a autopercepção de felicidade.

O crescimento não é capaz de incrementar a renda relativa de todos. As pessoas que conseguirem isso em conseqüência de crescimento adicional seriam compensadas por outras cuja renda relativa cairia. Além disso, se a renda de todos aumentasse proporcionalmente, nenhuma renda relativa cresceria, e ninguém se sentiria mais feliz. O crescimento torna-se como uma corrida armamentista em que os dois campos veem seus ganhos cancelados mutuamente.

Muito provavelmente, os países ricos atingiram o “limite de futilidade”, ponto além do qual o crescimento não incrementa a felicidade. Isso não significa que a sociedade de consumo morreu – apenas que o aumento do consumo além do limiar de suficiência, seja ele fomentado por publicidade agressiva ou compulsão inata por compras, simplesmente não está tornando as pessoas mais felizes, em sua própria avaliação.

Um corolário acidental é que a sustentabilidade poderá custar pouco em termos de felicidade para as sociedades que atingiram a suficiência. A “impossibilidade política” de uma economia sustentável pode ser menos impossível do que parecia.

Se não fizermos os ajustes necessários para atingir uma economia sustentável, condenaremos nossos descendentes a uma situação infeliz em 2050. O mundo se tornará cada vez mais poluído e mais despojado de peixes, combustíveis fósseis e de outros recursos naturais. Durante algum tempo, essas perdas poderão continuar a ser mascaradas pela enganosa contabilidade baseada no PIB, que mede o consumo de recursos como se fosse renda. Mas, em determinado momento, o desastre será sentido.

Será difícil evitar essa calamidade. Quanto mais cedo começarmos a agir, melhor.

Encruzilhada econômica

O PROBLEMA: O status quo econômico não poderá ser mantido por muito tempo. Se não forem feitas mudanças radicais, correremos o risco de perda de bem-estar e de possível catástrofe ecológica.

O PLANO: A economia precisa ser sustentada no longo prazo e obedecer a três preceitos:

1. Limitar o uso de todos os recursos para que os rejeitos possam ser absorvidos pelo ecossistema.

2. Explorar recursos renováveis de forma a não exceder a capacidade do ecossistema de regenerá-los.

3. Exaurir recursos não-renováveis a um ritmo que não exceda a taxa de desenvolvimento de substitutos renováveis.

Quando crescer é ruim – Crescimento deseconômico ocorre quando aumentos na produção se dão à custa do uso de recursos e sacrifícios do bem-estar que valem mais do que os bens produzidos. Isso decorre de um equilíbrio indesejável de grandezas denominadas utilidade e desutilidade. Utilidade é o nível de satisfação das necessidades e demandas da população; grosso modo, é o nível de seu bem-estar. Desutilidade refere-se aos sacrifícios impostos pelo aumento de produção e consumo. Podem incluir o uso de força de trabalho, perda de lazer, esgotamento de recursos, exposição à poluição e concentração populacional.

Uma maneira de conceituar o equilíbrio entre utilidade e desutilidade é com um gráfico mostrando utilidade marginal e desutilidade marginal . Utilidade marginal é a quantidade de necessidades que são satisfeitas quando se incrementa em uma unidade o consumo de determinada quantidade de bens e serviços. Ela diminui com o aumento do consumo, porque inicialmente satisfazemos nossas necessidades mais prementes. A desutilidade marginal é a quantidade de sacrifício adicional necessária para realizar cada unidade adicional de consumo. A desutilidade marginal cresce com o consumo porque as pessoas, em princípio, fazem antes os sacrifícios mais fáceis. Por exemplo, para comprar mais coisas, podemos trabalhar

dez horas a mais por semana, uma opção que vale, digamos, dez pontos de desutilidade. Para consumir ainda mais, podemos abrir mão de outras dez horas, e não dedicar tempo algum a nossos filhos. Isso poderia representar 20 pontos de desutilidade, além dos dez de que já abrimos mão.

A escala ótima de consumo é o ponto no qual a utilidade marginal e a desutilidade marginal se igualam. Nesse ponto, uma sociedade desfruta da utilidade líquida máxima . Incrementar o consumo além desse ponto faz com que a sociedade perca mais do que ganhe, por causa do crescimento das desutilidades, conforme representado pela área rosada de desutilidade líquida. O crescimento torna-se deseconômico.

Em determinado momento, uma população em crescimento deseconômico atinge o limite de futilidade, o ponto no qual deixa de acumular qualquer utilidade com o aumento de consumo. O limiar de futilidade pode já estar próximo para os países ricos. Além disso, uma sociedade pode ser levada ao colapso por uma catástrofe ecológica, resultando em enorme aumento de desutilidade . Essa devastação poderá acontecer tanto antes como depois de atingido o limiar de desutilidade.

O diagrama representa nosso conhecimento da situação em um ponto no tempo. Tecnologias futuras poderão deslocar as linhas de modo que os diversos aspectos ressaltados sejam movidos para a direita, permitindo o crescimento adicional do consumo antes que a desutilidade predomine. – H. E. D.

Herman E. Daly – De 1988 a 1994 foi economista sênior do departamento de meio ambiente do Banco Mundial, onde colaborou com a formulação de diretrizes de políticas relacionadas ao desenvolvimento sustentável. Escreveu diversos livros e é co-fundador e editor associado do periódico Ecological Economics.

Para conhecer mais:

The green national product: a proposed index of sustainable
economic welfare. Clifford W. Cobb e John B. Cobb Jr. University Press of America,
1994.

Will raising the incomes of all increase the happiness of all? Richard Easterlin, em
Journal of Economic Behavior and Organization, vol. 27, págs. 35-47, 1995.

Human well-being and the natural environment. Partha Dasgupta. Oxford
University Press, 2001.

Ecological economics: principles and applications. Herman E. Daly e Joshua Farley.
Island Press, 2004.

 

Artigo originalmente publicado na Scientific American Brasil Edição Nº 41

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/10/2020

 

[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate com link e, se for o caso, à fonte primária da informação ]