terça-feira, 5 de janeiro de 2021

Geladeira ou aquecedor? Motor quântico esquenta e esfria ao mesmo tempo

 Geladeira ou aquecedor? Motor quântico esquenta e esfria ao mesmo tempo 

Redação do Site Inovação Tecnológica - 30/12/2020 


 As assinaturas são claras: o dispositivo pode estar esquentando ou esfriando - ou as duas coisas ao mesmo tempo. 


[Imagem: Keiji Ono et al. - 10.1103/PhysRevLett.125.166802] 

 
 





Superposição de quente e frio 

O fenômeno da superposição quântica estabelece que uma partícula pode estar em dois estados ao mesmo tempo, ou em dois lugares simultaneamente - você só sabe o valor ou a posição reais quando faz uma medição, o que faz a superposição colapsar e a partícula assumir uma identidade ou uma posição definida. 


Se você já está acostumado com essa noção - bem demonstrada experimentalmente, é bom que se diga - então não vai estranhar muito o feito de Keiji Ono e colegas do Instituto Riken, no Japão. 

Ono criou um nanodispositivo que atua como um motor térmico, absorvendo calor ou liberando calor. 


Isso significa que o nanodispositivo pode funcionar tanto como uma minigeladeira, quanto como um aquecedor. 


Mas isso não é tudo: Com o toque quântico adicional da superposição, ele pode na verdade resfriar e aquecer ao mesmo tempo. 


Geladeira e aquecedor 

Normalmente, você não gostaria de combinar uma geladeira com um aquecedor. "Combinar um motor térmico tradicional com um refrigerador o tornaria uma máquina completamente inútil. Ele não saberia o que fazer," comenta Ono. 


Mas as coisas são diferentes quando você encolhe as coisas. Por exemplo, em nanoescala um refrigerador/aquecedor pode ser útil para alternar rapidamente entre as duas funções, em um chip de computação quântica, por exemplo. 


Em uma geladeira normal, como a que você tem em casa, há uma troca de calor entre dois volumes de fluido: Comprimir um deles faz com que ele aqueça, enquanto forçar o outro a se expandir faz com que ele esfrie. Se essas operações forem feitas em um ciclo periódico, os dois volumes de fluido trocarão energia e o sistema pode ser usado como uma máquina de calor ou como uma geladeira. 

No nanomotor, esse processo é feito aumentando ou diminuindo o hiato entre os níveis de energia internos de um elétron em um transístor. O elétron tem dois estados de energia possíveis, sendo que a lacuna entre esses dois estados de energia pode ser controlada aplicando um campo elétrico e micro-ondas. "Isso pode ser análogo à operação periódica de expansão-compressão de um fluido em uma câmara," disse Ono. 


Geladeira quântica 

Os ciclos desse nanodispositivo podem ser medidos porque o sistema "modula" as micro-ondas quando o elétron muda de nível de energia. E as micro-ondas reemitidas quando o elétron passa de um nível de energia mais alto para um nível de energia mais baixo são diferentes das micro-ondas reemitidas quando o elétron passa de um nível de energia mais baixo para um nível de energia mais alto. Isso permite definir claramente quando o aparato está funcionando como geladeira ou como aquecedor. 


Mas foi aí que veio a surpresa: A nanomáquina pode funcionar como geladeira e como aquecedor ao mesmo tempo, o que pode ser detectado na forma de um padrão de interferência de micro-ondas - o padrão de interferência é uma mescla das energias emitidas quando o dispositivo está aquecendo e daquelas emitidas quando ele está resfriando. 


"Houve uma correspondência quase perfeita entre o padrão de interferência experimental e o previsto pela teoria," disse Ono. "Isso pode permitir uma mudança rápida entre os dois modos de operação. Essa capacidade pode ajudar a criar novas aplicações com esses sistemas no futuro." 


Bibliografia: 
 
Artigo: Analog of a Quantum Heat Engine Using a Single-Spin Qubit 
Autores: Keiji Ono, S. N. Shevchenko, T. Mori, S. Moriyamaand Franco Nori 
Revista: Physical Review Letters 
Vol.: 125, 166802 
DOI: 10.1103/PhysRevLett.125.166802 
 

Guerra contra o plástico está nos distraindo de ameaças mais urgentes, alertam especialistas

 

Guerra contra o plástico está nos distraindo de ameaças mais urgentes, alertam especialistas

Redação do Site Inovação Tecnológica - 19/11/2020

Guerra contra o plástico está distraindo mundo de ameaças mais urgentes, alertam especialistas
Os plásticos representam um problema, mas não necessariamente o maior, diz o painel de especialistas.
[Imagem: University of Nottingham]

Guerra contra inimigo errado

Uma equipe de importantes especialistas ambientais lançou um alerta de que a "guerra contra os plásticos" sendo atualmente travada no mundo todo está eclipsando ameaças muito maiores ao meio ambiente.

O painel de 13 especialistas afirma que, embora os resíduos de plástico sejam de fato um problema, sua proeminência na preocupação da mídia e do público em geral com o meio ambiente está ofuscando ameaças maiores como, por exemplo, as mudanças climáticas e a perda de biodiversidade.

O argumento é que muito do discurso em torno dos resíduos plásticos é baseado em dados que nem sempre são representativos dos ambientes que foram amostrados - por exemplo, recentemente se comprovou que não há tanto plástico nos oceanos quanto se temia.

Os autores alertam que a poluição do plástico passou a dominar a preocupação do público com o meio ambiente e tem sido explorada politicamente, por exemplo, por meio de imagens emotivas da vida selvagem envolvida com lixo plástico e de manchetes alarmistas.

E isto é sério porque a aversão da população ao plástico pode encorajar o uso de materiais alternativos que têm efeitos potencialmente mais nocivos, algo que já aconteceu no caso dos gases projetados para salvar a camada de ozônio e que agora ameaçam o clima, e das lâmpadas fluorescentes compactas, que disseminaram o mercúrio por todo o planeta.

Alternativas que pioram as coisas

A equipe destaca que o plástico não é o único tipo de material poluente oriundo da atividade humana que contamina o meio ambiente. Outros exemplos incluem as fibras têxteis naturais, como algodão e lã, partículas carbonáceas esferoidais (restos de combustíveis fósseis) e partículas de desgaste dos freios de veículos - todas presentes em locais diferentes, onde podem ter efeitos ambientais adversos.

Esses materiais são frequentemente muito mais abundantes do que os microplásticos e alguns, como vidro, alumínio, papel e fibras naturais, estão associados a "plásticos alternativos" que são comercializadas como soluções para a poluição do plástico tradicional, mas na realidade são um passo para o lado, que não muda as práticas de consumo que estão na raiz do problema. Os impactos ecotoxicológicos de alguns desses materiais são menos conhecidos do que a poluição por plásticos e microplásticos, mas podem ter impactos significativos, diz a equipe.

Os autores do artigo apelam à mídia para garantir que as realidades da poluição do plástico não sejam deturpadas, particularmente na divulgação pública do problema, e exortam os governos a minimizar o impacto ambiental do consumo excessivo, por mais inconveniente que seja, por meio do projeto dos produtos, e da gestão de resíduos verdadeiramente circular.

"Estamos vendo um engajamento sem precedentes por parte do público com as questões ambientais, particularmente a poluição do plástico, e acreditamos que isso representa uma oportunidade em uma geração para promover outras questões ambientais potencialmente maiores. Este é um momento chave para destacar e abordar áreas como a 'cultura de jogar fora' da sociedade e reformular a gestão dos resíduos. Porém, se continuarmos a priorizar o plástico, essa oportunidade será perdida - e com grande custo para o nosso meio ambiente," ressaltou o professor Tom Stanton, da Universidade de Nottingham, no Reino Unido.

Bibliografia:

Artigo: It's the product not the polymer: Rethinking plastic pollution
Autores: Thomas Stanton, Paul Kay, Matthew Johnson, Faith Ka Shun Chan, Rachel L. Gomes, Jennifer Hughes, William Meredith, Harriet G. Orr, Colin E. Snape, Mark Taylor, Jason Weeks, Harvey Wood, Yuyao Xu
Revista: WIREs Water
DOI: 10.1002/wat2.1490

Físicos colocam partículas no hoje e no amanhã simultaneamente

 

Físicos colocam partículas no hoje e no amanhã simultaneamente

Redação do Site Inovação Tecnológica - 31/12/2020

Superposição temporal: Partículas podem estar no hoje ou no amanhã
Tudo acontece dentro de um cristal de diamante a temperatura ambiente.
[Imagem: Christophe Galland/EPFL]

Superposição temporal

Uma das mais impressionantes criações deste século, os cristais do tempo são estruturas cristalinas que apresentam uma periodicidade não no espaço, como nos cristais comuns, mas no tempo.

Perigosamente próximos de uma máquina de movimento perpétuo, segundo seu descobridor, o físico Frank Wilczek, esses cristais espaço-temporais poderão persistir mesmo em seu nível mais baixo de energia, quebrando as simetrias espacial e temporal e, eventualmente, sobrevivendo ao fim do Universo.

Agora, físicos demonstraram experimentalmente um fenômeno igualmente desafiador para o nosso senso comum: Uma partícula que existe simultaneamente em dois tempos diferentes.

É um tipo de superposição quântica, só que ocorrendo não no espaço - uma partícula que contém dois estados, por exemplo -, mas no tempo.

Em termos simples, é uma partícula que pode existir hoje e amanhã, ou ontem e hoje, ou ontem e amanhã - simultaneamente. Por ora, contudo, o experimento que demonstrou essa nova versão das chamadas correlações quânticas ocorre em "hojes" e "amanhãs" separados no tempo por períodos na casa dos picossegundos (4 x 10-12 segundo).

As coisas segundo a física clássica

A grande dificuldade em lidar com a superposição é que ela é destruída se qualquer tipo de informação sobre o local ou o tempo do evento vaza para o ambiente - um elétron ou um fóton desavisados passando por ali e entrando em contato com o experimento, por exemplo.

Santiago Velez e seus colegas da Escola Politécnica Federal de Lausanne, na Suíça, obtiveram evidências definitivas de uma superposição quântica temporal medindo a classe mais forte de correlações quânticas entre fótons (quant de luz) interagindo com fônons (quanta de vibração).

Os pesquisadores usaram um pulso de laser muito curto para disparar um padrão específico de vibração dentro de um cristal de diamante. Cada par de átomos vizinhos oscilava como duas massas ligadas por uma mola, e essa oscilação era síncrona em toda a região iluminada. Para conservar energia durante esse processo, a oscilação emite um fóton de uma nova cor, deslocada para o vermelho do espectro.

As mesmas coisas segundo a física quântica

No entanto, essa descrição clássica é inconsistente com os experimentos porque tanto a luz quanto a vibração devem ser descritas como partículas, ou quanta: A energia da luz é quantizada em fótons, enquanto a energia vibracional é quantizada em fônons (do grego antigo "foto = luz" e "fono = som").

Dessa forma, o processo descrito acima deveria ser visto como a fissão de um fóton proveniente do laser, criando um par de fóton e fônon - semelhante à fissão nuclear de um átomo dando origem a duas partes menores.

E essa não é a única deficiência da física clássica: Na mecânica quântica, as partículas podem existir em um estado de superposição, como o famoso gato de Schrodinger, que fica vivo e morto ao mesmo tempo.

Mais ainda, duas partículas podem ficar entrelaçadas (ou emaranhadas), perdendo sua individualidade: Tudo o que acontecer a uma afetará imediatamente a outra.

Superposição quântica no tempo

Velez e seus colegas usaram exatamente essa possibilidade, fazendo com que o fóton (luz) e o fônon (vibração) produzidos no cristal de diamante ficassem entrelaçados. Para fazer isso, eles projetaram um experimento no qual o par fóton-fônon pode ser criado em dois instantes diferentes. Em termos da física clássica, isso resultaria em uma situação em que o par é criado no momento t1 com 50% de probabilidade, ou em um momento posterior t2 com 50% de probabilidade.

Mas aí vem o "truque" que os pesquisadores usaram para gerar um estado entrelaçado. Com um arranjo preciso do experimento, eles garantiram que nem mesmo o menor traço do tempo de criação do par luz-vibração (t1 versus t2) fosse deixado no Universo - em outras palavras, eles apagaram todas as informações sobre t1 e t2.

A mecânica quântica prevê então que o par fônon-fóton se torna emaranhado e existe em uma superposição do tempo t1 e do tempo t2. Isto, que até agora era unicamente uma previsão teórica, foi espetacularmente confirmado pelas medições, que produziram resultados incompatíveis com a teoria probabilística clássica.

"Nosso estudo demonstra que mesmo um material comum [um diamante] em condições ambientais pode sustentar as delicadas propriedades quânticas necessárias para as tecnologias quânticas. Porém, há um preço a pagar: As correlações quânticas sustentadas por vibrações atômicas no cristal são perdidas após apenas 4 picossegundos - ou seja, 0,000000000004 de um segundo! Esta escala de tempo curta, no entanto, é também uma oportunidade para desenvolver tecnologias quânticas ultrarrápidas. Mas muita pesquisa ainda está por ser feita para transformar nosso experimento em um dispositivo útil - um trabalho para futuros engenheiros quânticos," disse o professor Christophe Galland.

Bibliografia:

Artigo: Bell correlations between light and vibration at ambient conditions
Autores: Santiago Tarrago Velez, Vivishek Sudhir, Nicolas Sangouard, Christophe Galland
Revista: Science Advances
Vol.: 6, no. 51, eabb0260
DOI: 10.1126/sciadv.abb0260