Monitoramento pioneiro identifica extensão das áreas queimadas no Pantanal
Duda Menegassi domingo, 16 agosto 2020 14:28
Entre 12 de junho e 14 de agosto, as queimadas já consumiram cerca de
1.552.000 hectares no Pantanal brasileiro, o equivalente a mais de 1,5
milhão de campos de futebol. Os dados são do Laboratório de Aplicações
de Satélites Ambientais (LASA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) que desenvolveu um monitoramento pioneiro para calcular a
extensão atingida pelo fogo no bioma em tempo quase real.
O objetivo do
sistema, batizado de ALARMES (Alerta de Área Queimada com Monitoramento
Estimado por Satélite) é auxiliar as equipes que atuam no combate aos
incêndios florestais, em especial as brigadas do PrevFogo do Ibama,
parceiras da iniciativa.
A principal técnica de monitoramento de queimada feita por satélite é
através da identificação de focos ativos de calor, como faz o Programa
de Queimadas do INPE. Esse método localiza pontos de fogo de forma
rápida, mas não funciona para calcular a extensão da área atingida pelas
chamas.
“É muito comum a detecção de fogo ativo. Enquanto o satélite está lá
em cima, ele passa e se está pegando fogo ele detecta. E essa informação
dos focos de calor é dada alguns minutos ou horas depois que o satélite
passa, é muito rápido, é o monitoramento em tempo quase real. Depois
que o fogo acaba ou passa por uma região, é que a gente vai conseguir
monitorar a extensão que queimou.
Porque quando a gente está falando de
foco de calor, o satélite vê um ponto, não a área e quantos hectares
queimaram. Isso é muito mais complicado de fazer. O que se faz há muito
tempo é você detectar a área queimada depois que passa algum tempo, o
que em geral demora 1, 2 até 3 meses. Isso é o que a maioria dos centros
fazem e essa informação vai ser útil, mas a gente perde essa
temporalidade e pros gestores é muito difícil esperar esse tempo todo
para ter essa informação. Fica uma lacuna. Porque eles precisam
gerenciar o incidente e qual a real situação, o tamanho da área
atingida, a magnitude do evento. Em geral isso é muito custoso para
eles, porque eles precisam de veículo aéreo, contingente para monitorar a
área, para sobrevoar, ver a extensão” explica a professora do
Departamento de Meteorologia do Instituto de Geociências da UFRJ, Renata
Libonati, que é uma das coordenadoras do LASA.
O que o ALARMES faz é justamente calcular através de imagens de
satélite a extensão dessa área queimada. “O nosso produto consegue num
curto espaço de tempo, de um dia para o outro, fornecer a área queimada
dos dias passados. Em tempo quase real. O satélite passou ontem, eu pego
essa imagem, já processo e no dia seguinte eu já tenho a estimativa da
área que queimou. Essa é a grande diferença”, pontua Renata.
Ela esclarece ainda que pela rapidez com que a informação é
processada, há limitações no processo. “Por eu estar dando uma
informação muito rápido, ela é menos precisa do que uma informação
processada por semanas-meses. Mas, por outro lado, pro tipo de uso que
esse dado vai ter, que é assistir os gestores no gerenciamento da
resposta ao incidente, eles não querem uma precisão tão grande. De
repente em vez de 100 hectares, eu digo que são 90, mas por outro lado
eu estou dizendo para eles o que acabou de acontecer e eles podem usar
isso para melhor aplicar os recursos, para aplicar rapidamente autos de
infração de multa considerando o total da área queimada, melhorar as
estatísticas de combate e direcionar as equipes”, acrescenta.
A Nota Técnica
divulgada pelo Laboratório traz um mapa com o avanço do fogo no período
e também um mapeamento de confiabilidade das detecções feitas pelo
sistema de monitoramento. Quanto mais vermelho a área, mais confiável é
aquela informação; e quanto mais para o azul, menor a certeza. “No geral
os pontos mais azuis estão nas bordas das cicatrizes. A cada rodada do
modelo, ele vai atualizando essa informação, então esses lugares que
estão azuis agora, amanhã já vão estar com uma cor mais pro amarelo e
depois pro vermelho. Porque no geral essas bordas são as regiões que
ainda estão queimando. Fica difícil monitorar quanto queimou quando
ainda está queimando. Quando o fogo já se extinguiu, a detecção é
melhor”, esclarece a pesquisadora.
A ferramenta ainda é considerada um protótipo e está em fase de
validação no campo – um retorno que tem sido animador para as equipes. O
sistema foi financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico) e pelo PrevFogo. A metodologia foi
desenvolvida no âmbito da tese de doutorado de Miguel Mota Pinto, da
Universidade de Lisboa, através do projeto Andura, parceiro do
Laboratório da UFRJ na iniciativa.
O Laboratório está produzindo uma plataforma online onde esses dados
do monitoramento poderão ficar disponíveis para consulta online. De
acordo com a pesquisadora, a expectativa da equipe é conseguir lançar a
plataforma virtual até o final de agosto. Enquanto isso, as equipes têm
desenvolvido relatórios semanais para atualizar a situação do fogo no
bioma.
Sesc Pantanal desmente em nota discurso de fazendeiro ouvido por Salles
Duda Menegassi terça-feira, 25 agosto 2020 17:36
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, foi ao Pantanal na
última semana para sobrevoar as áreas queimadas acompanhado do
governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (DEM-MT). Na visita, Salles
encontrou com fazendeiros da região, descontentes com o “modelo de
preservação” e que responsabilizavam a Reserva Particular do Patrimônio
Natural (RPPN) do Sesc Pantanal pelas queimadas que assolam o bioma
desde julho. “Esse modelo que o Sesc implantou (…) de RPPN, não poder
criar gado, é a maior coisa para queimar o Pantanal, essa matéria
orgânica. Se não botar o boi, esse Pantanal não vai viver mais”, alegou
um dos homens diante de Salles em vídeo que circulou pelas redes. Nesta
segunda (24), o Sesc se pronunciou por meio de nota para desmentir as
informações. “São centenas de focos de calor, nenhum deles iniciado
dentro da RPPN, tampouco saído dela, como relatado equivocadamente nos
últimos dias”, afirma a nota.
“As informações são inverídicas e não apontam soluções para a
tragédia que assola o Pantanal, já que o fogo não atingiu somente a
reserva, mas comunidades pantaneiras, indígenas e fazendas. Do total já
queimado em Barão de Melgaço [MT] e Poconé [MT], apenas 12% da área
queimada corresponde à RPPN”, continua a nota, que pode ser lida na íntegra neste link.
A RPPN Sesc Pantanal
está localizada no município Barão de Melgaço, ao sul do estado do Mato
Grosso, e compreende uma área de 108 mil hectares do bioma. As
queimadas que se acentuaram ao longo do mês de julho no Pantanal
atingiram a reserva apenas no início de agosto, conforme esclarece a
nota, a partir de uma área vizinha.
“O fogo que entrou na RPPN Sesc Pantanal começou em área vizinha na
divisa norte, no dia 2 de agosto. Desde o início, toda a estrutura de
combate aos incêndios da reserva foi acionada para evitar a entrada
desse foco na RPPN, mas o fogo avançou em uma extensa área da unidade de
conservação em direção à divisa sul da reserva. Ao chegar na divisa
sul, o fogo encontrou com outro incêndio que ocorria na Fazenda São
Francisco do Perigara, desde o dia 30 de julho”, explica a nota. “Todo o
trabalho do Sesc Pantanal, neste momento, está concentrado em controlar
o fogo, distante cerca de 100 km do ponto em que tiveram início os
incêndios na Transpantaneira, em 16 de julho”, acrescenta.
E lembra que
segundo dados do Ibama/Prevfogo, 98% dos incêndios têm origem em ações
humanas.
O texto rebate ainda a acusação de que a RPPN teria expulsado o homem
pantaneiro e o gado do Pantanal com esse modelo de preservação. “O Sesc
Pantanal esclarece que, enquanto propriedade privada, optou que a RPPN
seguisse o perfil primitivo do Pantanal, que não tem gado, porém, não
questiona a atuação pecuária da região. Ao contrário, reconhece a
importância econômica da prática.
A instituição, portanto, não impõe seu
modelo de gestão ambiental nem considera pertinente que outro modelo
seja imposto para a RPPN, visto que se trata de áreas privadas. A
reserva, as fazendas que praticam a pecuária, as comunidades
tradicionais pantaneiras e indígenas são capazes de ocupar este
território, que é patrimônio natural da humanidade, e conviver
harmonicamente nele, com discussões que estejam amparadas no respeito,
bom senso e dados verídicos emitidos pelos órgãos competentes”.
A RPPN Sesc Pantanal foi criada em 1997 e é a maior da categoria no
país, com 108 mil hectares de extensão. A nota afirma que a reserva
realiza trabalhos de prevenção contra os incêndios florestais, “que têm
sempre origem externa, acontece durante todo o ano, por meio de aceiros,
monitoramento e campanhas de conscientização com a população
ribeirinha, feitas com a mais preparada brigada contra incêndios da
região. Todo esse trabalho de prevenção, porém, não foi capaz de superar
a seca acentuada, baixa umidade do ar e ventos fortes que colaboram
para o pior cenário dos últimos 22 anos no Pantanal brasileiro”.
De acordo com o Sesc, as práticas de manejo do fogo “de todos os que
vivem no e do Pantanal vão precisar ser revistas, considerando a
dinâmica do bioma”. E acrescenta que serão feitos estudos sobre os
impactos do fogo para fauna e flora, para melhor planejar as medidas
preventivas. Leia a nota na íntegra.
Polícia Federal descarta participação de brigadistas de Alter do Chão nos incêndios da Amazônia
Marina Lang quinta-feira, 27 agosto 2020 23:59
Quase um ano após a prisão dos brigadistas de Alter do Chão sob a
acusação de que eles teriam iniciado os incêndios na vegetação nativa da
Amazônia na região conhecida como Capadócia, no Pará, a Polícia Federal
concluiu que os pontos iniciais de fogo começaram a 2,3 km e a 4,6 km
de distância da região apontada como o suposto início pela Polícia Civil
do estado, que indiciou quatro bombeiros ligados às ONGs de proteção
ambiental da região.
Após uma perícia com duração de quatro meses, a PF constatou que,
além de os incêndios terem começado em pontos distantes da região
inicialmente apontada pela Polícia Civil, o fogo se originou por ação
humana. Agentes foram a campo investigar os princípios das queimadas,
além de analisar imagens de satélites. No entanto, de acordo com o
relatório, não foi possível identificar quem teria iniciado os incêndios
e, portanto, pede o arquivamento do inquérito. A conclusão diverge do
que foi apontado pelas investigações estaduais.
Baseado em depoimentos, o inquérito estadual indicou que os
brigadistas, supostamente, teriam iniciado as queimadas no intuito de
obter doações de ONGs e do ator Leonardo Di Caprio, que refutou as
acusações. A diferença, agora, é que a PF apontou que não é possível
identificar os autores do incêndio, e que tampouco existem evidências
que apontem para os investigados pela Polícia Civil do Pará.
“Dessa forma, considerando que foram feitos diversos estudos
técnico-científicos e levantamentos e que apesar de todos os esforços
empreendidos, nenhum resultou em uma definição significativamente clara
de autoria, e que efetivamente não existe nenhum elemento que comprove a
ação de algum dos investigados para a ocorrência do incêndio, resta
prejudicado o apontamento autoral”, finaliza o relatório da PF.
A prisão dos brigadistas teve repercussão internacional em setembro
do ano passado. Eles tiveram seus cabelos raspados e ficaram detidos por
dois dias. Depois de soltos, todos se mudaram para São Paulo temendo
retaliações por parte de grileiros de terra. Eles sempre negaram as
acusações.
O pedido de indiciamento ainda não foi acatado pelo Tribunal de
Justiça do Pará. O juiz responsável pelo caso é Alexandre Rizzi, que foi
advogado de defesa de uma madeireira pertencente à sua família no Pará.
Foi ele quem determinou a prisão preventiva dos brigadistas, sob
argumento de “garantia da ordem pública” a fim de, supostamente, evitar
“a reiteração da prática delitiva, além de garantir a colheita de
elementos para a instrução criminal”.
((o))eco apurou que edificações estão sendo feitas, atualmente, por residentes nos locais das queimadas.
Mais de 100 entidades assinam manifesto pela revogação de decretos que facilitam acesso a armas de fogo
25 de agosto de 2020 Suzana Camargo
Mais de 100 entidades assinam manifesto pela revogação de decretos e portarias que facilitam acesso a armas de fogo
A imagem revoltante acima mostra um veado-catingueiro abatido em São Vicente do Sul, na região central do Rio Grande do Sul. Assim como ele, milhares de animais são mortos por caçadores no Brasil todos os anos. Para que atrocidades como essa não se tornem ainda mais comuns, 137 organizações da sociedade civil enviaram uma carta – “Manifesto sobre Armas de fogo, Biodiversidade e Serviços ambientais” – aos presidentes da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e do Senado Federal, Davi Alcolumbre, pedindo a revogação de decretos e portarias que facilitam o acesso a armas de fogo.
“Temos acompanhado com grande preocupação o aumento da compra e, consequentemente, da disseminação massiva do uso de armas de fogo em nosso país, sobretudo desde o início da atual gestão do Governo Federal”, diz a carta coletiva. “É de extrema gravidade o fato de o Governo haver revogado três portarias do Exército que permitiam a rastreabilidade de armas, dificultando, e até impossibilitando, a identificação dos perpetradores de delitos os mais diversos. Também vale mencionar que decretos geraram ampliação da validade de registro para 10 anos e renovação automática para os ativos, reduzindo a verificação de capacidade técnica e psicológica dos proprietários de armas”.
De acordo com as entidades, um dos principais beneficiados pela “política armamentista do governo” é o grupo de Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs).
“O registro concedido pelo Exército e a consequente autorização de compra de armas e munições têm grande influência no aumento da caça ilegal a animais nativos do Brasil. Uma vez que as armas foram compradas e registradas, é quase impossível fiscalizar como serão utilizadas”, denunciam as organizações. “A diminuição da diversidade dos animais silvestres ocasionada pela caça acarreta em impactos diretos sobre a estabilidade climática, deficiências nos ciclos naturais e outros serviços ecossistêmicos dos quais depende a nossa economia”.
Entre os signatários do manifesto público estão o Observatório de Justiça e Conservação, WWF- Brasil, Rede de ONGs da Mata Atlântica, Observatório do Clima, Fórum Brasileiro de ONGs, Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais, Proteção Animal Mundial e Instituto Sou da Paz.
“Pedimos medidas urgentes por parte do parlamento brasileiro para que pautem e aprovem os Projetos de Decretos Legislativos que tratam do tema a fim de sustar esse processo de facilitação de acesso dos cidadãos (CACs) às armas e às munições que contribuem para a deterioração da segurança pública de nossa população e a destruição das condições de vida silvestre em nosso país”, conclamam as entidades.
Conforme mostramos aqui, em outras reportagens do Conexão Planeta, 73% dos brasileiros são contra o porte de armas e 93% da população é contra a caça de animais silvestres.
Gato-maracajá morto por caçador de javalis
Atualmente, no Brasil, somente está liberada a caça de controle a uma espécie animal exótica e invasora, o javali-europeu (Sus scrofa) e a seu híbrido, o porco-doméstico (javaporco).
Confira o texto do Manifesto sobre Armas de fogo, Biodiversidade e Serviços ambientais, na íntegra, com o nome de todos seus signatários aqui.
Leia também:
Em carta aberta, governadores de 13 estados e do Distrito Federal pedem revogação do decreto das armas
Em vídeo, artistas protestam contra a liberação da caça de animais no Brasil Contra a caça de animais silvestres: por mais vida e paz em nossas florestas!
Fotos: ONG Rede de Proteção Ambiental e Animais – REPRAAS
Suzana Camargo
Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.
Pesquisa encontra 36 tipos diferentes de pesticidas em ninhos com filhotes de aves mortas
18 de setembro de 2019 Suzana Camargo
Em 2018, a organização de conservação da natureza Vogelbescherming Vlaanderen, da Bélgica, começou a receber uma série de relatos de pessoas que estavam encontrando filhotes de aves, mortos em ninhos.
A ONG decidiu então fazer uma pesquisa para tentar encontrar a razão da mortalidade dos jovens pássaros. Com o dinheiro arrecadado através de uma campanha de crowdfunding, foram feitas análises nos ninhos onde estavam as aves mortas.
O resultado da investigação foi divulgado há poucas semanas e é chocante. Foram descobertos 36 tipos de diferentes de pesticidas nos ninhos.
“Isso é preocupante. Especialmente porque os filhotes tinham duas semanas de vida, no máximo, e nunca estiveram fora da do ninho”, diz Geert Gommers, especialista em pesticidas.
“Detectamos fungicidas (contra fungos), herbicidas (contra ervas daninhas), inseticidas (contra insetos) e biocidas. É surpreendente que observamos ainda a presença de DDT em 89 dos 95 ninhos examinados. O uso deste inseticida foi oficialmente proibido na Bélgica desde 1974 e o DDT ainda está presente em nosso ambiente depois de todo esse tempo”, destaca o autor da pesquisa.
Aves encontradas mortas nos ninhos contaminados com pesticida
Declínio das aves
No ano passado, novos estudos revelaram que os pesticidas estavam provocando um declínio assustador de aves na Europa.
A pesquisa realizada na França indicava que os agrotóxicos estavam matando os insetos e com o seu desaparecimento, já que são alimentos dos pássaros, dezenas de espécies de aves tiveram uma redução brutal no número de indivíduos porque padeciam de fome. Algumas apresentaram uma diminuição de até 1/3 nos últimos 15 anos.
Os pesquisadores consideravam a situação catastrófica. Alertavam que se nada fosse feito, os campos do interior francês se tornarariam “desertos”.
Em comunicado à imprensa, o Centro Nacional de Pesquisas Científicas da França afirmava que uso indiscrimado de pesticidas e a monocultura, sobretudo de trigo e milho, são os principais responsáveis pela morte dos insetos e das aves.
Impacto sobre as abelhas
Diversos estudos também têm confirmado os efeitos nocivos dos pesticidas sobre as abelhas. E não é só. Pesquisadores denunciam que os agrotóxicos utilizados na agricultura são prejudiciais ainda para outros polinizadores, como as borboletas.
Na maioria desses trabalhos científicos, as evidências recaem sobre um tipo específico de pesticida: o neonicotinóide.
No estudo “Impacts of neonicotinoid use on long-term population changes in wild bees in England”, realizado pelo Centre for Ecology and Hydrology do Reino Unido, cientistas apontaram o declínio da população de 62 abelhas selvagens na Inglaterra, entre os anos de 1994 e 2011 – período este em que os neonicotinóides tornaram-se bastante populares e seu uso intensificado.
Derivado da nicotina, o neonicotinóide é usado para controlar pragas. O grande diferencial deste agrotóxico é ser sistêmico, ou seja, ele se espalha por toda a planta: folhas, flores, ramos, raízes e até, néctar e pólen. Em geral, ele é colocado na semente e a partir daí, toda a planta fica com vestígios dele.
Em toda Europa, estima-se que já houve um declínio de 80% na população de insetos, afetando diretamente a sobrevivência das aves no continente. Dados do European Bird Census Council indicam uma redução de 55% desde a década de 80. Das 39 espécies de aves “rurais” analisadas, 24 tiveram uma queda em seus números.
Entre as principais espécies impactadas estão as cotovias (Alauda arvensis), as papuxas (Sylvia communis) e a sombria (Emberiza hortulana). De cada dez petinha-dos-prados (Anthus pratensis), por exemplo, sete sumiram das plantações francesas.
Fotos: divulgação Vogelbescherming Vlaanderen
Suzana Camargo
Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.
Em novembro de 2015, a região da Bacia do Rio Doce foi devastada pelo rompimento da barragem de Fundão, próximo à Mariana, em Minas Gerais. Considerada uma das maiores tragédias ambientais da história do país, o acidente fez com que um mar de lama com rejeitos de metais pesados e elementos químicos da mineradora Samarcodestruísse o vilarejo de Bento Rodrigues (matando 19 pessoas) e contaminasse todo o leito do rio, tirando a vida de centenas de animais e deixando um impacto de longo prazo sobre todo o ecossistema local.
Desde 2017, a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), instituição global da área de conservação, trabalha para assessorar e fazer recomendações, com base em avaliações científicas e independentes, sobre as melhores estratégias para recuperação e preservação da bacia do Rio Doce.
No final de julho, a IUCN-Brasil apresentou um novo relatório em que destaca a vulnerabilidade da região e como as mudanças climáticas podem influenciar no processo de restauração da bacia.
Os cientistas citam, por exemplo, as fortes tempestades que ocorreram no primeiro semestre de 2020 na região sudeste do país, onde fica a Bacia do Rio Doce, com secas extremas no período de estiagem. Os especialistas envolvidos no estudo recomendam que sejam usadas soluções baseadas na natureza na manutenção da infraestrutura hídrica, a redução das emissões de gases de efeito estufa e capacitação para as autoridades estaduais e locais se adaptarem aos eventos climáticos por meio de mais cooperação e participação.
O Conexão Planeta enviou algumas perguntas para os cientistas responsáveis pelo relatório – Peter May, Christianne Maroun, Francisco Barbosa, Yolanda Kakabadse e Maria Cecília Wey de Brito.
Seguem abaixo suas respostas:
Quais são os principais pontos de preocupação levantados em relação à recuperação da Bacia do Rio Doce apontados por esse novo relatório?
O relatório aponta, principalmente, os potenciais riscos que a mudança climática pode significar para a região, assim como a vulnerabilidade desse território a esses efeitos. Também analisa programas do TTAC (Termo de Transação e Ajustamento de Conduta) que podem ter sua execução e resultados impactados pelos eventos extremos, assim como as possibilidades de mitigação e adaptação e também as oportunidades que a restauração pode trazer para uma transição para uma economia de baixo carbono, e os programas que podem impulsionar essa transição.
É importante ressaltar que os Programas do TTAC não levaram em conta os potenciais impactos das mudanças climáticas no desenho das intervenções para restauração da bacia, embora eventos climáticos extremos tenham ocorrido, expondo a vulnerabilidade das populações e do rio às intempéries indicadas por cientistas como presságio de mudanças climáticas mais drásticas para o futuro.
Como a bacia ainda é afetada pelo desastre ocorrido? Que impactos são sentidos pela fauna e flora da região?
Embora os dados sejam conflitantes, há possíveis danos associados à qualidade da água afetando o consumo de peixes, o que levou à manutenção do banimento de pesca em partes do rio. As condições atuais da qualidade da água provavelmente voltaram às condições prevalecentes antes do desastre, mas isto não quer dizer que estamos afirmando que a qualidade da água é boa, já que ainda foram relatadas violações de alguns elementos acima dos limites da legislação (As, Cu, Mn Ni, Zn) em amostras de pescado, provavelmente devido a fatores como desmatamento, erosão, esgoto doméstico e rejeitos da mineração de ferro, como também impactos sobre a diversidade microbiana de diferentes ecossistemas da bacia.
Outros autores também chamam atenção para o fato de que a permanência dos rejeitos constitui um fonte de contaminação crônica, mas os estudos ainda estão em andamento.
O relatório recomenda a redução da emissão de gases de efeito estufa para limitar o aumento da temperatura. Como isso seria possível localmente?
As ações mundiais de combate às mudanças climáticas têm duas vertentes muito claras: mitigação e adaptação. Mitigação diz respeito aos esforços de redução de emissões de GEE nos processos da nossa sociedade para que possamos no longo prazo reduzir o avanço das mudanças climáticas; e a adaptação refere-se a modificarmos processos já existentes para nos protegermos das mudanças climáticas já em curso ou que irão acontecer.
Ambas as vertentes fazem parte de uma ação climática conjunta e coordenada para que haja o enfrentamento do problema que tem escala planetária. A proposta de redução das emissões não irá reduzir diretamente a tendência de aumento da temperatura na região, pois o aumento relatado no documento já irá acontecer independentemente de qualquer ação praticada hoje (ele é resultado da soma das emissões já realizadas no mundo).
Porém, é fundamental adotar práticas de baixo carbono em todas as regiões do planeta para somar esforços de forma que as mudanças climáticas e os eventos extremos causados por elas não sejam ainda mais intensos. Além disso, as práticas de mitigação das emissões de GEE geralmente reduzem a poluição local devida a outros poluentes diferentes dos GEE, como por exemplo, óxidos de enxofre e nitrogênio, que provocam chuva ácida.
O estudo afirma que alguns programas de restauração da Fundação Renova apresentam riscos. Poderia citar alguns deles e explicar a razão pela qual eles não são os mais seguros?
Por exemplo, a ocorrência de secas severas ou a redução das chuvas (previstas nos estudos de clima da região) pode ter um forte efeito na sobrevivência das mudas usadas em programas de revegetação, restauração de nascentes e recuperação de áreas degradadas, gerando custos mais elevados devido à necessidade de repetir o plantio, além de atrasos na finalização da restauração.
Ao mesmo tempo, uma redução significativa nas chuvas pode deixar a vegetação mais vulnerável e suscetível a incêndios. Nesse caso, a seleção de espécies mais resilientes à essas alterações é um exemplo de medida que pode ser adotada. Estudos referenciados no relatório, mostram que a mudança climática também pode impactar negativamente os esforços para a retomada das atividades agropecuárias. Também é importante ressaltar que alguns programas, como o de Uso Sustentável da Terra, já adotam essa perspectiva, com análises detalhadas sobre os potenciais riscos à restauração.
Além disso, a maior intensidade e frequência de eventos extremos prevista para a região pode danificar outras estruturas da restauração, caso as mesmas não sejam implantadas levando em consideração essas mudanças no clima. Por exemplo, os depósitos de rejeitos em Candonga e outras construções em andamento.
Quais seriam algumas das soluções baseadas na natureza que ajudariam a recomper aquele ecossistema?
Os esforços já empreendidos pela Fundação Renova ainda em escala piloto de renaturalizar os cursos de água, no caso de partes do Rio Gualaxo do Norte onde ocorreu o desastre, são exemplos de soluções baseadas na natureza que poderiam ser empreendidas em escala, assim como a substituição de ações que envolvem mudanças estruturais. Outros exemplos são a recuperação de APPs e nascentes e a consolidação de Unidades de Conservação dentro da Bacia.
Novo relatório de 140 páginas lança luz sobre o tráfico ilegal de
animais silvestres na Amazônia. O estudo revela que milhões de aves,
tartarugas, mamíferos e peixes tropicais estão sendo retirados da
natureza e comercializados internamente ou exportados para Estados
Unidos, Europa, China, Oriente Médio e outros lugares. Muitos estão em
perigo de extinção.
O comércio internacional ilícito é facilitado por leis e penalidades
fracas, manutenção inadequada de registros governamentais e aplicação
ineficiente da lei, assim como corrupção generalizada, suborno, fraude,
falsificação, lavagem de dinheiro e contrabando.
Embora alguns animais sejam apreendidos e alguns contrabandistas de
baixo escalão sejam capturados, os líderes desta operação criminosa
global raramente são levados à justiça.
O relatório indica que o tráfico não só prejudica a vida silvestre
como também dizima ecossistemas e coloca em risco a saúde pública. Os
pesquisadores apontam que a covid-19 provavelmente foi transmitida aos
seres humanos por animais traficados e que medidas mais duras contra o
comércio ilegal da fauna silvestre da Amazônia brasileira poderiam
evitar a próxima pandemia.
A Amazônia brasileira perde todo ano milhões de animais silvestres para o tráfico ilegal, de acordo com um novo relatório da organização britânica Traffic.
Canários-da-terra e outros pássaros, incluindo araras e papagaios
raros, são capturados, traficados e vendidos como animais de estimação.
Alguns são leiloados para se tornar futuros competidores em concursos de
aves.
Peixes ornamentais destinados a aquários domésticos também são
retirados da Amazônia, entre eles o tetra-azul e o tetra-cardeal. O
pirarucu, um dos maiores peixes de água doce do mundo, é capturado
ilegalmente na natureza, misturado em meio a espécimes criados em
cativeiro e enviado para os Estados Unidos em grande quantidade.
Esse e outros peixes são servidos na mesa de jantar, assim como
tartarugas de água doce e seus ovos, enquanto antas, porcos-do-mato e
outros mamíferos são vendidos no Brasil como carne de caça. Já dentes,
cabeças e peles de onças-pintadas são enviados à China, para uso na
medicina tradicional ou como artigo de decoração.
“A captura abrangente e descontrolada de animais e plantas silvestres
para o tráfico está trazendo graves consequências à biodiversidade
brasileira, à economia nacional, ao Estado de Direito e à boa
governança”, diz o relatório.
O estudo de 140 páginas foi conduzido pela consultora em
biodiversidade Sandra Charity junto com Juliana Ferreira, diretora
executiva da Freeland Brasil. Seu foco foram espécies da Floresta Amazônica, com destaque para o comércio de aves.
Uma das descobertas da pesquisa foi a existência de um segmento cada
vez maior do comércio ilegal que “lava” pássaros vítimas de caça,
valendo-se de uma rede legal de criação de aves em cativeiro.
As autoras também detectaram que poucas agências governamentais
mantiveram registros ou reportaram dados sólidos que quantificassem o
verdadeiro escopo do problema. Em muitos casos, os registros nem mesmo
identificavam as espécies ou o número específico de animais apreendidos
pelas autoridades, enquanto os dados provenientes da Amazônia eram
“notoriamente escassos”.
“Apreensões significativas são feitas diariamente por ações policiais
no estado do Amazonas, mas não tivemos acesso aos dados”, diz Juliana
Ferreira. “Pelo que vimos, [o comércio ilegal] é ainda maior do que
imaginávamos.”
São tendências difíceis de acompanhar, uma vez que os dados de
apreensão representam apenas uma fração dos animais retirados
ilegalmente da natureza. A partir das informações existentes, porém,
pode-se notar um claro aumento no contrabando de algumas espécies: as
apreensões de onças-pintadas, por exemplo, aumentaram em 200% de 2012 a
2018.
O relatório aponta que a falta de dados abrangentes tende a minimizar
a severidade do tráfico de animais silvestres no Brasil – minando os
esforços de fiscalização, as medidas legais e o investimento necessário
para combatê-lo.
O estudo adverte, ainda, que o comércio ilegal está tendo sérias
consequências não apenas para os animais apreendidos, como também para
espécies, ecossistemas e povos inteiros — na Amazônia e em todo o mundo.
A atual epidemia do covid-19, por exemplo, causada por um coronavírus
que migrou da natureza para os humanos, lembrou ao mundo que o tráfico
de animais silvestres não é apenas uma questão de conservação da
biodiversidade, argumenta Ferreira. É tanto uma questão de saúde pública
quanto uma questão de biossegurança.
Impacto em cascata sobre os ecossistemas
O atual comércio ajudou a acelerar o desaparecimento de 1.173
espécies que enfrentam a extinção no Brasil. Muitas vezes, quem são
capturados são os indivíduos maiores, mais fortes e mais bonitos —
machos de aves, por exemplo —, impactando toda a população daquela
espécie. Os poucos sobreviventes em um grupo, por sua vez, podem se
tornar consanguíneos, enfraquecendo o patrimônio genético.
Segundo as autoras, retirar indivíduos de populações selvagens de
forma sistemática pode criar um efeito dominó, gerando impactos em
cascata e desmantelando os sistemas biológicos e físicos que sustentam
toda a vida na Terra.
Sem aves que atuam como dispersoras de sementes, as árvores e plantas
de que muitos animais dependem para se alimentar desaparecem. Vale
lembrar que as florestas tropicais atuam como enormes armazenadoras de
carbono, ajudando a minimizar os efeitos das mudanças climáticas, além
de amortecer enchentes e fornecer água potável para milhões de pessoas.
Perder milhões de animais todos os anos para o tráfico poderia não
apenas levar à existência de florestas vazias, mas eventualmente causar
o colapso de ecossistemas inteiros.
O tráfico como crime organizado global
O comércio ilegal de animais selvagens também está ganhando cada vez
mais atenção em função das redes criminosas transnacionais que abrangem
quase todos os continentes, gerando lucros gigantescos e cultivando a
corrupção em grande escala.
O Fundo Mundial para o Ambiente (GEF, na sigla em inglês) descreve
o tráfico de animais silvestres como “um dos negócios ilegais mais
lucrativos do mundo”. É classificado como a quarta maior fonte mundial
de ganhos criminosos, gerando até 23 bilhões de dólares por ano. Com tanto dinheiro circulando de modo ilícito, o tráfico tornou-se uma questão de segurança nacional em todo o mundo.
Mesmo que as autoridades ambientais possam apreender animais
comercializados ilegalmente e prender alguns contrabandistas, o estudo
indica que a aplicação da lei não está visando os líderes reais que
dominam o comércio ou suas cadeias de abastecimento. Como resultado, a
indústria do crime ambiental prospera, produzindo corrupção
generalizada, suborno, fraude, falsificação, lavagem de dinheiro e
contrabando.
Infelizmente, “a legislação existente não considera o tráfico de
animais selvagens um ‘crime grave’”, diz o relatório, alertando que há
diversas brechas e inconsistências nas leis. Como o comércio ilícito é
um negócio tão lucrativo, penas leves significam poucos obstáculos. Uma
“detenção” de 6 a 12 meses é comum nesse segmento, o que é apenas uma
restrição à liberdade, e não tempo de prisão propriamente dita. Muitas
vezes, essa pena é negociada para incluir parte do cumprimento em
serviço comunitário.
Além disso, o relatório documentou extensas evidências de fraude
cometida por criadores privados e comerciais no Brasil que falsificaram
licenças, etiquetaram indevidamente declarações de espécies e
adulteraram anilhas de identificação emitidas pelo governo para vender
pássaros adquiridos ilegalmente junto às espécies regulamentadas. Este
mercado específico é, em grande parte, doméstico – o que alimenta uma
cultura bastante consolidada no Brasil, que é a de manter pássaros
(especialmente canários) como animais de estimação. O Ibama estimou que,
só em 2015, cerca de 3 milhões de aves passeriformes foram registradas
por meio de práticas fraudulentas governo – 75% do total.
Tartaruga-de-cabeça-grande-do-Amazonas (Peltocephalus dumeriliana), capturada no Rio Negro. Foto: Staffan Widstrand / WWFControlando o tráfico na Amazônia
Embora o objetivo do novo relatório não fosse fazer uma avaliação
extensa do comércio internacional, as autoras detectaram que compradores
estrangeiros estão motivando grande parte dele. “Parece que alguns
países asiáticos estão adquirindo mais espécies no Brasil, tais como
pepino-do-mar, cavalos-marinhos, peixes ornamentais, onças e tubarões”,
diz Ferreira, acrescentando que os Estados Unidos são os principais
consumidores de peixes ornamentais e de couro feito de pele de pirarucu.
Aves, anfíbios e répteis normalmente são vendidos a colecionadores
europeus, e o Oriente Médio é um mercado para aves de rapina da
Amazônia.
O comércio digital – a internet, as mídias sociais e os grupos de
mensagens – tornaram-se “escritórios de vendas” chave para os animais
selvagens e produtos feitos a partir deles. A própria “mercadoria” é
movida de todas as maneiras imagináveis: por meio de carros, ônibus,
barcos, aviões e serviços de entrega durante a noite. “Mulas” humanas
foram detidas com pássaros ou ovos colados a seus corpos, ou escondidos
dentro de roupas. Uma fronteira permeável de cerca de 13 mil
quilômetros entre a Amazônia brasileira e sete países cria um fluxo
fácil. As fronteiras peruanas e colombianas, no noroeste da Amazônia,
formam um “eixo particularmente relevante” para o tráfico, observou o
relatório.
Segundo Sandra Charity, autora principal do estudo, o combate ao
comércio ilegal exige que ele seja reconhecido e tratado como um crime
grave. Também são necessários dados mais completos que viabilizem um
planejamento estratégico e reforcem a aplicação da lei,. Leis nacionais
mais duras que mirem nos traficantes profissionais também permitiriam a
aplicação das medidas previstas pela Convenção das Nações Unidas sobre o
Crime Organizado..
“Sem um mercado, não há comércio. Portanto, educar os consumidores é
fundamental”, conclui Juliana Ferreira. “Em última análise, é uma
questão de escolher por que estamos comprando aquele animal, ou produto
da vida silvestre, e se vale a pena. Culturas são dinâmicas e precisam
evoluir. Precisamos começar a mudar a maneira como vemos a vida
silvestre como mercadoria , e também entender que amar um animal pode
equivaler a aprisioná-lo”.
Restauração ecológica, caminho para superarmos a crise hídrica
Artigo de Natasha Choinski
[EcoDebate]
Como jamais visto, o Paraná enfrenta há meses uma séria crise hídrica,
potencializada por um momento de pandemia, que não será tão simples de
superar. A maioria dos reservatórios de abastecimento público,
principalmente os da capital paranaense, estão muito abaixo do nível
normal. Além disso, o momento de estiagem ainda pode se estender por, no
mínimo, mais um mês.
Mas o que podemos fazer diante desse cenário?
Enquanto muitos preferem tratar somente as consequências da má gestão
dos recursos hídricos, agindo apenas na redução de uso da água,
principalmente por parte dos consumidores, é necessário o pleno
entendimento para o tratamento adequado da causa de toda essa
problemática. Como uma das possíveis soluções, as florestas
apresentam-se como fundamentais neste processo.
São as florestas que regulam todo o ciclo da água, influenciando
diretamente nos regimes regionais de chuva e, consequentemente, na
disponibilidade desse recurso. Ainda, são elas que auxiliam na
qualidade, pois evitam erosão e sedimentação de cursos d’água, além de
regular todo o fluxo dentro de uma bacia hidrográfica, garantindo, dessa
maneira, o reabastecimento de nascentes, rios, lagos e aquíferos.
Assim, a relação entre as florestas e a água é de interdependência.
Interferências negativas realizadas em ambientes florestais, como os que
enfrentamos recentemente, onde os índices de desmatamento e queimadas
são recordes no Brasil, afetam diretamente no regime hídrico de uma
região, potencializando a indisponibilidade de água.
A compreensão desse cenário de interdependência nos permite avaliar
que a resposta mais simples de como superar uma crise hídrica e se
preparar para um futuro próximo mais seguro neste sentido, é realizando
investimentos em ações de conservação de remanescentes florestais
nativos e restaurando ambientes estratégicos.
Hoje, para contribuir nesse tipo de intervenção, existem várias
modelagens ambientais que são capazes de processar dados e auxiliar no
desenvolvimento de gestão das bacias hidrográficas. Isso acontece, por
exemplo, por meio da mensuração de quantidade de áreas naturais
necessárias para a recarga hídrica de uma região, que embasam a
definição de ambientes mais estratégicos para ações de preservação e
restauração.
É necessário compreender, ainda, que se começarmos a restaurar uma
área integralmente destruída hoje, ela levará um período de, no mínimo,
cinco anos para começar a se reestabelecer como ecossistema, retornando
seus processos e fluxos que permitam a volta da água.
Dessa maneira, mesmo que de forma lenta, a restauração ecológica,
aliada à conservação de remanescentes florestais, é a maneira mais
estratégica para salvar o sistema hídrico. Por isso, é preciso entender a
urgência de se tratar com qualidade a causa de toda essa problemática,
garantindo água de qualidade para o nosso futuro.
Natasha Choinski, Mestre em Gestão Ambiental e Analista de
Processos Ambientais da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e
Educação Ambiental (SPVS).
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Devastação da Amazônia já afasta investimentos externos
Engenheiro Ambiental enfatiza destruição da Floresta Amazônica, fragilidade da fiscalização, relaxamento em exigências de proteção, ameaças à população indígena a consequente redução de investimentos externos
Por Ágata Marcelo
Eugenio Singer, presidente da Ramboll Brasil, subsidiária de uma das maiores consultorias ambientais do mundo, e do Conselho de Administração do Instituto Pharos, organização dedicada à defesa dos recursos naturais, salienta que a agenda ambiental torna-se decisiva para a retomada das atividades econômicas pós-pandemia da Covid-19. “No Brasil, porém, os graves impactos do desmatamento na Amazônia colocam o País na contramão dessa irreversível tendência”.
O especialista pondera que, no momento em que a crise deflagrada pela expansão do novo coronavírus cria gravíssimo impacto planetário de múltiplas consequências, alguns fatos de especial relevância causam inédita preocupação pelo poder que têm em interferir nos já difíceis e imprevisíveis rumos do desenvolvimento humano, social e econômico global no futuro pós-pandemia.
Dentre tais fatores, ele aponta a maneira como distintas dimensões da crise entrelaçam-se no Brasil, fazendo convergir problemas anteriores e aqueles deflagrados pela Covid-19. Isso tem repercussões ambientais e sociais de alto risco para o País, seu povo e instituições, bem como para a humanidade. “Afinal, é inegável que o Brasil, por suas características geopolíticas, diversidade cultural e incomparável patrimônio ambiental, é um dos pilares para o turning-point que aponta cada vez mais, em escala global, para uma renovação estruturante dos conceitos de desenvolvimento prevalentes até o momento. Estes precisam ser reinventados com urgência, visando garantir até mesmo a vida na Terra, como alertam diariamente os efeitos dramáticos das mudanças climáticas, da perda de biodiversidade e da decrescente disponibilidade de água”, ressalta.
Eugênio Singer destaca que autoridades públicas dos distintos níveis de responsabilidade, centros de pesquisa, universidades, comunidade de saúde e sociedade civil empenham-se em atender às urgências da pandemia e, ao mesmo tempo, em preservar a capacidade do Brasil de se recuperar com a minimização possível de danos. “Porém, é preciso alertar sobre alguns pontos que podem ter efeitos desastrosos no futuro próximo do País e na sua inserção nos esforços globais de soerguimento, cada vez mais comprometidos com o desenvolvimento sustentável e a defesa dos direitos humanos”, observa, apontando cinco questões prioritárias:
1) Assim como grupos empresariais de diferentes nações, vinculados a diversos ramos de atividade econômica, manifestaram seu desconforto com os rumos que vem tomando a destruição da Floresta Amazônica, com aumento expressivo do ritmo e do volume do desmatamento, não poderíamos deixar de apresentar nosso ponto de vista. Nossa posição é lastreada pela presença de corporações estrangeiras no Brasil, especificamente da Europa, América do Norte e Ásia, em setores importantes, como os da agricultura, infraestrutura, transporte, mineração, saúde, telecomunicações, energia, petróleo e gás, automotivo, farmacêutico e alimentos. Vemos com crescente mal-estar a fragilização das condições de investimento no País. Este problema decorre das sinalizações efetivas, dadas por instituições e personalidades de governo, por meio de palavras, ações e omissões, de um afastamento dos preceitos ecológicos. Trata-se de postura em sentido contrário dos protocolos de ação consolidados no mundo inteiro, que reconhecem a necessidade – e, mais do que isso, a urgência inarredável – de respeitar e defender o meio ambiente como bem estratégico de uso coletivo, a ser planejado e utilizado como tal, e não mais como objeto de uso predatório e centrado em interesses produtivos mais imediatos. Fazemos parte da parcela crescente da sociedade global que, finalmente, reconhece na conservação rigorosa e de base científica dos recursos naturais e dos bens da natureza um ativo de imenso valor, preponderante para o crescimento econômico sustentável. É este o fator que garantirá às empresas uma inserção mais acolhedora e sensível nas questões sociais e culturais, imprescindíveis para um avanço civilizatório capaz de preservar, inclusive, nossos interesses e capitais. Tais movimentos transformadores são inadiáveis.
2) A pandemia atual e seus efeitos devastadores mostram-nos que a retomada das atividades e das esperanças individuais não deve pretender apenas recompor o desenho previamente existente no qual espelhávamos nossas vidas, nossas sociedades, nossa economia e nossas interações locais, nacionais e globais. A recuperação exige pensamento estratégico. É decisivo dar um passo à frente, dialogar com as reflexões e respostas positivas e inovadoras hoje gestadas no mundo todo. Dessa forma, é incompreensível e causa perplexidade que o Brasil não se dedique a inserir fortemente a Amazônia preservada como parte fundamental de seu cacife para a conjuntura necessariamente diferenciada que surgirá da crise da Covid-19. Mas, não é o que vemos. Ao contrário, observa-se o aumento expressivo e persistente do desmatamento, a fragilização dos órgãos de fiscalização com expertise na área ambiental e a redução significativa das punições impostas aos infratores, a despeito de novos arranjos institucionais formalmente destinados à proteção da Floresta Amazônica.
3) Ao mesmo tempo, causa-nos profundo pesar constatar a situação de risco extremo a que estão submetidos os povos indígenas em todo o País, sobretudo na Amazônia. À escalada da pressão de atividades ilegais de mineração e desmatamento em suas terras, mesmo as já demarcadas, soma-se agora a ação devastadora do novo coronavírus. Mesmo diante de tais ameaças concretas, esses brasileiros não vêm recebendo a atenção diferenciada que sua situação de maior vulnerabilidade exige. Em contraste com o esforço voluntário da sociedade civil brasileira e internacional para socorrê-los, é nítida a participação tímida dos órgãos governamentais destinados à proteção indígena, mesmo diante dos números que indicam um impacto que pode ser fatal para várias etnias.
4) Entendemos ser indissociáveis as duas questões aqui destacadas, ou seja, a proteção ao meio ambiente e os direitos indígenas. A destruição de uma acarretará graves danos à outra e vice-versa. E ambas são conquistas que estão na base do pensamento crítico e analítico que nos leva, desde o século passado, a rever padrões de valores que fundamentam a vida em sociedade e, principalmente, a arejar o pensamento empresarial sobre seus compromissos para além da realização econômica. Hoje, de maneira nítida e abrangente, tais princípios passam a fazer parte intrínseca da vida das empresas, dos critérios de mercado, de investimentos e de viabilidade de parcerias. E não há como ser diferente, dadas as duras lições que a humanidade tem aprendido sobre o uso predatório dos recursos naturais e sobre a desconsideração de direitos humanos, sociais e culturais básicos. Embora ainda não possamos afirmar a hegemonia desses novos parâmetros, sabemos que é um caminho sem volta, no qual países, corporações e indivíduos engajam-se cada vez mais. Afinal, não se trata de ideologia, mas de constatar, o que temos feito com frequência e bom senso, o efeito virtuoso de tal atitude, inclusive para os resultados da produção econômica. Trata-se, enfim, de trazer o futuro para os cálculos do presente e de não destruí-lo.
5) Assim, ao mesmo tempo em que reconhecemos no Brasil um tradicional ambiente propício a investimentos, não podemos ignorar e deixar de nos manifestar a respeito da insegurança atual quanto aos fatores aqui expostos. Ao mesmo tempo em que vemos o País como potência ambiental capaz de participar de maneira decisiva da recomposição planetária pós-pandemia, reconhecemos num possível estigma antiambiental e contrário aos direitos indígenas o poder de afastá-lo da interlocução global e do fluxo de capitais, para os quais este é um ponto de difícil superação. E, certamente, a política ambiental atual, com um nível ponderável de relaxamento dos protocolos básicos de licenciamento, controle e garantia de transparência dos dados sobre desmatamento, aliada ao insuficiente apoio às comunidades indígenas, não é um caminho que possa dar suporte a parcerias duradouras com corporações, instituições e fundos globais.
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Organizações da sociedade
civil pedem ao Congresso que revogue a facilitação do
uso de armas para a caça
Por iniciativa de entidades
ambientalistas, 137 organizações reivindicam em
manifesto que Câmara e Senado votem pela
anulação de decretos e portarias que facilitam o acesso a armas
Um conjunto de 137 organizações da
sociedade civil, como WWF- Brasil, Rede de ONGs da Mata Atlântica-RMA, Observatório do Clima - OC, Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais - FBOMS, Mater Natura -
Instituto de Estudos Ambientais, Observatório de Justiça Ecológica - OJE/UFSC e Instituto Sou da Paz assinam uma
carta coletiva em que denunciam a expansão de compras e registros de novas
armas de fogo. O problema tem relação com as alterações em decretos e portarias
do Exército pelo governo Bolsonaro.
O grupo de Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs) é um dos mais beneficiados pela política armamentista do governo.Os ativistas
denunciam que o registro concedido pelo Exército e a consequente autorização de compra de armas e munições têm grande influência no aumento da caça ilegal a animais nativos do Brasil.. Uma vez que as armas foram compradas e registradas, é quase impossível
fiscalizar como serão
utilizadas. A diminuição da diversidade dos animais silvestres ocasionada pela caça acarreta em impactos diretos sobre a
estabilidade climática,
deficiências nos ciclos
naturais e outros serviços
ecossistêmicos dos quais
depende a nossa economia.
“Pedimos
medidas urgentes por parte do parlamento brasileiro para que pautem e aprovem
os Projetos de Decretos Legislativos que tratam do tema a fim de sustar esse
processo de facilitação de acesso dos cidadãos (CACs) às armas e às munições que contribuem para a deterioração da segurança pública de nossa população e a destruição
das condições de vida silvestre em nosso país”, subscrevem as organizações.
O que pensa a população brasileira - De acordo com pesquisas do Ibope: 73% são
contra a flexibilização do porte de armas por cidadãos comuns; 61% são contrários à maior facilidade para possuir arma em casa
e 93% dos brasileiros são contra a caça. Afirmações que são corroboradas
pelas assinaturas eletrônicas
de mais de um milhão de pessoas na plataforma Change contra Projetos de Lei que
tramitam no Congresso Nacional para favorecer a flexibilização da legislação
para acesso às armas de caça.
O Fórum de ONGs Ambientalistas é um dos signatários do manifesto, participe também desta campanha, compartilhe!
Atualmente, no Brasil, somente está liberada a caça de controle a uma espécie animal exótica e invasora, o javali-europeu (Sus scrofa) e a seu híbrido, o porco-doméstico (javaporco).
Confira o texto do Manifesto sobre Armas de fogo, Biodiversidade e Serviços ambientais, na íntegra, com o nome de todos seus signatários aqui.