terça-feira, 6 de dezembro de 2022

NASA contrata empreiteira para obras na Lua

 

NASA contrata empreiteira para obras na Lua

Redação do Site Inovação Tecnológica - 29/11/2022

NASA contrata empreiteira para obras na Lua
Idealização artística de um canteiro de obras na Lua.
[Imagem: ICON]


Construção 3D na LuaA NASA contratou a empresa construtora Icon, especializada em obras de construção civil feitas por impressoras 3D, para desenvolver tecnologias de construção que possam ser usadas na Lua.

O objetivo do contrato é ajudar a construir infraestruturas básicas, como plataformas de pouso, habitats e estradas na superfície lunar.

Com o programa Artemis finalmente decolando, visando a exploração humana de longo prazo da Lua, novas tecnologias são necessárias para enfrentar os desafios de viver e trabalhar em outro mundo, justifica a agência.

"Para explorar outros mundos, precisamos de novas tecnologias inovadoras adaptadas a esses ambientes e às nossas necessidades de exploração," disse Niki Werkheiser, diretor de maturação de tecnologia da NASA. "Impulsionar esse desenvolvimento com nossos parceiros comerciais criará os recursos de que precisamos para futuras missões."

Como a Icon já possui a tecnologia de impressão 3D de residências aqui na Terra, o objetivo do contrato, com valor de US$57 milhões, é adaptar a tecnologia para funcionar com materiais nativos da Lua, como o regolito, o poeirento solo lunar.

O uso de recursos locais é essencial para viabilizar construções de grande porte, já que seria inviável levar materiais da Terra.

Há mais de uma década, várias equipes trabalham na construção em 3D de estruturas usando simulações de poeira lunar.

A ESA (Agência Espacial Europeia) também trabalha com a ideia de usar a impressão 3D para construir bases na Lua. A proposta envolve usar um módulo inflável, sobre o qual o material será aplicado pela impressora.

NASA contrata empreiteira para obras na Lua
O mesmo conceito poderá ser usado em Marte.
[Imagem: ICON]

Simulações e análogos

A empresa Icon, agora contratada pela NASA, já tem experiência na área, tendo construído aqui na Terra o módulo Alfa, um habitat de 160 m2 que simula as condições de Marte, que será usado durante a missão simulada de saúde e desempenho da tripulação (CHAPEA: Crew Health and Performance Analog), a partir de 2023.

A Icon também competiu no Desafio de Habitat Impresso em 3D, da NASA, em parceria com a Escola de Minas do Colorado. A equipe ganhou um prêmio por imprimir em 3D uma amostra de estrutura que foi testada quanto à capacidade de manter vedação, resistência e durabilidade em temperaturas extremas.

São Paulo terá primeira usina de geração de energia elétrica a partir de lixo residencial

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São Paulo terá primeira usina de geração de energia elétrica a partir de lixo residencial

São Paulo terá primeira usina do país de geração de energia elétrica a partir de lixo residencial

Foi lançada hoje a pedra fundamental para a construção da Usina de Geração de Energia Elétrica do Consórcio Intermunicipal do Vale do Paranapanema (CIVAP), na cidade de Palmital, localizada a pouco mais de 400 km da capital paulista. A usina irá transformar lixo residencial em energia elétrica. Será a primeira do estado a usar esse tipo de tecnologia.

O projeto, realizado por meio de uma parceria pública privada (PPP), contemplará inicialmente outros 13 municípios da região, além de Palmital. O lixo será coletado de aproximadamente 150 mil casas de Cândido Moura, Tarumã, Assis, Paraguaçú Paulista, Florinea, Santa Cruz do Rio Padro, Ourinhos, Ibirarema, Echaporã, Oscar Bressane, Lutécia e Pedrinhas Paulista.

A estimativa é que as obras sejam finalizadas entre 15 a 18 meses e numa área de 15 mil m² a capacidade seja para o recebimento de 300 toneladas de lixo/dia e geração de 144 MW/dia, o suficiente para atender a demanda energética de quase 30 mil residências por ano.

Outro ponto positivo da futura entrada em operação da nova usina será que ela evitará o descarte anual de quase 94 mil toneladas de resíduos em aterros sanitários.

De acordo com a concessionária BAL-CIVAP, responsável pelo projeto, as cinzas geradas pela transformação do combustível derivado dos resíduos em gás são inócuas ao meio ambiente, podendo ser reaproveitadas para fazer massa asfáltica e tijolos.

“Receberemos o lixo in natura, trituramos, desidratamos e criamos um combustível, que posteriormente é transformado em gás”, explica Luciano Reis Infiesta, presidente da Carbogás Energia, empresa executora do projeto e detentora da patente.

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Foto de abertura: montagem domínio público/pixabay (torre de energia) e Toninho Tavares/Agência Brasília/Flickr (coleta de lixo)

Emissões de metano da JBS ultrapassam as dos rebanhos de França, Alemanha, Canadá e Nova Zelândia juntos

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Emissões de metano da JBS ultrapassam as dos rebanhos de França, Alemanha, Canadá e Nova Zelândia juntos

Emissões de metano da JBS ultrapassam as dos rebanhos de França, Alemanha, Canadá e Nova Zelândia juntos

Cinco das maiores empresas de carnes e dez das maiores fabricantes de laticínios do mundo produzem aproximadamente 12,8 milhões de toneladas de metano, o que equivale a mais de 80% de toda a liberação desse tipo de gás pela União Europeia. Juntas essas 15 companhias são responsáveis por cerca de 3,4% de todas as emissões globais de metano antropogênico e 11,1% do metano relacionado à pecuária mundial.

Assim como o dióxido de carbono, o metano é um gás de efeito estufa e contribui para o aquecimento da superfície da Terra. Todavia, apesar de ter uma vida mais curta em relação ao gás carbônico, ele é extremamente mais potente: tem cerca de 80 vezes mais potencial de aquecimento do que o CO2.

E não tem jeito, este é um processo natural. Em seu processo de digestão, vacas, bois, ovelhas e outros animais produzem o gás metano. E consequentemente, o liberam no ar. O problema é quando há um rebanho gigantesco no planeta sendo criado para atender a demanda do consumo de carne.

Os números mais acima fazem parte de uma análise inédita, divulgada em novembro pelo Institute for Agriculture and Trade Policy, dos Estados Unidos, que faz um sério alerta sobre a emissão global de metano e reforça que uma legislação urgente e ambiciosa seja implementada para lidar com os impactos climáticos gerados pelas empresas do setor e para que os governos apoiem uma transição da pecuária industrial em direção à agroecologia.

“Nossas estimativas mostram que as emissões combinadas de metano dessas 15 empresas excedem em muito toda a pegada de metano de muitos países, incluindo Rússia, Canadá, Austrália e Alemanha. Suas emissões desse gás são 52% maiores do que aquelas relacionadas à pecuária da UE e 47% maiores do que as dos Estados Unidos”, aponta o relatório.

Emissões de metano da JBS ultrapassam as dos rebanhos de França, Alemanha, Canadá e Nova Zelândia juntos

Quinze multinacionais liberam mais metano do que Estados Unidos e União Europeia

Duas empresas brasileiras no topo da lista

Logo no primeiro lugar do ranking elaborado pelo Institute for Agriculture and Trade Policy está a multinacional brasileira JBS, a maior produtora mundial de carne, com um faturamento anual de US$ 50 bilhões, que tem sido constantemente acusada de ser cúmplice do desmatamento no Brasil. Em 2021, oito das maiores redes de supermercados da Europa afirmaram que não iriam mais comprar os produtos da empresa. Um ano antes, milhares de britânicos já tinham assinado uma petição pelo boicote da carne da JBS (leia mais aqui).

As emissões de metano da JBS superam em muito as de todas as outras empresas citadas no levantamento. Elas excedem as emissões combinadas de metano pecuário da França, Alemanha, Canadá e Nova Zelândia ou se comparam a 55% do metano pecuário dos Estados Unidos.

E outra companhia brasileira também aparece no documento. A Marfrig, segunda maior empresa do segmento pecuário do mundo, contribui com 1,9 milhões de emissões de metano e produz o mesmo volume desse gás de efeito estufa do que o rebano inteiro da Austrália.

“É urgente reduzir o aquecimento a curto prazo, mas as emissões de metano aumentaram 9% entre 2008 e 2017 em comparação com a década anterior. Nos cenários políticos atuais, as emissões antropogênicas de metano devem aumentar em 30% entre 2015 e 2050. A maior fonte de metano produzido pelo homem é o manejo do esterco e a fermentação entérica em animais ruminantes, um processo em que microrganismos criam metano no estômago de animais como vacas, ovelhas e cabras”, revela a análise.

Emissões de metano da JBS ultrapassam as dos rebanhos de França, Alemanha, Canadá e Nova Zelândia juntos

No gráfico acima, as emissões de metano da JBS que se comparam às mesmas de
França, Canadá, Alemanha e Nova Zelândia juntas

De acordo com os especialistas do instituto americano, a única alternativa para combater o problema é reduzir o número de animais em sistemas de produção industrial em massa.

A organização acusa ainda corporações como a JBS e a Marfrig de “falta endêmica de transparência e um profundo vácuo de responsabilidade”. Por isso, recomenda estimativas independentes das emissões dessa companhias. “Esta é uma razão crítica pela qual os governos devem exigir relatórios de emissões consistentes e abrangentes e verificação independente dessas emissões”, afirma o relatório.

O Conexão Planeta entrou em contato com as assessorias de imprensa da JBS e da Marfrig para ter uma declaração das mesmas sobre o relatório e as denúncias feitas. Ainda não obtivemos resposta, mas essa reportagem será atualizada assim que houver um retorno.

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Mapa global mostra as 15 empresas citadas: no setor de laticínios aparecem Nestlé e Danone

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Imagem de abertura: ilustração de capa do relatório “Emissions Impossible: Methane Edition”


Expansão da agropecuária no Cerrado pode favorecer espécies consideradas pragas para a lavoura, como a saúva

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Expansão da agropecuária no Cerrado pode favorecer espécies consideradas pragas para a lavoura, como a saúva

Expansão da agropecuária no Cerrado favorece espécies consideradas pragas para a lavoura, como a saúva

*Por André Julião

Cerrado pode ter sido, no último milhão de anos, um centro para o surgimento de novas espécies de saúva, como são conhecidas as formigas do gênero Atta. Contudo, a recente expansão da agropecuária na região parece estar afetando negativamente a biodiversidade desses insetos na região – favorecendo justamente espécies consideradas pragas para a agricultura. A conclusão é de um estudo conduzido por pesquisadores do Brasil, da Argentina e dos Estados Unidos.

Publicado na revista Systematic Entomology, o trabalho indica que a origem das saúvas se deu cerca de 8,5 milhões de anos atrás em algum ponto da chamada Mesoamérica, região que atualmente abrange do sul do México ao noroeste da Colômbia. Na sequência, esses insetos teriam se espalhado pela América do Sul, principalmente a partir do Cerrado. Ainda segundo o estudo, uma explosão de novas espécies pode ter ocorrido entre um e três milhões de anos atrás, justamente quando o Cerrado se expandia.

“A expansão do Cerrado brasileiro aparentemente favoreceu as saúvas, pois propiciou maior diversidade de alimento e ambientes mais abertos, aos quais elas se adaptaram muito bem. As saúvas foram se especializando nesses diferentes hábitats e gerando novas espécies”, explica Corina Barrera, primeira autora do estudo, realizado durante seu doutorado no Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (IB-Unesp), em Rio Claro.

“Se o Cerrado acabar, talvez elas passem por uma nova retração em termos de biodiversidade, como outras que ocorreram no passado. Pode ser que isso já esteja acontecendo com a introdução da agricultura extensiva na região. Não medimos ainda a magnitude desse fenômeno. Sabemos que existe uma grande explosão populacional de saúvas, porém com baixa diversidade biológica, causada pela expansão da agricultura. As poucas espécies que se beneficiam de culturas como soja e cana-de-açúcar, por exemplo, se tornam pragas. Por sua vez, espécies florestais, que não se adaptam às lavouras, podem sofrer uma grande extinção”, conta Maurício Bacci Júnior, professor do IB-Unesp e coordenador do estudo.

O trabalho integra dois projetos apoiados (19/24470-2 e 19/03746-0) pela FAPESP e coordenados por Bacci, um deles no âmbito de uma parceria entre a National Science Foundation, dos Estados Unidos, e o Programa BIOTA-FAPESP.

Para realizar o trabalho, os pesquisadores coletaram amostras de 865 colônias de saúvas, em 19 países e em 25 dos 26 estados brasileiros. Foram selecionados 224 espécimes para extração de DNA, de onde foram recuperados 2.340 dos chamados elementos ultraconservados, regiões do código genético idênticas em mais de um organismo. A comparação desses elementos é uma ferramenta conhecida por determinar relações evolutivas com bastante precisão.

Formigas agricultoras

Embora do ponto de vista humano a saúva seja considerada uma praga agrícola, esses insetos têm praticado a agricultura desde antes do surgimento do homem na Terra.

Enquanto a maioria das formigas é caçadora-coletora, matando presas ou comendo o que encontram pelo caminho, as saúvas fazem parte de uma subtribo, chamada Attina, que entre 50 milhões e 60 milhões de anos atrás passou a produzir o próprio alimento.

“Os inventores da agricultura são as formigas e alguns grupos de cupins e besouros. São insetos que começaram a se alimentar de fungos e evoluíram para cultivá-los dentro dos seus ninhos, em cima de algum substrato. No caso das formigas-cortadeiras, folhas e outros restos de plantas. Com isso, possuem uma fonte de alimento que dura todas as estações do ano e conseguem uma certa segurança alimentar”, define Bacci, que é ligado ao Centro de Estudos de Insetos Sociais (Ceis) do IB-Unesp.

Tanto tempo praticando a agricultura possibilitou às formigas produzirem até mesmo seus próprios defensivos. No caso de um grupo mais antigo do que as saúvas, por exemplo, isso ocorre por meio de uma relação de mutualismo com bactérias. Os microrganismos protegem os fungos que servem de alimento para as formigas contra patógenos. Recentemente, os compostos usados por uma dessas bactérias têm sido explorados como possíveis medicamentos para doenças humanas (leia mais aqui).

Mas enquanto essas formigas mais antigas usam restos de plantas, como flores e folhas caídas no chão, como substrato para cultivar fungos, as chamadas formigas-cortadeiras, da qual fazem parte as saúvas (gênero Atta) e as quenquém (gêneros Acromyrmex e Amoimyrmex), cortam folhas ativamente para levar para os ninhos. Daí se tornarem potenciais pragas.

Surgidas por volta de 19 milhões de anos atrás, tendo se dividido nos dois mais recentes gêneros (Atta e Acromyrmex) há cerca de 16,5 milhões de anos, as cortadeiras são as mais recentes entre as formigas cultivadoras de fungo. No que se trata das saúvas, algumas espécies são ainda mais novas, tendo surgido entre 1 milhão e 300 mil anos atrás, como a saúva-preta (Atta robusta), no último caso.

Mal surgiu na Terra e já está ameaçada de extinção. Restrita a regiões costeiras do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, a saúva-preta é considerada “vulnerável” pelo Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção. Uma das explicações para a ameaça é sua baixa capacidade de adaptação a outros hábitats.

Outras espécies, no entanto, têm sua área ampliada à medida que o homem aumenta seu domínio e por isso estão em franca expansão. Uma delas é a saúva-limão (Atta sexdens), que tem esse nome pelo cheiro característico que exala quando tem a cabeça esmagada, mas é mais famosa por dizimar lavouras inteiras, por vezes da noite para o dia.

“Uma plantação de qualquer coisa que não seja nativa da América do Sul, como são as principais culturas agrícolas, será sempre também uma ‘plantação’ de formigas”, afirma Bacci.

O pesquisador atualmente realiza um mapeamento dos genes presentes nas saúvas, a fim de encontrar características (assinaturas genéticas) que possam tê-las tornado bem-sucedidas ou em vias de extinção. Além de entender melhor a seleção natural ocorrida no grupo, o trabalho pode abrir caminho para o desenvolvimento de formicidas mais direcionados, que atinjam apenas os genes dessas espécies danosas e em expansão, e não os de outras formigas inofensivas, além de peixes, aves e mamíferos.

O artigo “Phylogenomic reconstruction reveals new insights into the evolution and biogeography of Atta leaf-cutting ants (Hymenoptera: Formicidae)” pode ser lido neste link.

*Texto publicado originalmente em 25/02/22 no site da Agência Fapesp de Notícias 

Foto: Wikimedia Commons

Um dos ‘hotspots’ de biodiversidade do mundo, Cerrado pode entrar em colapso em menos de 30 anos devido ao agronegócio




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Um dos ‘hotspots’ de biodiversidade do mundo, Cerrado pode entrar em colapso em menos de 30 anos devido ao agronegócio

Um dos 'hotspots' de biodiversidade do mundo, Cerrado pode entrar em colapso em menos de 30 anos devido ao agronegócio

Por Fernanda Wenzel* – O bioma do Cerrado, um dos hotspots de biodiversidade do mundo e fonte vital para grande parte da água no Brasil, pode entrar em colapso em menos de 30 anos se o agronegócio continuar avançando no ritmo atual. Esta é a descoberta fundamental de um artigo baseado em pesquisas primárias apresentado por 12 cientistas brasileiros e publicado recentemente na revista Global Change Biology.

“Estamos falando de linhagens inteiras de vida que desaparecerão, sem mencionar vários insetos que existem apenas no Cerrado”, alerta Gabriel Hofmann, doutor em Ecologia e estudante de pós-graduação em Geografia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Hofmann é o autor principal de um novo estudo que analisa como a transformação da vegetação nativa em lavouras está acelerando as mudanças climáticas em um bioma que já teve quase metade de sua área convertida em plantações de soja, milho e algodão e pastos para gado.

A maior parte da rápida escalada do desmatamento aconteceu após os anos 1990, quando produtores do agronegócio se concentraram numa parte do bioma que apelidaram de Matopiba – acrônimo que reúne as sílabas iniciais de quatro estados: Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.

Hoje, a região é o coração da nova fronteira agrícola brasileira.

Um dos 'hotspots' de biodiversidade do mundo, Cerrado pode entrar em colapso em menos de 30 anos devido ao agronegócio
Rã-quatro-olhos (Physalaemus nattereri): uma das espécies nativas do Cerrado cujo futuro está em risco / Foto: Felipe Gomes/ Wikimedia Commons (CC BY-SA 2.5)

Uma savana mais quente e mais seca

O Cerrado de hoje é bem mais quente e seco do que no passado, conclui o artigo a partir de análises de temperatura e mudanças na precipitação ao longo de seis décadas. Aumentos de 2,24 °C em média nas temperaturas máximas mensais foram observados entre 1961 e 2019, com picos de 4 °C no mês de outubro. Se esta tendência persistir, a temperatura será 6 °C mais alta em 2050 em comparação com 1961, afirma o artigo.

“As mudanças climáticas por si só já têm este efeito (quente e seco) sobre a região. O que estamos fazendo é ampliar este efeito expandindo as áreas de plantações, como a soja, e reduzindo a cobertura de vegetação nativa”, diz Francisco Aquino, professor de Geografia da UFRGS e um dos autores do estudo.

No artigo, os pesquisadores argumentam que a interferência humana está perturbando uma estratégia eficiente da natureza, em que, durante os meses de pouca ou nenhuma chuva, as árvores do Cerrado usam suas raízes profundas para buscar água em aquíferos a até 15 metros de profundidade no subsolo.

Isso permite que as plantas continuem realizando fotossíntese e soltando água na atmosfera através da transpiração e da evaporação, mesmo na estação seca.

Esse mecanismo, explica Hofmann, desaparece com o avanço do agronegócio e a substituição da vegetação por grandes lavouras: “Na estação seca, os fazendeiros não plantam nada no Cerrado. Eles deixam o solo nu ou (coberto) com matéria orgânica morta. Como não há plantas para absorver a energia do sol e fazer fotossíntese, toda essa energia é usada para aquecer o ar, e a temperatura aumenta”.

Esse processo de esquentar e secar desencadeia um efeito cascata que pode acabar com a maior parte da biodiversidade do Cerrado. Plantas menores, que não têm raízes longas, dependem do orvalho como sua única fonte de água na estação seca.

O orvalho costuma se formar à noite, quando as temperaturas mais baixas condensam a umidade atmosférica (que passa para o ar através da transpiração e evaporação das árvores de raízes profundas). Mas agora, com menos árvores e menos vapor de água no ar, além de temperaturas mais altas durante o dia e a noite, o orvalho é um fenômeno cada vez mais raro. “Essas plantas vão simplesmente torrar ao sol”, diz Hofmann.

Insetos, incluindo abelhas e formigas e aranhas também são muito dependentes do orvalho como fonte de água. “Se tirarmos os insetos polinizadores, o ecossistema entra em colapso”, conclui Hofmann, que prevê grandes impactos na biodiversidade do Cerrado nos próximos 30 anos.

Um dos 'hotspots' de biodiversidade do mundo, Cerrado pode entrar em colapso em menos de 30 anos devido ao agronegócio
Para muitos dos insetos e plantas nativas do Cerrado, como a Gaylussacia brasiliensis vista aqui, o orvalho é a única fonte de água na estação seca. Com menos umidade no ar e temperaturas mais altas, a formação de orvalho diminui, desencadeando um efeito cascata que pode levar ao colapso da biodiversidade do bioma / Foto: Ruy Walka Alves

“Poderemos ver o Cerrado se transformar em algo muito parecido com um deserto”, alerta Tércio Ambrizzi, professor do Departamento de Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo, que não esteve envolvido no estudo. Ambrizzi, que estuda as mudanças climáticas na América do Sul, diz que as descobertas da equipe de pesquisadores de Hofmann confirmam as previsões que ele e outros pesquisadores fizeram oito anos atrás para o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas.

“Essas descobertas mostram que teremos menos chuvas no Norte e no Nordeste, portanto o Cerrado será mais quente e seco e mais vulnerável a incêndios”, diz Ambrizzi. Em 2019, o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) registrou 63.874 focos de incêndio no Cerrado – um aumento de 61,92% em relação ao ano anterior. O número de incêndios permaneceu alto em 2020.

Em 2017, Bernardo Strassburg, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, alertou para o que chamou de “tempestade perfeita”: o encontro dos impactos da expansão do agronegócio, o desenvolvimento de infraestrutura, a fraca proteção legal da terra e incentivos limitados à conservação.

De acordo com o artigo que publicou na época, as áreas públicas protegidas cobriam apenas 7,5% do bioma (em comparação com 46% na Amazônia).

Além disso, a moratória da soja, acordo segundo o qual as companhias de commodities se comprometem a não comprar soja de terras recentemente desmatadas na Amazônia Legal, não se aplica ao Cerrado. Tentativas de fazer com que as empresas concordem com uma moratória semelhante para a savana, conhecida como o Manifesto do Cerradofracassaram em grande parte.

“O quadro que vemos é bem pior”, escreveu Strassburg. Se nada mudar, ele estima que mais de 30% da vegetação nativa remanescente do Cerrado seja removida para dar lugar à agricultura até 2050, resultando possivelmente na extinção de 480 espécies endêmicas de plantas; isso equivale a mais de três vezes todas as extinções de plantas documentadas desde o ano 1500”.

A vegetação do Cerrado é composta por gramíneas e árvores com raízes profundas que podem buscar água a até 15 metros de profundidade no subsolo. Quando essas árvores são removidas para dar lugar a grandes lavouras, há menos umidade lançada no ar, levando a um aumento das temperaturas e agravamento da seca / Foto: Gabriel Hofmann

Fontes de recursos hídricos em risco 

No fim de junho, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, falou em rede nacional de televisão para pedir o uso “consciente e responsável” de água e energia no país, que enfrenta a pior seca em quase um século.

Essa seca é uma péssima notícia para um país que gera 65% de sua eletricidade a partir de hidrelétricas. No nível individual, ela já significa um aumento nas contas de energia e até o risco de blecautes. A seca e os danos que ela traz à agricultura também representam uma ameaça à economia do país, que luta para se recuperar da pandemia de covid-19, na qual mais de meio milhão de brasileiros já morreram (579.330 óbitos, em 29/8/2021, segundo o Consórcio de Veículos de Imprensa, com dados das secretarias de saúde dos estados).

De acordo com cientistas, uma parte substancial da crise se deve à interferência humana. Em primeiro lugar, existem as mudanças climáticas causadas pelo homem, que tornam o país bem mais quente e seco. Além disso, outra parte importante do problema é que o Brasil está ameaçando gravemente suas duas principais fontes de recursos hídricos.

“Se preservarmos a Amazônia e o Cerrado, preservaremos as fontes de água em geral. Estamos falando de duas áreas extremamente importantes, e ambas têm sido desmatadas, queimadas ou alteradas”, explica Aquino.

A Amazônia é onde os chamados “rios aéreos” da América do Sul se originam: correntes atmosféricas de umidade que partem das florestas tropicais e se dirigem ao sul e sudeste do país, onde se transformam em precipitação. Essas regiões, por sua vez, abrigam até um terço da população do país, e são as maiores vítimas da seca recorde de 2021.

Assim como o Cerrado, a Amazônia também vê sua vegetação nativa encolher ano após ano com o desmatamento, que reduz o fluxo dos rios aéreos. Entre janeiro e julho de 2021, um total de 5.100 quilômetros quadrados de floresta foram perdidos, de acordo com o Inpe – uma área maior que três vezes a extensão do município de São Paulo.

O desmatamento tem crescido em velocidade acelerada sob o governo do presidente Jair Bolsonaro.

A vocação do Cerrado de fornecer grãos para o Brasil e o mundo depende diretamente da sua riqueza hídrica – cada vez mais em risco em decorrência do desmatamento e das mudanças climáticas. Na imagem, cachoeira na Chapada dos Veadeiros (GO). Foto: Max Moura Wolosker

Já o Cerrado é fonte de oito das doze bacias hidrográficas do país. Isso se deve em parte à topografia da savana, que se estende sobre o Planalto Brasileiro: a chuva que cai sobre o platô alimenta rios que fluem a jusante para as regiões de menor altitude, incluindo o Pantanal, a maior planície alagada do mundo.

“Se houver menos umidade e chuva no Cerrado, não haverá água para os rios e não teremos fornecimento de água para a população (do país). É catastrófico”, alerta Hofmann.

Os problemas hidrológicos do Cerrado também pressagiam tempos difíceis para o agronegócio brasileiro, e também para o fornecimento de alimento para humanos e animais do planeta.

O Brasil é hoje o maior produtor de soja do mundo, ultrapassando recentemente os Estados Unidos. O país fornece soja para países do mundo inteiro, incluindo a China, outras partes da Ásia e a União Europeia. Assim, o Cerrado é a região brasileira fundamental e insubstituível para a produção de soja.

De acordo com estudo publicado recentemente na revista científica World Development e assinado por cientistas do Brasil, Estados Unidos e Áustria, o aumento das temperaturas no Cerrado pode reduzir a produtividade da soja a um custo de US$ 4,5 bilhões por ano.

Os impactos mais devastadores, dizem os especialistas, podem não ser sentidos pelo agronegócio, mas por aqueles que não têm dinheiro para se adaptar às mudanças climáticas.

“Os grandes produtores de soja podem reduzir o ciclo de suas plantações para evitar a estação seca, ou podem investir em caros sistemas de irrigação. Os mais afetados, contudo, serão as comunidades tradicionais e agricultores familiares, que são aqueles que produzem alimentos para a sociedade”, diz Hofmann.

*Este texto foi publicado originalmente no site Mongabay Brasil, em 19/8/2021 e publicado aqui, no Conexão Planeta, por Mônica Nunes.

Foto: Max Pixel/Domínio Público (Coruja em uma plantação de soja no Cerrado)

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