Equipe Bolsonaro
Quem são os principais financiadores de Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente
Mais de 100 empresários do
agronegócio, e de setores como armas e munição, deram dinheiro para a
campanha de Ricardo Salles a deputado federal. Vídeo anuncia "sinergia"
dos ruralistas com o novo ministro
por Cida de Oliveira, da RBA
publicado
17/12/2018 08h19,
última modificação
18/12/2018 13h25
Gilberto Marques/A2img/Governo de SP
Salles (terceiro da direita para a
esquerda) durante cerimônia de posse de dirigentes da Sociedade Rural
Brasileira, em março de 2017. Ao seu lado, sua futura colega de governo:
Tereza Cristina, a 'dama do veneno', que assumirá a pasta da
Agricultura
São Paulo – Anunciado pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) para ministro do Meio Ambiente, o advogado e ex-secretário de Geraldo Alckmin (PSDB), Ricardo Salles,
é tudo que os ruralistas desejam: um homem afinado com os interesses do
agronegócio e que vai atuar em sinergia com quem "quer trabalhar", como
têm anunciado com entusiasmo expoentes do setor. Em outras palavras,
retirar entraves e acabar com a "indústria de multas do Ibama" conforme
promessa de campanha do capitão reformado do Exército que deve tomar
posse neste 1º de janeiro.
Além de entrevistas, circula em grupos de WhatsApp um vídeo, gravado na Granja do Torto, em que o futuro ministro aparece entre o dirigente da Sociedade Rural Brasileira, deputado federal eleito Frederico D’Ávila (PSL-SP) e o “comandante em chefe das forças agrícolas”, o presidente da União Democrática Ruralista (UDR) Luiz Antônio Nabhan Garcia e o futuro ministro.
“Meus amigos, estou aqui com Frederico D’Ávila, nosso
deputado estadual, liderança do agro, e nosso presidente Nabhan Garcia,
grande força de todo setor, para dizer a vocês que nós teremos total
sinergia da agricultura com o meio ambiente. Total respeito ao produtor
rural e nosso apoio”, afirma Salles. Afago para os ruralistas, a
convicção de suas palavras reforça, mais uma vez, seu compromisso com o
setor. E demonstra que ele se sente representado por essas lideranças.
Desejando sorte ao futuro ministro, o “comandante em chefe”
Nabhan diz que Salles fará uma grande administração. “Porque (Salles) à
frente do Meio Ambiente significa o fim do estado policialesco e o fim
do estado confiscatório (sic) em cima de quem trabalha e produz nesse
país”.
Criado em 1993, o Ministério do Meio Ambiente tem
como missão formular e conduzir políticas públicas para o setor em todo o
país. Isso significa proteger as florestas, os recursos hídricos, os
ecossistemas, florestas e toda a biodiversidade do avanço de um modelo
de agropecuária predatória, baseado no desmatamento para pastos e para a
monocultura, dependente do uso de sementes transgênicas e de
agrotóxicos – que já consumiu praticamente todo o Cerrado e avança em
direção à Amazônia.
No entanto, pelo conteúdo do vídeo (assista a seguir), o
Meio Ambiente tem tudo para ser submetido à Agricultura, tal como
Bolsonaro pretendia com a duramente criticada fusão das duas pastas.
Suplente
Outra forte evidência de que o escolhido por Bolsonaro é o
homem sob medida para transformar o Ministério do Meio Ambiente em uma
sucursal do Ministério da Agricultura é o perfil dos apoiadores de sua
disputa por uma vaga na Câmara. Sem conseguir votos suficientes para se
eleger deputado federal pelo Novo paulista, Salles, que é fundador do
Movimento Endireita Brasil ficou como suplente.
A campanha, aliás, está sendo questionada pelo Ministério Público Federal
por abuso de poder econômico. O então candidato publicou diversos
artigos sobre sua plataforma em jornais de grande circulação dias antes
da eleição.
Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
mostram que o total arrecadado foi de R$1.567.339,90, montante bem
menor que os R$ 2.239.027,97 da campanha da deputada federal eleita e
futura ministra da Agricultura Tereza Cristina (DEM-MS).
Presidente da Frente Parlamentar Agropecuária,
a parlamentar viu seu cacife aumentar depois de conseguir, com suas
manobras, aprovar em comissão especial o substitutivo para projetos que
compõem o Pacote do Veneno, que praticamente revoga a atual Lei dos Agrotóxicos.
O pacote que visa facilitar o registro e alavancar ainda mais as vendas
desses produtos está pronto para ser votado pelo plenário da Câmara. Se
for aprovado, segue para sanção presidencial.
A lista de Salles inclui financiamento coletivo de um pequeno grupo e mais 108 nomes de pessoas físicas. A RBA
apurou se tratar de grandes empresários dos mais diversos setores, que
têm no agronegócio o carro chefe de suas empresas ou mesmo uma atividade
secundária.
É o caso do presidente do conselho de administração
da Porto Seguro Seguros, Jayme Brasil Garfinkel. Principal acionista da
Porto, é também o principal doador da campanha de Salles, tendo
contribuído com R$ 260 mil, equivalente a 16% do total. Mais conhecido
por dirigir uma das três maiores seguradoras do país, o empresário tem
entre seus negócios a Fazenda Periquitos Companhia Agropecuária. A propriedade que se estende por parte de Três Lagoas e Selviria (MS), produz soja e gado de corte.
Outro é José Salim Mattar Junior, controlador da Localiza Hertz,
empresa mais valiosa do setor de locação de automóveis. Anunciado como
futuro secretário de Privatizações de Bolsonaro, é o segundo maior
doador de Salles. Depositou na conta da campanha R$ 200 mil. Entre outros de seus negócios está o Haras Sahara,
em Matozinhos (MG). Embora o site remeta apenas à criação de cavalo
árabe, a ficha no cadastro nacional da pessoa jurídica (CNPJ) da Receita
Federal informa que a fazenda, entre as atividades econômicas
secundárias, cria gado de corte.
Remédios
Diretor-superintendente da Companhia Comercial de Drogas e
Medicamentos, a Codrome, Ronaldo José Neves de Carvalho segue em
terceiro na lista dos financiadores da campanha do agora futuro
ministro. Doou R$ 100 mil. O comandante da Drogaria São Paulo, uma das
maiores redes do setor, tem negócios que vão além da venda de remédios.
Conforme a Receita Federal, a Agropecuária Codrome é
proprietária do Sítio Rancho Alegre, em Mirandópolis (SP), que tem como
atividade principal o cultivo de seringueira. A secundária é a cana de
açúcar. Na Fazenda Moinho, em Guaracai, com 4.308 hectares, também
cultiva cana de açúcar e seringueira. No mesmo município, uma terceira
fazenda do grupo, a Caetés, produz cana, seringueira, abacaxi e gado
leiteiro.
Outro famoso patrocinador é Luis Stuhlberg, gestor do Fundo Verde do Credit Suisse Hedging-Griffo (CSHG),
com R$ 50 mil para a campanha. O fundo, elogiado pelos analistas como
dos mais rentáveis, recebe aplicações de pessoas físicas, jurídicas e de
outros fundos de investimento administrados pela própria CSHG. Os
recursos captados são então investidos em mercados de capital como
ações, câmbio, juros e commodities agrícolas.
Segundo analistas de investimentos, só obtêm ganhos com aplicação em papeis dessas commodities quem realmente "conhece bem" o setor.
Também aplicou R$ 50 mil na campanha de Salles o
empresário Gastão de Souza Mesquita, controlador de uma das maiores
empresas do agronegócio do país, a Companhia Melhoramentos do Norte do Paraná (CMNP). O grupo atua na produção de etanol e na pecuária.
Alexandre Balbo Sobrinho, da Cana Verde –
que tem em seu portfólio açúcar orgânico para um nicho de mercado que
pode pagar mais caro –, doou R$ 41 mil. Ele é também controlador da
Agropecuária Iracema, que tem canaviais e usinas de produção
convencional de açúcar e de etanol espalhadas pela região de
Sertãozinho (SP).
Grãos, armas e munição
Contribuíram com R$ 30 mil cada os empresários Flávio Pascoa Teles de Menezes, Eduardo Define e Antonio Marcos Moraes Barros.
Menezes, que já foi presidente da Sociedade Rural
Brasileira, tem fazendas em Buritama, Vicentinópolis, Birigui,
Araçatuba, Castilho e Santo Antonio do Aracangua, em SP, onde
produz soja, cana, milho e gado de corte. Ele é parte de uma disputa por
terras em Japorã (MS), reivindicando a fazenda Remanso-Guaçu, em posse
de famílias indígenas por uma determinação judicial.
Define tem entre seus negócios a criação de gado de
corte, a comercialização de matérias-primas agrícolas, armazéns e o
processamento do conhecido arroz Brejeiro. A marca cresceu e incorporou novos produtos, como óleos de soja, entre outros.
Também dedicado à produção agrícola, com fazenda de café em
Caconde (SP), e de produção de grãos e gado de corte em Amambaí (MS),
Moraes Barros é presidente da Companhia Brasileira de Cartuchos, a CBC.
Além de dirigir a empresa fabricante de munições, é um dos maiores acionistas das fábricas de armas Taurus.
Seguindo a lista, agora com doações de R$ 25 mil estão Salo
Davi Seibel, Marcelo Campos Ometto, João Guilherme Sabino Ometto e
Helio Seibel. Salo e Hélio controlam o Grupo Ligna, constituído pela Leo Madeiras, Duratex e a Ligna Florestal, com 60 mil hectares de terra em Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
Marcelo Ometto é presidente do conselho de administração do Grupo São Martinho e João
Guilherme, o vice. Com três usinas no interior de SP e uma no interior
de Goiás, a companhia está entre os maiores grupos produtores de açúcar e
etanol.
Num grupo de 17 que doaram valores próximos a R$ 25 mil estão ainda empresários como Elie Horn, da Cyrela e
Tecnisa; Rafael Sales Guimarães, do setor de shopping centers; João
Carlos de Paiva Veríssimo, da Moinho Paulista, e Arthur Vicintin Neto,
do setor metalúrgico. A reportagem não encontrou vínculo direto desses
nomes com propriedades de produção agropecuária.
Maiores desmatadores
Entre aqueles que oficialmente investiram valores menores
estão Gustavo Diniz Junqueira (R$ 500), Renato Diniz Junqueira (R$
2.000), Roberto Diniz Junqueira Filho (R$ 5 mil) e Carlos Viacava (R$ 5
mil).
Ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira e nomeado
futuro secretário estadual da Agricultura de São Paulo, gestão João
Doria (PSDB), Gustavo é sócio das fazendas Santa Claudia, em Pirapozinho
(SP), onde planta cana, e da Bela Vista Agropecuária, em Guaíra, com
soja – nesta Gustavo é sócio de Roberto Diniz. Renato Diniz cultiva cana
na fazenda Pontal da Onça, em Guaíra (SP), e na fazenda Sucuri, em
Morro Agudo (SP), cria gado de corte.
Ministro da Agricultura no governo do general João
Figueiredo (1979-1985), Carlos Viacava é produtor de soja, cana, milho e
gado de corte em fazendas em Presidente Epitácio (SP). Um dos seus
sócios é seu filho, Ricardo Caldeira Viacava, casado com Ana Luiza
Junqueira Vilela Viacava. O casal está entre os acusados pelo Ministério Público Federal de grilagem e desmatamento de terras públicas no Pará.
Em junho de 2016, o Ibama, a Polícia Federal, o Ministério Público Federal (MPF) e a Receita Federal deflagraram a Operação Rios Voadores. Segundo várias denúncias oferecidas pelo MPF, um grupo chefiado pelo ruralista socialite e irmão de Ana Luiza, Antônio José Junqueira Vilela Filho, o AJ Junqueira, e Ricardo Viacava, teriam
desenvolvido metodologia para conversão forçada de florestas em
pastagens, com uso de mão de obra análoga à escravidão, movimentando R$
1,9 bilhão em quatro anos (2012-2015) e destruindo 290 quilômetros
quadrados de florestas em Altamira (PA) – uma área do tamanho de Belo
Horizonte.
AJ passou a ser chamado de maior desmatador do país, tendo causado um prejuízo ambiental estimado em R$ 420 milhões. Clique aqui para acessar o processo na Justiça Federal do Pará.
Na época, Vilela Filho, Viacava e Ana Luiza chegaram a ser presos, mas acabaram libertados por um habeas corpus e respondem ao processo em liberdade. Outra irmã, Ana Paula Junqueira Carneiro Vianna, socialite que foi casada com bilionário sueco, teve mandado de condução coercitiva, mas estava fora do Brasil.
Os envolvidos, que negam qualquer participação nos crimes
apontados pelo MPF, questionaram a competência do foro onde tramita o
processo. No começo de novembro passado, a Justiça Federal em Altamira
acatou ação de AJ Junqueira, transferindo o processo para a subseção de
Itaituba, também no Pará.
Já o Ministério Público de São Paulo (MPSP) acusa AJ de
tentar matar a trabalhadora sem terra Dezuíta Assis Ribeiro Chagas, no
acampamento 1º de Maio, vizinho a fazendas da família em Euclides da
Cunha Paulista, no pontal do Paranapanema.
O inquérito que apurava a tentativa de
homicídio estava arquivado por falta de provas. No entanto, com o
episódio do Pará, o MPSP utilizou provas coletadas nas investigações da
operação Rios Voadores para denunciar novamente AJ, que responde em
liberdade.
Segundo desafetos, o futuro ministro do Meio Ambiente – do qual pouco se sabe sobre sua história – é um lobbista que enriqueceu de uma hora para outra, que é investigado por adulterar processos e tem ligações nebulosas com os Junqueira.
Em abril de 2013, Salles estaria entre os convidados da festa de 35
anos de AJ Junqueira em sua casa, no Jardim Europa, região nobre de São
Paulo.