A proposta dispensa do licenciamento ambiental as atividades agropecuárias e de florestas plantadas.
A Câmara dos Deputados pode colocar em votação a qualquer momento o
substitutivo ao PL 3729/04, projeto de lei que busca criar um novo
“sistema” de licenciamento ambiental. O substitutivo elaborado pelo
deputado Mauro Pereira (PMDB/RS), relator da Comissão de Finanças e
Tributação, acaba, na prática, com o licenciamento ambiental brasileiro.
O relator avaliou os substitutivos aprovados anteriormente nas Comissões
de Agricultura e de Meio Ambiente, elaborados pelos deputados Moreira
Mendes (PSD/RO) e Ricardo Tripoli (PSDB/SP), respectivamente, e optou
por seguir a proposta da Comissão de Agricultura que flexibiliza regras e
reproduz vícios da PEC 65, que tramita no Senado e é fortemente
repudiada pela sociedade.
O substitutivo de Mauro Pereira busca facilitar empreendimentos do setor
elétrico e destaca que os custos ambientais e sociais representam 12%
do valor das obras de construção de usinas hidrelétricas. Como exemplo,
aponta a UHE de Belo Monte, que demandou R$ 5 bilhões para o atendimento
de condicionantes socioambientais.
O relator incorporou outras propostas polêmicas ao substitutivo e que
foram alvo de criticas e de mobilização contrária por organizações civis
e Ministério Público, como a que tramitou no Conselho Nacional do Meio
Ambiente (CONAMA), em pleno Carnaval, por iniciativa da Associação
Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (ABEMA).
O projeto de lei permite a dispensa e a simplificação do licenciamento,
sem critérios ou diretrizes gerais, o que fere princípios
Constitucionais e cria insegurança jurídica.
A proposta também delega aos Estados e municípios a definição de quais
empreendimentos estarão sujeitos ao licenciamento ambiental, de acordo
com a natureza, porte e potencial poluidor. O licenciamento poderia se
dar em três modalidades: ordinário, simplificado ou dispensa.
Essa
discricionariedade incluída no artigo 3o. do substitutivo, desconsidera
biomas, bacias hidrográficas e áreas estratégicas para conservação,
enfraquecendo a União na competência de dar diretrizes gerais para a
proteção do meio ambiente. O dispositivo permite, por exemplo, que uma
mineração seja dispensada de licenciamento em um estado e submetida à
licenciamento ordinário com EIA/Rima em outro.
O art. 4º, caput e §§, praticamente anistia e desobriga empreendimentos
implantados sem licença de compensatórias por passivos para
regularização, limitando apenas os impactos ao meio físico. Caso venha a
ser aprovado o texto impediria, por exemplo, a implantação de
infraestrutura de saneamento básico para as comunidades afetadas pela
hidroelétrica de Belo Monte, por não reconhecer o impacto socioambiental
da obra. Deixaria descobertos também moradores e comunidades das áreas
afetadas pelo dano da Samarco, na bacia do rio Doce, a quem caberia
simplesmente recompor, quando muito, matas ciliares danificadas,
desconsiderando ainda potenciais danos futuros que a atividade pode
acarretar.
A proposta dispensa do licenciamento ambiental as atividades
agropecuárias e de florestas plantadas, à exceção da instalação de novas
atividades quando houver restrições à sua implantação, estabelecidas em
zoneamento agroecológico aprovado por lei específica.
O único
zoneamento agroecológico aprovado atualmente é do da cana-de-açúcar, que
tampouco é aprovado por lei específica, mas sim pelo Decreto nº 6.961,
de 2009. Sendo assim, não havendo qualquer restrição legal, a entrada em
vigor da lei proposta liberaria de forma generalizada as atividades de
agricultura e floresta plantada.
O texto pode afetar também áreas protegidas, patrimônios tombados,
quilombos e terras indígenas, entre outros instrumentos da legislação
ambiental brasileira, por buscar “facilitadores”.
O Governo Temer se posicionará em relação aos projetos de lei por meio
da Casa Civil com uma nova proposta que reúne avaliação técnica do
Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ibama e demandas dos diversos setores
produtivos e da sociedade, incluindo outras pastas. Entretanto, o
conteúdo de tal proposta ainda não é de conhecimento público.
Sobre a votação
O licenciamento ambiental assegura a vida e garante a ordem social. Um
tema tão importante e estratégico como esse não pode ser discutido e
votado sem transparência e em meio à Olimpíada e a escândalos. Um bom
sinal é que o Ministério do Meio Ambiente assumiu, a partir da última
quarta-feira (3), agenda permanente de articulação direta com o
Congresso Nacional para assegurar a condução de pautas estratégicas como
essa para o país.
Para a SOS Mata Atlântica, a articulação política do MMA com o
Parlamento pode minimizar a pressão setorial sobre deputados e bancadas e
impedir graves retrocessos à legislação ambiental brasileira, como o
que ocorre com o licenciamento ambiental.
Entretanto, agora a sociedade
também precisa reagir para evitar que o substitutivo de Mauro Pereira ao
PL 3729/04 seja votado às escuras no Legislativo e se mobilizar para
aprovação de uma Lei moderna, que defenda o meio ambiente e a sociedade
sem retrocessos, e faça do licenciamento ambiental um instrumento
arrojado de ganho para o desenvolvimento socioambiental no país.
Fonte: Ciclo Vivo