Ex-MasterChef e ambientalistas se mobilizam contra liberação recorde de agrotóxicos
Petições reúnem mais de 166 mil assinaturas contrárias ao uso excessivo e crescente de pesticidas na agricultura brasileira.
Sentar-se
à mesa para uma refeição rica em frutas e verduras escolhidas
cuidadosamente nas prateleiras dos supermercados pode não significar uma
dieta tão saudável quanto parece. Isso porque desde 2016 a quantidade
de agrotóxicos liberados no Brasil vem seguindo uma tendência
desenfreada de aumento. Somente nos seis primeiros meses deste ano, 239
substâncias foram aprovadas no País, que já é um dos maiores
consumidores de pesticidas do mundo.
O total de agrotóxicos registrados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) na primeira metade deste ano é um recorde para o período e tem provocado reações de ambientalistas a consumidores comuns, passando por chefs de cozinha e profissionais sanitários. Na plataforma Change.org, mais de 166 mil pessoas assinaram petições posicionando-se contra o ritmo acelerado e excessivo de liberação desses produtos.
Uma das mobilizações foi criada pela chef de cozinha e semifinalista da terceira edição do reality de culinária MasterChef Brasil, Raquel Novais. “Temos todos que ter consciência e tomar a responsabilidade de esclarecer e lutar pelos nossos direitos. Pela nossa segurança”, destaca a cozinheira. Raquel, que abriu o abaixo-assinado online ainda em 2016, ano em que o número de agrotóxicos começou a crescer no País, conta que a situação vem piorando devido ao forte lobby da agroindústria e parlamentares que integram a bancada ruralista no Congresso.
“Desde o governo Temer a bancada ruralista tem ganhado força e agora tem conseguido ainda mais concessões. É absurdo notar que estamos indo na contramão da ciência, do bom senso, dos fatos”, indigna-se Raquel. “Influenciado pela bancada ruralista, o Ministério da Agricultura tem recebido mais poderes para avaliar e aprovar o uso desses venenos, enquanto as responsabilidades do Ibama e da Anvisa têm sido minimizadas. Assim temos um total desequilíbrio de forças, em que são privilegiados os interesses econômicos da agroindústria, em detrimento da segurança ambiental e da saúde”, acrescenta a chef.
Dados do Ministério da Agricultura mostram que em 2015 foram aprovados 139 agrotóxicos, passando para 277 em 2016, 405 no ano seguinte, chegando a 450 no ano passado. Como cozinheira, Raquel comenta que a preocupação com o excesso de agrotóxicos nos alimentos é grande. “Sempre dou preferência a produtos orgânicos e de pequenos produtores. Acho que muita gente não para pra pensar sobre isso, mas fica aqui a informação: alimentos sem agrotóxicos têm menor impacto ambiental e respeitam a sazonalidade”, diz.
A preocupação da chef é real. Criador de outro abaixo-assinado contra os agrotóxicos, o doutor em Ciência de Alimentos e inspetor sanitário Augusto Kluczkovski Junior explica que os Limites Máximos Residuais (LMR), ou seja, os resíduos de substâncias encontradas nos alimentos, são maiores no Brasil que em outros países. “A gravidade é alta desde muito tempo já”, revela Kluczkovski, completando que ainda há falta de controle e fiscalização por parte do Estado devido ao baixo número de técnicos em atuação na área.
Kluczkovski e Raquel Novais ainda chamam a atenção para o fato de o mercado nacional manter produtos com princípios ativos de alta toxicidade já banidos no exterior. “Enquanto, mesmo que ainda longe de estar em situações ideais, Europa e Estados Unidos proíbem uso de diversos agrotóxicos, o Brasil amplia o leque de disponibilidade”, destaca a chef.
Raquel enfatiza que os alimentos livres de pesticidas se desenvolvem da maneira correta e no tempo certo, fazendo que o sabor deles seja melhor. “Além disso, [os alimentos sem agrotóxicos] são mais saudáveis porque tiveram o desenvolvimento completo de seus nutrientes, ou seja têm maior concentração vitaminas e minerais”, completa.
O total de agrotóxicos registrados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) na primeira metade deste ano é um recorde para o período e tem provocado reações de ambientalistas a consumidores comuns, passando por chefs de cozinha e profissionais sanitários. Na plataforma Change.org, mais de 166 mil pessoas assinaram petições posicionando-se contra o ritmo acelerado e excessivo de liberação desses produtos.
Uma das mobilizações foi criada pela chef de cozinha e semifinalista da terceira edição do reality de culinária MasterChef Brasil, Raquel Novais. “Temos todos que ter consciência e tomar a responsabilidade de esclarecer e lutar pelos nossos direitos. Pela nossa segurança”, destaca a cozinheira. Raquel, que abriu o abaixo-assinado online ainda em 2016, ano em que o número de agrotóxicos começou a crescer no País, conta que a situação vem piorando devido ao forte lobby da agroindústria e parlamentares que integram a bancada ruralista no Congresso.
“Desde o governo Temer a bancada ruralista tem ganhado força e agora tem conseguido ainda mais concessões. É absurdo notar que estamos indo na contramão da ciência, do bom senso, dos fatos”, indigna-se Raquel. “Influenciado pela bancada ruralista, o Ministério da Agricultura tem recebido mais poderes para avaliar e aprovar o uso desses venenos, enquanto as responsabilidades do Ibama e da Anvisa têm sido minimizadas. Assim temos um total desequilíbrio de forças, em que são privilegiados os interesses econômicos da agroindústria, em detrimento da segurança ambiental e da saúde”, acrescenta a chef.
Dados do Ministério da Agricultura mostram que em 2015 foram aprovados 139 agrotóxicos, passando para 277 em 2016, 405 no ano seguinte, chegando a 450 no ano passado. Como cozinheira, Raquel comenta que a preocupação com o excesso de agrotóxicos nos alimentos é grande. “Sempre dou preferência a produtos orgânicos e de pequenos produtores. Acho que muita gente não para pra pensar sobre isso, mas fica aqui a informação: alimentos sem agrotóxicos têm menor impacto ambiental e respeitam a sazonalidade”, diz.
A preocupação da chef é real. Criador de outro abaixo-assinado contra os agrotóxicos, o doutor em Ciência de Alimentos e inspetor sanitário Augusto Kluczkovski Junior explica que os Limites Máximos Residuais (LMR), ou seja, os resíduos de substâncias encontradas nos alimentos, são maiores no Brasil que em outros países. “A gravidade é alta desde muito tempo já”, revela Kluczkovski, completando que ainda há falta de controle e fiscalização por parte do Estado devido ao baixo número de técnicos em atuação na área.
Kluczkovski e Raquel Novais ainda chamam a atenção para o fato de o mercado nacional manter produtos com princípios ativos de alta toxicidade já banidos no exterior. “Enquanto, mesmo que ainda longe de estar em situações ideais, Europa e Estados Unidos proíbem uso de diversos agrotóxicos, o Brasil amplia o leque de disponibilidade”, destaca a chef.
Raquel enfatiza que os alimentos livres de pesticidas se desenvolvem da maneira correta e no tempo certo, fazendo que o sabor deles seja melhor. “Além disso, [os alimentos sem agrotóxicos] são mais saudáveis porque tiveram o desenvolvimento completo de seus nutrientes, ou seja têm maior concentração vitaminas e minerais”, completa.
“Comer é um ato político”
“Acredito
muito numa frase que li recentemente: ‘Comer é um ato político. Somente
sabendo de onde vem a nossa comida, como ela é feita e o impacto que
causa na nossa sociedade é que poderemos ser agentes ativos de algum
tipo de mudança’”, conta Raquel Novais. A frase, citada pela
ex-participante do MasterChef e de autoria da empresária e chef de
cozinha Paola Carosella, é uma realidade na vida da analista e educadora
ambiental aposentada Leticia Antonioli, que produz parte de sua
alimentação em hortas orgânicas na sua casa.
Leticia também é autora uma das petições criadas na Change.org contra o “Pacote do Veneno”, como foi apelidado o projeto de lei 6.299/2002, que tramita no Congresso Nacional e pretende flexibilizar a Lei Federal de Agrotóxicos (7.802/89). Formada em Antropologia e moradora de Sobradinho (DF), a educadora ambiental prepara a terra de sua horta com adubo vegetal em canteiros elevados. “Mesmo estando em área rural a água é escassa. Ainda é preciso investir em captação de água da chuva, mas a horta é totalmente orgânica”, comenta a aposentada.
Por mais de 30 anos, Leticia trabalhou com educação ambiental, participando de programas de rádios, exposições, palestras e cursos em parques nacionais, escolas, comunidades rurais e associações de moradores em Piauí e Brasília. “Consigo ver que muita gente quer saúde mesmo e acredita na alimentação saudável. E o meio ambiente tem que estar saudável. Mas precisamos encorajar e empoderar opções como hortas orgânicas em espaços urbanos comuns, produção familiar sustentável em áreas rurais próximas às cidades e fundamentalmente banir o agrotóxico”, declara a aposentada.
Leticia conta que outros métodos de cultivo como a permacultura e a agrofloresta poderiam ser explorados e aumentariam a produtividade, contradizendo argumentos dos defensores dos agrotóxicos de que esses insumos são necessários para o aumento da produtividade no campo. “Criei a petição naquele momento como que gritando: ‘Basta!’. Chega de bancarmos os cegos e abstratos. É real! Agrotóxico não vai aumentar produção de alimentos coisa alguma!”, desabafa a aposentada. “Alimentação é e tem que ser saúde”, completa.
Para a analista ambiental, ganância e interesses de lucratividade do mercado têm interferência nessa questão. “Defensores do agrotóxico ganham dinheiro com ele”, diz. “É muito bom mobilizar pessoas e provocar questionamentos do suposto poder que nos agride mais que nos organiza, quando se sabe que as questões mais sérias da humanidade, como a ambiental, são adiadas, empurradas para o reino abstrato do tempo longínquo, embaixo do tapete”, finaliza.
O Mapa considera critérios agronômicos, sendo responsável pelo registro de pesticidas. Já à Anvisa cabe a avaliação toxicológica dos produtos, com foco na segurança da saúde humana. O Ibama, por sua vez, avalia os impactos ambientais causados por eles.
O Ministério da Agricultura informou que não autoriza agrotóxicos de forma isolada, já que a legislação e os procedimentos vigentes garantem que apenas produtos aprovados pela pasta, pela Anvisa e pelo Ibama podem ter seu uso autorizado. A nota do ministério frisa “que o aumento no número de registros de agrotóxicos dos últimos três anos não representa aumento do uso em campo, pois esses mesmos ingredientes ativos já eram comercializados por outras empresas, muitas vezes sob monopólio ou oligopólio”, que representam mais de 95% dos registros de agrotóxicos concedidos nos últimos três anos, sendo o restante representado por produtos para uso na agricultura orgânica e de baixa toxicidade.
A Anvisa esclareceu que vem implementando melhorias de processo para dar mais eficiência às análises, e que isso tem sido feito por meio de tecnologia, separação de processo por natureza de complexidade e remanejamento de pessoas. “Os critérios de segurança de avaliação dos produtos não mudaram. O que tivemos foram melhorias de processos e racionalização do trabalho. Ou seja, aumentamos a eficiência da equipe”, diz a nota enviada pela agência. Ainda segundo a Anvisa, a equipe de técnicos e gestores é formada por servidores de carreira com mais de dez anos de atuação no órgão.
O Ibama respondeu por meio do Ministério do Meio Ambiente. Um dos comunicados enviados trata de um levantamento do instituto, que afirma que “apesar do aumento do número de registros de defensivos agrícolas no País”, a venda desses produtos registrou redução entre 2016 e 2017. “[De 2016 para 2017], o valor total das vendas de ingredientes ativos no País caiu de 541.861,09 toneladas para 539.944,95”, diz trecho da nota.
Ainda de acordo com o órgão, “o objetivo da aprovação dos produtos genéricos é aumentar a concorrência no mercado e diminuir o preço dos defensivos, o que pode refletir na queda do custo de produção”.
Leticia também é autora uma das petições criadas na Change.org contra o “Pacote do Veneno”, como foi apelidado o projeto de lei 6.299/2002, que tramita no Congresso Nacional e pretende flexibilizar a Lei Federal de Agrotóxicos (7.802/89). Formada em Antropologia e moradora de Sobradinho (DF), a educadora ambiental prepara a terra de sua horta com adubo vegetal em canteiros elevados. “Mesmo estando em área rural a água é escassa. Ainda é preciso investir em captação de água da chuva, mas a horta é totalmente orgânica”, comenta a aposentada.
Por mais de 30 anos, Leticia trabalhou com educação ambiental, participando de programas de rádios, exposições, palestras e cursos em parques nacionais, escolas, comunidades rurais e associações de moradores em Piauí e Brasília. “Consigo ver que muita gente quer saúde mesmo e acredita na alimentação saudável. E o meio ambiente tem que estar saudável. Mas precisamos encorajar e empoderar opções como hortas orgânicas em espaços urbanos comuns, produção familiar sustentável em áreas rurais próximas às cidades e fundamentalmente banir o agrotóxico”, declara a aposentada.
Leticia conta que outros métodos de cultivo como a permacultura e a agrofloresta poderiam ser explorados e aumentariam a produtividade, contradizendo argumentos dos defensores dos agrotóxicos de que esses insumos são necessários para o aumento da produtividade no campo. “Criei a petição naquele momento como que gritando: ‘Basta!’. Chega de bancarmos os cegos e abstratos. É real! Agrotóxico não vai aumentar produção de alimentos coisa alguma!”, desabafa a aposentada. “Alimentação é e tem que ser saúde”, completa.
Para a analista ambiental, ganância e interesses de lucratividade do mercado têm interferência nessa questão. “Defensores do agrotóxico ganham dinheiro com ele”, diz. “É muito bom mobilizar pessoas e provocar questionamentos do suposto poder que nos agride mais que nos organiza, quando se sabe que as questões mais sérias da humanidade, como a ambiental, são adiadas, empurradas para o reino abstrato do tempo longínquo, embaixo do tapete”, finaliza.
O outro lado
A equipe da Change.org Brasil entrou em contato com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para ter uma resposta sobre o aumento na quantidade de registros de agrotóxicos.O Mapa considera critérios agronômicos, sendo responsável pelo registro de pesticidas. Já à Anvisa cabe a avaliação toxicológica dos produtos, com foco na segurança da saúde humana. O Ibama, por sua vez, avalia os impactos ambientais causados por eles.
O Ministério da Agricultura informou que não autoriza agrotóxicos de forma isolada, já que a legislação e os procedimentos vigentes garantem que apenas produtos aprovados pela pasta, pela Anvisa e pelo Ibama podem ter seu uso autorizado. A nota do ministério frisa “que o aumento no número de registros de agrotóxicos dos últimos três anos não representa aumento do uso em campo, pois esses mesmos ingredientes ativos já eram comercializados por outras empresas, muitas vezes sob monopólio ou oligopólio”, que representam mais de 95% dos registros de agrotóxicos concedidos nos últimos três anos, sendo o restante representado por produtos para uso na agricultura orgânica e de baixa toxicidade.
A Anvisa esclareceu que vem implementando melhorias de processo para dar mais eficiência às análises, e que isso tem sido feito por meio de tecnologia, separação de processo por natureza de complexidade e remanejamento de pessoas. “Os critérios de segurança de avaliação dos produtos não mudaram. O que tivemos foram melhorias de processos e racionalização do trabalho. Ou seja, aumentamos a eficiência da equipe”, diz a nota enviada pela agência. Ainda segundo a Anvisa, a equipe de técnicos e gestores é formada por servidores de carreira com mais de dez anos de atuação no órgão.
O Ibama respondeu por meio do Ministério do Meio Ambiente. Um dos comunicados enviados trata de um levantamento do instituto, que afirma que “apesar do aumento do número de registros de defensivos agrícolas no País”, a venda desses produtos registrou redução entre 2016 e 2017. “[De 2016 para 2017], o valor total das vendas de ingredientes ativos no País caiu de 541.861,09 toneladas para 539.944,95”, diz trecho da nota.
Ainda de acordo com o órgão, “o objetivo da aprovação dos produtos genéricos é aumentar a concorrência no mercado e diminuir o preço dos defensivos, o que pode refletir na queda do custo de produção”.